THE LAST DANCE

Estou no me que parece ser um galpão escuro. Não consigo enxergar, mas algo me diz que não estou sozinha. Aguardo um tempo até minhas pupilas dilatarem, mas continuo sem ver qualquer coisa que seja.

Antes que eu possa perguntar quem está aqui comigo, ouço três passos e em seguida um holofote se ascende na minha frente. Hesito antes de chegar até onde está sendo iluminado pela luz e então, assim que chego, olho ao meu redor, procurando por quem dera aqueles passos e ascendeu a luz.

- Haymitch, é você? - pergunto quase involuntariamente. Algo me diz que ele seria a única pessoa possível de estar aqui, mas não consigo entender o que me levou a esta conclusão.

Ouço novamente os passos, seguidos de uma voz vinda de trás de mim.

- Quem mais seria? - ouço-o dizer. Viro-me, então, para finalmente vê-lo e um sorriso nasce nos meus lábios. Haymitch parece tão seguro de si quando caminha em minha direção.

- O que estamos fazendo aqui? - indago, franzindo o cenho. Haymitch sorri um pouco e o lanço um olhar desconfiado.

- Para ser sincero, eu não sei - ele responde, ainda sorrindo.

De repente, uma música começa a tocar. Olho para cima, assustada, tentando entender de onde vem o som, mas parece vir de todos os lados. Haymitch também olha para cima, mas não parece tão assustado quanto eu. A melodia é apenas no piano, lenta, como uma valsa. Fecho os olhos e aproveito a música, deixando os meus ouvidos a absorverem ao máximo. Então volto a abrir os olhos e quando olho para frente, vejo Haymitch com um braço estendido, convidando-me a dançar.

- Você dança? - pergunto, surpresa.

- Dá para desenrolar um pouco - ele diz, um pouco desconcertado.

Mordo o lábio e seguro sua mão. Haymitch me conduz até o centro da área iluminada e me para de frente para ele. Com a outra mão ele segura a minha cintura e eu descanso a minha em seu ombro. Então começamos a dançar.

Um, dois, três... a música permanece no mesmo ritmo, lenta. Um, dois, três... me sinto presa olhando em seus olhos. Um, dois, três... ele levanta minha mão e me gira. Um, dois, três... sua mão passa para as minhas costas, aproximando-me um pouco mais. Um, dois, três... posso sentir o cheiro de álcool mais forte. Então nos movimentamos mais lentamente. Ele agora me segura com as duas mãos e as minhas estão envoltas no seu pescoço. A música está chegando ao fim. Seu rosto começa a se aproximar do meu aos poucos e os meus olhos se fecham.

Effie.

Ouço alguém me chamar, mas está tudo escuro. Não sinto o beijo de Haymitch.

- Effie! Effie, acorda! - me chamam novamente e me desperto. Quando olho para frente vejo Peeta prendendo o riso. - Effie, em que mundo você estava?

Olho ao meu redor e percebo que estou na estação de trem, na Capital. Então volto a mim. Os garotos estão voltando ao Distrito 12. Katniss também está rindo da situação. Já Haymitch, por outro lado, parece ainda estar tendo devaneios. A seriedade em seu olhar distante diz tudo.

- Me desculpe - digo, sentindo-me envergonhada. Provavelmente já está na hora deles irem embora e queriam se despedir.

Peeta me abraça forte e murmura algo como "ir conosco". Bufo e balanço a cabeça depois que nos separamos. Katniss vem em seguida e repete o ato de Peeta, porém um pouco receosa. Aperto o abraço para deixar claro que ela pode contar comigo e finalmente sinto-a retribuir. Dou-lhe um beijo no rosto e seguro suas mãos por alguns instantes.

- Você é uma heroína, Katniss - digo e ela sorri em resposta.

- Obrigada por tudo, Effie - ela diz.

Volto a olhar para Haymitch, que agora já parece estar de volta a si, mas ainda "distante". Caminho até ele, um pouco nervosa por conta do sonho que tivera há pouco.

- Ei - digo. Haymitch levanta a cabeça de imediato e me fita em silêncio. Seus olhos trazem um lamento que, acredito, seja maior que o meu. - Acho que... - tento continuar, mas na verdade não sei o que dizer. E ao que me parece, Haymitch parece também não saber.

