Regis Um Menino do Planeta Terra escrita por Celso Innocente


Capítulo 14
A cirurgia




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Após nossa primeira refeição da volta à Suster, sem contudo encontrar Leandra, que mesmo sabendo de nossa presença, teria deixado a refeição pronta e saído a algum compromisso importante, fomos rever o belo jardim cheio de arvoredos, na frente da grande residência.

Sentados à sombra de uma bonita árvore, semelhante a uma mangueira terráquea, fomos visitados por senhor Frene, que já de longe insinuou:

— E então Regis! Está disposto a ir ao hospital?

— Quando? — Especulei com o coração ansioso.

— Agora! A equipe está seguindo pra lá.

— Estou pronto — me levantei.

Arthur também se levantou e me disse sério:

— Boa sorte. Vai dar tudo certo.

— Você vem comigo! — Aleguei.

— Não! — Negou ele. — Detesto hospital.

— Ninguém vai relar em você! Só em mim!

— Mesmo assim eu não quero.

— Eu quero que você vá! — Insisti. — Você é meu irmão. Meu amigo fiel!

— Não gosto de ir a hospitais!

— Por favor!

Ele me olhou triste. Tinha no semblante, um jeito preocupado, como se realmente tivesse grandes motivos para detestar hospitais.

Mas nos acompanhou calado.

Entramos no esquisito carro do senhor Frene, de apenas duas rodas, com cerca de quatro metros de comprimento e em poucos segundos já estávamos seguindo pelas ruas de Malderran, em direção a tal estabelecimento de saúde.

Mas por que hospitais? Se Suster é um planeta imortal, onde não há doenças ou mortes.

Engano! Não há doenças físicas! Mas se algum desavisado se descuidar e cair de um edifício terá que ser socorrido emergencialmente em hospitais e dependendo do caso, adeus imortalidade.

Outra utilidade primordial foi com a descoberta da clonagem humana, de onde surgiu Arthur e seus outros tantos mil irmãos, todos idênticos a mim, menino da Terra, que doei, embora sem autorização e também sem saber, microscópico DNA, que após manipulação genética, teria sido implantado no útero, embora estéril, de determinada mulher voluntária, para com isto, terem para si, a presença de crianças e eventual continuação de sua espécie ameaçada de, apesar de lentamente, extinção.

— Por que você tem pavor de hospitais? — Perguntei preocupado à Arthur.

— Nem sei! — Balançou os ombros.

— Quando esteve hospitalizado?

— Que eu saiba, só quando nasci.

— O qual você nem se lembra! Portanto, medo de hospitais, seria irrelevante.

— Fiquei preso em incubadora em meus primeiros dez anos de vida — explicou ele tristemente. — Acho que isto me traumatizou.

Eu já sabia disso. Meu sósia teria permanecido em local imune a radiação de seu mundo, em seus primeiros dez anos de vida (seis anos, se contarmos em meu mundo), caso contrário, ele seria sim um bebê saudável, porém, não passaria disso.

Em poucos minutos, estávamos em majestoso hospital, deixando o carro no estacionamento frontal e seguindo imediatamente para a sala de tal exame.

— Olá Menino Regis! — Cumprimentou-me uma moça, que aparentava pouco mais de vinte anos — Por acaso se lembra de mim?

— Desculpe — pedi mordendo os lábios. — Não!

— Da outra vez em que você iria fazer esta mesma cirurgia, fui eu quem o acompanhou nos exames.

— Desculpe! Acho que não sou tão bom de memória!

— Eu também ajudei na diferente gestação e nascimento de seu primeiro irmão.

— Carlos Henrique!?

— Não ele! Este seu irmão aqui! — Justificou, abraçando a Arthur.

— O que iremos fazer? — Questionei-a assustado.

— Não há perigo! O que iremos fazer agora é o mesmo que na Terra vocês chamam de tomografia computadorizada. Você entrará dentro desta máquina, que nos mostrará você por dentro, como se estivéssemos te fatiando, igual faz um cortador de presunto.

Só para entendermos: por incrível que possa parecer, em Suster existe presunto; porém não é feito a partir de carne animal e sim carne vegetal. Neste planeta não existem animais, além do homem. Nem insetos ou peixes.

A máquina: um aparelho cilíndrico, em material parecendo vidro rosado, transparente, com um leito forrado por colchonete de feltro na mesma cor.

— Não é radioativo?

— Não! Embora o processo seja semelhante aos seus, que emitem ondas de raio xis, em nosso caso, não usamos iodo, mercúrio ou quaisquer reagentes químicos para contraste.

— E como vocês conseguem o contraste, pra descobrir o que procuram?

— O computador faz isto. Na verdade, aqui não buscamos doenças. Às vezes precisamos descobrir luxações ou pequenas quebraduras internas. Em seu caso, examinaremos apenas o cérebro.

— Embora não seja minha especialização, sou médico. Irão injetar antimatéria em meu cérebro para criar as fotografias por pósitrons?

— Você é inteligente! — Concordou ela — Na verdade, iremos injetar glicose com flúor radiativo. Mas como a quantidade é mínima e você sendo médico, sabe que não há qualquer risco para sua integridade.

— Mentiu dizendo que não era radioativo.

— A quantidade é insignificante e seu organismo a expelirá em poucas horas.

— Poucas horas para meu organismo, significa dezenas de anos.

— Não é bem assim! — Negou ela, um pouco brava com minha insistência — Todos os organismos vivos têm anticorpos, que são um verdadeiro exército, que trava uma guerra sem trégua contra qualquer invasor. E pode ter certeza que tal exército vence.

— Você também me ama?

