Premonição 9: A Dama no Escuro escrita por Lerd


Capítulo 3
Anna


Notas iniciais do capítulo

Antes de tudo, eu preciso pedir mil desculpas pelo ENORME hiatus no qual deixei a fanfiction. Isso nunca me aconteceu, e nunca mais vai acontecer, prometo. Eu não a abandonei e nem pretendo abandoná-la! :D
Enfim, aqui está o terceiro capítulo. Logo, logo pretendo postar o quarto! :)
Enjoy!



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— Riley? Você está bem? — Sketch disse, visivelmente preocupado.

A garota estava estática, com os olhos arregalados e o olhar fixado no infinito azul à sua frente. Apertou fortemente os dedos ao redor da barra de metal da amurada, sentindo seu mundo girar. Vai acontecer um acidente. Todos nós vamos morrer.

— Riley, você está pálida. Eu vou chamar a professora Emma. — Sketch falou. Ele então fez menção de se afastar, mas a garota segurou-o pelo braço, ainda olhando para o horizonte. O rapaz parou, sem entender a situação.

Foi então que a ruiva virou-se na direção dele e balbuciou, com os olhos começando a ficar mareados:

— Eu tive um sonho horrível de que um helicóptero ia cair em cima desse iate e matar todo mundo. Eu, eu... — E parou de falar.

Sketch olhou para ela com uma expressão assustada, temendo que a garota estivesse mal. Riley deu dois passos para longe da amurada, ficando de costas para Sketch. Então a música começou, e a ruiva sabia exatamente qual seria a letra, mesmo estando ouvindo-a pela primeira vez. Não. Pela segunda vez.

That was then, this is now,

Here we go starting over!

You decide, change your mind,

Miracles happen every day!

Milagres acontecem todos os dias.

Não.

Andi e Lucas saíram da cabine no mesmo instante, correndo na direção da pista de dança. Riley via as coisas que vira em sua visão se repetindo, e sabia que precisava fazer alguma coisa antes que fosse tarde demais. Ela virou-se para Sketch e disse na voz mais firme e calma que conseguiu imprimir:

— Você precisa me ajudar, Sketch. Eu sei que tudo isso parece loucura, mas...

— Eu ajudo. — Ele disse, olhando diretamente dentro dos olhos dela, antes que a garota pudesse terminar sua frase. — O que nós precisamos fazer?

Riley não conseguiu conter o sorriso que apareceu em seu rosto por debaixo da expressão apavorada.

— Nós precisamos avisar todo mundo sobre esse acidente. Nós temos que tirar o iate da rota do helicóptero.

Sketch olhou para o céu, tentando entender o que a garota dizia. E então percebeu o ponto negro distante no infinito, mas que a cada segundo ficava mais próximo. Ele apontou para o alto e Riley viu o objeto que causaria a tragédia há vários metros de distância. Ela meneou a cabeça positivamente e correu o mais rápido que pode na direção da pista de dança.

Quando Riley subiu a escada de metal que levava à pista de dança, Andi e Lucas notaram sua presença. A amiga tentou interceptá-la com um abraço, mas imediatamente percebeu o estado em que a ruiva estava, bem como sua expressão facial completamente apavorada.

Riley empurrou o DJ que cuidava da música de maneira abrupta e pegou um microfone que estava em cima da mesa em que ele trabalhava. Disse de maneira trêmula:

— Tem um helicóptero se aproximando desse iate. Ele vai cair em cima da embarcação e causar um acidente que vai matar a todos nós. Vocês precisam mudar a rota dele. Por fav...

E então a garota teve o microfone tomado de sua mão. O professor Finn Waterson segurou o objeto com firmeza e disse:

— Você não tem o direito de causar uma histeria coletiva, mocinha.

Mas Riley não se importou com aquelas palavras, ignorando-o. Desceu através da escada de metal, chamando Andi e Lucas para que descessem também. Os amigos obedeceram-na prontamente. Embaixo, Sketch a esperava, com uma expressão de ansiedade em seu rosto.

This is the beginning, the beginning!

This is the beginning of the rest of your life!

This is the beginning, the beginning!

This is the beginning of the rest of your life!

— Eles não vão fazer nada, Riley. Eu fui até a cabine do piloto e eles me expulsaram de lá. Ninguém acredita em você.

A garota meneou a cabeça negativamente, frustrada. Andi então disse:

— Amiga, me fala o que está acontecendo. Você está bem? Alguém te deu alguma coisa pra tomar ou algo assim?

— Eu estou perfeitamente bem. É só que... — Então ela parou de falar ao perceber a presença dos outros.

Atrás dela estava o quarteto. Paris, Michaela, Junior e Nina observavam com atenção o que Riley dizia, cada um deles com uma expressão diferente em seu rosto. Michaela parecia assustada, enquanto os outros três aparentavam estar curiosos.

