Um Coração Teimoso! escrita por JL Yújó


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Uma excelente leitura para vocês!! ♥ =^-^= ♥



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**

O que eu poderia fazer? O que havia para ser feito?

Não teria como eu ir embora e dar as costas para ela, assim como todos pareciam fazer. Eu a amo, sempre a amei! Oh, coração teimoso!

Âmber Harris sempre foi à típica filhinha de papai, mimada, 1,65m de altura, loira de olhos verdes, roupa da moda e, como não poderia deixar de ser, capitã das líderes de torcida. Claro, ela tinha de namorar o capitão do time de futebol americano, também. Um playboy que adorava bancar o terror nos que ele considerava inferiores.

Quem eu sou?

Bem, sou uma garota normal. 1,75m de altura, cabelos negros, olhos castanhos escuros, magra, porém, com músculos definidos de uma nadadora. Não que eu seja uma, apenas gosto de praticar artes marciais na academia do meu pai. Minha mãe faleceu quando eu era pequena em um acidente de carro, mal me lembro dela. Tenho um irmão mais velho que está na faculdade, seu nome é Trevor... Oh, só para constar, meu nome é Charlotte Lopez e, sim, sou uma latino-americana muito orgulhosa de minhas origens.

Meu pai sabe de minha opção sexual e a única coisa que disse foi: Graças a Deus, assim eu não preciso ficar me preocupando com os marmanjos!

Vai entender!

Mas permitam-me contar-lhes um pouco de minha atual aflição.

A primeira vez que eu vi a Âmber, meu pobre coração quase saltou de usa caixa torácica para chegar a ela. Estávamos no primeiro ano do ensino médio. Três anos depois, acho que esse órgão traiçoeiro é um masoquista inveterado, pois não cedeu um só centímetro de si para amar outra pessoa.

A loira não me destrata como a ‘trupe’ dela faz, mas não podemos ser consideradas amigas, também. Mal trocamos uns ‘oi’, ‘como vai?’ ou ‘bom fim de semana!’ durante esses anos. Sempre que via o namorado dela agarrando-a na frente de todos, eu tinha de segurar as lágrimas persistentes que teimavam a embaçar minha visão. Sofri calada por todo esse tempo.

Patético, não é?

Eu sei, mas quando a razão vencer uma briga com o coração o mundo não será mais mundo!

A mais ou menos um mês, percebi que Âmber estava mais reservada, triste e sendo um pouco ignorada por seus amigos. Apesar de minha curiosidade e inquietude para saber o que a estava afligindo, decidi esperar e ver no que iria dar.

Ali estava eu, sentada sozinha em uma mesa da cantina, lanchando sossegada quando começo a escutar uma discussão. Estava pronta para ignorá-la quando reconheci a voz alterada de Âmber.

- Como assim, você não tem nada a ver com isso, Erick?! – ela estava gritando com o namorado.

- Eu não vou estragar a minha vida por sua culpa! – o jogador retrucava irritado, cheguei a ficar em pé, pensando que ele fosse agredi-la, mas, felizmente, um de seus amigos o segurou pelo braço.

- Que culpa eu tenho se o preservativo estourou, seu idiota?!

- Eu também não tenho culpa! – ele retrucou.

As palavras deles já estavam começando a fazer certo sentido em minha cabeça quando a diretora se interpôs entre eles e ordenou que a acompanhassem até a sua sala. Assim que saíram os alunos remanescentes começaram a especular sobre a discussão.

Os ditos amigos estavam nem aí para o que iria acontecer com os amigos, bem, exceto por uma garota que se dizia melhor amiga de Âmber. Ela estava comentando com as outras líderes de torcida o quanto a loira foi burra e que agora ela iria poder ter o Erick só para ela.

Com uma amiga dessas quem necessita de inimigas, não é verdade?

No momento que as aulas do dia terminaram, uma chuva forte começou a desabar dos céus. Minha mente estava ocupada se preocupando com Âmber enquanto eu fazia o meu caminho para a minha casa, preferi ir a pé para colocar meus pensamentos em ordem. Sorte que me lembrei de colocar o meu guarda-chuva em meu armário da escola.

Eu estava passando pelo parque infantil que ficava a poucos quarteirões da escola e, claro, da minha casa, quando algo, ou melhor, alguém chamou a minha atenção. Havia ali uma garota totalmente molhada sentada em um balanço, seus ombros estavam tremendo, não sei se de frio ou de soluços. Seus cabelos loiros chegando até a cintura denunciaram imediatamente quem era.