Abro a boca para tentar dizer mais alguma coisa, mas ele me interrompe quando me puxa para um abraço. Me prendo a ele por um bom tempo, desejando que isto não acabe. Afundo minha cabeça no seu ombro e sinto seu cheiro, querendo memorizá-lo. Não que seja difícil. Apesar de não ter mais bebido, o cheiro de álcool ainda impregna sua pele. E, apesar de ter cismado muito com isso, sinto-me bem ao sentir o cheiro.

Me afasto um pouco dele para poder fitá-lo. Seguro seu rosto em minhas mãos e respiro fundo.

- Se cuida, ta? - digo. Haymitch mexe de leve o canto da boca no que me pareceu um sorriso. - Tenta não beber - acrescento e ele faz uma careta.

- É... você também - ele diz.

- Mas eu não bebo, Haymitch - corrijo-o.

- Se cuida... pra você se cuidar.

Concordo com a cabeça. Talvez eu esperasse que ele dissesse outra coisa. Na verdade ainda espero.

Olho para trás e vejo a bolsa que eu trouxe. Mordo o lábio e penso no que dizer, mas nada me vem a cabeça no momento. Mas sou pega de surpresa quando sinto a mão de Haymitch mexer na minha peruca. Viro-me imediatamente para ele e o pego sorrindo um pouco.

- O que foi? - pergunto.

- Ainda prefiro você sem isso - ele diz e eu deixo escapar uma ponta de riso.

- Eu disse que a moda sempre volta.

- Mas só aqui na Capital. No Distrito 12 você poderia ficar normal.

Franzo o cenho e cruzo os braços, avaliando-o de cima a baixo.

- O que quer dizer com isso, Haymitch? - pergunto, já imaginando a resposta. Na verdade, torcendo por estar certa.

Ele suspira antes de responder.

- Seu lugar não é aqui, Effie - ele diz. Franzo o cenho e desvio o olhar por um instante.

- Aqui sempre foi o meu lugar - respondo, mas minha voz não sai tão firme quanto eu gostaria.

- Mas não agora - ele me interrompe, segurando as minhas mãos. - Você não precisa mais disso e você sabe muito bem.

- Mas eu...

- Shhh - me interrompe novamente, pondo um dedo nos meus lábios. - Você vai entrar neste trem e levar aquela mala que você trouxe - ele continua, apontando para a bolsa que eu deixei no banco - porque eu sei que ela está cheia de roupas suas.

- Quem disse que tem roupas lá dentro? - indago com a voz fina, acusando-me. Tento não olhar para Haymitch, mas percebo um sorriso brincalhão em seus lábios. - Não tem... nada.

Haymitch me fita desconfiado.

- Ta bom - ele diz. - Então eu vou lá checar.

- Não! - me adianto e o seguro pelo braço. - Não precisa. - acrescento. Haymitch não resiste e desata a rir. Sinto meu rosto corar de raiva e permaneço da mesma forma. Suspiro antes de prosseguir. - Tudo bem, Haymitch... eu... eu trouxe as minhas coisas.

- Eu sei disso - diz Haymitch. Ele dá um passo curto para frente e me segura pela cintura. Acabo sentindo um frio na barriga com o toque, mas disfarço minha reação e olho para baixo. Haymitch, então, me aperta um pouco mais e me aproxima dele, obrigando-me a olhar nos seus olhos. - Você não consegue mentir para mim.

- Mesmo? - pergunto, arqueando uma sobrancelha.

- Tenho certeza - ele diz. - Assim como eu sei que você quer me beijar.

Meu estômago revira novamente. Ele me pegara de surpresa, mas antes que eu pudesse pensar em qualquer coisa para dizer, Haymitch me envolve em seus braços e me beija. Ele me mantem junto ao seu corpo, puxando-me cada vez mais. Ele dá dois passos para trás e eu o acompanho, o que me faz lembrar do sonho que tivera há pouco: uma dança.

Tomamos um pouco de distância para nos vermos novamente. Haymitch sorri de leve.

- Está na hora de ir - ele diz e eu concordo com a cabeça. Viro-me para ir ao trem, mas sou surpreendida quando Haymitch me joga por sobre o ombro e me carrega até lá.

- Me põe no chão, Haymitch! - protesto enquanto ele continua caminhando. Consigo ouvir sua risada.

- Peeta, pega a bolsa dela ali em cima - ele diz e vejo o garoto obedecendo-o. Este e Katniss entram no trem rindo e entramos em seguida. Haymitch acaba esbarrando a minha perna na lateral da entrada e grito querendo descer, mas ele não me ouve. Desisto, então, de protestar e fico observando o que há atrás de nós. Até que a porta por onde entramos se fecha.

Estamos indo para o Distrito 12.