Incertezas do amor escrita por Aislyn


Capítulo 1
Quando a dúvida assola um homem seguro de si


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura...



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A semana mal havia começado e Kirishima já se sentia cansado. O final de semana, diferente do que ele havia planejado, havia sido bem desgastante. Não que estivesse trabalhando, mas Hiyori estava crescendo e com isso o seu medo de perdê-la. Já havia brincado várias vezes dizendo que nunca a deixaria se casar, mas sabia que isso era inevitável. A cada dia que passava ela se tornava uma moça mais bonita do que fora quando criança, além de ser muito fofa e gentil.

Chegou finalmente ao quinto andar do prédio da editora Marukawa, caminhando até sua mesa e se jogando na cadeira. Passou a mão pelos fios claros, afastando-os de sua face e soltando um suspiro desolado. Ele sabia que estava sendo super-protetor e um pouco exagerado com relação à filha, mas tirando os pais, ela era sua única família.

Não. Aquilo não era verdade. Já fazia um bom tempo que mais alguém havia entrado em sua vida e podia considerar tão especial quanto sua filha. Yokozawa Takafumi, o editor do terceiro andar responsável pela parte de vendas, com quem atualmente mantinha uma relação estável, mesmo que não fosse de conhecimento geral, afinal de contas, eram dois homens.

Takafumi havia chamado sua atenção, não só pela sua boa aparência, mas também pela sua inteligência e o modo como lidava com os negócios, ou talvez porque, ao observá-lo num momento de guarda baixa, tenha conseguido ver o seu lado frágil, que era escondido pela máscara de um homem maduro, forte e decidido.

Aquele dia que se encontraram no bar, Kirishima realmente ficou com pena ao ver o estado que o rapaz se encontrava, e pensando em seu lado egoísta, tentou ajudá-lo enquanto ajudava a si mesmo. Ele estava seguro que conseguiria alcançar seu intento e fazê-lo se animar, mas também queria que ele o notasse, mesmo que só por um instante.

Estarem juntos agora fazia um calor gostoso subir por seu peito…

– Kirishima-san! – já era a terceira vez que o rapaz chamava por seu nome, dessa vez conseguindo tirá-lo de seus pensamentos.

– Ah, desculpe. Estava distraído. – sorriu amável para seu assistente, jogando suas preocupações para um canto afastado em sua mente, concentrando-se por fim nas tarefas que precisa cumprir naquele dia. Não podia deixar que seus problemas, mesmo que idiotas e paternais, interferissem no seu trabalho.

* * *

Após sua crise paternal no começo da semana, Kirishima também teve uma crise de meia-idade na outra semana, onde a própria filha apontou-lhe pequenas rugas no canto dos olhos e um outro editor brincou dizendo que nem mesmo o seu bom humor o livrara de cabelos brancos. Ao chegar ao fim do mês, percebeu-se acometido da terceira crise, e talvez a pior de todas: o abandono.

Já fazia vários dias, se não mais de uma semana, que não via e nem recebia boas notícias de Yokozawa. Quando foi procurá-lo dias atrás, seu assistente, Henmi, havia informado que ele acabara de sair correndo para verificar algumas edições que precisariam ser reimpressas com urgência devido a um erro no arquivo original. Esse pequeno incidente da equipe de impressão obrigou Yokozawa e toda sua equipe a fazerem hora extra a semana toda.

Kirishima entendia que o trabalho era importante e Yokozawa gostava muito do que fazia, mas ele podia ter mandado uma mensagem avisando sobre o problema que tiveram, afinal de contas, ele era seu editor-chefe, não era?

A quem queria enganar? Aquele tipo de situação não era isolada ou merecia atenção desnecessária. Yokozawa era capaz de resolver sozinho, sem ter que incomodar o seu superior. Só que ele queria ser incomodado! Não para falar de serviço, mas sentia sua falta.

Outro final de semana chegou e Kirishima não estava feliz com as perspectivas. Hiyori havia avisado alguns dias antes que ia dormir na casa de uma amiga e, se a mãe da coleguinha não se importasse, voltaria apenas no começo da semana. Ele não queria se preocupar, sabia que ela era uma boa menina e nunca faria nada de errado, mas todo aquele tempo que passava fora de casa, deixando-a sozinha, o fazia imaginar se agora ela não saia justamente para continuar a não tê-lo por perto. Era um pensamento idiota, mas que o atormentava muito ultimamente.