Apressei meu passo e estendi meu guarda-chuva para amparar-lhe, mas era inútil já que ela não tinha nem mesmo uma capa para evitar encharcar-se com aquele temporal.

Ela encarou-me com uma expressão tão derrotada que eu podia ouvir meu coração quebrando como um vidro fino após levar uma bolada.

Não falei nada, apenas retirei meu casaco, cobrindo-lhe os ombros, apanhei a sua mochila de dentro de uma poça d’água, pendurando-a junto a minha, sorte que deixávamos os livros na escola. Passei um braço por seus ombros e a induzi a me acompanhar até a minha casa, não sabia bem onde ficava a dela.

Minha casa era... Como eu posso dizer? Sendo direta, uma mansão!

Sabe a academia do meu pai? Ele tem uma rede nacional delas, além de ser dono de uma rede internacional de hotéis luxuosos, mas como a sua paixão são as suas academias ele colocou um CEO para gerir seus outros empreendimentos... Mas ele está sempre por dentro das coisas!

Mas esse fato não pareceu infiltrar-se na mente de Âmber enquanto eu a guiava para dentro e pedia que a governanta preparasse algo quente para ela. Levai-a para meu quarto, fazendo-a sentar-se em minha cama, ignorando que ela estava molhando-a. Larguei as mochilas num canto qualquer do quarto.

- Você precisa tomar um banho e vestir roupas secas, Âmber! – ditei suavemente, mas ela parecia em transe. Novas lágrimas voltaram a descer por seu rosto delicado e suspirei.

Reuni toda a coragem que eu ainda tinha naquele momento e comecei a despi-la. Assim que ela estava só de roupas intimas, comecei a cantarolar o hino nacional em minha mente. Não estava funcionando muito bem. Comecei a recitar todos os golpes de artes marciais que eu conheço e a levei ao banheiro do meu quarto.

Pelo o tempo em que estava terminando de enumerar todas as músicas de Evanescence, ela já estava de banho tomado e vestida novamente, com uma blusa do meu time favorito de futebol americano, uma calcinha box preta, que eu ainda não tinha usado, e adormecida confortavelmente em minha cama.

E eu?

Fui tomar um banho mega gelado para abaixar o fogo que queimava em meu baixo ventre.

Saí e vesti uma calça moletom preta e um suéter cinza de mangas compridas e gola em ‘V’.

Ouvi algumas batidinhas na porta do quarto e permiti a entrada. Sorri agradável para Carmem, nossa governanta. Uma verdadeira figura materna em minha vida e na do meu irmão.

- O que aconteceu, menina? Quem é ela? – ela indagou-me em voz baixa para não perturbar Âmber. Peguei a bandeja, estilo mesinha de café-da-manhã, de suas mãos e coloquei em minha mesinha de estudos.

Suspirei... Estava fazendo muito isso ultimamente.

- Âmber! – ditei simplesmente. Carmem ergueu uma sobrancelha em surpresa e encarou a loira encolhida em minha cama de casal.

- Aquela Âmber? – apenas concordei com um meneio de cabeça. – Oh! – franziu o cenho.

- Não pergunte! É assunto dela! – adverti e ela concordou.

- Tudo bem, então, chame se precisar de algo mais! – ela ditou, fazendo um breve carinho em meus cabelos curtos e saindo.

Caminhei meio hesitante até a cama e me sentei.

- Por quê? – a indagação sussurrada pegou-me de surpresa. Será que ela estava falando enquanto dormia? – Por quê? – tornou a repetir, desta vez ela sentou-se, recostando na cabeceira da cama e encarando-me. Seus olhos vermelhos e inchados, mas ainda tão linda como sempre.

- Porque o quê? – retruquei sem entender e fui buscar a bandeja, depositando-a em seu colo. Ela olhou-me confusa por um momento. – Coma, você estava debaixo desse temporal e em choque! – ditei gentil.

Ela me obedeceu, mas pude ver algumas lágrimas descendo por sua face pálida. Era uma canja simples, mas parecia estar muito gostosa e uma xícara de chocolate quente. Ela não tocou nesse último e eu estranhei.

Quem em sã consciência não gosta de chocolate? Ela pareceu notar a minha incredulidade.

- Eu ando enjoando muito esses dias!