— Você realmente viu um acidente acontecendo, Riley? Como você sabe disso? — Paris perguntou, se aproximando um pouco dela.

A garota meneou a cabeça positivamente, engolindo em seco. Ela então se virou na direção de Junior e instintivamente disse:

— Você salvou a minha vida ontem, e eu preciso retribuir. Acredita em mim. Nós precisamos fazer alguma coisa pra evitar esse acidente.

Nina arregalou os olhos diante daquela frase, parecendo pessoalmente ofendida com a maneira como a ruiva se dirigira ao namorado dela. Naquele momento um grupo de alunos já se reunia ao redor dos oito, observando com atenção a cena que se desenrolava.

A loira respirou fundo e então disse, em um tom de voz calmo:

— Você salvou a vida dela ontem, Junior? Quando?

O rapaz gaguejou algumas vezes e então engoliu em seco, sem saber o que dizer. Olhou para o gêmeo com uma expressão de confusão em seu rosto. O que você fez, Paris?

— Paris?

— Fui eu. — O outro rapaz disse. — Quando eu fui te buscar lá na clínica, Nina. Eu estava com as roupas do Junior, a Riley deve ter me confundido com ele por isso.

A ruiva então começou a observar os gêmeos com outros olhos. Por alguns instantes se descolou da situação em que estavam e da visão que acabara de ter. A percepção não é sempre a realidade, Riley.

A embarcação ao lado do Atlântida chamou a atenção da ruiva no mesmo instante em que o helicóptero começou a se aproximar ainda mais do iate. Riley sentiu seu coração disparado, e olhou ao seu redor, procurando por uma escapatória. Notou rapidamente que a professora Emma estava encostada próxima de onde o copiloto conversava com o piloto do outro barco, e correu até lá.

Ao chegar do lado da professora, a garota tocou seu braço com delicadeza e disse:

— Professora...

— Riley. — Emma respondeu de maneira firme. — Nós estamos indo. — A ruiva então esboçou uma expressão de alívio, somente para ter suas esperanças massacradas com a frase seguinte: — Eu e você. A festa acabou pra você, mocinha. Eu vou te levar pra casa.

O que a garota sentiu foi um misto de alívio e terror. Enquanto o iate desviava poucos metros de sua rota para se aproximar da outra embarcação e permitir que Riley e quem mais quisesse ir com ela embarcassem, a garota viu que o helicóptero já sobrevoava o iate, porém vários metros distante da pista de dança, ainda perto do mar

Atrás dela, o quarteto, Andi, Lucas e Sketch ainda a observavam.

— Por favor, acreditem em mim.

Andi e Lucas entraram no outro barco no mesmo instante, seguidos de Sketch. Emma ajudou os três a embarcarem e então entrou também. Paris olhou para Michaela e então olhou para Junior. Nenhum deles sabia o que fazer. A expressão no rosto de Riley, porém, era de puro horror. Paris observou-a por um longo segundo e então algo dentro dele despertou. Sabia que estava fazendo a coisa errada, mas mesmo assim disse:

— Vamos, Junior. — E pegou o irmão pelo braço, puxando-o com firmeza. Olhou para Michaela de maneira doce e a namorada concordou com ele com um aceno mudo.

Paris ajudou que a garota entrasse e então olhou para Nina, que segurava fortemente o outro braço do namorado, como a pedir que ele ficasse.

— Eu não posso ficar, Nina. Me desculpa. Eu escolho o meu irmão, sempre.

E então olhou ternamente para a namorada, procurando acalmá-la e convencê-la a ir. Nina ergueu o rosto de maneira imponente e entrou no barco sem a ajuda de ninguém, sendo seguida por Paris e Junior. Riley foi a última a entrar, no exato momento em que o professor Waterson gritava:

— Saiam de perto da pista!

Dentro do helicóptero, Riley voltou a ver a noiva. Dessa vez, porém, ela se atentou aos detalhes. A garota era asiática e parecia bastante nova. Ao lado dela, um homem de terno também bastante bonito podia ser visto.

E então aconteceu. O helicóptero dessa vez, porém, caiu na água. Apesar disso, ele bateu na lateral do Atlântida, fazendo com que o iate sofresse um dano irreparável.

O piloto da embarcação em que os nove estavam parecia aterrorizado. Ele apressou-se a se afastar com o barco, enquanto dizia em um rádio que ficava dentro de sua cabine:

— Nós temos um acidente em alto mar, próximo da baía. O Atlântida está afundando, nós precisamos de ajuda!

