Aquele Que Venceu a Morte escrita por Ri Naldo


Capítulo 38
Lágrimas


Notas iniciais do capítulo

Só pra não confundir a cabecinha linda de vocês: a primeira parte do capítulo foi escrita pelo mestre Clodoaldo, logo, é POV Lucas. A segunda foi escrita por mim, então é POV Dylan.



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— Surpreso, sério? Eu esperava mais de você. Quero dizer, de ti... — disse Luna, com um sorriso no rosto.

Felizmente, eu não estava surpreso. Dylan estava. Anne parecia confusa. Luna não mudara nada com os anos. Conheço essa bruxa há muito tempo. Nunca gostei verdadeiramente dela. Eu a usei e a deixei. E não, ela não era uma prostituta. Possivelmente, ela quem me usara, com sua voracidade e penalidade, quando o assunto foi ferrar os outros.

— De todas as pessoas possíveis, você? O que quer de mim? Louise e Mirina não foram suficientes? — perguntou o pobre Dylan, rastejando para trás, fugindo de Luna.

— Você não vê que quero te dar outra chance de recomeçar? Assim como você, quero consertar meus erros — ela disse, tentando conquistá-lo.

Botei minhas mãos atrás do corpo. Andei de cabeça baixa em círculos, evitando olhar para aquela que vestia o capuz. Fiz de mim uma rosa, aparentemente inofensivo, porém com espinhos voltados para fora.

— Não me surpreende que Lucas — ela usou um tom doce e sarcástico ao pronunciar meu nome — não tenha lhe contado nada. Acredite, Dylan, ele não podia. Ainda me perguntou por que deixei ele te acompanhar. Quase estragou tudo.

Sorri parcialmente, olhando fixamente para Luna, finalmente. Andei alguns passos, ficando mais perto dela.

— Você sabia? — gritou Dylan. — Seu maldito traidor! Então era isso que você escondia de nós!

— Isso e muito, muito mais. — disse Luna, ainda sorrindo.

Ela pôs uma das mãos em meu rosto, acariciando. Eu continuava com o meu sorriso imparcial, sarcástico.

— Acho que posso dizer-te que eu vos amo. — disse Luna, me olhando.

Tirei a mão dela do meu rosto.

— Pare com sua fala rebuscada. Não precisamos mais desse tipo de exibicionismo. Não mais. — falei, com raiva em meu rosto.

Virei-me, olhando para Dylan. Agora eu estava sério e com minhas mãos novamente atrás do corpo. Ele rastejou um pouco mais, querendo a todo custo fugir de mim. Estendi minha mão para levantá-lo.

— Não tenha medo. — falei, expressando minha mais sincera compaixão. Digo, a mais sincera que eu poderia fingir.

— Saia de perto de mim. — disse Dylan, pausadamente, como se estivesse pronto para cuspir em mim a qualquer momento.

Anne continuava perplexa. Ela não sabia o que fazer, nem mesmo como agir.

— Não acha que chegou a hora? Não sei qual dos dois está mais perdido. — comentou Luna. — Eu permito.

Ninguém disse nada. Continuei olhando para Dylan, que continuava olhando para mim como se eu fosse o pior dos monstros do mundo.

Um traidor sempre é um monstro.

— Mil novecentos e cinquenta e quatro — falei. — Eu tinha dezoito anos. — ele esbugalhou os olhos, emitindo um “dezoito” sem som. — Namorava uma garota chamada Elizabeth, filha de Atena. O Acampamento tinha sido fundado há pouco tempo. Depois de um tempo de namoro, teríamos nossa primeira relação íntima, quando a perdi. Ela morreu aos dezessete por um ciclope. Ela era a minha Louise. — com essa frase, pude ver que ele sentiu verdadeiramente o que eu estava falando. — Tempos depois, eu quebrei minha perna. Sem mais o que fazer, passei a viver na biblioteca, porque aquele lugar me lembrava dela. Nesse período, descobri que Zeus havia mandado o ciclope para matá-la, pois havia sido profetizado que ela seria um grande perigo ao Olimpo e aos deuses. Todo o meu ódio floresceu e cresceu como uma massa cresce com fermento.

Suspirei.

— Estava disposto a dar meu sangue por isso. — continuei — Eu dediquei todo o meu tempo para estudar magia como um louco. Na época, eu sofria de problemas cardíacos, o que me impedia de fazer qualquer esporte ou atividade física. Por isso os livros eram tão necessários. Qualquer filho de Atena invejaria o conhecimento que eu adquiri em tão pouco tempo. Eu passava dias inteiros sem comer, apenas lendo livros enormes e aprendendo coisas extremamente complexas. Foi quando Luna apareceu. Ela viu a sede que eu tinha por conhecimento, e me propôs um trato. Um desejo pelo meu sangue. O pacto de sangue.

Anne apresentou os primeiros sinais de entendimento. Claro, eu havia feito o pacto com ela também.

— O que diabos você pediu? — perguntou Dylan, extremamente confuso.

