Corremos por pouco mais de duas horas e só paramos por que eu já estava me arrastando. Quer dizer, eu passei dois anos presa em um porão! Preciso me acostumar com a liberdade, além do que eu mal comi a lasanha do almoço por culpa da Kayla. Eu tenho fome, sabia?!

Ela me levou até uma pequena praça discreta, pegou uma mesa, puxou uma cadeira e me deixou sentar. Depois comprou um sanduíche e me deu.

-Você está chamando muita atenção.

Falou. Olhei para mim e percebi que ainda estava com aquelas roupas horrorosas e que as poucas pessoas que passavam por nós me olhavam com aquela cara estranha.

-E o que vamos fazer?

Perguntei, corando. Fazia tanto tempo que eu não via gente! Nem sabia mais como devia reagir direito.

-Vamos a um bosque. È minúsculo, afinal aqui é a Califórnia. É cheio de praias, mas sei onde podemos ir.

Kayla falou com suas irritantes voz e articulação perfeita e suave. Eu não conseguia fazer minha voz sair assim, baixa e profunda. E também não conhecia nenhum bosque.

Engoli rapidamente o sanduíche e me pus de pé. Kayla já tinha se levantado e já andava em direção a rua.

Eu a acompanhei rapidamente, tendo o cuidado de não ir rápido demais na presença de humanos. Já não me sentia da mesma espécie. A Ninfa dentro de mim gritava e tomava meu ser.

Ela me guiou até um bosque minúsculo. Parecia ser muito velho, o que explica eu não conhecer esse lugar. Eu não conhecia lugares muito velhos.

Então ela deixou finalmente seu manto cair e eu pude ver o que ela vestia por baixo. E aquilo não me fez ficar feliz.

Era um top e um mini-short, mais parecido com uma tanga do que com qualquer outra coisa, mas feitos basicamente de material natural. Tipo, folhas, palha e não sei mais o que.

Ah, não! Será que eu teria de usar aquilo? Era tão... surreal.

Ela nem olhou para mim duas vezes. Lançou-se para as árvores com uma habilidade inacreditável e sumiu por dentro do bosque. Era incrível, ela não parecia humana. Parecia que todo esse tempo ela esteve no lugar errado, correndo pelas estradas e finalmente achava um lugar onde devia ficar. Um lugar natural.

Kayla estava de volta uns vinte minutos depois, no alto de uma palmeira. Ela se jogou lá de cima e caiu como um gato, agachada e com uma mão no chão. Ela se levantou e atirou roupas iguais as dela para mim.  Depois se abaixou e juntou seu manto, tocando-o apenas com a ponta dos dedos finos e delicados. Vestiu-se rapidamente, então olhou com seus olhos vermelhos e indagadores para mim.

-Ainda não se vestiu?

Ela perguntou. Eu corei e andei como uma pessoa normal para as árvores. Depois troquei de roupa. Não precisava de um espelho para saber que a roupa caia bem em mim, e que poderia parecer normal se não fosse uma roupa tão ridícula.

Voltei para Kayla e ela tinha um manto igual ao dela em suas mãos. Ela também o atirou para mim.

-Só essas roupas chamam muita atenção.

Ela explicou rapidamente.

-Como você as arranjou?

Perguntei enquanto me cobria com o manto. As mangas estavam grandes demais, cobrindo as minhas mãos, e o cumprimento estava curto, diferente da roupa minúscula que parecia ter sido feita para mim.

-São roupas de Semi-Ninfa. Feitas pela natureza. Taksuame, o espírito dos bosques, as faz para nós. Basta pedir.

Aquela articulação era perfeita demais. Sua voz tomou um respeito forte ao pronunciar o nome de Taksuame, e eu podia sentir a presença do espírito.

-E o manto?

Ela sorriu e explicou, dando ombros.

-Eu trouxe quando vim lhe salvar.

Isso despertou uma série de perguntas em minha mente.

-Você vai me explicar tudo, Kayla Went.

Falei, séria. Ela riu e percebi que havia falado como ela. Falei seu sobrenome. Levei um leve sobressalto.

-Taksuame é o espírito que protege todos os bosques e florestas. Há vários espíritos como ele, todos os filhos da Natureza. Os únicos espíritos que assumem forma visível, são as Ninfas. Nós vivemos em clãs, como já lhe expliquei. O nosso clã é o clã de Washington. A líder do clã sente quando uma nova Semi-Ninfa vai completar a transformação, então manda alguém ir buscá-la, se esta tiver nascido no estado. Você nasceu em Washington, apesar de ter se mudado. Algumas Semi-Ninfas fazem isso. Apesar de ser difícil para mim vir a Califórnia, vir te buscar valeu a pena. Você não sabe a quantidade de poder contido em você que pode ser libertado, Naya Bronks.

Ela falou rapidamente. Meu Deus, a droga da sua maneira de falar irritava! Aquela perfeição em pronunciar as palavras só se acentuava quando ela falava rápido demais.

Começamos a correr por um caminho conhecido, e eu percebi que estávamos indo para o aeroporto. Estávamos indo para casa.