Beyond the Vengeance escrita por Mello


Capítulo 3
Primeira Base


Notas iniciais do capítulo

Fala galera, mais um capítulo da fic.

Consegui mudar a capa pra uma melhor (finalmente consegui outro programa de edição que não seja o paint)
Cometem aí o que acharam.



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Naquela noite sonhei que estava caindo. Considerando todas as loucuras que vivi na noite passada acho que tive um sonho leve. Estava em um prédio alto com vista para o resto da cidade. Me aproximei da borda do edifício para olhar melhor, mas escorreguei e comecei a cair. De repente o prédio e a cidade inteira tinham sumido. Lá em baixo o acampamento meio-sangue se aproximava rápido. Olhei para o lado e vi a coruja da noite interior mergulhando junto comigo. Ela me olhava com a cabeça inclinada para o lado como se perguntasse “o que você está fazendo caindo aqui?”.

Acordei cedo. Apesar do sonho tinha dormido muito bem pra alguém que acabou de descobrir que a mãe é uma deusa superpoderosa, e que o fato de ser seu filho significa que eu vou passar o resto da minha vida sendo perseguido por monstros que querem me matar… ou devorar… ou matar e depois devorar… Nada como um pensamento positivo logo de manhã.

Levantei de minha cama com o máximo de cuidado para não acordar os outros nas camas de baixo. Pela primeira vez me dei conta de que se todos ali eram filhos de Atena então, tecnicamente, todos ali eram meus meios-irmãos. Tentei não pensar naquilo. Já tinha o bastante para passar o resto da vida pensando.

Me aprontei o mais rápido que pude afim de procurar Quíron. Tinha milhares de perguntas para fazer e ele tinha prometido respostas. Prendi a faca no cinto e passei a camisa do acampamento por cima para escondê-la. Me senti mais seguro com ela por perto. Quando estava saindo do chalé encontrei John que parecia estar me esperando.

— Bom dia — ele cumprimentou.

— Bom dia. Hum… você sabe onde Quíron está?

— Ele me disse para te mostrar melhor o acampamento e depois vamos encontrá-lo.

— Ah… tudo bem.

— Primeiro vou te levar ao refeitório. Aposto que está com fome.

Não estava com fome. Mais da metade do meu café da manhã foi para a fogueira como oferenda para Atena. De acordo com John aquilo era costume no acampamento. Esperava que Atena gostasse de bolo de cenoura com cobertura de chocolate. Por que não? Depois do refeitório John me levou para uma caminhada tranquila (e demorada) pelos campos de morangos. Ele falava sem parar sobre isso e aquilo do acampamento e como eu ia adorar a Caça a bandeira na floresta, mas tudo o que eu queria era ver Quíron. Depois de mais um pouco de enrolação. Ele disse que me levaria até ele, na Arena.

Fui correndo na frente, pois queria acabar logo com aquela caminhada. Quando entrei na arena fiquei impressionado com o que vi. De longe a arena parecia realmente grande, mas por dentro parecia muito maior. Havia vários campistas na arena, mesmo assim ela ainda parecia incrivelmente vazia. Cada campista desempenhava uma tarefa diferente: alguns treinavam contra outros campistas, outros treinavam acertando golpes em bonecos de palha e outros ainda lutavam contra um... Robô? Primeiro achei que fosse alguém que simplesmente estivesse mais aparamento que os outros, mas depois vi que era inteiro feito de bronze e estava equipado com elmo, armadura, espada e escudo, todos feitos de bronze. Estava tão impressionado com aquilo que nem percebi Quíron chegando.

― Aquilo é um autômato ― quase pulei de susto ― você ainda vai treinar com um desses algum dia.

Era estranho ver Quíron como centauro. Eu tinha visto uma única vez em sua forma humana na cadeira de rodas quando cheguei ao acampamento. Eu já sabia que ele era na verdade um centauro, mas ver ele daquele jeito ainda era meio perturbador. Resolvi me concentrar na parte de cima dele, e notei alguns detalhes que não tinha notado antes: ele estava vestindo a camiseta do acampamento e trazia nas mãos uma espada e um escudo de bronze.

― A propósito, você não deveria estar treinando? — ele disse levantando a sobrancelha num gesto sugestivo. Então é pra isso que ele me chamou aqui…

― É que eu acabei de chegar e… — não sei o que eu pretendia dizer à Quíron, mas pareceu menos constrangedor ficar quieto.