– Quer que eu te leve até a casa da sua amiga? – Kirishima ofereceu carona enquanto a filha lhe servia o jantar, notando que ela deixara uma mochila com suas roupas separadas em outra cadeira.

– Não precisa, papa. Elas virão me buscar. – Hiyo comentou animada, contando alguns dos planos que elas haviam feito para se divertirem, deixando-o mais desanimado ainda. Ele nem sabia quando a filha passara a gostar de certas coisas que ela comentava, como músicas ou filmes. Sentia que pouco a pouco ia perdendo sua garotinha para o mundo e não podia fazer nada para impedir.

Pouco tempo depois a campanhia tocou e Hiyori saiu correndo animada para atender, levando consigo a mochila e depositando um beijo rápido na bochecha do pai, pedindo para ele se cuidar.

E pensar que até pouco tempo atrás era ele quem dava essas recomendações...

Afastou aqueles pensamentos, pegando a louça suja que ficara na mesa e levando até a pia para lavar. Não havia como evitar aqueles acontecimentos. Precisava aceitar que sua menininha agora era quase uma mulher e-

Não! Não importava o que acontecesse ou quanto tempo passasse, pois ela continuaria sendo sua pequena e gentil Hiyo-chan.

Ouviu um movimento na sala e pensou que a garota tivesse voltado para pegar algo que esquecera. Enxugou as mãos no avental, caminhando até lá para ajudá-la. Qualquer segundo que tivesse para ficar perto da filha deveria ser bem aproveitado.

– Esqueceu algo, Hi- – mas não era Hiyori quem estava parada próxima à porta, retirando os sapatos.

– Boa noite, Kirishima. – Yokozawa cumprimentou em tom baixo e cansado, entrando no apartamento enquanto desabotoava o casaco.

– Olha só quem resolveu aparecer! Lembrou que temos uma relação? – Kirishima apoiou-se no batente da cozinha de braços cruzados, recebendo-o com um sorriso zombeteiro.

– Não seja idiota, falando essas coisas! Sabe que ando ocupado. Está uma loucura na sessão de vendas. – Yokozawa retrucou contrariado, ignorando tom de brincadeira que Zen usara. Não estava com paciência para lidar com aquilo.

– Eu sei disso, mas podia ter me avisado. – Kirishima acabou por fazer um biquinho manhoso, mesmo sabendo que seria inútil. Não era assim tão fácil comover Yokozawa.

– Você é o editor-chefe. É óbvio que sabia de tudo que estava acontecendo. Não preciso te informar tudo que acontece na editora. – passou por Kirishima sem olhá-lo uma segunda vez, caminhando até a sala, onde sabia que Sorata estaria dormindo.

Ajoelhou-se em frente à pequena cama do gato, acariciando-lhe o pêlo algumas vezes, recebendo um ronronado de aprovação em resposta. Estava com saudades de Sorata e como estava numa época agitada na editora, onde só voltava para casa para dormir, teve que recorrer à ajuda de Hiyori para fazer companhia ao gato.

Claro que também estava com saudades do namorado, mas Kirishima não precisava saber disso. Ele sempre foi auto-suficiente, confiante e forte, não precisava de mais um elogio para se gabar.

– Sente mais falta desse gato do que de mim? – o editor-chefe havia seguido Yokozawa até a sala, observando enquanto ele baixava a guarda, sorrindo para o pequeno animal.

– Ainda tem dúvidas quanto a isso? – Yokozawa agradeceu ao fato de estar de costas e não encarando aqueles olhos castanhos que lhe faziam perder a compostura. Se tivesse que encará-lo, qualquer comentário que surgisse o faria corar.

Yokozawa acariciou o gato mais algumas vezes antes de se levantar, caminhando até a estante da sala, pegando uma pasta ao lado da televisão e conferindo se os papéis que procurava estavam realmente ali.

– Hmm… então foi aqui que deixei... - Yokozawa passou a mão pelos cabelos curtos e escuros, afastando-os do rosto com um longo suspiro. Se tivesse levado a pasta consigo para a editora, não teria que fazer aquele desvio – Só vim atrás disso. Preciso voltar.

