Meu macaco era muito gentil. Enquanto eu corria para a macieira, finalmente ao alcance do teste, ele subia pelas minhas costas e ombros, subia na minha cabeça e fazia caricias macacas.

-Ei – Eu falei carinhosamente quando ele se empoleirou no meu ombro novamente, acariciando sua cabeça. – Você precisa de um nome, não precisa? Deixe-me ver, você é menino ou menina?

Perguntei mais para mim mesma. Então me lembrei da voz em minha mente. Era como se ela tentasse me dizer que a natureza pode entender o que eu falava... Eu tentei.

-Um grito para menina, dois para menino.

Falei ao meu macaco. Não foi uma boa idéia. Ele deu dois gritos estridentes, bem ao lado do meu ouvido, e por alguns minutos eu fiquei parcialmente surda.

-Certo, você é menino. Que nome eu posso te dar?

Eu nunca tive um bichinho. Meu pai jamais aceitaria que um animal adentrasse sua casa, sujasse sua sala, destruísse a sua imagem de empresário brilhante. Do mesmo jeito que ele não me deixou arruinar sua carreira, com minhas visões e colapsos, minhas orelhas pontudas e olhos roxos. Então, por causa de Luke, eu não sabia como cuidar dele. Minha face endureceu com as lembranças e minha felicidade tinha se esvaído.

Lembrei de seus cabelos loiros e tremi ao saber que uma Semi-Ninfa loira esperava por mim. Susan parecia ser boa pessoa, mas era... loira. Decidi que talvez Semi-Ninfas não se aplicassem as regras dos humanos. Tentei voltar minha atenção para meu macaco.

-Você pode chamar Michael...

Falei para ele, mas depois me interrompi com uma cara carrancuda.

- Não. É parecido demais com Matthew.  Que tal então... – Pensei um pouco, então minha cara se iluminou a pensar em um nome que talvez desse certo.

-Murilo. É o nome perfeito.

Murilo pareceu concordar com a decisão. Ele deu alguns dos seus gritos e se sustentou atrás da minha cabeça. Eu sorri e o deixei lá, enquanto finalmente chegava à macieira.

Era a maior macieira que eu já vi. Era grossa, seus galhos fortes e seus diversos ramos eram escuros. Não havia um único cupim na madeira e suas maçãs eram as mais vermelhas que eu já tinha visto. Suas raízes estavam aparentes e a grama sobre elas era verde. Era como tudo neste lugar. Era mágico. Pela primeira vez, eu pude apreciar a dimensão da planície.

-Muito bem. Vamos lá.

Eu sussurrei e comecei a subir na árvore. Mas não foi fácil como eu planejei. A árvore era escorregadia e eu escorregava mais do que subia. Além disso, quanto mais alto nos galhos eu subia, mas parecia que eu estava descendo. O chão logo ficava fora de vista e eu perdida no meio das folhas, me guiando pela luz, e logo então estava em um dos mais baixos galhos novamente. Se eu chegava próximas as maçãs de um salto, eu perdia o equilíbrio, escorregava e caia.

Não sei quanto tempo eu fiz isso. Talvez uma, duas ou três horas. Não tenho certeza. Só sei que, na última vez que escorreguei para um dos galhos baixos, resolvi me deitar para descansar um pouco e me dei de cara com um céu escuro, onde as estrelas brilhavam e não havia lua. Era uma lua nova.

Virei de lado, em direção ao acampamento das Semi-Ninfas e pude ver uma listra fina de fumaça exalada por uma fogueira em algum lugar à esquerda. Além disso, se eu fechasse os olhos, podia ouvir lindas canções cantadas na mesma língua que as canções de minha mãe.

Fechei os olhos sem pretender dormir, e Murilo veio se aninhar nos meus braços. Eu fiquei fazendo caricias enquanto pensava em uma maneira de conseguir uma maçã.

Comecei a escutar a música sem realmente entendê-la, mas pouco a pouco, o significado foi brotando na minha mente, uma palavra primeiro, depois outra, e mais outra, e logo eu podia ouvir as vozes das Semi-Ninfas entoando uma canção dos dias de glória.

A música era muito bonita, e eu comecei a cantar baixinho com elas, aperfeiçoando minha pronuncia enquanto cantava.

O que é da natureza, da natureza veio, à natureza retornará. O que é da natureza, todos deviam respeitar. O que é da natureza, só a natureza pode tomar. Semi-Ninfas são a prova, natureza é mãe, gentil e acolhedora, dá o que precisa sem nunca reclamar. Peça com jeito, com gratidão, e a vida seria de rosas um mar. Mas os humanos existem, e as rosas tem espinhos, que podem machucar. Ó natureza, a única dúvida que resta é, animais ou Semi-Ninfas, qual deles é mais filho teu?

Então, finalmente eu tive um estalo. O que é da natureza, da natureza veio, à natureza retornará. A maçã. O que é da natureza, só a natureza pode tomar. Animais.

Olhei para Murilo como se ele fosse promover a paz mundial.