Sabe aqueles momentos em que você daria tudo para conseguir chutar o próprio traseiro? Então, foi eu!

- Hum! – apenas resmunguei e desviei o olhar.

- Por quê? – ela tornou a indagar-me e eu tornei a encará-la em confusão. Ela revirou os olhos. – Porque você me ajudou? Nunca fomos amigas! – ela ressaltou e corou em seguida ao perceber o que falara.

- Eu não gosto de ver alguém em dificuldades! – o que não deixava de ser verdade. Ficamos em silêncio até ela terminar de comer e eu devolver a bandeja para a mesinha de estudos. – Então... Quer que eu ligue para alguém vir te buscar? Pai? Mãe? – indaguei gentil.

- Minha mãe! – ela murmurou de cabeça baixa e eu tornei a encará-la.

- Você quer conversar? – ela negou com um meneio. Suspirei e perguntei o número de sua casa. – Sua mãe disse que estará aqui em vinte minutos! – informei assim que desliguei.

- Obrigada! – ela murmurou, ainda sem encarar-me.

- De quanto tempo você está? – indaguei, sentando-me em uma poltrona que ficava próxima a janela alta do meu quarto. Ela pareceu surpresa por um momento e constrangida no seguinte.

- Dois meses! – ditou baixo, mas eu pude identificar a mágoa em seu tom. Franzi o cenho.

- Você já conversou com seus pais?

- Eles ficaram decepcionados quando contei! – ela murmurou chorosa.

- E os pais do Erick? – eu sei que estava sendo um tanto cruel nesse momento, mas eu realmente queria saber o que aconteceria com aquela criança.

- Eles não apóiam a gravidez, pois Erick conseguiu uma bolsa esportiva para a faculdade e eles não querem que ele a perca! Claro, aquele idiota também não fez muita questão de assumir! – ela ditou amarga.

- E você? Quer essa criança, Âmber? – indaguei simplesmente.

- Eu... Eu não sei! – ela confessou, apertando o edredom em um punho apertado e cerrando os olhos, impedindo que mais lágrimas descessem. – Eu me sinto tão sozinha! Meus amigos, ou melhor, as pessoas que eu considerava meus amigos não querem mais falar comigo! – ela corrigiu-se com um sarcasmo incomum para ela.

Tanto amargor vindo de alguém tão frágil e delicada me fazia querer chorar. Levantei-me e fui sentar ao seu lado na cama. Acho que foi um ato instintivo, não sei, mas quando dei por mim, meus lábios já estavam colados aos dela em um selinho carinhoso. Meus olhos não desviaram dos verdes até vê-los fechar lentamente e sua boca abrir-se com um suspiro. Aproveitei essa chance e transformei o selinho em um beijo explorador.

Afastamo-nos alguns minutos depois. Ambas ofegantes.

Suas faces não estavam mais pálidas como antes. Agora possuíam um rubor lindo e cativante. Sorri comigo mesma.

Saltei assustada quando bateram na porta.

- Entre! – permiti, ficando em pé e ocultando minha expressão de excitação.

- Menina Charlie, há uma senhora lá embaixo que veio buscar a sua... A menina Âmber! – ela retratou-se rapidamente ao notar meus olhos arregalados. Eu sabia que ela iria dizer sua Âmber.

- Claro! Faça sala para ela por um minuto, Carmem, por favor!

- Certo! – concordou e saiu, fechando a porta.

- E... Eu preciso ir! – ela ditou nervosa. Acho que já havia se recuperado do beijo e não sabia o que fazer. Fui até o meu closet e peguei uma calça moletom cinza com cadarços e um nome qualquer bordado que descia por uma perna na cor verde.

- Vista! – ditei ao entregar-lhe a peça, virando-me de costas para ela, dando um pouco de privacidade.

Ouvi o farfalhar dos lençóis e percebi que ela havia se levantado e estava vestindo a calça. Logo, ela estava passando por mim sem falar nada. Segurei seu braço, fazendo-a encarar-me surpresa.

- O que você... – cortei suas palavras com mais um beijo.

Eu sempre pensei, inocentemente, que essa minha obsessão por ela fosse por não poder tê-la, que se eu a beijasse e percebesse que ela não era tudo o que a minha mente fértil conjurava, talvez pudesse partir para outra, em especial, se ela não correspondesse ou me desse um tapa na cara, mas beijá-la apenas acentuou os meus sentimentos e tê-la correspondendo... Eu estava tão ferrada!

