Russo de Neve escrita por Sirukyps


Capítulo 3
Capítulo 03




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No jardim do castelo, o russo admirava os girassóis desabrochando durante a calorosa primavera. Pássaros, borboletas, alegria. Embora o reino fosse muito quente, o rapaz de cabelos loiros quase sem cor sentia um estranho frio e bebia vodca, buscando algum calor.

Talvez fosse solidão.

Somente o inglês lhe concedia mínima atenção naquele local e, ultimamente, este havia ingressado ao mar sem perspectiva de retorno devido uma infindável guerra contra alguns rebeldes duma indeterminada parte do Oriente Médio.

— É uma pena que as flores murcham um dia... – Comentou o francês, capturando a atenção do solitário. Terminava de arrumar os materiais para pintura diante o cavalete. Caracterizado como um digno pintor, ele enquadrava o horizonte entre os dedos (indicador e polegar), planejando um súbito quadro, o qual aprisionaria a vitalidade esvanecida daqueles olhos tristonhos junto ao entardecer.

— Mas são calorosas e adoráveis. – Interpôs o jovem. O tímido sorriso quase fechava os arroxeados olhos, sendo apertados pelas albinas bochechas rechonchudas.

— Sim. – Concordou. Tristemente, começava a pincelar o retrato na branca tela. – São tão belas... Adoro coisas belas... – Pensativo, observava o rapaz retornar ao estado de contemplação como passava as horas, os dias, os anos, desde a ausência do inglês.

Sem luxo, trajava roupas velhas, trocando apenas quando o inglês retornava com novidades. Humilde, agradecia e recusava, afirmando precisar somente do essencial para viver. Uma pessoa tão simples, não importando em compartilhar o que detinha. E, para o francês, a simplicidade era enriquecedora para alma. – Você cresceu tão rápido e está tão belo... Poderia me conceder o prazer em pintá-lo?

O mais novo assentiu positivamente. Não era de muitas palavras e emoções. Levantou-se, deduzindo a possível solicitação, revelando-se mais alto que o apreensivo carrasco.

Francis sorriu falsamente, impressionado com o repentino crescimento. Talvez, porque nunca havia o observado atentamente. Pedindo que continuasse como estava, explicou ser exatamente “aquele” o cenário que lhe arrebatava o fôlego.

Obediente, sem questionar, o russo assim fez.

O Sol saindo dentre as montanhas geladas e iluminando o caloroso campo de girassol. Queria capturar a tímida brisa acariciando os cabelos daquele inexperiente contemplador.

Não. Não poderia.

Francis engolia em seco. A árdua tarefa lhe rasgava a garganta, levando-o a pincelar qualquer bobagem motivada pela preocupação. Todavia, a ameaça lhe desarmava. Maldita hora quando Arthur se distanciou sem ao menos deixar uma miserável forma de contato ou informação sobre o destino.

 - Irei te aprisionar em um quadro para que nunca venha a padecer.

 - Mas o padecimento é um espetáculo formidável da natureza. E o que me conforta é esta lembrança que todos ao meu redor irão sucumbir, apodrecendo aos vermes.

— Você se sente infeliz aqui no castelo? – Interessou-se, não obtendo resposta. – Realmente... No último natal, você parecia tão feliz. Desde então, seus olhos vem perdendo o brilho. – Capturando a coragem num profundo suspiro, ele levantou, retirando uma prateada corrente do bolso. Caminhando para próximo ao desatento, ajoelhou-se, ficando a altura deste. – Mas este colar alegrará seu coração... Permitiria... – Vacilava. Era errado. – Pe-Permitiria testá-lo?

O russo maleou um desconfiado sim.

Hesitando nervoso, as trêmulas mãos francesas depositavam a valiosa peça ao redor do pescoço exposto. Sentia-se intimidado, como se o russo pudesse farejar o evidente medo do ato perverso, denunciado pela rigidez de cada um daqueles músculos.