Todos os olhos se voltaram para Riley. À medida que a embarcação deles se afastava, a ruiva via com horror os colegas de classe caindo na água e sendo esmagados por objetos do iate. Ela e os outros ouviam os gritos de desespero e os pedidos de ajuda, e sabiam que não podiam fazer nada para ajudá-los. Me desculpem, por favor... Eu tentei...

Emma correu até a ponta do barco e apertou a mão contra a amurada de madeira, com os olhos cheios de lágrimas. Sentado no chão ao seu lado, Lucas tinha a cabeça entre as pernas e os olhos fechados. Andi e Sketch estavam sentados olhando para o acidente de maneira estática, assim como os gêmeos. Michaela por sua vez tinha o rosto colado no peito de Paris, não querendo presenciar a cena.

E então havia Nina. O céu estrelado daquela noite iluminava os olhos castanhos dela e fazia as lágrimas neles brilharem, simulando um quadro dramático que não poderia ser retratado por nenhum pintor. Ela apenas virou a cabeça para o lado e encarou Riley com a expressão mais dolorosa do mundo. Balbuciou:

— Você... Sabia.

x-x-x-x-x

Riley estava sozinha na sala, ainda fantasiada de Nicki Minaj. Estava sentada em uma cadeira de metal e tinha diante de si uma mesa de madeira. Atrás dela não havia nada, apenas uma parede preta e um relógio, indicando que já era mais de duas horas da madrugada. À sua frente havia uma porta e uma janela de vidro escuro, sendo que as pessoas do lado de fora conseguiam vê-la sem que ela os visse.

Através do duto de ventilação instalado ali, porém, ela ouvia uma música, que provavelmente estava tocando no rádio de alguma das salas da delegacia.

There was a time I was one of a kind

Lost in the world out of me myself and I

Was lonely then like an alien

I tried but I never figured it out

Why I always felt like a stranger in a crowd

Ooh that was then like an alien

Perdida no mundo, fora de mim? Quem diria que Britney Spears poderia me entender...

Mas então a garota teve seus pensamentos interrompidos por uma dupla de policiais que entrou na sala. Eram um homem e uma mulher. Ele era negro, e ela era loira. Ambos pareciam ter entre quarenta e cinquenta anos, utilizavam ternos bem cortados e tinham duas pastas em mãos. Riley só soube que se tratava de homens da lei porque eles entraram mostrando seus distintivos.

Os dois se sentaram em frente à garota e então a mulher disse:

— Meu nome é Sasha Boney, e esse é o detetive Jim Abbott. Nós viemos conversar com você, Riley. Essa conversa não tem nada de mais e nós não estamos te acusando de coisa alguma. É preciso que você saiba disso. Nós só queremos que você nos ajude a entender a série de eventos que levaram à queda do helicóptero e ao naufrágio do Atlântida. Você consegue falar sobre isso?

Riley timidamente meneou a cabeça positivamente, olhando para baixo.

— Certo. — O detetive Abbott disse. — Nós conversamos mais cedo com a sua professora, a senhora... — E então ele olhou um papel que estava dentro de sua pasta. — Emma Lynn Brown. Ela disse que minutos antes do helicóptero colidir com o iate, você disse, abre aspas: tem um helicóptero se aproximando desse iate. Ele vai cair em cima da embarcação e causar um acidente que vai matar a todos nós. Fecha aspas. Bom, como nós agora sabemos isso realmente aconteceu. A pergunta agora, senhorita Driskill, é a seguinte: como você sabia?

Eu não posso falar sobre a visão pra eles. Eles não acreditariam em mim. Ninguém acreditaria. Mas se eu não der alguma explicação, qualquer que seja, eles podem achar que eu fui a responsável por isso. O que eu faço?

— Eu só estava assustada. Eu tenho medo de embarcações desde quando eu era criança, já que os meus avós morreram em um acidente semelhante. — Mentiu. — Quando eu vi o helicóptero no céu, mesmo estando longe, eu surtei. Foi só isso, mais nada. Eu não poderia imaginar que um acidente iria realmente acontecer.

E então a garota observou com atenção a expressão facial dos policiais, esperando que sua mentira tivesse sido convincente.

— E por que então a senhorita e os seus amigos saíram de lá momentos antes do acidente? — A detetive Boney perguntou no instante seguinte, como se a questão já estivesse na ponta de sua língua.

Por sorte, Riley também já esperava por aquela pergunta.

— Por ordem da professora Emma. Como punição por eu ter assustado todo mundo.

— Você sim. — A mulher rebateu imediatamente. — Mas e quanto aos seus colegas? Segundo outro depoimento que obtivemos, de uma colega sua chamada Nina Spradlin... — E então a detetive folheou sua própria pasta. — Você tentou convencer o namorado dela, Jeremiah Nowak Junior, a sair do iate também. Se você não imaginava que um acidente realmente iria acontecer, por que se dar ao trabalho?

