Não compreendia como as mechas de nossos cabelos podiam ser iguais. Mas eram. Eram exatamente da mesma cor, e haviam nascido naturalmente.

-Naya Bronks, - Kayla repetiu. – Sua transformação se completou.

Sua voz era incrivelmente correta, sua boca formava todas as palavras com precisão. Então, por que eu não entendia o que ela queria dizer?

-Transformação?

Perguntei, confusa. Eu queria correr, queria fugir dali. Queria jamais ver aquela casa novamente. No entanto, a garota mirrada, com uma face que lembrava a de uma fada me prendia ali.

Tudo seu era meio místico. Suas maçãs do rosto altas e coradas, seu queixo pontudo, seu cabelo liso – liso demais. Tudo que amarrasse nele, cairia. Eu sabia por experiência própria. Embora nossos rostos tivessem muitos pontos em comum, tantos que poderíamos ser irmãs na teoria, eles eram extremamente diferentes.

-Você não sabe o que é?

Kayla me perguntou, inclinando a cabeça para um lado. Sim, eu quis responder, eu sou uma garota que passou os últimos dois anos da vida dela trancada em um porão e agora foi libertada por uma doida.

Então eu comecei a encará-la, a perceber alguma coisa.

Seus olhos eram de uma cor estranha, como os meus. Sua estrutura era mirrada, mas esbelta e forte, como a minha. Seus cabelos eram lisos, como os meus. Ela tinha uma mecha azul em seu cabelo, como eu. Mas nada disso foi tão forte quanto quando eu vi suas orelhas. Por que as orelhas daquela bela morena eram pontudas. Como as minhas.

Minhas mãos ganharam vida própria e correram até sua orelha. Ela se esquivou, mas as mãos a tocaram mesmo assim. Era idêntica a minha. Puxei a ponta da sua orelha, mas eu sabia que não ia sair. E sabia que isso fazia cócegas.

Pela primeira vez, fiz o que eu nunca pude fazer faz dezessete anos. Coloquei o cabelo atrás da orelha.

-O que eu sou?

Sussurrei, temerosa. Eu não era normal, eu sabia. E Kayla tinha as respostas. Não sei como nem por que, mas confiava nela. Sentia que ela falava a verdade.

-Você é uma semi-ninfa.  

Kayla Went falou, convicta.

-Uma semi-ninfa?

Perguntei, sem saber o que pensar. Não sabia o que eu era. Isso não me explicou nada, apenas destruiu todas as certezas que eu tinha.

-Uma meio-sangue. Metade humana, metade ninfa. – Ela falou calmamente, então acrescentou bem rápido. - Seu pai é aquele humano ali, não é? Ele é sua metade humana, metade do seu sangue pertence a ele. A outra metade pertence a sua mãe, ela deve ser a ninfa, ela representa sua parte mágica. Onde está sua mãe?

Lágrimas surgiram em meus olhos e eu sussurrei.

-Está morta.

A garota era maluca, eu sabia disso. Mas também sabia que podia confiar nela. Todos os meus instintos diziam isso. Que ela falava a verdade. Mas minha mente se recusava a acreditar. Quer dizer, semi-ninfa? Qual é! Eu nem sabia por que eu ainda falava com ela. Queria ir embora. Meus olhos estavam irritantemente fixos nela, mas todo meu corpo estava consciente da estrada apenas a poucos metros de mim.

-Sinto muito. É muito raro uma Ninfa pura ser morta. Chegou a conhecê-la?

Kayla era doida? Pergunta mais besta, é claro que era. Mas falar assim, daquela maneira, tão insensível... Quer dizer, a minha mãe morreu. Por que ela ainda tinha que dizer que era uma ninfa? Se minha mãe fosse uma ninfa, não teria morrido.

-Você é maluca!

Gritei, andando para trás. Aqueles olhos vermelhos nunca foram mais assustadores. Sua boca se franziu em uma linha fina, um barulho esquisito cortou sua garganta. Com um sobressalto, percebi que era um rosnado.

-Não sou maluca. Você sabe o que você é, Naya Bronks. Seus instintos lhe dizem isso. Pense!

Por um lado, eu sabia que era verdade. Por outro, minha própria mente me dizia que eu era tão maluca quanto ela. Resolvi ignorar essa parte.

-Digamos que talvez possa ser uma verdade. E o que ser uma semi-ninfa compreende?

Perguntei, hesitante. Não estava concordando, nem negando. Queria saber o que exatamente ela achava que eu era.

Kayla sorriu com aqueles lábios carnudos, mas delicados. Seu cabelo liso era partido de lado, diferente do meu que era partido no meio e tinha franjinha.

-A explicação pode demorar.

-Quero ouvi-la.

Falei, convicta.