– Voltar? Não vai passar a noite aqui? – dessa vez Kirishima foi pego desprevenido, encarando o namorado com incredulidade.

Ele sabia que Yokozawa não era bom em demonstrar seus sentimentos, sempre tentando se esconder atrás da máscara de um homem frio e inflexível, às vezes sendo exigente demais com seus subordinados, mas com a convivência aprendeu a notar pequenos gestos e sinais que indicavam quando Yokozawa realmente se sentia incomodado ou quando ele só estava se fazendo de durão, mas querendo dizer o contrário.

E naquele instante, com aquela afirmação que iria sair, Kirishima teve dúvidas se realmente conhecia aquele homem. Takafumi não hesitou um instante sequer e nem chegou a corar ou gaguejar.

– Ainda preciso revisar esses papéis e se eu ficar aqui, você vai me atrapalhar. – desviou o olhar de Kirishima, fingindo que lia algo naqueles documentos. Se ele insistisse um pouco mais iria ceder. E só ele sabia o quanto queria ceder àquele homem. Sentia tanta falta de tê-lo por perto…

– Entendo… bom, tome cuidado na volta. – e estendeu um embrulho em saco de papel, que continha alguns onigiris que sobraram do jantar. Sabia que com toda aquela correria Yokozawa se esqueceria de comer direito.

– Pare de me tratar como criança. Eu sei me cuidar! – ralhou envergonhado, pegando o pacote e voltando para a entrada do apartamento, calçando novamente seus sapatos.

Aquela atitude de Kirishima havia sido estranha. Ele não se importou que viesse ali apenas para pegar os papéis e não insistiu novamente para que ficasse, muito menos tentou agarrá-lo, como já acontecera diversas vezes. O editor-chefe era um humano, afinal de contas, também tinha suas responsabilidades na editora e devia estar cansado. E foi graças a esses pensamentos que Yokozawa conseguiu ir embora sem se preocupar, pois se tivesse observado-o com mais atenção, notaria o olhar perdido que o homem exibia.

Vendo-se sozinho no apartamento, Kirishima se permitiu sentar encolhido no sofá, com as pernas em cima do estofado, abraçando-as pelo joelho.

Era assim que Takafumi se sentia antes de se envolverem? Sozinho no seu apartamento, enquanto pensava em Takano, seu amor não correspondido?

Pelo menos Zen sabia que era correspondido, mesmo que nunca houvesse escutado as tão almejadas palavras saindo da boca do namorado. Ele sabia pelo olhar, pelas atitudes, pelo seu rosto corado…

E ali, sozinho em seu apartamento, Kirishima se perguntou se aqueles sinais realmente queriam dizer algo. Se Yokozawa soubesse o quanto o amava…

– Acho que somos só nos dois hoje, Sorata… – acaricou o gato que, compadecido de seu estado, subiu no sofá e se deitou ao seu lado.

* * *

Finalmente aquela semana horrível havia passado, todos os problemas foram resolvidos e Yokozawa finalmente poderia voltar para casa. Não o seu apartamento exatamente, mas o de Kirishima. Estava com saudades de Hiyori e de Sorata. A garota havia lhe mandado várias mensagens nos últimos dias, perguntando quando voltaria para casa e dizendo que queria sua ajuda na cozinha para tentar um prato novo, já que o pai era desajeitado demais para isso. E, é claro, estava com saudades do pai da garota também, por mais que negasse até seu último fio de cabelo.

Foram poucas as vezes que encontrara Kirishima pelos corredores depois daquela visita em seu apartamento. Ele ainda parecia estranho e um pouco distante, mas como tinha outros problemas para resolver, não pode dar a atenção necessária. Por outro lado, se Yokozawa mostrasse que se importava, iria ver aquele sorriso zombeteiro na face do namorado, jogando em sua cara o quanto ele era frágil e fofo.

Só de pensar nessas palavras ele sentia seu sangue ferver.