— Por que eu estava assustada, tá legal? — Riley disse de maneira exaltada. — Agora, aqui na frente de vocês, eu percebo que o meu medo inicialmente era infundado, mas isso não o torna menos real. Eu surtei e tive medo. Medo de morrer e medo de que meus amigos morressem comigo. Eu não tive nada a ver com a porcaria desse acidente! — Ela terminou sua frase gritando de maneira histérica.

Aquela resposta pareceu ser o suficiente para Boney e Abbott. A mulher simplesmente disse:

— Obrigada pelo seu tempo, senhorita Driskill. Nós manteremos contato. — E então se levantou e saiu.

Seu parceiro, porém, demorou um pouco mais. Ele olhou fixamente nos olhos de Riley por vários segundos e ela não os desviou. O homem então meneou a cabeça positivamente e sorriu de maneira enigmática, levantando-se da cadeira e indo embora.

x-x-x-x-x

Sketch foi o último a sair da delegacia. O rapaz imediatamente pegou seu celular, pronto para pedir um táxi, mas então viu Riley acenando para ele há alguns metros dali. O rapaz inicialmente estranhou aquilo, já que já passava das três da madrugada, mas sorriu diante da situação.

Quando ele se aproximou o suficiente, notou que Andi e Lucas também estavam ali, ambos dentro de um fusca que estava estacionado atrás da ruiva.

— Nós te esperamos pra te dar uma carona. — Ela disse, deixando que o rapaz entrasse e se sentasse no banco de trás do veículo. Andi já estava ali e acenou timidamente para ele. Por ter sido o único a não beber, Lucas dirigia; e Riley sentou-se ao lado dele, fechando a porta e colocando o cinto de segurança.

— Obrigado. Isso é muito gentil.

— De nada, cara. — Lucas respondeu.

E então ele deu a partida no carro.

— Onde você mora? — Riley perguntou.

Sketch pensou por alguns segundos antes de responder. Ele sabia seu endereço, era óbvio, mas por algum motivo sentia-se desconfortável em deixar que outras pessoas soubessem disso. A casa de Sketch era pequena e de madeira, quase nos limites da cidade. Ele morava lá com seus avós desde a morte de seus pais, dez anos antes. Os pais lhe deixaram uma boa herança, e os avós, como seus guardiões, não mexiam em um centavo do dinheiro, continuando a viver de maneira simples em sua pequena casinha de madeira. Sketch os amava muito, mas às vezes sentia um pouco de vergonha. Não deles, mas de sua vida como um todo. Deixar que outras pessoas entrassem em seu mundo era uma tarefa deveras complicada.

— É perto do clube de hipismo, quase nos limites da cidade. É muito longe, então vocês podem me deixar o mais perto que conseguirem e eu pego um táxi dali. — Ele respondeu, aproveitando-se da situação para se livrar daquilo.

— Nah. — Lucas devolveu. — Eu não moro muito longe dali, te deixo em casa de boa.

Sketch suspirou. Agradeceu timidamente e então ficou em silêncio.

Por consequência, o carro andou por vários minutos no mais completo silêncio. Mas então subitamente Riley o quebrou:

— Vocês são meus amigos. Eu sei que vocês querem perguntar algo, mas não têm coragem. Perguntem.

Estava claro no rosto de Andi e Lucas que eles entendiam pouco do que estava acontecendo, e só se mantinham calados para poupar os sentimentos de Riley. Diante da deixa da amiga, porém, a outra garota disse:

— Como você sabia, amiga? Quero dizer... Como você sabia sobre o acidente?

Riley suspirou. Decidiu que com os amigos seria sincera:

— Eu tive uma premonição. Foi uma espécie de sonho, em que tudo isso aconteceu.

Lucas arqueou as sobrancelhas, e Sketch desviou o rosto, olhando pela janela. Andi por sua vez, concordou com um aceno de cabeça, dizendo:

— Eu acredito em premonições. Eu acredito em você, Riley.

A ruiva sorriu através do espelho retrovisor. Ela então estendeu o braço para trás de seu banco e apertou a mão da amiga com força. Imaginou que, se estivesse passando por tudo aquilo sozinha, provavelmente iria surtar. Mas não estava. Tinha Andi, tinha Lucas e... Esperava ter Sketch.

Apesar desse conforto, porém, Riley não conseguia ficar sossegada. Talvez fosse o olhar do policial na delegacia de polícia, ou apenas o trauma pela tragédia recente, mas... A ruiva tinha a sensação de que aquilo ainda não estava acabado.

x-x-x-x-x

Junior terminou de escovar os dentes e entrou no quarto. O lugar estava parcamente iluminado, sendo que a única luz provinha de um pequeno abajur ao lado da cama. Ao lado dele, um relógio indicando que eram quatro horas da manhã.