Afastei-me e fitei-a. Seu olhar parecia nublado com desejo, fazendo-me respirar fundo para recuperar meu autocontrole ou, ao menos, um fragmento dele.

- Porque você está fazendo isso? – ela indagou em um tom rouco, mas estava tão perto de mim que seu hálito acariciou os meus lábios, arrepiando-me.

- Você quer que eu pare? – respondi com outra pergunta, acariciando sua face macia. Ela prensou os lábios e tentou abaixou a cabeça, mas eu segurei seu queixo entre o dedo indicador e o polegar. – Responda-me, Âmber! – exigi gentil e a senti arrepiar-se. Abri um pequeno sorriso com isso.

- Eu não sei! – respondeu-me sincera e um pouco chorosa, recostando sua testa no vale entre os meus seios em um ato impensado. – Estou tão confusa! Meus hormônios estão um caos! Ouvi apenas rejeições no último mês e, então, você me aparece... Tão gentil e carinhosa... Sem julgar ou insultar, apenas cuidando de mim! – ela desabafou entre murmúrios, suspiros e choramingos. Nem percebeu que segurava meu suéter em um aperto firme. Eu a abracei.

- Está tudo bem, Âmber! Eu estarei aqui enquanto você precisar de mim! – murmurei suavemente e depositei um beijo no alto de sua cabeça.

- Obrigada! – ditou tão baixinho e abafado que quase não escutei.

- Vamos, a sua mãe está te esperando! – lembrei-a, afastando-me dela e colocando as mãos nos bolsos de meu moletom, evitando tocá-la novamente.

Nós descemos as escadas em forma de ‘Y’ e caminhamos até a sala de estar. Carmem estava conversando baixinho com uma senhora que era uma versão mais velha de Âmber, apenas que seus olhos eram azuis claros. Ambas se levantaram ao notar a nossa presença.

Carmem despediu-se discretamente e foi para a cozinha, dando-nos privacidade.

- Eu fiquei preocupada, Âmber! – a senhora ditou com um ar cansado.

- Desculpe-me, mamãe! – ela murmurou cabisbaixa.

- Senhora Harris, fui eu quem te ligou há pouco! – fui até ela e estendi a minha mão. – Charlotte Lopez!

- Oh! Obrigada por ligar para mim e por cuidar da minha filha! – ela aceitou a minha mão e sorriu. Mesmo que cansado ele foi um sorriso sincero.

- Não precisa agradecer, senhora...

- Pode me chamar de Clarisse, senhorita Lopez! – ela prontificou-se cortês. Sorri.

- Certo, então pode dispensar as formalidades também! Chame-me Charlie! – ditei gentil e as convidei para sentar.

- Eu não sabia que a minha filha e você eram amigas! – indagou curiosa.

- Não somos, quero dizer, não éramos?! – eu estava confusa e Âmber acabou rindo baixo. Senti-me a mulher mais incrível do mundo por ser a causadora daquela risadinha linda.

- Você parece tão madura... Talvez se Âmber tivesse tido a sua influencia ela não estivesse nessa situação! – Clarisse lamentou-se cansada. Acho que ela se culpava pela a gravidez da única filha. Senti a loira ao meu lado ficar tensa e suspirei.

- Quando algo está destinado a acontecer nada pode impedir, Clarisse! – ditei com cautela para não piorar a situação. Ambas soltaram um suspiro de resignação e ficaram em pé quase ao mesmo tempo. Levantei-me também.

- Precisamos ir, meu marido não queria admitir, mas também estava preocupado com a demora de Âmber!

- Compreendo! – comentei com um sorriso. – A senhora veio de carro? Se não, eu posso pedir para o motorista levá-las! – propus.

- Sim, estou de carro, mas obrigada por sua oferta, Charlotte! – ela agradeceu simpática e foi para o corredor que dava ao hall da frente.

- Obrigada por tudo, Charlie! – Âmber ditou, depositando um beijinho em minha bochecha. Acho que corei imediatamente e ela também. Logo ambas foram embora e eu fiquei sentada no sofá da sala de mídia, encarando o teto e refletindo sobre essa reviravolta em minha vida.

- Muito bonita essa sua Âmber! – sorri com essa afirmação.

- Sim, ela é! – concordei com um suspiro.