E pensar que avançaram para o nível de namorados... Aquilo era um absurdo! Zen apareceu com essa ideia de um relacionamento sério porque a filha andava muito curiosa, perguntando coisas demais e ele não queria esconder nada dela e, ao mesmo tempo, não podia dar uma resposta pra garota sem antes receber dele uma confirmação sobre o que tinham. Naquele instante seu coração palpitou e sentiu seu rosto esquentar, tendo a certeza que estava corado. Já ia desviar o olhar de Kirishima, quando notou que daquela vez ele não estava rindo de si. Ele realmente estava falando sério! Lutou contra seus próprios instintos, que gritavam para se afastar de toda aquela loucura, mas acabou resmungando uma afirmativa, usando a desculpa que não queria deixar a garota confusa.

Yokozawa balançou a cabeça, afastando aqueles pensamentos de sua mente. Eram boas memórias, mas não gostava de parecer uma adolescente.

Caminhou com passos decididos pelo corredor até chegar ao elevador, entrando na caixa metálica e se dirigindo ao quinto andar. Era raro Yokozawa subir até lá, normalmente só seguia até ali quando precisava gritar com o editor-chefe ou quando tinham uma reunião importante, mas naquele dia, com uma coragem que não sabia de onde vinha, ele quis tomar a iniciativa de chamá-lo para irem embora para casa juntos.

Só não contava encontrar com Takano naquele mesmo andar, que bloqueava sua saída do elevador.

– Ah, Yokozawa. – Takano o cumprimentou com um pequeno sorriso, dando-lhe espaço para sair do elevador.

– Como vai, Masamune?

Diferente do que acontecia há um tempo atrás, agora Yokozawa conseguia cumprimentá-lo normalmente, sem gaguejar, tremer ou se sentir corar. Tudo graças à Kirishima. Se não fossem as brincadeiras do atual namorado e o seu apoio, mesmo que um pouco distorcido para fazê-lo notar o mal que estava se causando, talvez ainda estivesse afogando naquele amor platônico. Takano nunca olharia para ele como algo além de um amigo. E, se antes se lamentava, hoje agradecia por não ter dado certo, pois agora tinha Kirishima ao seu lado.

Conversaram por mais algum tempo, sobre a editora e os novos lançamentos, mas também falaram de assuntos mais pessoais, Masamune perguntou como ia Sorata, o gato que dera para Yokozawa quando não podia mais cuidar dele e que agora estava com Hiyo e, apenas por educação, Takafumi perguntou como estava Onodera.

Alguém esbarrou com força em Yokozawa enquanto passava por eles pelo corredor e, não ouvindo nenhum pedido de desculpas, o responsável pela área de vendas se virou para ver quem quase o derrubara, arregalando os olhos ao ver Kirishima entrar no elevador poucos segundos antes das portas se fecharem.

Inventou uma desculpa qualquer para se afastar de Takano, ignorando o elevador pois sabia que ele demoraria a voltar para aquele andar, descendo rapidamente as escadas, às vezes pulando dois degraus de uma vez. O que aquele editor idiota estava pensando? Passar por si, como se nem o conhecesse?

Chegou ao térreo quase sem forças, apoiando as mãos nos joelhos enquanto tentava fazer a respiração voltar ao normal. Olhou ao redor, procurando algum sinal de Kirishima, mas não o viu em lugar nenhum. Correu até a recepção de entrada, perguntando se haviam visto o editor-chefe passando por ali, sendo informado que ele saíra para a rua há poucos minutos.

Yokozawa pegou o caminho tão conhecido e que sabia levar à estação que Kirishima usava para ir pra casa, sacando o celular no percurso e discando para o namorado, colocando o aparelho no ouvido, que chamou diversas vezes até cair na caixa postal.

Por que ele estava ignorando sua ligação?

Quando chegou à estação, o trem já havia saído e Yokozawa se deu por vencido, desistindo de correr atrás do namorado. Poderia falar com ele em casa e com mais calma.

* * *

– Onii-chan! Bem-vindo de volta! – Hiyo cumprimentou Yokozawa toda animada, segurando sua pasta enquanto ele retirava os sapatos.

– Seu pai já chegou? – perguntou sem rodeios, fazendo um cafuné na garota enquanto adentrava o apartamento, sendo recebido a seguir pro Sorata, que se esfregava em suas pernas.

– Chegou sim. Está na varanda, tomando uma cerveja.

Takafumi abaixou-se por um instante, dando um pouco de atenção ao gato antes de se virar novamente para a garota, pensando se iria falar com o pai dela agora ou se esperava até que ele o procurasse. Nunca havia visto Kirishima daquele jeito, e isso mostrava que ainda precisavam se conhecer melhor. Quando ia perguntar a garota se o pai comentara algo, ela o encarou fixamente, como se tivesse receio de algo.

