Eu sabia que as Semi-Ninfas eram muito ligadas à natureza, mas não sabia que eram tanto, a ponto de confiar uma de suas tarefas a um animal. Então, eu fiquei surpresa quando percebi que Murilo, meu macaco, poderia ser a solução deste enigma. Por que não pensei nisso antes?

Sentei-me de súbito no galho da árvore onde eu estava, e deixei que Murilo escalasse meu ombro.

-Olá amiguinho. Hm, será que você poderia pegar uma maçã desta árvore por mim?

Perguntei quando ele já estava suficientemente estável em meu ombro. Ele apenas me encarou com seus olhinhos astutos brilhando contra o marrom opaco de seu pêlo.

Percebi que ele não estava me entendendo e bufei frustrada. Parecia que as Semi-Ninfas tinham me designado uma tarefa impossível.

Nesse segundo irritado, me ocorreu uma idéia. Era estranha, mas, de certa forma, fazia sentido. E se eu tivesse que falar com o macaco na língua das Semi-Ninfas? Eu não a conhecia ainda, mas sabia por instinto interpretá-la.

Forcei minha mente ao máximo, tentando lembrar-me de palavras que eu nunca aprendi, mas que pareciam há muito esquecidas. Tentei lembrar da canção de minha mãe, e de repente um clarão encheu minha mente, inundando-a com palavras acolhedoras. Então eu já sabia falar, não perfeitamente, mas alguma coisa, eu sabia.

-Macaco, eu te chamo de Murilo. – Falei a ele, na língua das Semi-Ninfas, escolhendo as palavras com cuidado. – Então, Murilo, eu tenho um favor a ti pedir.  Será que você poderia pegar uma maçã, querido?

Perguntei. Então percebi que minha voz parecia soprano, melodiosa e suave, uma doce canção de ninar. Aos meus ouvidos apurados, era ainda mais bela que a voz de Kayla quando falava na voz humana.

Mais do que nunca, senti minha face felina, e minha expressão como a de uma caçadora.

Murilo pareceu entender, pois deslizou do meu ombro para o chão, e dali começou a pular de um galho para o outro. Eu ia orientando-o de baixo, para que ele não se perdesse, como acontecia comigo. Finalmente, quando ele estava a meio metro da copa, achou a primeira maçã.

Eu o estimulei na nova língua, tropeçando em algumas palavras. Então finalmente, ele arrancou a maçã e escorregou dos galhos, se jogando no ar até parar em meus braços. Quando seu pequeno corpo se chocou com meus ossos, ele largou a maçã na minha mão e voltou a se empoleirar no meu ombro.

Olhei para a pequena fruta em minhas mãos, percorrendo sua circunferência com os dedos e sentindo seus sulcos. Parecia inacreditável que algo tão simples e comum rendesse tanto trabalho.

Eu me joguei uns dois ou três galhos a baixo, então saltei direto para o chão. Meus pés tocaram a terra com suavidade, absorvendo o impacto com as pontas dos pés. Fui obrigada a me agachar um pouco na queda para aumentar a sutileza do gesto. Parecia estranho, um felino com um macaco em seu ombro.

Meus olhos, já ajustados a escuridão, não tinham problemas para encontrar o acampamento das Semi-Ninfas, que agora estava silencioso.

Corri à toda velocidade para onde eu sabia que elas estavam. Quando calculei que faltava pouco mais de cinco metros de distância, eu gritei.

Deixei escapar da minha boca um urro de vitória, que mais parecia um rugido selvagem. Depois, na língua das Semi-Ninfas, minha língua, eu cantei.

-Consegui! Aqui! Consegui a maçã!

Em poucos momentos, pude sentir uma agitação furtiva, e em segundos havia um círculo de Semi-Ninfas a minha volta, todas nós reunidas sob as estrelas.

-Naya.

Falou uma voz com som de sino e eu percebi que era Kayla falando na nossa língua.

-Você conseguiu. Você é quase uma de nós. Falta apenas a ultima etapa de sua transformação.

Ela falou, e eu acariciei o pêlo de Murilo enquanto perguntava.

-E qual seria?

Os lábios cheios de Kayla formaram um sorriso e todas as outras Semi-Ninfas riram. Eu franzi a testa para isso.

-Venha, Naya Bronks. Raphaella Minucci pode te mostrar.

Eu dei ombros e segui Kayla. Afinal, ser Semi-Ninfa não é tão entediante como parecia à princípio.