- O que você pretende fazer agora que ela está em uma situação tão delicada, menina Charlie? – eu sabia que ela iria indagar-me sobre isso. Ela me conhece bem.

- Não sei, realmente! – ditei dando de ombros.

- Você ainda a quer, não é?

- Sim!

- E quanto à criança?

Boa pergunta. E quanto à criança? Minha mente começou a conjurar a imagem deu uma menininha loira de olhos verdes. Seria tão linda. O fato de Erick ter os cabelos tão negros quanto os meus me fez pensar em um garotinho moreno com os mesmos olhos da mãe. Suspirei agradada.

- Eu a quero também, Carmem! – respondi por fim. Ela pareceu concordar e voltou a seus afazeres, deixando-me perdida em pensamentos.

*

Um mês havia se passado, Âmber era ignorada por todos, mas parecia não ligar quando comigo. O idiota do Erick e seus amiginhos viviam soltando piadinhas de nossa nova amizade, algo como: “Bastou eu te dispensar para você revoltar-se desta forma, Âmber?”; “Vai empurrar o bastardinho para ela criar? Olha que ela não pode te engravidar, por isso vai ser difícil!”

Essa última idiotice me fez socá-lo até que implorasse por misericórdia. Por incrível que pareça, não foi por ele ter insultado o próprio filho ou a garota que amo, mas, sim, a dor que senti ao ouvir aquelas palavras: “não pode te engravidar”. Não pelo sentido literário, claro que uma garota não pode engravidar outra, mas o fato de eu ser estéril desde o acidente que matara a minha mãe doía mais que qualquer coisa. Eu sempre quis ser mãe! Eu ser lésbica minimizou um pouco isso, já que a minha futura parceira poderia gerar a nossa criança, mas ainda machucava ouvir, mesmo que indiretamente, algo sobre essa minha incapacidade.

Depois desse episódio, ninguém daquela “trupe” idiota ousava sequer olhar enviesado para o nosso lado. Confesso que, apesar de tudo, eu amei quebrar aquela carinha de bundinha do Erick.

O fato de meu pai ter bastante influencia na cidade fez os pais dele não quererem briga comigo. Por mim, todos eles poderiam estoporar!

Meu relacionamento com Âmber melhorou também, não do jeito que eu gostaria, pois não voltamos a nos beijar, mas estamos firmando uma linda amizade. Ela sempre vai para a minha casa depois das aulas, onde ficamos conversando sobre tudo, até mesmo os nomes do bebê, tanto menina quanto menino. Seus pais já haviam chegado a um termo sobre o futuro neto ou neta. Eu também ia a casa dela e era muito bem tratada pelo senhor e senhora Harris.

Mesmo assim eu não conseguia sentir-me satisfeita, não quando meu coração gritava em cada batida que a queria permanentemente ao meu lado. Eu estava quase enlouquecendo por tê-la tão perto e não poder fazê-la minha. Acho que me tornei uma masoquista inveterada no auge dos meus dezessete anos.

E mais uma vez ali estávamos nós, em minha casa, em meu quarto, respondendo um questionário qualquer da escola... Ela estava tão linda com um vestido amarelo florido, chegando um pouco acima dos joelhos, as sandálias rasteirinhas haviam sido largadas em um canto quando ela chegou, acho que elas estão desconfortáveis agora que seus pés incharam um pouco. Sua barriguinha, marcada pelo vestido, estava redondinha com quatro meses.

- Charlie? Charlie?! – ouvi a sua voz exasperada e pisquei, saindo de meus devaneios. Suspirei quando foquei em seus olhos verdes. – Você fez novamente! – acusou-me.

- Fiz o quê? – indaguei confusa.

- Suspirar! Você está a quase meia hora encarando o nada e suspirando! – ditou irritada. Logo seus olhos ficaram estreitos. – Estava pensando em quem? – não sei se foi o fato de eu ter sido retirada de meus pensamentos de forma brusca ou o seu tom enciumado, mas me ouvi respondendo a verdade.

- Em você!

- Em mim? – indagou surpresa. Apertei os lábios juntos e respirei fundo.

