Hinan escrita por Hakiny


Capítulo 35
Mizuno - A água dos Pesadelos


Notas iniciais do capítulo

Esse cap é um mix de passado e futuro. Contando um pouco de Miran e das gêmeas Mizus.



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― eu não quero ir papai...

Uma frágil menininha de pele pálida como um papel e lisos cabelos azuis que chegavam até o seu pescoço, se agarrava a perna de um homem de idade avançada.

― você vai ficar bem princesa, vai ser feliz lá!

O homem acariciava a cabeça da criança inconsolável.

― eu estou feliz aqui!

A menina berrava ainda mais alto.

― mas elas são tão pequenininhas... só tem oito anos! Isso não é justo! Podemos esperar até que fiquem mais velhas! Até que...

― Lira, os guardas já estão na porta! Essas crianças tiveram seus poderes liberados muito cedo, precisam ser levadas para o castelo, para exercer a função para qual elas nasceram!

O homem interrompia a mãe desesperada, com um tom de voz triste.

― minhas meninas...

A mulher se ajoelhava no chão, enquanto chorava incessantemente.

― fica calma mamãe. Eu cuido da Mizusha.

Uma pequena garotinha idêntica a que se encontrava agarrada ao homem, tocava o rosto da mulher, com suas pequenas mãos geladas.

― Mizuno!

A mulher se agarrava a menina. Com toda a delicadeza do mundo, a inocente garotinha acariciava os ondulados cabelos claros de sua amada mãe.

― senhor Navy! Traga as garotas!

Uma voz masculina ecoava em um tom alto do lado de fora da porta.

― NÃO! DEIXE MINHAS FILHAS EM PAZ! NÃO!

A mulher segurava as duas garotas com todas as suas forças. Foi então que a porta se abriu e os dois soldados entraram. De forma bruta e impiedosa arrancaram as crianças dos braços da mãe e as levaram para fora. O marido segurava a esposa desesperada. Lágrimas escorriam pelo seu rosto, doía tanto nele quanto aquela pobre mãe sentia. Mas as regras precisavam ser cumpridas, afinal, as meninas eram guardiãs de nascença, filhas da água. Mesmo que fossem dolorosas aquelas palavras, ele repetia a si mesmo que elas não pertenciam a eles. E caso as regras fossem desobedecidas, eles poderia até ser condenados a morte. Navy queria lutar, queria suas filhas ali, com ele. Mas se lembrou do garoto de seis anos que dormia inocente no quarto dos fundos. Ele lutaria, por seu ultimo filho.

Do lado de fora da casa, Mizusha chorava e gritava pelo nome da mãe. Mizuno por outro lado se mantinha calma, serena. Olhou para trás por uma ultima vez e pela pequena abertura da porta semifechada, pôde ver sua mãe se debatendo em desespero, sendo amparada por seu pai. Uma única lágrima escorreu pelo rosto da garotinha, mas logo foi enxugada e esquecida. Ela precisava ser forte, por ela, por Mizusha e pela promessa que havia feito.

**

― quem é você?

Lily encarava a inimiga.

― me chamo Mizuno.

A garota sorria de uma forma tão singela, quase imperceptível.

― o que você está fazendo aqui Mizuno? O que aconteceu?

Raque parecia confusa.

― o que eu estou fazendo aqui...

Mizuno sorria de forma irônica ― é tão notável, o quanto a família real sabe sobre os escravos não é mesmo?

― escravos? Que idiotice é essa?

A jovem miraniana não compreendia as palavras ditas pela guardiã.

― meus amigos foram sequestrados, a não ser que você saia da minha frente... acho que é hora de te mandar pro inferno!

Lily dizia em um tom ameaçador, enquanto erguia sua mão esquerda em direção a Mizuno.

― ah claro! Você vai proteger seus amigos não é mesmo?

A mulher encarava Lily ― assim como os protegeu há quatro anos, quando a Hinan do Sul foi atacada. Todas aquelas pessoas inocentes, sendo dilaceradas pelos dentes afiados das aberrações famintas.

Com os olhos arregalados, Lily dava alguns passos para trás, sua expressão era de horror.

― você sabe do que eu estou falando não é mesmo Lily? Claro que sabe! Eu já entrei na sua mente. E eu sei de todas as noites em que você foi assombrada por seus terríveis pesadelos! É bem engraçado como algumas lembranças podem marcar a vida de alguém não é mesmo Lily? Como por exemplo aqueles braços e pernas espalhados pelos corredores, uniformes ensanguentados e paredes rachadas...

―PARA!

Lily gritava desesperada enquanto caía de joelhos.

― você continua sendo a mesma Lily, a mesma garotinha assustada e fraca. Alguns fogos de artifícios não mudaram a sua essência, não farão de você mais do que é, afinal você não passa de uma inútil!

―CHEGA MIZUNO!

Raque tentava repreender a inimiga.

― mas agora que está tão divertido?

Mizuno mantinha seu sorriso cínico no rosto.

― deixe-a em paz! Esses malditos feitiços são...

― feitiços?

