Invisível em infelicidade escrita por Lady Vérity


Capítulo 1
Invisível em infelicidade


Notas iniciais do capítulo

Nessa pequenina história muito muito curtíssima, mais uma vez lhes apresento mais um de meus personagens conhecidos apenas como Ele e Ela, ha ha ha ha ha ha, não é falta de imaginação, não, ok? Trata-se apenas de uma série de personagens para histórias curtas que não tem nome porque eu queria que essa fosse uma espécie de característica peculiar nesses pequenos contos, acho que já enrolei de mais certo? Sigam em frente boa leitura.



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Ele trabalhava fazendo pesquisa nas ruas. Tinha apenas que parar em algum lugar e falar com as pessoas, tentar convencê-las a gastar uns poucos minutos de seu precioso tempo respondendo umas poucas perguntas, mas era raro que alguém quisesse desperdiçar o que quer que fosse com ele, fosse tempo ou atenção. O que ele mais odiava naquele trabalho humilhante não era ter que abordar as pessoas, era ser ignorado ou até humilhado por pessoas que acreditavam ser engraçadas demais ao ponto de transformá-lo em uma espécie de piada.

Quando deitava em sua cama todas as noites, sentia-se como nada, não sentia-se como nenhum dos adjetivos depreciativos que a maior parte das pessoas costuma usar, sentia-se como se não devesse existir, pois não tinha importancia e nem era necessário para ninguém, muitas vezes se perguntava porque estava alí, ocupando um lugar no mundo, mas parecia clichê demais se perguntar porque nascera, qual o sentido da vida e como era a melhor forma de se matar. Era doloroso se sentir como nada, doloroso sentir que ninguém o enxergava, pior, que ninguém queria enxergá-lo, porque ele não tinha nada de especial. Ele não era musculoso, bonito, rico ou se quer tinha olhos de alguma cor diferente, exótica, ele era menos que apenas mais um na multidão.

Numa tarde nublada, a garota cega parou assim que ele perguntou, timidamente, se ela poderia responder à pesquisa. Ela tinha um sorriso gentil e mãos pequenas, enquanto ela respondia suas perguntas, ao invés de marcar as respostas, ele se distraía olhando para as mãos dela segurando a coleira do cão guia, ela não podia enxergá-lo e por algum motivo essa parecia ser a melhor coisa sobre ela, ele podia observá-la sem ter medo de ser mal interpretado ou humilhado. Ela era comum, mas ao mesmo tempo especial, comum porque era como a maior parte das pessoas, cabelos e olhos escuros, não muito mais baixa do que ele, mas era especial porque mesmo que não pudesse vê-lo, ela o ouviu, ao contrário das outras pessoas que o viam, mas sempre fingiam que não o ouviam.

Faltavam poucas perguntas quando a chuva começou, ela se desculpou por ter que ir embora e ele ficou encantado com isso, com a forma que ela sorriu e acenou para onde achava que ele estava com sua mãozinha pequena. Por algum motivo, tudo em que ele conseguira pensar, fora em como gostaria de ver como a mãozinha dela caberia dentro das suas.

Ele voltou para casa segurando firme nas mão um pedaço de papel rasgado da folha da pesquisa, com um número de telefone que ela lhe passara no começo da pesquisa para confirmação posterior, pensou nela por muito tempo, nas mãozinhas e no cão que parecia sério, tinha um pêlo bonito, parecia macio, gostaria de ter tocado. Muito frequentemente ele se perguntava porque sempre tinha pensamentos tão estranhos.

No meio de uma madrugada, muitos dias depois, quando a solidão parecia grande, sufocante e assustadora demais para deixá-lo dormir, ele pegou seu telefone e o papel rasgado com o número da garota cega e antes que pudesse se arrepender e desistir, fez a ligação.

Com voz sonolenta, antes do último toque a garota atendeu, ele mentiu que queria falar com uma pessoa qualquer e assim que a ouviu dizer que era engano, disse a verdade misturada a um pouco de mentira. Disse que queria falar com quem quer que fosse que atendesse sua ligação para um número aleatório, ele apenas queira ouvir a voz de outro ser humano e ser ouvido. Ele pensou que ela iria desligar, qualquer um faria isso, mas ela, depois de alguns segundos em silêncio, perguntou sobre o que ele queria falar. Ele disse que gostava de poesia e que gostaria de ler alguns para ela. A garota foi simpática, disse que ele poderia ligar novamente quando quisesse conversar, mas deveria fazê-lo em um horário razoável, porque ela ficava de mau humor quando não podia dormir o suficiente.

Ele ligou novamente no dia seguinte e no outro dia, de novo e de novo e de novo. No início ela apenas o ouvia e dava sua opinião sobre o que ele falava, mas depois falou um pouco de sí e de suas preferências e então, foi ela quem pediu para encontrá-lo.

Quando o encontro aconteceu, numa pequena praça repleta de flores de cheiro cítrico, ela lhe disse que sabia exatamente quem ele era, ela reconhecera sua voz logo durante a primeira ligação, ela se recordava bem dos detalhes, especialmente das vozes. Admitiu que fora estranho receber o telefonema, mas conforme foi ouvindo o que ele queria dizer, gostou do que ele fez, sentiu-se lisonjeada, afinal ele gostara dela e não soubera como dizer isso, fez algo ilegal roubando seu telefone da pesquisa apenas para encontrar um jeito de falar com ela novamente, era estranho, mas bastante romântico na opinião dela.

Ele sentiu que seu coração poderia arrebentar seu peito quando ela lhe pediu para tocar seu rosto, disse que era sua forma de "enxergar" as pessoas. As mãozinhas que ele quisera tanto sentir entre as suas, estavam em seu rosto, em cada parte de seu rosto e cheiravam a cachorro, perfume adocicado e sorvete de chocolate que ele comprara para ela. No momento em que ela o deixou segurar sua mão entre as dele e sorriu, ele sentiu algo quente em seu coração, sentiu algum vestigio de uma alegria que não conhecia havia anos, porque finalmente ele era alguém, finalmente alguém o enxergava. A garota que não podia enxergar, estava enxergando o garoto que, havia tempos, se tornara invisível em sua infelicidade...


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Notas finais do capítulo

Sei que é pequenina e não acontece quase nada, mas mesmo assim espero que tenham gostado e agradeço a quem gastou seu precioso tempo com minha minúscula obra!! :D



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