— Claro! Você poderia se despir?

— Todo?

— Não existe nada de metal em sua bermuda?

Acenei que não.

— Pode ser apenas a camisa — concordou ela.

Tirei a camisa e fiz gesto sobre meu tradutor.

— Principalmente.

— Ficaremos sem comunicação.

— Ninguém entenderá você?

— Arthur sim! — Confirmei — Você também! Caso use este aparelho.

Ela colocou meu tradutor sobre seu pescoço, deitei-me sobre o tal leito, ela se retirou da sala da máquina, permanecendo junto ao senhor Frene, Arthur e outra moça, aparentando sua mesma idade, em uma sala fechada por vidros transparentes; ou seja: todos protegidos contra quaisquer riscos de radiação, menos o bobão aqui.

— Está me ouvindo? — Perguntou-me ela pelo microfone.

— Sim!

— Você não deverá se mexer muito e nem falar. Tudo bem?

— Tudo!

— Estamos iniciando o exame. Vai demorar apenas dois ou três minutos. Quero que você procure se concentrar em suas recordações, em todo o tempo de sua vida, desde seu nascimento, principalmente ao lado de seus familiares e amigos.

— Pra que serve? — Especulei nervoso.

— Evite falar! Iremos fazer um mapeamento de seu cérebro.

— Seu cérebro aparecerá na tela do monitor, como um belo mapa estelar — ironizou Arthur.

A máquina continuou lendo meus neurônios e criando assim, tal mapa, para auxiliá-los em uma microcirurgia.

Arthur tinha razão em se falar de mapa estelar. Os neurônios são uma grande cadeia, como constelações estelares de nosso cérebro; algo tão divino e espetacular, que faz qualquer incrédulo, a não duvidar da existência e poder de um Deus Supremo, ao criar dentro de tão pequeno espaço, um universo infinito com mais de oitenta e seis bilhões de neurônios, todos interligados entre si, sendo eles os responsáveis para que a gente possa andar, falar, enxergar, amar, chorar, sorrir, sofrer...

A cirurgia que estava sendo preparada em mim seria apenas a inibição de comunicação entre poucos destes neurônios, bloqueando-os através do axônio, envolvido por um caminho transmissor chamado de bainha de mielina.

Dois minutos depois, a moça retornou, me mandou sair da máquina, me entregou meu tradutor e me mandou vestir a camiseta.

Dali, acompanhado por ela, Arthur e o senhor Frene, fui levado a uma sala totalmente lacrada, onde somente eu e ela entramos.

Colocou-me deitado em uma grande mesa cirúrgica, revestida de branco, semelhante às que temos na Terra, me deu cinquenta mililitros de um líquido amarelo.

— Pra que serve? — Perguntei-lhe.

— Vai lhe fazer dormir um pouco.

— Pra me fazer dormir, é só trazer o Luecy — aleguei rindo.

Na verdade, estava assustado e sentia meu coração bater descompassado.

— Tome isto! Precisamos controlar seus batimentos cardíacos. Eles estão alterados.

— Não acha que vou ter um infarto. Não é?

— Com certeza não! — Riu ela — É apenas ansiedade.

— Já estava preocupado.

— Pra você morrer do coração, só se o atirador for muito bom de mira! — Ironizou ela.

Tomei o líquido, devolvi-lhe o copo vazio e ela se retirou.

Em alguns segundos, com uma máscara na boca, entrou o senhor Frene.

— Não é o senhor quem vai me operar! É?

— Por que não? — Alegou ele — Não confia em mim?

— Não! — Insinuei preocupado.

— Sou médico! Já não lhe contei?

— Não faço esta cirurgia com o senhor! — Neguei assustado.

— Claro que não serei eu, bobinho! — Exclamou ele sério — Só vim conversar.

Colocou a mão direita sobre meu peito e disse nervoso:

— Você sabe que esta cirurgia, sempre foi o que eu mais queria, durante todo o tempo em que você esteve conosco...

— Não pretende cancelá-la novamente. Não é?

— Seria egoísmo da minha parte, não tornar a lhe perguntar, se é realmente o que você deseja!

— Não posso viver do jeito que estou senhor Frene. Estou sofrendo de verdade.

— Vou tornar a lhe dizer que é irreversível.

— Ou seja: — interferi — Não irão apenas desabilitar meus neurônios!

— Esta cirurgia irá neutralizá-los...

— Queimá-los! — Insinuei nervoso — Sei de tudo isto! Sou médico! Já lhe disse! Minha preocupação é: não há riscos de queimar parte errada de meu cérebro, me deixando inválido?

— É seguro — garantiu ele. Embora nervoso.

— Por que então o senhor está nervoso?

— Não sei meu filhinho! Parece que não é o que você quer!

— Não tenho nada a perder senhor Frene! Farei a tal cirurgia.

Quando ele já saia da sala, tornei a chama-lo:

— Senhor Frene.

Ele se voltou preocupado. Então continuei:

— A primeira vez em que fui embora daqui, o senhor me disse, que se um dia eu quisesse voltar, era só avisá-lo que o senhor me buscaria na hora, mesmo que nesse dia eu já tivesse setenta anos de idade.

Ele fez gesto positivo com a cabeça e ainda sério, confirmou:

— Realmente. Eu me lembro desse dia.

— Pois é! Acho que o senhor já sabia disso.

— Como assim?

— Tenho setenta... agora!

Acho que nem vi o senhor Frene sair da sala. O tal remédio me fez dormir rapidamente.

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Notas finais do capítulo

Só mais um capítulo e acertaremos a felicidade desse jovenzinho de setenta anos de idade.



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