― Bom… — ele fez uma pausa — então você vai treinar comigo hoje.

No começo não entendi o conceito dele de "treinar". Quíron se posicionou na minha frente com o escudo e espada levantados, então caiu a ficha, eu estava prestes a lutar com ele. Um campista novato sem nenhuma experiência além do golpe de sorte de ter matado uma górgona, contra um centauro com centenas, milhares ou talvez até muito mais anos de experiência, treinador dos semideuses mais poderosos da história. Uma luta muito equilibrada.

― Tudo bem, eu vou pegar leve com você — é obvio que ele percebeu meu nervosismo, mas tentei parecer desinteressado com o máximo de dignidade que consegui juntar — Vá pegar as armas pra você naquela caixa — ele disse apontando.

Olhei dentro da caixa que estava abarrotada de espadas e escudos de bronze. Peguei uma espada com a mão direita e firmei o escudo na esquerda. Me posicionei na frente dele em postura defensiva, imitando a dele. Comecei atacando: corri em sua direção e desferi um golpe na direção de seu peito, mas ele bloqueou facilmente, tentei acertar o ombro esquerdo, mas ele parou o golpe com o escudo e contra-atacou com espada. Levantei meu escudo a tempo de bloquear o golpe, mas como já era esperado de alguém que nunca usou um escudo, não me firmei o bastante para receber o golpe e quase cai com o impacto, tive que dar três passos pra trás para recuperar o equilíbrio. Pude ver que Quíron reprimiu um sorriso.

Ataquei novamente, já preparado para um possível contra-ataque. Ataquei a barriga dessa vez, mas ele parou o golpe com espada. Tentei várias vezes, mas ele sempre bloqueava sem nenhuma dificuldade e contra-atacava quando eu me descuidava. Estava brincando comigo. Nenhum ataque funcionava. Ele já devia ter feito aquilo milhões de vezes e eu estava ficando cansado. Meus golpes já não tinham tanta intensidade como no começo. Precisava adotar outra estratégia.

Desferi outro golpe aleatório só pra que ele tivesse que se defender e não me atacasse, assim consegui tomar distância. Controlei minha respiração. Ele não podia saber que eu estava cansado senão me pressionaria para finalizar a batalha logo. Pensei um pouco. Ele tinha muita experiência naquele tipo de ataque e, provavelmente, em todos os tipos de ataques. Precisava fazer algo que ele nunca tinha visto antes. Ele ainda não tinha percebido a minha faca… E disse que ia pegar leve comigo… Talvez se…

― Já desistiu? ― sua voz interrompeu meus pensamentos, mas eu já tinha uma ideia.

― É claro que não! ― gritei irritado.

Avancei na direção do centauro, mas dei apenas três passos e joguei meu escudo com toda força em sua direção. O movimento sem dúvida o surpreendeu, mas não adiantou de nada, pois ele apenas deu um passo para lado enquanto o escudo batia no chão.

― Eu odeio essa coisa! É muito pesada! Prefiro lutar espada contra espada! ― Quíron sorriu com a minha exclamação repentina.

― Se é assim que você quer tudo bem, mas isso não vai ajudar em nada ― disse enquanto largava o escudo no chão.

A parte fácil do meu plano eu tinha conseguido, faltava a difícil.

Avancei o mais rápido que pude. Pouco antes de chegar perto puxei a espada para minha direita na altura do ombro e ao me aproximar desferi o golpe da direta para esquerda formando um arco horizontal com a ponta da minha espada e direcionando o ataque para o braço esquerdo de Quíron. Previsível até pra mim, pensei. Como esperado ele bloqueou. Eu continuei forçando a espada na sua direção, mas passei meu corpo para a sua esquerda. Quando minha espada deixou a espada dele eu já estava a sua esquerda, de frente para sua "parte cavalo". Ele tentou se esquivar provavelmente pensando que eu fosse atacar, mas fui mais rápido e com um salto passei minha perna direita envolta de suas costas de cavalo e montei em cima dele. Troquei a espada de mão. Mesmo de costas ele me atacou com sua espada, eu bloqueei o golpe com a minha e com a mão direita retirei a faca do cinto e coloquei a ponta da lâmina no pescoço do centauro. “Ganhei!” tive vontade de gritar. E bem a tempo. Estava exausto, Meus pulmões imploravam por oxigênio. Eu quase perdi o equilíbrio e caí no chão.

