O Ministério escrita por Vendetta23


Capítulo 5
Chão de Sangue




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No momento que Adam acordou, a manhã já havia chegado e frágeis raios de Sol penetravam por pequenos buracos em sua tenda. O jovem vestiu seu casaco e tirou suas armas de debaixo do travesseiro, só então ele se lembrou da situação na qual ele se encontrava. Ele respirou fundo antes de abrir a tenda e pisar lá fora, como se o ar em seus pulmões fosse o relembrar de por que e por quem estava fazendo tudo aquilo.

Lá fora, a Seya estava debruçada sobre si, presa ao lado da árvore, as mãos acorrentadas juntas como se estivesse em meio a uma prece. O garoto fez o mínimo de barulho possível enquanto organizava as coisas em sua mochila e limpava os rastros da fogueira e do acampamento, ele teve a sensação de estarem sendo observados, e preferiu então rapidamente sair daquele lugar e avançar um tempo antes de comerem alguma coisa. Passando os olhos pela figura curvada, ele se lembrava do que havia lido sobre a religião dos Seyas, que recusavam crer no Senhor Criador, e dividiam sua fé entre múltiplas entidades da floresta, sendo Azalen tido como um deus também. O rosto da criatura se ergueu no momento que Adam fechou sua mochila, ela o observou de uma forma diferente da qual o havia observado nesses dois dias, como se os traços de ódio tivessem se dissipado e a fúria se acalmado.

“Uma grande chuva está vindo”. Foi a primeira vez que Adam houve a voz dela, que saiu rouca e cansada, como se houvessem feridas até dentro de sua garganta, ele se virou surpreso.

“Como você sabe?” ele se aproximou dela e tirou a corrente da árvore, seu estômago se embrulhou ao ver os cortes em seus pulsos produzidos pelas pesadas algemas.

“Sabendo” ela mais uma vez virou-se para a floresta. Por um instante, o medo produziu um frio na espinha de Adam, que começou a se perguntar se essa sensação de estar sendo observado não era produzida por entidades ou até outros Seyas que estavam sendo convocados por meio de rezas ou magias para ajudá-la.

“Vamos” ele disse com voz ríspida e ele se puseram a caminhar, era um dia seco e quente apesar de estarem envolvidos pela floresta. Depois de algum tempo andando, Adam diminuiu o passo e se colocou ao lado da Seya “Você estava chamado alguém ontem à noite?” ele perguntou com seriedade, se lembrando da melodia que ecoou em seus ouvidos próximo do cair do sono. Ela olhou para o chão alguns segundos antes de responder.

“Sim” ela disse sem a mínima descrição ou embaraço.

“Quem?” ele se pôs a frente dela, uma mão no cabo da espada e a outra segurando seu pescoço, a Seya facilmente se esquivou e o ódio voltou a dilatar suas pupilas.

“Aakosh, Azalen, Mimene” ela respondeu “Bel, Vinito” ele continuou diante do olhar de dúvida de Adam, ele não havia decorado todas as entidades que os Seyas adoravam, e tinha certeza de que a maioria delas eram desconhecidas até ao mais profundo estudioso “Vocês recorrem aos seu Senhor sujo e eu não posso rezar aos deuses da floresta que vocês abandonaram, garoto?”. Ele deu um passo à frente e a olhou nos olhos, metade da espada já se projetava para fora da cinta.

“O Senhor me ouve porque eu não sou um assassino” ele sussurrou a centímetros do rosto dela “A não ser que os seus ‘deuses’ tenham as mãos manchadas de sangue também”. A Seya cuspiu nele e trincou os dentes, ele limpou o rosto com as costas da mão e levou a ponta da espada à garganta dela.

“Faça” ela disse com uma risada de deboche “Eu não quero que você faça mais nada além disso, e nem você”, a ponta da espada tremeu em contato com a sua pele até Adam forçosamente guardá-la na cintura novamente.

“Eu não quero ouvir você atraindo mais nada para nós” ele ameaçou.

Enfim chegaram ao descampado que era cena das mais terríveis histórias de infância de toda a criança humana. Adam tentou atravessar as Planícies da Morte o mais rápido que pôde, se controlando para não pegar um atalho diverso do indicado pelo mapa, mas a chuva os pegou no meio do caminho. Eles estavam agora, além de completamente expostos, com a visão limitada pela névoa cinza. ‘Desgraçada’ ele pensou enquanto suas botas se manchavam do barro daquele lugar desolado. Nenhuma planta ou erva sequer crescia há milhas daquele descampado e eles não tinham nenhuma caverna ou abrigo à vista. A tempestade encharcava a terra e fazia com que seus pés se afundassem cada vez mais. Ao olhar para o solo, o ar escapou dos pulmões de Adam e suas pernas enfraqueceram.