— Conhecimento. — expliquei — Eu pedi para ser igual a Atena. Eu tenho todos os poderes dela. Eu sou um Conde, Dylan. Eu sou o Conde do passado, do presente e, de alguma forma, do futuro. Eu prevejo a probabilidade, vejo o que acontece e o que se passou. Eu sei mais da sua vida que você mesmo. Agora eu sei que poderia ter me tornado isso sozinho, mas Luna me usou, me pôs sob o domínio dela. Desde então, eu não posso dar um passo sem que ela saiba. Para você ter uma ideia, não posso nem morrer sem a permissão dela. Meu espírito vagou pelo Acampamento por cinquenta anos. Eu fiquei sozinho por mais de cinco malditas décadas, para lá e para cá. Então, eu achei um jeito de me levar de volta à um corpo material. Esse corpo. Foi quando eu fui parar nas ruas, e conheci Mirina. Mesmo assim, minha cabeça estava inundada por coisas que eu queria e que não queria saber. Eu não tinha me libertado do pacto que fiz com Luna. Esse tipo de pacto era altamente proibido, mas os deuses nada fizeram, por pedido de Atena, que temia que eu tomasse o lugar dela, já que eu tenho o mesmo nível de conhecimento. Eu sei de tudo, Dylan, mas não posso compartilhar com ninguém. Isso não é um dom, é uma maldição. Luna preveu tudo, até chegar a este dia. Hoje, Dylan, é o dia mais importante da história da humanidade, e você nem sabe.

— Ela fez com você o que você fez comigo — observou Anne.

— Exato. — concordei.

Dylan continuou sem falar nada, perplexo. Ele não deve ter acreditado em uma palavra do que eu disse, e agora deve estar sentindo nojo de Anne também. Mas não importa. Já está feito.

— Eu tentei te avisar, Dylan. Você não sabe o que...

— Pare. — ordenou Luna, mas eu a ignorei.

— … acontecerá quando você...

— Pare! — ela gritou, e eu me contorci de dor, sem poder falar outra palavra.

Depois de um tempo, ela me deixou falar novamente.

— Há apenas lágrimas. — eu disse, levantando-me e olhando para Luna, que estava séria e de rosto empinado, imponente. — Apenas lágrimas nessa tempestade.

— Você é o pior escravo de todos, Lucas. — declarou Luna, com desprezo.

— Não mais, Luna. Não mais.

Tirei uma adaga da minha manga. Uma adaga cor de prata e com dois raios verdes estampados. Segurei em minha mão e apertei o cabo com a maior força que eu podia.

Luna riu.

— Vai tentar me matar? Pois bem. Você irá comigo, e ainda será meu subordinado nos Campos de Punição — ela disse.

Eu sorri. Um sorriso verdadeiro, como no trem. Joguei a adaga, que pegava fogo, estava flamejando em verde. Ela passou pelo lado direito de Luna, cortando de leve seu braço. Ela nem tentou se mexer.

— Nem para isso você serve mais, Lucas. Você é só um idiota. — disse Luna.

— Dylan, — falei — desista enquanto pode.

Ele expressou confusão e medo ao mesmo tempo.

— Não, Luna. Eu não sou um idiota. — disse enquanto dava passos para trás — Eu sou uma lágrima. Uma lágrima em meio a tempestade. Uma lágrima caindo. E eu irei com elas…

A adaga verde voltou pelo lado esquerdo de Luna.

Ela acertou exatamente meu peito esquerdo. Luna levantou uma sobrancelha, curiosa.

— Meu sangue em uma adaga.

As chamas se apagaram.

Por um momento, eu senti paz. A única paz desde muito tempo. A única paz desde 1954.

Eu senti paz.

Eu morri sorrindo.

Ψ

Lucas tinha acabado de cair na minha frente, com a adaga fincada fundo no coração. Seu corpo se desfez em pó, brilhando no ar, contrastando a terra vermelha que pintava o Mundo Inferior.

Luna se moveu, aproximando-se do local onde o corpo dele caíra, pegando a adaga do chão e guardando dentro da capa.

Ela olhou para mim. Um olhar tenso e penetrante.

— Ele morreu? — perguntei.

— De certo modo, sim. Ele se libertou do pacto de sangue. Está vivo em um corpo mortal por aí, em algum lugar. Já era hora, aliás.

— Dylan… Quem é ela? — Anne perguntou.

— Por favor, sem mais palavras da sua parte. — pediu Luna educadamente.

— Ninguém me manda calar a boca. — rebateu Anne.

— É? Pois eu mando.

— Quem você pensa que é?

Luna olhou para Anne, com olhos dourados. Lembrei de quando ela fez isso conosco, na prisão. Ela nos paralisou e nos obrigou a assistir aos nossos piores medos. Anne não tinha chance alguma.

— Deixe-a em paz! — gritei. — O que você quer de mim?

Ela libertou Anne, que caiu no chão, ofegante. Depois, estendeu a mão para mim, porque eu ainda estava no chão.

— Quero completar o ritual.

— Depois de todo esse tempo, você quer me ajudar?

— Dois anos, Fletcher. Achei que você tivesse aprendido alguma coisa sobre a vida. Ninguém nunca quer te ajudar, todos sempre querem algo em troca. É simples: eu preciso do seu poder para realizar o ritual. Não me faça dizer isso novamente. No fim, você terá o que quer, Louise e Mirina, e eu terei o que quero.

— O que você quer?

— Talassa.

Franzi o cenho.

— Mas você a matou!

— Ela estava se tornando algo fora de controle. Talvez já tenha aprendido a lição. Então, Dylan. Suas amigas pela minha irmã.

Eu tinha chegado tão longe, não poderia desistir agora.

Eu tinha que fazer isso. Tinha que consertar meus erros.

Ignorei o que Lucas estava tentando me avisar.

Peguei a mão de Luna.

Ψ


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