― Fique… parado ― disse entre as minhas buscas insaciáveis por ar.

― Quem disse que pode fazer isso? — Quíron disse perigosamente calmo.

― Ninguém disse que eu não posso.

Quíron começou a abaixar lentamente a sua espada até que a ponta ficasse próxima ao chão. Ótimo! Finalmente aceitou a derrota, pensei. Ou pelo menos foi isso que eu achei, pois quando eu menos esperava, ele, com um movimento rápido e de incrível precisão, posicionou a ponta de sua espada entre minha faca e seu pescoço e a afastou com força o que fez minha faca cair no chão (ok, eu realmente não esperava por essa). Assim que minha faca tocou o chão Quíron começou a se mover como cavalo selvagem tentando me tirar de cima dele. Peguei minha espada com a mão direita e segurei firme para que ela não caísse e teria usado ela contra o centauro se ele não estivesse desferindo golpes com sua espada e eu por um milagre conseguindo me defender. Quíron me sacudia pra um lado e pro outro tentando me derrubar enquanto atacava com a espada ao mesmo tempo. Como ele conseguia atacar até mesmo de costas pra mim? Me agarrei a ele o quanto pude, mas ele girou dando um coice no ar e me arremessou para o alto. Eu cai de costas no chão da arena e minha espada voou para longe. Mal tive tempo para levantar a cabeça e já senti a ponta afiada e fria de sua espada no meu pescoço. Olhei para minha espada com o canto do olho, estava longe demais pra eu pegar. Ele virou o jogo. Ele ganhou.

― Você é muito bom para um campista novato, mas jamais baixe a guarda antes da batalha acabar ― ele disse em um tom duro. Eu acho que ele não gostou nada de ser "montado".

Ele tirou a espada do meu pescoço e saiu trotando para fora da arena. Percebi que vários campistas estavam parados olhando pra mim e para Quíron saindo da arena. Em algum momento pararam o que estavam fazendo e assistiram a minha luta com o centauro. Ótimo. Provavelmente vou ser a nova piada do acampamento.

Uma menina da minha idade, loira e de olhos escuros pegou minha espada e começou a se aproximar de mim. Como eu ainda estava caído tentei me levantar, o que reanimou minha dor na parte de trás da cabeça, provocada pela minha queda. Quando fiquei em pé a menina já estava ao meu lado segurando a minha espada. Estava vestindo calças jeans com a camiseta do acampamento, seus cabelos ondulados caíam por cima dos ombros.

― Obrigado ― eu disse olhando para ela

― De nada ― ela disse me entregando a espada ― Você lutou muito bem contra Quíron.

― Bem? Eu perdi feio.

― Claro! Você não esperava ganhar dele assim tão fácil, esperava?

― Eu esperava me sair melhor.

― Está brincando? Você foi o melhor novato que já vi enfrentando Quíron superou até alguns campistas mais experientes.

― Você só esta falando isso para me animar.

― Mas você realmente foi muito bem. Bom, meu nome é Christy, e o seu?

― Terry.

― Quanto tempo faz desde que você chegou?

― Cheguei ontem.

― Ontem? E você já consegue lutar daquele jeito com a espada, muito bem!

― Não é só com a espada que ele leva jeito ― disse uma voz atrás de mim

Me virei e vi um garoto um pouco mais velho do que eu vindo em minha direção com minha faca e o escudo. Ele estava com a camiseta do acampamento como todo mundo, mas tinha puxado as mangas até seus ombros, tinha olhos escuros e cabelo meio arrepiado. E quando digo "meio arrepiado" é literalmente isso. O cabelo estava metade arrepiado e a outra metade estava penteada de um jeito esquisito.

― Ei, Greg, o seu cabelo… ― disse Christy.

Ele me entregou a faca e o escudo e voltou as mãos pros cabelos, mas ao invés de arrumar o cabelo arrepiado, ele arrepiou o lado com o penteado esquisito. O que ele fez pra ficar daquele jeito? Lutou contra um pente?

― Bom, como ela disse meu nome é Greg, filho de Hermes e ela é Christy, filha de Héstia. E você é…?

― Terry, filho de Atena.

― Filho de Atena? Não é a toa que leva jeito com espada. Da próxima vez que quiser treinar pode falar com a gente. Garanto que vai ser mais fácil que lutar contra Quíron.

― Obrigado.

― O que é isso? ― Christy disse apontando para meu braço direito.