Ele e o irmão dividiam o mesmo quarto, e ambos dormiam em um beliche. O de Junior era o de baixo, enquanto o de Paris era o de cima. Estranhamente, dessa vez o irmão estava deitado na parte de baixo da cama, com os braços atrás da cabeça e olhando para cima. Ele estava sem camisa, e usava apenas uma calça de moletom. Junior por sua vez, estava com uma regata branca e uma cueca samba-canção.

— Você tá na minha cama, Brian.

— Eu sei. — Paris respondeu. — Você pode vir aqui um pouco?

— Aí? Você quer dizer na cama com você? — Junior perguntou, parecendo estar ofendido.

Paris riu de maneira desanimada.

— Para de frescura, Junior, deita aqui do meu lado um pouco. Não vai ser a primeira vez. Você tinha medo de dormir sozinho até uns cinco anos atrás, era um saco.

O irmão riu de volta e fez o que o outro dizia. Empurrou-o para o canto da cama e deitou-se ao seu lado, também olhando pra cima.

— Eu estou confuso. — Paris começou. — Você sabe, com tudo o que aconteceu hoje. Você tem noção de que todos os nossos colegas de classe estão mortos?

O gêmeo suspirou, com uma expressão de melancolia em seu rosto.

— Nós ainda não sabemos disso, cara. Eles estão procurando por sobreviventes nesse momento. — Junior disse, tentando confortar o irmão.

Paris sorriu de maneira conformada.

— É perda de tempo, eles não vão encontrar nada. A Riley disse que todos nós íamos morrer naquele acidente. Nós somos os únicos sobreviventes.

Junior murmurou qualquer coisa ininteligível e em seguida disse em voz alta:

— Como ela sabia disso, aliás?

Mas o irmão meneou a cabeça negativamente, sem saber o que responder.

Ele não tinha ideia do motivo de Riley saber daquele acidente, bem como não tinha ideia do motivo de ter acreditado nela. Talvez fosse o puro e simples... Medo. Paris havia lido algumas vezes sobre um fenômeno chamado “histeria coletiva”, em que várias pessoas começavam a acreditar (e a demonstrar fisicamente isso) sinais e ações semelhantes umas às outras, sem que houvesse um motivo para isso. Talvez o que tinha acontecido fosse semelhante. Riley falou e ele acreditou, mesmo que não houvesse qualquer motivo para isso.

Apesar disso, sentia-se aliviado por ter acreditado nela. Ele de certa forma tinha salvado a vida de Riley no dia anterior, e ela pagara sua dívida, de modo que eles não deviam mais nada um ao outro.

Pensar nisso, porém, lhe trouxe um pensamento macabro na cabeça. Se ele não tivesse salvado Riley no dia anterior, o que poderia ter acontecido? Mesmo que ela não tivesse morrido no atropelamento, isso com certeza a impediria de comparecer à festa no iate. E, nesse momento, ele estaria morto, seu corpo caído no fundo do oceano. Era horrível só de imaginar.

— Bom, vamos dormir. — Paris começou, tentando mudar o foco do assunto. — Aproveito o momento para te lembrar que a Michaela tem aquela competição de hipismo depois de amanhã, e você e a Nina prometeram que iriam comparecer. Ok?

Junior sorriu e concordou com um aceno de cabeça. E então Paris se sentou na cama, pronto para pular por cima do irmão e subir para sua cama. Mas o outro gêmeo então segurou seu braço e disse:

— Fica aí, Brian. Só não me agarra durante a noite, porque eu não gosto de dormir de conchinha com ninguém.

Paris caiu na gargalhada, e o irmão fez o mesmo. Ele então concordou com um aceno de cabeça e voltou a se deitar, virando-se de costas e fitando a parede. Estava exausto, e sabia que dormiria imediatamente assim que fechasse os olhos. Temia, porém, era o que o sono tinha reservado para ele.

x-x-x-x-x

Riley acordou no mesmo horário de sempre naquele dia.

Mesmo tendo ido dormir depois das cinco da madrugada, às oito da manhã já estava de pé. Verificou seu celular e percebeu que não havia nenhuma mensagem ali. Imaginou que Andi e Lucas ainda estivessem dormindo, o que era bom. Ela, porém, tivera as três piores horas de sono de sua vida.

Um filme passava diante de seus olhos. A única coisa que ela conseguia ver em sua cabeça eram seus colegas de classe caindo do navio, sendo esmagados por objetos e morrendo afogados. O pior de tudo, é que ela sabia que aquilo não era outra visão, mas algo que realmente acontecera. Pessoas com as quais ela convivera por anos, mortas. Nenhum amigo, era verdade, mas conhecidos, pessoas que faziam alguma diferença em sua vida. Mais do que isso: jovens. Era de partir o coração.