- Sim, em você! – confirmei e levantei-me de minha poltrona começando a andar sem rumo pelo quarto. Ela ergueu-se de sua posição deitada e sentou-se na cama, encarando-me calada. – Eu não sei mais o que fazer, mulher! Você é uma feiticeira por acaso? Sim, porque eu devo estar enfeitiçada para ter me apaixonado por você desde o primeiro momento em que nos vimos na escola! – ela abriu a boca com ar indignado no início, mas tornou a fechá-la enquanto os olhos se arregalavam em surpresa. Respirei fundo novamente e fui sentar-me de frente para ela em minha cama. – Quando eu escutei você discutindo com o Erick na cantina e eu percebi que você estava grávida, meu coração quase parou... ‘Será que a perdi definitivamente?’ ‘Não terei uma chance sequer de tê-la para mim?’ Essas perguntas quase me destroçaram, Âmber!

- Charlie... – posei um dedo em seus lábios, pedindo que me deixasse continuar. Ela assentiu.

- Aquele temporal parecia refletir como eu estava por dentro, até que te vi encharcada no parque! Aquele olhar triste e desistente não era o olhar que eu me acostumei a admirar de longe! Eu sentia a sua dor e desespero como se fossem meus, Âmber! – parei para enxugar uma lágrima que descia por sua pele de porcelana. Meu polegar continuou a fazer carinho em sua bochecha até chegar aos lábios carnudos, acariciando-os. – Quando eu pude finalmente sentir o sabor desses lábios... Juro que tive um fio de esperança de poder te esquecer depois que eu tivesse provado essa boca que tanto desejei! – não pude evitar rir dessa última parte, não um riso feliz, era mais como se eu estivesse rindo após ouvir um absurdo... O que não deixava de ser verdade.

- E você conseguiu? – a ouvi suspirar e murmurar. Fitei-a com uma intensidade tão grande que podia jurar que nossos olhos se fundiram por um segundo.

- Não! – respondi sincera.

- Graças a Deus! – seu ar aliviado deixou-me meio atordoada.

- Hã?

- Você, às vezes, é uma tapada, Charlotte! – ela declarou convicta e quando eu pensei em retrucar ela sentou-se no meu colo e me beijou. Era mais um selinho, mas eu tratei logo de mudar isso, deitando-a na cama e deitando ao seu lado para que eu não esmagasse o bebê. Separamo-nos ofegantes.

- O que significa isso, Âmber? – indaguei encarando-a seriamente. Eu queria que ela falasse com todas as letras para não restar dúvida alguma entre nós.

- Eu... Eu... – ela respirou fundo e começou a mordiscar aqueles lábios pecaminosos atraindo a minha atenção par eles. Ela sorriu e acariciou a minha bochecha. – Eu te amo, Charlotte e gostaria de ter notado você antes de cometer a idiotice de ficar com o Erick! – ela confessou.

- Eu também te amo, mas não desejo que essa situação fosse diferente!

- Mas... – calei-a com um selinho e acariciei a sua barriguinha linda.

- Se fosse assim nós não estaríamos esperando essa princesinha linda aqui! – ditei com um sorriso.

- Nós?! – indagou erguendo uma sobrancelha inquiridora. Tive de rir e beijá-la novamente.

- Sim, nós! – confirmei.

- Oh, então você pode ficar com a parte dos enjôos e das contrações quando à hora chegar! – gargalhei nesse momento e ela sorriu lindamente. – Mas quem foi que te disse que seria uma menina? Pode muito bem ser um menino!

- Se for um menino eu irei ensiná-lo a jogar bola e como lutar, mas eu tenho certeza de que será uma menina linda igual à mamãe dela! – ditei convicta.

- Sim? – inquiriu sorridente.

- Sim! – confirmei e ajeitei-me melhor na cama, fazendo-a deitar a cabeça em meu peito. Suspirei agradada por nossa posição.

- Charlie?

- Hum? – não queria me mexer.

- Estamos namorando? – indagou um pouco hesitante. Parei para pensar.

- Não! – senti que ela tencionou um pouco, mas não permiti que se afastasse de mim, segurando seu queixo para que visse em meus olhos o quanto minhas próximas palavras eram verdadeiras. – Estamos correndo contra o tempo, Âmber, assim que eu declarar que irei assumir este bebê, papai exigirá casamento! Nenhum Lopez nasce fora do casamento! – ditei dando de ombros. Ela pareceu confusa por um momento, mas logo seus lábios estavam separados formando um lindo “o”.

- C-Casar? – indagou surpresa.

- Casar! – confirmei.

- Mas... – algumas batidinhas na porta a interromperam.

