Desalmados escrita por Pedro Couto


Capítulo 2
Capítulo 2




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O sol mal aparecera mas para Cortez aquele era o dia. Aquele seria o dia em que ele se tornaria uma lenda no colégio, virando o namorado de Daniele. Enfim ele ia declarar-se para sua amada, falar tudo que sentia.

Cortez levantou-se com os olhos mais abertos que o normal, estava mais desperto que qualquer outro dia de sua vida, ainda mais sendo uma segunda-feira. A mente de Cortez estava alerta a cada detalhe, ele morava num apartamento com seus pais no décimo quinto andar do condomínio chamado "Spazio de Verona".

Foi direto para o chuveiro de seu quarto, uma suíte bem decorada e organizada. As paredes brancas, o armário de seis portas cinza e preto ficava ao lado da janela de Cortez, que dava vista a grande parte da cidade que ele morava. Daniele morava logo abaixo dele, no 14° andar, de onde Cortez estava era possível ver seu colégio. Sua cama ficava encostada na parede oposta a da janela e ficava ao lado de um grande móvel que tomava todo o resto da parede, uma espécie de escrivaninha, porém, com um espaço deste móvel feito para acomodar um computador desktop, no qual Cortez possuía um das mais novas gerações. Sua televisão era enorme, de 42 polegadas e ficava ao lado da porta que direcionava-se ao banheiro. Ao lado desta porta ficava a porta de entrada do quarto. Em baixo da sua televisão, acoplada a parede, ficava uma mesa de madeira maciça pintada de branco com as pernas da mesa, juntas tornando-se apenas duas, pintadas com uma madeira diferente que possuía uma textura de madeira bege, ela servia de suporte para seu Xbox 360 preto, seu DVD, e possuía uma pequena estante onde guardava separados os jogos e os filmes. Ao lado de sua cama existia um tapete grande preto e branco que cobria todo o espaço da cama até o guarda roupas.

O seu banho foi rápido. Vestiu-se rápido, arrumou suas coisas as pressas e bebeu o suco de laranja que tanto adorava feito pela sua mãe, com a maior pressa. Cortez costumava acordar cedo, as 5h30min para começar a aprontar-se para o colégio e ficava pronto as 6h30min, mas, dessa vez ele conseguiu quebrar seus recordes em tempo de preparo e ficou pronto as 6h15min. Seus pais, Anderson e Izabela mal haviam colocado seus uniformes quando Cortez os chamou impaciente.

– Vamos, pai!
– Calma, rapaz! Acabei de acordar e você já está todo arrumado?! - Anderson colocava sua camisa de botões branca com a logo-marca da empresa que trabalhava. Ao vesti-la, sentou-se na cama e começou a calçar seus sapatos. - Já escovou os dentes?
– Já, pai. - respondeu.
– Tomou o café da manhã?
– Sim.
– Pegou a autorização e o dinheiro da sua excursão?
– Já, pai! - respondeu revirando os olhos.
– Tudo bem. Me deixe apenas tomar café que já o levo para a escola.
– Certo... - Cortez saiu e foi em direção a sala de estar, caiu deitado no sofá vermelho e ligou a TV.

Os minutos pareciam ser horas perturbadores enquanto seu pai tomava seu café e lia o jornal. Então seu pai levantou-se, pegou seu paletó preto e foi até a porta, destrancando-a e chamando seu filho. Cortez levantou-se num pulo enquanto desligava a televisão, correndo até a porta e esquecendo de algo importante. Quando ia fechar a porta, sua mãe colocou a mão sobre a porta e o fez relembrar o que havia esquecido de fazer. Cortez abraçou sua mãe com força, levantando-a do chão e deu um beijo em sua bochecha. Em retribuição, sua mãe beijou-lhe carinhosamente a testa e os dois despediram-se.

– Boa aula, filho.
– Será, mãe! - disse sorridente.

O caminho até o colégio fora rápido, por terem saído mais cedo o trânsito estava menos caótico como de costume e sua chegada na sala de aula foi uma surpresa para algumas garotas que nunca imaginaram que um menino conseguisse chegar tão cedo na aula. De certa forma aquilo era verdade, mas, não hoje. Cortez entrou, fechou a porta azul de sua sala que estava muito mais quente do que de costume, pois o zelador havia ligado o condicionador de ar a poucos minutos, escolheu a cadeira ao lado da que Daniele sempre se sentava, uma das últimas cadeiras da terceira fileira, e retirou de sua mochila seu celular, pegou seus fones de ouvido e escolheu um dos álbuns de sua banda favorita, System of a Down. As músicas iam passando e cada vez mais pessoas começavam a chegar, mas, nada de Daniele. Cortez não sabia ao certo que horas Daniele chegava, pois ela sempre estava lá quando ele chegava.