— Talvez, um pouco mais apertado. – Comentou, enroscando as pontas da peça em torno da mão, desistindo no último momento, sem graça. – Como fica...

— Senhor Francis...! – O alegre jovem sem presença se aproximava portando uma arrumada bandeja, onde equilibrava uma jarra e três taças. Embora o natural sorriso, notava-se certa exaltação em decorrência dos cenhos franzidos sobre as armações do quadrado óculos. - Eu estava lhe procurando há algum tempo, senhor Francis... Peter me disse que você tinha vindo ao jardim. Eu queria degustar um bom vinho nesta manhã, mas era solitário demais na cozinha do castelo...

— Matt, meu querido... – O francês vacilou ao escutar a doce voz. Permaneceu segurando as pontas prateadas, caçando a imprescindível coragem de prosseguir com a decisão. Sentando na grama sobre as panturrilhas, soltou o colar por um momento. O arrependido olhar implorava para que o outro desaparecesse urgentemente.

— Não, senhor Francis...! – Teimou, revidando o olhar, o qual implorava pela desistência daquilo. Depositando a bandeja sobre a áspera grama, serviu uma taça, passando para a vítima sem tremeluzir, enquanto proferia uma desculpa qualquer. – Sinto muito não lhe cumprimentar corretamente, Ivan. Por isto, gostaria que tomasse a primeira taça.

— Não há motivos para preocupação. – Respondeu calmamente, fitando o casal sobre os ombros. Recolhendo a garrafa da bandeja, diante os repugnantes sorrisos falsos, retirou a rolha e ingeriu a substância num exclusivo gole.

— Francis disse que este vinho da prima... – O canadense explicava descrente.

Nenhuma reação.

— Um tiro seria mais eficiente. – Comentou casualmente, limpando o canto da boca, enquanto retornava a garrafa ao devido lugar. – Os planos do Alfred correm pelo castelo, por isto prometo que não lhe machucar por consideração ao meu tutor que ainda preza pela sua existência. – Voltando a admirar os desconhecidos caminhos, tornava-se possível sentir uma maligna aura emanada por este, como se realmente algo ruim fosse acontecer. - Contudo, em poucos segundos, eu posso mudar de bruscamente ideia.

— Que... – Sem opção, o francês retirou o revolver da cintura e destravou o gatilho, após ajustar a munição. Seria rápido. Não... Não conseguiu prosseguir e abaixou a arma. Jamais realizaria um ato tão injusto, principalmente na frente do amado amedrontado. Desnorteado, fitava o chão buscando resposta. – Tenho que conseguir carne de hambúrgueres para o jantar... Mas não consigo. Alfred deseja seu coração, mas eu quero que encontre o prazer na vida. – Apontando para o horizonte. – Você é uma pessoa gelada, aposto que seria ótimo se vivesse lá nas montanhas...

— Francis! – Matthew repreendeu.

— Matt, Alfred não ficará sabendo. – Levando o indicador aos lábios, garantiu calmamente. - Será nosso segredo, pois vermelho sangue está meio fora de moda. 

— Ele não pode partir agora. Temos que lhe entregar suprimentos. Garantir sua estabilidade... – Completou o canadense, retirando os poucos dólares contidos no bolso. – E ele precisa concordar... Além que... Tem o guarda alemão...

— Eu, realmente, desejo sair deste reino e ganhar forças para destruir este cruel predomínio capitalista. – Interpôs o russo através de um suspeito sorriso.

— Certo. Matt irá lhe ajudar esta noite. Pode pegar o que precisar no castelo durante a tarde. Eu distrairei o Alfred.

Os dois rapazes assentiram positivamente.

Retornando para o castelo, aquilo era loucura. Nada passava despercebido pela rede de informação americana. Francis permaneceu pintando, analisando as possíveis falhas daquela segura residência, rogando a Jeanne por sucesso na perigosa fuga. 


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