Mizuno interrompia a garota, enquanto se virava para encará-la ― isso não é um feitiço... eu apenas lembro as pessoas de seus erros... de suas culpas.

Naquele momento Raque sentiu seu corpo inteiro tremer.

― você sabe do que eu estou falando não sabe Raque? Afinal você tem tantas culpas não é mesmo?

Pouco a pouco uma sensação estranha correu pelo corpo da jovem maga, seu coração acelerava e sua visão ficava cada vez mais embaçada. O terror era tanto que não conseguia conter suas emoções, lágrimas corriam pelo seu rosto e nem os gritos de agonia de Lily ela era capaz de ouvir. Tudo que a garota podia ouvir era a voz de Mizuno, aquelas palavras perfurantes que criavam imagens em sua cabeça, lembranças.

― a maldição dos dois filhos do rei...

Mizuno cantarolava o que parecia ser uma canção antiga, num idioma desconhecido, mas familiar aos ouvidos de Raque.

“ haviam duas crianças, o demônio e a salvação

Quem poderá salvar os sorrisos daqueles rostos inocentes?

Matem o demônio! Erradique o mal...”

Aquela canção... aquela maldita canção... Raque se lembrava, se lembrava muito bem. Lembrava-se de todas as vezes que a ignoravam no colégio, dos cochichos nos cantos do palácio.

De todas as pessoas a olhando como se fosse um...

― demônio.

A garota sussurrava.

“ a espada da justiça reluz como o sol da manhã

Ela anseia pelo fim da maldição

Matem o demônio! Erradique o mal...”

Mizuno cantava cada vez mais alto.

― pare... por favor.

Raque debruçava-se sobre a superfície gelada do chão.

― parar? Mas é uma musica tão bonita! Faz parte da cultura de nosso planeta! Não se lembra de todas aquelas criançinhas de mãos dadas, rodando em torno de você? Quase como um belo coral.

Mizuno sorria.

― não é justo... eu nunca fiz mal pra ninguém!

Raque sussurrava.

― você é o mal... Raque.

Mizuno sussurrava.

**

Após uma longa viagem, as duas garotas finalmente haviam chegado ao enorme palácio.

Mizusha havia dormido, mas Mizuno permanecia em alerta.

― tirem-nas da carruagem!

Uma voz masculina deu a ordem. Rapidamente a pequena garota, chacoalhou sua irmã, fazendo com que dessa forma a garotinha recuperasse os sentidos.

Antes mesmo dos guardas abrirem a porta, as duas estavam ali, de pé diante da saída da carruagem.

Em passos rápidos, os guardas conduziram as garotinhas aos seus aposentos e saíram.

― eu estou com medo Zuno.

Mizusha se debruçava sobre aquela cama macia.

― não a o que temer Zusha. Nós só vamos morar aqui! Vamos ter comida, abrigo, e eu vou cuidar de você.

Mizuno se sentava na cama e acariciava a menininha.

― HORA DO CAFÉ DA MANHÃ!

Uma voz vinda de um alto falante no quarto, fez com que as duas garotas se assustassem.

― eu não quero sair...

Mizusha se agarrava aos joelhos.

― vamos Mizusha... eles devem estar servindo bolo.

Mizuno sorria. Um pequeno sorriso também brotou nos lábios da outra garotinha.

Após andarem pelo imenso corredor repleto de quartos, chegaram a uma grande sala iluminada e cheia de pessoas.

De mãos dadas, as gêmeas andavam vagarosamente até a mesa enfeitada de comida.

― MEU DEUS! SÃO DUAS GAROTINHAS!

Uma voz feminina estridente fez todos se calarem.

― como são lindas!

Uma outra mulher comentava.

A primeira vestia um uniforme claro, repleto de babados, provavelmente era algum tipo de arrumadeira. Delicadamente a mulher conduziu as duas meninas até a mesa e as serviu.

― me chamo Nádia.

A mulher sorria.

― Mizuno.

― Mizusha.

As duas meninas responderam educadamente.

― olhem para elas... que delicadas e esses cabelos, não são convencionais. Qual a idade de vocês?

Nadia interrogava.

― 8

Mizuno respondia, enquanto se deliciava do bolo servido.

― dessa vez eles passaram dos limites! Arrancar duas crianças dessa idade dos pais é no mínimo cruel!

Uma senhora se pronunciava do canto oposto da mesa.

― silêncio dona Valentine! Quer que a ouçam?

Nadia olhava para todos os lados, certificando-se de não estar sendo vigiada.

―comam depressa antes que...

― então essas são as recém-chegadas?

Um rapaz de estatura alta havia entrado na sala.

― já é hora do treinamento! Elas estão atrasadas!

― Eize,elas estão com fome e...

Um olhar frio por parte do garoto foi o suficiente para fazer com que a mulher se calasse.

― sigam-me.

Eize dizia, enquanto se retirava da sala. Sem discutir as duas garotas fizeram como mandado.

Depois de uma curta caminhada, as crianças haviam chegado a uma sala repleta de pessoas e equipamentos.