– Onii-chan… sabe se aconteceu algo com o papa? – Hiyori perguntou baixinho, apertando a pasta de Yokozawa contra o peito – Ele anda estranho…

– Bom… não sei realmente… – suspirou cansado, olhando de relance para a entrada da sacada – Ele passou direto por mim hoje. Devo ter feito algo que ele não gostou… – Yokozawa resmungou a última parte, tentando se recordar de algo que pudesse ter magoado o namorado, mas não conseguiu pensar em nada.

– Não, onii-chan. Isso não é de hoje. Ele está estranho já faz mais de uma semana. – confessou a garota em tom preocupado – Eu tentei falar com o papa, mas ele está distante também…

Pensar que tinha feito algo errado deixou Yokozawa preocupado, mas ouvir da garota que ele estava assim há vários dias o deixou em alerta. Ele não havia notado nada de diferente e não havia mesmo como perceber, já que passara a última semana afundado em trabalho e horas extras. O que teria acontecido com o editor-chefe?

– Eu vou falar com ele, então pare de se preocupar. – acariciou novamente os cabelos da garota, tentando acalmá-la um pouco – Que tal preparar um jantar bem gostoso? Isso pode deixá-lo feliz, não acha?

– Certo! Vou fazer o melhor prato que eu puder! – e com uma nova animação, Hiyori saiu decidida de casa, pensando no que comprar para preparar pro jantar, pois devia ser algo que o paii gostasse muito e sabia também que precisava dar privacidade aos dois enquanto conversavam.

Takafumi afrouxou a gravata enquanto se dirigia até a sacada, olhando para Kirishima do batente da porta por um instante e depois se aproximando, parando ao seu lado, olhando para a rua e os outros prédios a frente.

Não era bom naquilo. Não sabia demonstrar o que sentia. Era difícil dizer que estava preocupado sem se sentir fraco. Por outro lado, era Kirishima ao seu lado. Ele não o julgaria como um fraco ou tolo. Conhecia seus limites e podia dizer com toda a certeza que o conhecia muito bem. Podia fazer alguma brincadeira idiota depois para vê-lo irritado, mas nunca para magoá-lo de verdade.

– Você está bem? – Yokozawa perguntou por fim, sem pensar em mais nada que pudesse lhe dizer.

– Não pareço bem pra você? – veio a resposta irônica do mais velho, que não se dignou a olhá-lo, tomando mais um gole de sua cerveja.

Takafumi notou que havia abordado da forma errada.

– Hiyori também está preocupada com você.

Dessa vez, Zen ficou em silêncio, pois sabia que não havia como esconder nada da própria filha. Ela estava sempre por perto e notava qualquer pequena mudança em seu humor, mesmo que não lhe falasse diretamente. Ela comentava com a avó, que sempre lhe sugeria não se intrometer nos assuntos dos adultos e assim a pequena fazia.

– Por que me ignorou mais cedo? – Yokozawa nunca o abordaria tão diretamente numa situação normal, ainda mais sem corar ou gaguejar, mas depois de saber pela filha de Kirishima que ele estava estranho há algum tempo, sua preocupação mandou a timidez para algum canto de sua mente.

– Você estava em boa companhia. Não queria atrapalhar sua conversa. – comentou com descaso, tomando mais um gole da sua bebida.

– Pensei que você seria o primeiro a me tirar de perto do Masamune.

E mesmo que não confessasse em voz alta, sabendo que morreria de vergonha depois, Takafumi queria ver o namorado a defendê-lo ou puxando-o para si, para mostrar que era ele era a pessoa que o fazia feliz.

Se não agiu assim, poderia ser por pensar que Yokozawa ainda sentia algo por Takano e não seria de todo mentira. Como repetiam bastante por aí, o primeiro amor a gente nunca esquece. Porém, Takafumi havia esquecido. Não do outro homem como um amigo e dos bons momentos que tiveram juntos, mas do sentimento forte que nutriu por anos e anos sem ser correspondido. O único que ocupava seus pensamentos agora era Kirishima.

Takafumi sabia que precisava deixar isso claro de alguma forma.