O álbum de músicas acabou e sem mais vontade de ouvir músicas, apenas guardou seu celular e seus fones no mesmo lugar de sempre. Cruzou os braços e apenas ficou observando seus colegas conversarem enquanto a primeira aula não começava. Um deles era Túlio, rodeado de garotas que adoravam conversar consigo. Era como se ele fosse o homem mais divertido do mundo, as garotas todas sentadas ao seu redor riam de quase tudo que ele falava e confirmavam o que ele dizia enquanto riam.

Enquanto olhava para o seu relógio que já marcava 6h58min, a porta abriu-se e o professor de biologia entrou na sala. Seu jaleco verde era parte do uniforme dos professores, apesar de ser um acessório que era apenas opcional. Cortez sentiu um aperto no peito, sabia que quando o professor entrava não havia mais ninguém que pudesse entrar a não ser que tivesse bons motivos para chegar atrasado, mas, logo Daniele entrou. Ela acompanhava o professor e os dois conversavam enquanto caminhavam. Ela fechou a porta e o professor, Renan, continuou sua caminhada até sua mesa. Daniele olhou de relance o lugar que sentaria, apenas para confirmar que estava vago e viu ao redor as várias mochilas que sempre estiveram por lá, mas, desta vez uma das mochilas estava diferente e alguém estranho, porém, conhecido estava lá. Daniele não falava com Cortez havia muito tempo. Quando se falavam apenas trocavam cumprimentos rápidos, mas, depois da 8° série, quando Daniele ganhou novas amigas, eles nunca mais conversaram, não como antes.

Ela gostava de Cortez da mesma forma que Cortez gostava dela, eram dois apaixonados, mas, que mantinham seus sentimentos escondidos um do outro a muito tempo. Daniele sentou-se no seu lugar, percebendo certo nervosismo nos olhos de Cortez, ela tentou ignorá-lo e apenas o cumprimentou.

A aula começou e Cortez aguardava a hora exata para contar para ela tudo que sentia, o intervalo; ele chegaria apenas as nove horas, mas, ele precisava aguardar esse tempo. Renan ensinou um assunto que felizmente Cortez já conhecia, por ter estudado em outros estados ele havia estudado um conteúdo mais avançado do que o de seu colégio e por isso já estava adiantado. Ficou calculando a aula inteira como pediria que ela fosse com ele a um lugar particular, como começaria a falar, como contaria a ela e principalmente: como agiria se ela retribuísse o sentimento. Foram tantas análises que o intervalo havia chegado e todos tinham saído, menos ele, Daniele e algumas de suas amigas mais íntimas que continuaram conversando com ela.

Os remanescentes da sala saíram quando uma das fiscais do colégio apareceu para trancar a porta da sala, aquele era o momento. Cortez foi o primeiro a sair, seu coração começou a palpitar cada vez mais rapidamente, estava suando frio e as pernas ficaram bambas. Ele aproximou-se de Daniele que continuava conversando com suas amigas e proferiu palavras que ele nunca iria esquecer:

– Daniele... - ela virou-se e suas amigas observaram o que se desenrolaria a partir dali. - Posso falar com você a sós? - ele engoliu em seco.
– Claro. - ela esperou um pouco antes de responder, mas, o fez com um belo sorriso estampado no rosto. Ela tinha esperanças de que aquele fosse o momento em que ele contaria tudo, mas, tinha receio de que realmente acontecesse. Um lado de sua alma queria aquilo mais do que tudo, mas, outra parte queria que aquilo não acontecesse.

Os dois foram para um lugar mais reservado, desconhecido por muita gente e sentaram-se. As amigas de Daniele tinham seguido-os motivadas pela curiosidade e ficaram escondidas a poucos metros de distância, o suficiente para ouvirem o que os dois conversavam.

– Eu tenho que te contar uma coisa... Algo que eu quero te contar faz muito tempo, mas, nunca criei coragem. - ele olhou em seus olhos e continuou. - Eu... Eu amo você, gosto de você a muito tempo. Lembra-se quando tínhamos 10 anos e eu te mandei um bilhete perguntando se você gostava de mim? - ele parou de falar e relutou um pouco em perguntar. - Você nunca me respondeu, acho que essa pode ser a hora certa para isso.