Riley sabia também que não estava acabado. A sensação que ela tivera na noite anterior, agora tomava forma. Era claro que não estava acabado. Aquele era, provavelmente, o episódio mais trágico de sua vida. Mais que o divórcio dos pais e o abandono da mãe, mais que a sua época bulímica... As consequências daquele dia lhe acompanhariam pelo resto da vida. Paris, Junior, Nina, Michaela... Todas aquelas pessoas com as quais ela não tinha nada em comum, agora faziam parte de sua vida. E ela imaginava que eles jamais a deixariam esquecer tudo o que acontecera.

A ruiva foi até o banheiro e lavou o rosto, escovando os dentes em seguida. Ela então prendeu o cabelo num rabo de cavalo e agradeceu a Deus pelo fato do pai estar viajando e só voltar à noite, segundo o bilhete que ele deixara em cima da mesa da cozinha. A última coisa que ela queria no mundo era conversar com ele sobre aquilo, especialmente porque ele provavelmente saberia do ocorrido por conta dos noticiários.

Oh, ele vai surtar quando ver sobre isso na TV! Como ele vai saber que eu escapei?

Aquele pensamento foi o suficiente para que ela pegasse o celular e digitasse uma mensagem de texto para o pai, dizendo:

Quando você assistir o noticiário, não se assuste. Eu to bem, pai. Nos falamos quando você voltar.

Aquilo era suficiente. Riley largou o celular em cima da cama, virado para baixo e no mudo, e desceu as escadas.

No andar de baixo, apressou-se em ligar a televisão da sala para lhe fazer companhia. Não gostava do silêncio, especialmente naquele momento em que se sentia vulnerável.

Se arrependeu no mesmo instante.

Assim que ouviu as primeiras palavras da repórter do noticiário, Riley correu para a sala. A palavra “Atlântida” foi a que prendeu sua atenção. Na TV, uma mulher de nome Heather Diamond dizia:

— ...o casal, cujos nomes são Claire Blanche e James Ziegler, foi levado ainda com vida para o hospital central, onde receberão o devido atendimento. O estado do homem é grave, mas a mulher parece não correr risco de morte, e foi ela quem deu a identidade de ambos. Os dois estavam dentro do helicóptero que colidiu com o iate Atlântida na madrugada desse sábado. Até agora, mais nenhuma pessoa foi encontrada com vida... — E então a garota desligou-se mentalmente do noticiário.

Riley lembrava-se claramente do casal no helicóptero. A garota oriental com o vestido de noiva e o homem que estava ao lado dela. Então estes são os nomes deles. Claire e James.

A ruiva não soube explicar, mas ouvir aquela notícia lhe deu uma pontada de esperança. O casal não sabia da visão dela, de modo que não escaparam do acidente de maneira propriamente dita. Mas mesmo assim, por algum motivo, eles estavam vivos. Ela lembrou-se imediatamente do “efeito borboleta”, e ficou feliz por ele estar provando-se verdadeiro. Eles conseguiram... Isso é bom.

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Emma tremeu ao ouvir a notícia na televisão a respeito do Atlântida.

Seus olhos ainda estavam vermelhos e inchados, mas ela tentara ao máximo esconder isso dos filhos ao deixá-los na casa de sua irmã. Seu filho mais velho ouvira a conversa que ela tivera com o marido a respeito do acidente que matara seus alunos, mas a caçula não sabia de nada. Emma preferia que fosse assim. Não era justo que a dor que ela sentia naquele momento fosse transferida para os filhos.

Seu marido, Julio, aproximou-se timidamente e lhe entregou uma xícara de chá, dizendo:

— Camomila.

A mulher agradeceu o gesto e pediu que ele se sentasse ao lado dela, tocando o tecido aveludado do sofá.

— É difícil de acreditar. — Emma disse, assim que Julio sentou-se ao seu lado. — Meus alunos, mortos. Eles eram crianças, e... E... — E então as lágrimas voltaram a escorrer de seu rosto.

O marido tirou a xícara de sua mão e então a abraçou com carinho.

— Eu sou o homem mais sortudo do mundo por ainda ter você comigo, Emma.

A mulher sorriu diante da fala de Julio, lhe dando um delicado beijo na boca.

Ela não contara a ele sobre as alegações de Riley de que havia tido uma premonição. Limitara-se a dizer que saiu do iate para levar a garota de volta para casa depois de ela ter sido indisciplinada durante a festa. Emma não sabia dizer se acreditava em precognições, mas sabia a opinião do marido, um psicólogo cético. A última coisa que ela queria, naquele momento, era ouvir o que ele tinha a dizer sobre o que Riley alegava ter visto.