– Por que eu faria isso se você estava feliz?

– De onde tira essas ideias estúpidas?! – levantou um pouco a voz, se aproximando mais de Kirishima, que apenas o olhou de canto. Aquele desprezo estava tirando Yokozawa do sério, bem mais do que se estivesse ouvindo alguma piadinha típica do namorado – Eu fui até lá chamá-lo para virmos embora juntos!

– Você queria minha companhia para vir embora? – dessa vez Kirishima o encarou nos olhos, mais incrédulo do que surpreso pela afirmação.

Eles nunca iam embora juntos, e por culpa de Yokozawa, que morria de vergonha de serem vistos saindo da editora. Sempre um deles saía na frente e esperava o outro em algum local marcado com antecedência. O responsável pela área de vendas era capaz de pedir para morrer se alguém ao menos desconfiasse que eles tinham um caso.

– … – sabia que devia assumir que queria sim a companhia do namorado, mas era difícil pronunciar em voz alta. Kirishima não podia simplesmente adivinhar seus pensamentos e vontades como sempre fazia?

– Às vezes acho que você estaria melhor se estivesse com Takano… – o editor-chefe suspirou longamente, terminando sua bebida, murmurando a última parte mais para si do que para Yokozawa – Parece tão mais a vontade com ele, sorrindo e conversando normalmente…

– Que merda está dizendo? – Takafumi se aproximou, puxando-o pela gola da camisa, fazendo-o encarar de frente.

– Vê? É disso que estou falando! – Kirishima afastou-o de si, dando alguns passos para trás – Sempre me responde gritando ou contrariado! Acho que nunca mantemos uma conversa calma, só entre nós dois!

– E onde Masamune entra nisso? Você sabe que ele me vê só como um amigo! – Yokozawa revirou os olhos, furioso demais para notar que Zen também estava perdendo o controle.

Podiam nunca ter mantido uma conversa sensata, sem que Takafumi tenha corado com alguma atitude do namorado, mas também nunca haviam discutido daquela forma. As brigas eram sempre por coisas bobas e simples, e rapidamente se resolviam.

– Se dependesse de você, não seriam só amigos! É óbvio que você quer algo mais com ele!

– Sim, eu já quis e você sabe disso melhor do que ninguém. Mas se ainda quisesse alguma coisa com ele, não estaria hoje com você! – Takafumi sentiu o rosto esquentar, mas ignorou completamente a vontade de desviar o olhar e se esconder.

– Você continua vindo aqui apenas por causa do seu gato e da Hiyori. Aceita minha companhia apenas porque tem medo de ficar sozinho!

Dessa vez Zen havia ultrapassado os limites. Como ele podia sugerir aquilo? Takafumi avançou para cima dele com o punho fechado, mesmo sabendo que o outro era mais forte e mais ágil. E como o esperado, Kirishima conseguiu desviar, segurando-o pelo pulso acima da cabeça.

– Seu… Acha que sou tão fútil assim? – Yokozawa rosnou baixo, a raiva crescendo dentro de si, mais e mais, enquanto se debatia e tentava se soltar – Como se eu precisasse mendigar pra ganhar um pouco de atenção?! Acha mesmo que continuo vindo aqui todos os dias por medo de ficar sozinho?

– E não é? – Zen finalmente o soltou, um sombra de tristeza atravessando seu olhar.

Antes, Yokozawa só o acompanhava por medo das ameaças com relação a algumas fotos sugestivas que Zen dizia ter e que, no final, se provaram não existir realmente. Não uma foto dele nu ou que realmente o envergonhasse. E mesmo depois de descobrir a verdade, mesmo depois de concordar em terem um relacionamento, para Kirishima, parecia que tudo era forçado demais e que ele nunca conseguia fazer Yokozawa feliz. Ele sempre se continha na sua frente, não era espontâneo e raramente lhe sorria… E o sorriso que ele viu sendo dirigido a Takano… Por que não poderia ser pra ele?

– Não… não é… – Yokozawa afastou-se do namorado, dando-lhe as costas e saindo da varanda, mas parando seu percurso antes de voltar para dentro do apartamento, murmurando baixinho para que só Kirishima o ouvisse, e quando não obteve nenhuma reação, Yokozawa apenas soltou um suspiro, saindo dali o mais rápido que pode.