- Pode entrar! – permiti sem sair de minha posição. Âmber corou quando meu pai encarou-nos especulativo. Ele sabia que eu era arriada os quatros pneus por aquela loira. – Eu vou assumir o bebê! – respondi sua pergunta muda.

- Espero que uma aliança de compromisso esteja incluso em seus planos, mocinha! – ele ditou com um olhar estreito. – Nenhum Lopez desta família nasceu fora de um casamento em mais...

- De dezessete gerações! Eu sei e estava tentando dizer isto para ela, mas ela não acreditou! – argumentei com ar inocente, recebendo um tapa no braço. Doeu caramba!

- Charlotte! – Âmber repreendeu-me.

- Pois pode acreditar, minha jovem! Minha neta não nascerá fora de um compromisso! – ele ditou categórico. Abri o maior sorriso que podia.

- O que há com essa família para enfiarem na cabeça que o bebê é uma menina? – ela preferiu focar no que era menos complicado. Eu a entendia.

- Oras, porque será uma menina! – papai e eu afirmamos juntos.

**

Dez anos depois...

**

Muita água passou por baixo dessa ponte. Casei com a mulher da minha vida e, não demorou muito, para eu poder pegar a minha princesinha nos braços.

Eu sabia que seria uma menina!

Melissa era uma pequena cópia de Âmber, exceto pelos cabelos negros. Quem não soubesse de nosso passado jurava que ela carregava meus genes. Bem, isso não importa, pois ela é minha!

Âmber e eu terminamos o ensino médio, mas ela não quis ingressar na faculdade imediatamente, preferia cuidar de nossa princesa. Eu sempre apoiei todas as suas decisões, como a esposa babona que sou.

Eu fiz administração e hoje dirijo os negócios da família lado a lado com meu irmão. E foi com a ajuda de Trevor, que ainda está solteiro para desgosto do meu pai, a minha esposa engravidou de nosso segundo filho, sendo um menino desta vez.

Fernando Lopez!

Ele era uma cópia da irmã: cabelos negros e olhos verdes. Porém, mesmo com apenas seis anos, já mostrava que seria mais alto do que Mel.

Ambos são os meus orgulhos! Eu, simplesmente, amo a minha família!

Minha esposa voltou a estudar quando Fernandinho tinha dois anos e acabou de formar-se em Design de Moda... Mas já está sendo muito bem aceita no ramo por seus talentos inatos.

Meu pai vive babando aos netos, afinal, moramos com ele... Ou ele mora conosco... Nem sei mais! Âmber e eu chegamos à conclusão que não queríamos deixá-lo só após a sua aposentadoria e ele concordou de bom grado. Bem, o caso é que ele idolatra tanto a nora que já montou um atelier com tudo o que ela for precisar para seus modelos. Até uma assistente ele fez questão de contratar para ela. Minha esposa quase surtou, mas ela ama muito o sogro para esganá-lo.

- Mãe, a mamãe mandou avisar que se a senhora não sair imediatamente desse escritório, já poderia ir armando acampamento no sofá! – ouvi a voz risonha da minha filha na porta e sorri para ela.

- Já estou terminando aqui, princesa!

- Certo, mas não demore! Sabe como ela fica uma fera quando contrariada! – advertiu e saiu, fechando a porta atrás de si.

Tive de rir com aquilo. Sim, Âmber tem um temperamento... Durante a gravidez do Fernando perdi as contas de quantas vezes tive de desviar de algum objeto não identificado quando ela tinha uma crise hormonal, para em seguida chorar e me pedir que a abraçasse.

Soltei um longo suspiro ao me lembrar disso.

Minha menina tem um temperamento igual ao da mãe. Às vezes me sinto como em uma guerra, Fernandinho sempre corre para perto de mim, nesses momentos! Minha vida é um caos, mas vale à pena.

Vou encerrar por aqui ou me atrasarei para o jantar de bodas dos meus sogros... E também porque não quero passar uma longa semana no sofá, mesmo que a minha esposa não consiga dormir sem mim e venha dormir comigo nele, ela não dá o braço a torcer e no fim das contas sou eu quem acorda com ela dormindo confortável em cima de mim e minhas costas sentindo as molas desconfortáveis do sofá.

Espero que tenham curtido o resumo da minha vida... Que começou com um coração teimoso que se recusou, veementemente, a abrir mão do seu primeiro e único amor!


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Notas finais do capítulo

Gostaram??
..
Xerim! =^-^=



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