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Quando a campainha tocou, Riley pensou em não atendê-la. Já passava do meio dia, e ela estava sentada em frente à televisão, assistindo um seriado qualquer e sem vontade alguma de conversar com quem quer que fosse. O celular ainda estava no andar superior, mas se fosse algo realmente importante, tanto Andi quanto Lucas tinham o seu telefone fixo e poderiam ligar para ele.

Por algum motivo, porém, a ruiva viu-se levantando do sofá e seguindo em direção a porta para atendê-la. Naquele momento ela tinha os cabelos vermelhos presos em um desajeitado rabo de cavalo que caía por cima de seu ombro, e estava usando uma regata branca e um short jeans.

— Oi. — Sketch disse quando ela abriu a porta.

— Oh. — Riley exclamou, surpresa. — Entra.

O rapaz sorriu de maneira tímida e entrou. Ele estava com uma mochila em suas costas, usando uma camiseta roxa e uma bermuda cáqui, e com um par de mocassins da cor marrom em seus pés. Parecia também bastante vermelho e suado, como se tivesse caminhado no sol por bastante tempo.

Sketch observou todo o cômodo em que estava, enquanto Riley voltava a fechar a porta atrás dele. A garota sorriu e o chamou para a cozinha.

— Quer um suco, uma água...? — Ela perguntou ao chegarem lá.

— Água gelada, se não for pedir muito. — Ele respondeu sorrindo.

Riley voltou a sorrir e abriu a geladeira, pegando uma jarra. Ela em seguida abriu o armário e pegou um copo, colocando-o em cima da mesa e o servindo com a água gelada. Sketch agradeceu a gentileza e bebeu dois copos. A ruiva então se sentou na frente dele, em um dos banquinhos da bancada, enquanto o rapaz tinha os cotovelos apoiados ali.

— Eu não vou desperdiçar o seu tempo, Riley. — Ele disse de repente. — Eu passei a madrugada pesquisando a respeito do que aconteceu ontem com você. — Sketch então parou de falar, observando a reação que a ruiva teria. A garota apenas meneou a cabeça positivamente, pedindo que ele continuasse. — E eu acho que encontrei algumas respostas.

Sketch então abriu sua mochila e retirou de lá um iPad. Enquanto ele iniciava o aparelho, Riley pegou os copos e os colocou na pia, aproveitando também para colocar a jarra de água de volta na geladeira.

— Eu... Eu encontrei isso. — Sketch continuou, gaguejando. E então tocou a tela, dando início a um vídeo, que Riley aproximou-se no mesmo instante para ver.

Na tela do tablet havia uma bonita garota, usando uma camisa social branca com gola preta e sem mangas. Ela tinha os cabelos castanhos e lisos, e uma melancolia evidente em seu olhar. A garota parecia estar em seu quarto, aparentemente em um dormitório estudantil. Ela dizia:

Meu nome é Anna Hill. Eu tenho dezoito anos e sou uma estudante de psicologia. Hoje é dia... Oh, eu não me lembro. — E então ela sorriu levemente. — Mas não importa. O importante é que já faz algum tempo desde que Phillip e todos os outros morreram. Oh, eu estou estragando tudo! — Anna exclamou, batendo em sua testa. — Eu suponho que eu deva começar do começo, já que vocês não conhecem a minha história.

“Há alguns meses, eu e meus amigos viajamos para o Havaí, a fim de gravarmos um filme para um trabalho acadêmico de alguns deles. Eu também fui, por motivos que não vem ao caso agora. O que acontece, é que o aconteceu lá foi... Inesperado. Nós pegamos um ônibus, desses de turismo, e decidimos passear pela ilha. Mas em um dado momento, eu tive um sonho... Uma espécie de visão... E eu vi um acidente. O ônibus em que estávamos caía em um precipício e explodia, e em consequência a isso todos nós morríamos. Foi aterrorizante e... Eu acreditei. Eu evitei que o ônibus saísse do lugar, e com isso nós escapamos. O ônibus explodiu como na minha visão, mas apenas um de nós estava lá. Eu salvei todos os outros...”

Riley tapou a boca, surpresa. Aquela garota tinha os olhos mareados, e falava com a convicção de quem realmente presenciara aquilo. Ela não estava mentindo, era claro.

— Eu não sou a única... — Riley murmurou.

— Não. — Sketch respondeu. — Mas... Fica pior.

A ruiva sentiu o coração bater mais forte, e então pediu que o rapaz continuasse reproduzindo o vídeo.

O pior de tudo foi o que aconteceu depois. O que eu fiz ao ter aquela premonição... Não foi correto. Eu enganei a morte. Eu a trapaceei e, de alguma forma, destruí o balanço e os desígnios da morte. Nós não deveríamos estar vivos, nós deveríamos estar mortos. Nós estávamos condenados.