Ela não respondeu, apenas ficou olhando para ele estática. Ela sabia que queria dizer que o amava, mas, como um impulso ela o beijou. Os dois trocaram um beijo apaixonado, digno de um filme de romance. Abraçaram-se enquanto beijavam-se, seus olhos fecharam-se e eles imaginaram o que poderia ser a melhor época dos dois. As amigas de Daniele não conseguiam acreditar naquilo, o garoto mais estranho da turma, a única pessoa da turma que usava roupas pretas quase o tempo todo, aquele garoto estranho que era um mistério para qualquer garota ou garoto, agora beijava a menina mais linda e desejada da sala. Num impulso elas correram e com maldade em seus corações, foram em direção a qualquer pessoa de sua sala que encontrassem para espalhar o ocorrido.

O mundo parecia parado, o tempo parecia não existir mais, quando Cortez desgrudou seus lábios dos lábios carnudos, com sabor de maçã de Daniele. Ela estava mergulhada na mais potente confusão mental que já presenciara ocorrer consigo, não sabia o que dizer e apenas queria que Cortez tomasse uma outra iniciativa, mas, antes que ele pudesse fazer qualquer outra coisa, por motivos desconhecidos, Daniele levantou-se e saiu correndo dali, deixando Cortez sozinho. Ele foi mergulhado numa incerteza macabra, não sabendo se deveria continuar o que tinha começado ou parar, mas, antes de tomar qualquer decisão o sinal tocou e automaticamente ele se levantou e foi em direção a sua sala.

Enquanto andava as pessoas que já haviam tomado conhecimento do ocorrido cochichavam sobre ele, quase todos os olhares estavam direcionados para si, seu coração sentia que havia feito o certo, mas, a lógica o dizia que aquilo tinha sido um erro e logo todos ficariam sabendo. Aquele momento precedera os dias sombrio que ele viveria por muito tempo, até tornar-se uma pessoa insensível e irritante.

A porta de sua sala já estava aberta, escancarada. Ele colocou as mãos nos bolsos e lentamente foi em direção a sua mesa, Daniele estava sentada em seu lugar, mas, mesmo depois daquele beijo apaixonado Daniele o ignorou. Ele passou o resto daqueles minutos de espera quieto, apenas pensando no que tinha feito. Foi quando começaram as implicâncias... As pessoas começaram a perguntar-lhe várias vezes se ele era apaixonado por Daniele e, todas as vezes ele negou, mas, aquilo não iria adiantar já que eles já sabiam de tudo que acontecera. Quando uma das melhores amigas de Daniele veio perguntar-lhe essa mesma coisa, ele tomou finalmente a conclusão de que seus colegas já sabiam de tudo. Por fraqueza e descuido ele disse sim para a pergunta.

Antes que o professor chegasse, um dos garotos mais irritantes da sala foi a frente das mesas e cadeiras e chamou a atenção de todos. Cortez sabia o que aquilo insinuava, pois sabia que ele já havia tomado conhecimento da fofoca. Ele motivou todos a o observarem atentamente, talvez fosse algo importante, mas, Cortez sabia qual o rumo que aquela conversa tomaria.

– Bom, hoje nós tivemos uma grande mudança nessa sala. - falou alto e confiante - Nós temos um novo casal, a Bela e a Fera! - dizendo isto, caiu em uma gargalhada que motivou a maioria a rir também. - Bom... - disse enxugando as lágrimas de seus olhos - Esse novo casal é o da nossa querida e linda Daniele com o desajeitado, estranho, patético e anormal: Cortez! - toda a sua "plateia" começou a gargalhar. Cortez sentiu-se estranho, desconfortável, mas, sabia que Daniele também deveria estar sentindo aquilo.

Aquela foi a primeira humilhação pública que Cortez sofreria, ao longo dos dias, semanas e meses as humilhações foram ficando piores, até chegarem a um ponto em que Cortez não ligava mais para elas. Daniele desistiu de sua felicidade junto a Cortez para não sofrer mais daquele bullyng constante, em público ela o humilhou também. Dizendo palavras que Cortez jamais esquecera, fazendo coisas que ele nunca se recuperaria, mas, que nunca diminuiriam o que ele sentia por Daniele.

Daquele dia em diante, Cortez não seria mais o mesmo. Tudo que ele já fez em sua vida, tudo aquilo mudou. Ele começou a tirar notas mais baixas, sua vida social ruiu pouco a pouco, sua mentalidade e aceitação das pessoas mudou. Aquele era um novo Cortez, um frio e ignorante Cortez.


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