Olhei para onde ela apontava e vi uma mancha vermelha na manga da camisa, segui a trilha de sangue e vi que o sangue já tinha escorrido até minha mão. Greg olhou para o corte que com tanta agitação nem eu tinha percebido.

― Não é grave, mas é melhor você fazer um curativo nisso. Vamos, eu te mostro onde é a enfermaria.

Me despedi de Christy e fui com Greg conhecer enfermaria.

Após ficar alguns minutos na enfermaria fazendo um pequeno curativo saí para caminhar sozinho, me despedindo de Greg. Me sentia mais a vontade conhecendo o acampamento do meu jeito. Passei pela parede de escalada, pela quadra de vôlei, pela casa grande, imaginando que poderia tirar algumas dúvidas com Quíron, mas ele não estava lá. Por fim fui até o lago e me sentei perto da água pensativo. Eu ainda usava a pulseira de prata. Aquilo já até parecia fazer parte do meu corpo, mas eu não fazia ideia do que era. Quer dizer eu sabia que era uma pulseira (obviamente), mas por algum motivo me parecia que aquilo não era apenas uma pulseira. Duvidava que Atena distribuísse joias para seus filhos. Olhei para os pingentes e segurei um entre o polegar e o indicador. Fiquei segurando o pingente e olhando para água do lago. Queria tentar achar uma forma de descobrir mais, mas minha mente parecia estar fazendo uma faxina e não queria ideias brilhantes por perto. Não percebi que estava puxando o pingente, mas quando percebi já era tarde demais. Senti o elo que prendia o pingente ceder e com a surpresa acabei soltando-o e ele caiu. Ouvi um barulho de algo caindo com um baque forte no chão, forte demais para um pequeno pingente. Ao olhar para o chão vi uma espada, aparentemente feita de aço com uma pequena corujinha prateada entalhada na ponta. Olhei espantado para a pulseira já sem o pingente de espada. Precisei de alguns segundos para absorver aquilo. Apanhei a espada com cuidado, como se ela fosse uma bomba que poderia explodir a qualquer momento. Ensaiei alguns golpes. A espada tinha o peso perfeito, nem pesada, nem leve demais. Perfeitamente balanceada. Os golpes com ela pareciam tão familiares que me assustei.

Estava muito feliz com minha nova espada, mas logo pensei se não havia um modo de torna-la novamente um pingente. Imaginei a espada como um pingente e a aproximei da pulseira. De repente eu estava mais uma vez segurando um pingente de prata. Olhei para os outros pingentes com um sorriso nos lábios.

Testei cada pingente. O segundo era uma adaga, sua lâmina era enegrecida e o cabo levemente dourado, porém fosco. O terceiro era uma lança de cabo negro e lâmina prateada, uma replica da lança de Atena, imaginei. O último pingente era uma pequena coruja de prata. Por algum motivo não quis puxá-la para testar, apenas a segurei encarando seus pequenos olhos de safira azuis. Quando já estava prestes a desistir vi seus olhos brilharem em um azul mais intenso. Ouvi um barulho vindo das árvores e avistei a coruja de sempre. Já era a terceira vez que a via. Dessa vez estendi o braço para que ela pousasse nele e foi exatamente o que ela fez. Eu a acariciei e ela bateu as asas agitada, mas não saiu do meu braço. A coruja me fitou com seus grandes olhos amarelos, balançando levemente suas orelhas pontudas.

— É bom te ver também — disse sorrindo — Você não tem um nome, tem? Que tal… Elie? — a coruja piou e se agitou em meu braço como se tivesse sido ofendida. Pensei um pouco — Então… Adam?

Ela inclinou a cabeça como se estivesse pensando no nome, mas depois voltou ao normal. Uma coruja macho, pensei. Ouvi outras corujas piarem pela floresta. Adam olhou na direção do som.

— São suas amigas? — perguntei.

Ele levantou voo e desapareceu atrás das árvores. Olhei para minha pulseira que, agora eu já sabia, era na verdade um conjunto de armas e uma amiga coruja de bônus, ou melhor, um amigo. Olhei para o céu e agradeci sussurrando:

— Obrigado, mãe.


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Notas finais do capítulo

Adam - http://img3.wikia.nocookie.net/__cb20101020020009/guardiansofgahoole/images/b/b4/Great_horned_owl_face_2_copy.jpg

Não se esqueçam de comentar o que acharam e se liguem no próximo capítulo.



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