“Nos dias que se seguiram ao desastre no Havaí, meus amigos foram morrendo um a um, em bizarros acidentes, causados pelos mais diversos fatores. Elevadores, partidas de futebol, bolas de construções... Tudo ao nosso redor era uma armadilha mortal buscando por nossas vidas. Todos morreram. Todos com exceção de mim e...”.

E então Riley tocou a tela do iPad, parando o vídeo. Em seu rosto, uma expressão tremendamente ansiosa.

— Isso não pode ser sério. Você checou as redes sociais dessa garota? Facebook, Twitter, Instagram...? Ela cita um “Phillip” no vídeo, você tentou encontrá-lo? Conferir se ele está vivo? Se ele... — E então Sketch se aproximou da garota e calou sua boca com um delicado beijo.

Quando os dois se afastaram, Riley tinha uma expressão de surpresa em seu rosto. Sketch por sua vez, parecia completamente vermelho de vergonha.

— Me desculpe, eu...

— Não, não. — A garota disse no mesmo instante, interrompendo-o. — Foi uma boa maneira de me fazer parar de surtar.

Sketch sorriu e abaixou a cabeça. O que deu em você, Sketch?

— Respondendo a sua pergunta... Não, eu não chequei nenhuma dessas informações. Eu simplesmente... Acreditei. Eu acreditei nessa tal de Anna, assim como eu acreditei em você.

Riley meneou a cabeça positivamente, compreendendo a situação. Que direito eu tenho de ser cética sobre isso?, refletiu.

— Obrigada por me mostrar isso, Sketch. — Foi tudo o que conseguiu dizer, não querendo dar o braço a torcer. — Eu preciso refletir sobre isso, tudo bem?

— Claro, claro. — O rapaz respondeu, guardando seu tablet dentro de sua mochila. — É muita informação de uma vez só. Você não precisa acreditar em nada disso.

A garota não soube o que dizer, então apenas concordou com um aceno de cabeça. Sketch sorriu de maneira sem graça e então houve um silêncio sepulcral por vários segundos.

— Nós podemos nos encontrar amanhã? — Ela pediu, de repente. — Se o que essa garota fala for verdade, nós não temos muito tempo... — E então um súbito pânico a invadiu, mas Riley tentou contê-lo, respirando fundo. Até ele ir embora, Riley. Depois você pode surtar. — Eu gostaria de pensar sobre isso essa noite, e te contar o que eu concluí amanhã, se não for um incômodo...

Sketch sorriu.

— De forma nenhuma. — E então se aproximou da garota, olhando diretamente em seus olhos. — Só tem um probleminha...

— Qual?

— Bom, eu meio que tenho um compromisso amanhã. — Ele começou, e quando Riley estava prestes a interrompê-lo, Sketch continuou: — Então eu gostaria de saber se você não quer ir comigo. Não é nada de mais, só uma apresentação de globo da morte. O meu primo é um motociclista e ele vai estar lá e...

— Eu aceito. — Riley concordou, antes que se arrependesse da decisão. — Estarei lá. Que horas?

— À tarde. — Sketch respondeu. — Eu sei que você trabalha à noite, não é?

Como ele sabe?, a garota refletiu, mas não disse.

— Isso mesmo.

O rapaz então sorriu mais uma vez, saindo da cozinha e sendo acompanhado por Riley em direção à porta da frente.

— Então eu passo aqui as duas pra te buscar, tudo bem? Podemos comer algo e conversar com mais calma depois, e eu te dou uma carona até o trabalho daí.

A ruiva abaixou a cabeça, sentindo que estava corada. A ansiedade e o pânico que sentira minutos antes ao ver o vídeo de Anna se esvaíram naquele momento. Ela estava extasiada, anestesiada pela presença de Sketch.

— Perfeito. — Foi tudo o que conseguiu responder.

Daquele instante até o momento em que Sketch saiu porta a fora, Riley sentiu-se completamente leve. O pressentimento ruim que a cercava desde o acidente com o iate ainda existia, mas por algum motivo, naquele momento ele parecia pequeno diante do sentimento bom que Sketch trouxera a ela.

Aquele encontro era a melhor coisa que poderia ter lhe acontecido. O problema era que o momento era, paradoxalmente, o pior de todos.


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Notas finais do capítulo

Como de praxe, as músicas utilizadas no capítulo:
The Beginning - RuPaul: https://www.youtube.com/watch?v=MYlJdE5MNQ0
Alien - Britney Spears: https://www.youtube.com/watch?v=YTITmXu3yMs

Próximo capítulo estará SANGRENTO, prometo! O ritmo dessa fic será mais calmo, assim como Condenados, mas prometo muito mais ação! :D

See ya!