Ele definitivamente não era bom em demonstrar o que sentia e quando tentava mostrar, não recebia a resposta que queria em troca. Foi assim com Takano anos atrás e agora, com Kirishima. Ele não parecia ter entendido o que quis dizer... ou não foi claro o suficiente… ou ele só não acreditou. Era de se esperar, afinal nunca havia dito com todas as letras o que sentia pelo editor-chefe.

Pegou sua pasta na mesa da sala, seguindo até a entrada do apartamento para calçar seus sapatos, sendo prensado contra a porta antes mesmo de conseguir abri-la.

– O que pensa que está fazendo? - Yokozawa tentou se soltar, mas Kirishima não se moveu um centímetro sequer.

– Diga novamente. - sussurrou em tom grave contra seu ouvido, a respiração quente batendo no pescoço de Yokozawa, causando-lhe arrepios – Eu só preciso ouvir mais uma vez.

– Do q-que está falando? – o rosto de Yokozawa corou fortemente e ele desviou o olhar para o chão, temendo se desconcertar mais diante do olhar do editor-chefe. Ele sabia do que se tratava.

Infelizmente não pode desviar seu olhar por muito tempo, pois Kirishima o virou de frente para si, ainda mantendo-o contra a parede, prendendo-o com seu corpo, enquanto uma das mãos o segurava pelo queixo e a outra servia de apoio ao lado de sua cabeça.

– Você sabe que eu tenho ciúmes e não quero que ninguém, além de mim, toque em você. E eu sei que você também gosta assim. Por mais que negue, eu sei o que você quer. – Kirishima aproximou-se mais, roçando seus lábios de leve contra os de Yokozawa – Mas eu preciso ouvir o que você disse. Repita.

Aquele pedido soou como uma ordem e fez o baixo-ventre de Yokozawa formigar. Como se não bastasse o olhar de Kirishima para excitá-lo, agora tinha também o seu toque, o corpo dele contra o seu e para finalizar a sua voz, rouca e baixa, quase fazendo-o gemer.

– E-eu… eu disse que não vinha aqui só pela Hiyo-

– Não! – interrompeu-o Kirishima, mordendo-lhe o lábio inferior – A última parte. Repita a última parte.

Yokozawa respirou fundo, fechando os olhos diante aquela provocação, apoiando as mãos contra o peito de Zen, tentando afastá-lo e ao mesmo tempo puxá-lo mais para si, como se ele o sufocasse, mas também lhe fizesse falta. Eram sentimentos tão contraditórios… Não sabia se conseguiria mais viver sem aquele homem.

Kirishima levou um tempo para reagir com a saída de Takafumi da varanda, pois não havia acreditado em seus ouvidos. Em todos os anos que estavam juntos, nunca ouvira palavras tão sinceras saindo dos lábios do editor de vendas. Ele sabia que fora um momento raro e que Takafumi não diria aquilo novamente por vontade própria, mas ele precisava confirmar. Ficaria imensamente feliz se apenas pudesse ouvir mais uma vez.

– Vamos… diga de novo… por mim… – todas as preocupações que o incomodaram nas últimas semanas, o medo de perder a filha, de não ser correspondido, todo o drama com a sua idade, tudo fora dissipado naquele instante. E sabia que sua alegria e jovialidade retornariam quando Yokozawa atendesse seu pedido – Diga…

– Amo você…

A seguir os lábios de Yokozawa foram tomados num beijo sedento, enquanto as mãos de Kirishima se apoiavam em sua cintura, apertando e expondo a pele aos poucos, jogando a pasta que estava contra o seu peito no chão, desabotoando-lhe a camisa quando teve o acesso livre.

Yokozawa tentava conter os gemidos, mas já havia notado que era impossível. Não com Zen tocando cada parte sensível de seu corpo, marcando-o com dedos ágeis e lábios famintos, apertando, mordendo e sugando a pele clara.

Em pouco instantes Yokozawa foi conduzido para o quarto, sendo jogado na cama enquanto a porta era fechada com um baque. Kirishima deixava para fora todas as preocupações e crises, pronto para recomeçar, deixando de lado todas as suas incertezas, principalmente quando se tratava do homem que amava.


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Notas finais do capítulo

FIM ♥



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