“O...” ele engasgou “O... O sangue” ele se virou olhando ao seu redor, o vermelho do sangue humano derramado na Batalha das Sombras cobria seus pés, e seus olhos arregalados demonstravam o terror que sentia. A Seya parou no mesmo lugar aonde estava e não disse uma palavra enquanto ele olhava atônito para o chão e as lágrimas que subiam começaram a esquentar seu rosto. “Você não está vendo??” ele se virou para ela, parada ao seu lado, os pés negros submersos naquele mar de sangue como se ela própria o tivesse criado.

“Não, não estou” ela retirou um dos pés do solo, a água vermelha pingando deles.

“Mentira!” ele gritou em fúria.

“Do que você está falando?”

“Muito engraçado” ele passou a mão nos cabelos, jogando-os para trás, encharcados da tempestade que caía, os trovões abafavam sua voz e ele disse ainda mais alto “Mas eu não vou deixar você brincar comigo, sabe para onde estamos caminhando?” ele respondeu a si próprio levando seu dedo de um lado a outro de seu pescoço, em um sinal mórbido de morte e vingança que parecia fazer sentido em sua cabeça mas perdeu todo o significado quando ele olhou nos olhos da Seya, que se antes eram desafiadores, agora eram temerosos, ele desviou o olhar e seguiu caminhando.

Apesar do barulho da chuva, ele ouviu passos rápidos se aproximando atrás dele, quando se virou, a Seya havia se jogado em cima dele com uma força brutal que o levou ao chão. Em cima do garoto, a Seya exprimia sons de raiva e tristeza, ele tentou tirá-la de cima dele mas ela jogou seu tronco em cima dele e o prendeu ao chão, ‘Se essa é a forma enfraquecida dela...’ ele pensou desesperado. Antes que ele conseguisse levar a mão à pistola ela abaixou a cabeça e falou eu seu ouvido.

“Não tem sangue nenhum na terra, ao invés de acreditar em tudo o que te dizem, veja”. Seu tom raivoso o fez rapidamente virar a cabeça no barro, que aos poucos perdeu seu tom avermelhado para assumir o de um marrom escuro. As batidas de seu coração foram aos poucos retornando ao ritmo normal e as gotas de chuva irritando seus olhos à medida que caíam. A Seya se levantou de cima dele e o garoto se ergueu em seus cotovelos, as lágrimas se confundiam com a água da chuva que varria seu rosto.

A noite já caía quando chegaram à borda da floresta e encontraram uma caverna para se abrigar e passar a noite. A fogueira iluminou paredes cobertas por desenhos e escrituras cujos significados Adam desconhecia. Ele largou sua mochila em um canto e encostou-se em uma pedra, sua cabeça doía com um turbilhão de pensamentos que rompiam com toda a lógica que seguiu por toda a sua vida. Ele não dirigiu o olhar para Kara, que observava atentamente todas as cores nas pedras.

“O que significam?” ele perguntou, sabendo que os Seyas eram o único povo humanoide de que se tem conhecimento habitando a floresta, ele se levantou e tirou seu casaco molhado e manchado de barro, esticando-o perto da fogueira.

“Para você, nada” ela respondeu em um tom cínico. Adam resolveu ignorar a provocação devido ao cansaço, e retirou mais um embrulho de folhas de sua mochila, oferecendo-o à Seya, que recusou o pacote.

“Não comemos nada o dia inteiro” ele disse, ela continuou virada para as paredes, murmurando uma língua desconhecida, ele então deixou o pacote em uma pedra ao seu lado. Ela parecia a cada dia mais fraca e debilitada, mas continuava transbordando certo orgulho destrutivo. Os cabelos negros dela caíam em mechas confusas até a base de seu pescoço e, de costas, ela não parecia monstruosa como as histórias narravam, na verdade, seu corpo era igual ao de uma jovem humana, se havia algo de assustador nela, era sua força e a magia contida em seu olhar. ‘A luz que saía de seus membros tomava a forma de armas que dilaceravam qualquer humano à sua frente’ ele lembrava do trecho de um de seus livros.

Os murmúrios e pensamentos foram interrompidos quando ambos ouviram passos do lado de fora da caverna seguidos por um urro aterrorizante.

“Urso” ela se virou para ele, e ambos congelaram no lugar.


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