Homens armados de espadas se enfrentavam, era possível ouvir explosões e gritos. Assustada, Mizusha agarrou com força o braço da irmã, também assustada, Mizuno manteve uma expressão séria.

Em passos rápidos as meninas confusas foram até o canto aparentemente mais seguro daquela sala.

Passado alguns segundos, uma sirene tocou e todos os presentes na sala saíram, pelo menos quase todos.

―ouvi falar que mesmo sendo tão pequenas, já haviam despertado seus poderes.

Uma voz masculina de tom grave vinha do canto da sala. As meninas ficaram em silêncio.

― não parecem lá grande coisa.

Eize debochava.

― são realmente muito pequenas e...

― Eu quero ir pra casa!

A voz de Mizusha saiu quase como um choro.

― shiiiiii!

Mizuno repreendia a irmã.

―mimadas... acham que tudo é um mar de rosas? Acham que podem fazer o que querem a hora que bem entenderem?

Eize se alterava ―vamos ver o quanto são “dotadas”.

Com essas palavras o miraniano fez surgir uma enorme ventania ao redor de Mizusha, a arrastando para perto de si.

Mizusha gritava e chorava, uma pequena explosão chamou a atenção de Eize, mas antes que pudesse tomar qualquer atitude, sentiu uma enorme quantidade de água empurrar o seu corpo para trás. O liquido parecia vivo, e o que indicava estava prestes a tentar afogá-lo.

Dentro da bolha de água que havia lhe envolvido, Eize formou um pequeno redemoinho, o suficiente para desfazer aquela prisão. Sem hesitar ele avançou para cima da origem dos ataques. Mizuno era forte, porem sua pouca idade e nenhuma experiência seriam o suficiente para o fim rápido daquela batalha. Estando a poucos centímetros da pequena guardiã, Eize foi parado por uma grande muralha de pedra.

― Chega Eize!

A voz autoritária daquele homem estranho ecoou por toda a sala.

― não amola Ivan!

Eize se irritava.

― magnífico!

A voz do estranho que parecia observar tudo era acompanhada por palmas do mesmo. Os seus lisos e longos cabelos esbranquiçados se balançavam a cada passo dado por ele.

― mestre Céverus.

Eize se curvava em reverência.

― majestade.

Ivan fazia o mesmo.

― olhem só pra essa bagunça!

Céverus observava o local. O chão coberto de água e lama, um bebedouro estourado, devido aos poderes de Mizuno e uma enorme muralha de pedra no meio da sala.

― levante-se pequena. Ninguém vai te machucar.

Céverus estendia sua mão para Mizusha, que ainda estava no chão em prantos.

― Eize, elas são membros do conselho de guardiões, um arranhão nessas garotas e explodirei todos os órgãos do seu corpo, lhe causando uma morte lenta e dolorosa. Entendeu?

Céverus mantinha um sorriso no rosto.

Naquele momento, Eize sentiu um frio percorrer por sua espinha.

―sim senhor.

**

― me ajuda com a louça?

Um pouco zonza, Lily aos poucos recuperava a consciência.

―Erii! Não use tanto sabão!

― por quê? Sua família está passando por alguma dificuldade financeira?

Aquelas vozes, pareciam tão familiares. Já de pé Lily reconhecia aquele lugar, aquele carpete, aquele cheiro.

― minha casa...

Lily sussurrava, enquanto tentava assimilar aquela imagem com a realidade. Sim, aquela era sua antiga casa, a casa que ela não via a quatro anos. Lugar aonde ela se recusou a voltar depois daquela grande tragédia. Seus pais haviam se mudado para Hinan do Norte a pedido dela, pois aquela pequena garota não conseguia mais respirar o ar de dolorosas lembranças daquela cidade, sua amada Hinan do Sul.

Mas o que ela estaria fazendo ali? Estava tudo tão, em seu devido lugar...

― DROGA ERII!

Lily então mais uma vez se atentou as vozes.

― Erii?

A menina estranhava. Aos poucos ela seguia aquelas vozes, gargalhadas constantes. Ela conhecia aquelas vozes tinha certeza.

― a cozinha!

Lily seguia até a origem das vozes foi então que ela se deparou com o que seus olhos não podiam acreditar.

De costas para uma pia repleta de pratos e sabão ela via uma imagem de si mesma, ao lado ela pôde ver Erii com um pano enxugando o chão.

― não pode ser... não pode.

Lily levava a mão ao rosto demonstrando espanto. Ela havia se lembrado daquele dia, e sabia o que aconteceria nos próximos que viriam...

Lágrimas começaram a surgir.

― NÃO!

Lily se desesperava, ela não queria viver aquilo de novo. Em um ato de insanidade ela correu sem rumo, precisava fugir, mas para onde?

Abriu rapidamente a porta que levava para fora de casa, mas tudo o que ela encontrou foi a paisagem de sua velha rua. Não, aquilo não era um sonho, era real e não havia saída.


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Notas finais do capítulo

uooou! A pequena Lily está em maus lençóis hehehehehe



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