Já fazia cinco meses que a guerra acabara. Nico di Angelo estranhava aquela paz, não era algo normal para ele, que vivera rodeado de problemas. A convivência no Acampamento Meio-Sangue era o maior dos problemas naquele momento, e, sejamos sinceros, não é nada comparado a tudo que aquele garoto passara.

E quando dizemos convivência no Acampamento Meio Sangue, dizemos convivência com uma certa pessoa.

Will Solace.

Nico não entendia o que sentia por aquele garoto. Na real, para meninos deve sempre ser mais difícil, mas no caso era um menino gostando de outro menino, e isso, sinceramente? Não facilitava as coisas.

Nico se sentia ridículo por aquilo. Ele era um semideus, poxa! Filho de Hades, deus do submundo, passou por tudo que se poderia passar para uma vida inteira e agora estava sofrendo por... amor? Ridículo, ridículo...

Sua justificativa eram hormônios. Ah, você sabe, quando se tem quatorze anos parece que tudo vai explodir (mas não explode, relaxe). Porém, como ele saberia que era reciproco? Vai ver Will estava sendo só amigo, simpático. Vai saber.

- Me chamou? – Nico estava na porta da enfermaria do acampamento. Ele vestia a camiseta laranja como todos naquele lugar, contrariando a higiene esperada em um leito.

- Ah, sim! Obrigado por vir. – Will sorriu calorosamente para Nico. Era sempre assim: o que um tinha de frieza outro tinha de calor.

- Tem algo de errado aqui?

- Este sátiro aqui do qual estou tratando – Will puxava vários espinhos da bunda peluda do sátiro. Nico odiava sangue, e havia bastante sangue na mão de Will. - Jura de pés juntos, quer dizer, de cascos juntos que estava sendo assombrado por espíritos na floresta. Eles pediam ajuda, algo do tipo. Pensei que você seria o melhor qualificado para isso contando com o fato de que é filho de Hades e tal.

- Espíritos por aqui? Não vejo razão alguma para estarem assombrando a floresta.

- Eu juro, eles eram cruéis! Haviam três, e o que deveria ser o chefe ficava pedindo para eu roubar morangos da plantação, armas do arsenal. Eu não dei, óbvio, e olha só o que me aconteceu! Ai! – Will tirou mais um espinho. Ele não demonstrava sentimentos, apenas focado no trabalho.

- Posso dar uma conferida, mas isso soa estranho.

- Faça isso, Nico. Obrigado. – Will continuou seu trabalho e Nico foi ver se realmente tinha algum espírito na floresta.

~~*~~

- Eles queriam falar com você então?

- É. O sátiro se enganou, só isso. Agora está tudo certo.

Nico estava sentado com Will Solace nos bancos em volta da fogueira. Era tarde, bem tarde, e todos provavelmente dormiam. Will ficara de plantão até tarde na enfermaria e quando saiu foi imediatamente falar com Nico sobre o que acontecia. Finalmente podiam conversar.

Nico não podia deixar de comparar Will com Percy. Era inevitável. Ambos eram altos, tinham sorrisos bonitos, pele bronzeada e estilo surfista. Mas as semelhanças paravam por aí. Percy tinha um humor infantil, enquanto Will é de poucas palavras, mas muito agradável. Percy é um herói, luta com espada. Will não procurava glória, apenas queria ajudar aos feridos. Percy deixava Nico suando frio em sua presença, admiração e aura imponente. Will era só Will. Will deixava ele confortável, alguém fácil de conviver.

Era essa a diferencia entre os dois. Amar Percy é como amar algo incansável. Amar Will era simples. Sua presença era o suficiente.

Mas como dizer isso ao garoto?

Nico não aceitaria uma rejeição. Desde de que chegara ao acampamento Will estava ao seu lado em todos os momentos, então ele deveria notar algo, não é?

O que Nico sabia sobre Will? Vejamos, ele é filho de Apolo, o que já ganha ponto. Ele é um excepcional curandeiro, tem dezessete anos, cresceu na Flórida e está no Acampamento desde seus doze anos. Mas faltava uma coisa: relacionamento. Ele já teve um namorado? Ou uma namorada?

Will nunca dera uma dica sobre sua sexualidade. Gostava de garotas ou de garotos. Ou gostava de garotos e garotas?

Vai saber.

Nico tinha interesse, mas caras não perguntavam a outros caras sobre essas coisas. Sabe como é, garotos são complicados.

- Nico.

- Sim?

- Posso te contar uma coisa?

As pessoas não costumavam procurar Nico para contar seus segredos. Isso era estranho.

- Conte.

- É estranho dizer que sinto algo entre nós?

- Algo como? – Nico estava com medo.

- Por favor, cara, não me mata! Quer saber, esquece.

- Não, agora diz.

- É ridículo.

- O que é ridículo.

Will suspirou, cansado. Seu sorriso que costumava estampar seu rosto desapareceu.

- É como se eu alimentasse uma esperança impossível. Você vai rir.

- Se você não contar como poderei saber se rir é a melhor escolha?

- Tá. Bem, você sabe Jake.

- Jake Mason, do Chalé de Hefesto.

- É, ele mesmo. Cara, isso vai soar estranho, mas a gente se encontrava ano passado.

Foi como um chute no meio das pernas de Nico. Não podia ser.

- Ah, sério? Jake não tem jeito de gostar de...

- É, eu sei. Também não desconfiava. Na realidade, nem eu sabia do que eu gostava. Esse negócio de ser semideus e tal ocupa todo meu tempo. Deuses e gigantes malignos, monstros, e feridos para eu tratar fez com que eu esquecesse do meu coração e quando fui notar eu não sabia se gostava de garotas ou garotos.

- E você gosta de garotos?

- Essa é a parte estranha. Eu saí com Jake por algum tempo, e ele era legal e tal. Eu me sentia bem com ele. Mas tudo era escondido pois eu ainda estava bem confuso. Mas tem coisas que vão acabando naturalmente, e a gente acabou. E eu voltei a me dedicar somente ao trabalho.

- Onde você está querendo chegar?

- Depois disso eu conheci uma garota. Nossa, isso é estranho. Ela conseguiu acender uma chama em mim do mesmo modo que Jake acendera, e então começamos a sair também. Algo estranho, sabe? Eu me sentia igualmente bem ao lado de uma garota. Mas o problema é que ela era mortal, e eu não poderia alimentar algo que não daria certo. Nossos mundos eram diferentes demais e eu não queria mais mentir para ela sobre minha origem. Então sumi. Parei de encontrá-la. E nem doeu tanto assim. Eu me preocupo mais com as feridas dos outros, sabe. Coisa de curandeiro.

Nico não sabia o que dizer. Ele arriscou umas palavras:

- Então você gosta de meninos e meninas?

- Eu acho que eu gosto de pessoas, sendo elas o que forem. É complicado, eu sei. Talvez um dia me apaixone por uma ninfa ou sátiro, sei lá.

- É, talvez.

- E eu sei que eu gosto de alguém porque uma chama acende dentro de mim. Foi o que aconteceu com Jake e com a garota, a Jessie. – ele pigarreou. – Mas pela primeira vez uma chama não acendeu. Parece que essa chama sempre esteve dentro de mim brilhando, só faltava eu notar.

Nico ficou nervoso. Ótimo, um outro alguém. Seria o quê, um centauro?

- E essa pessoa gosta de você?

- Bom, ainda não sei.

- Já tentou mostrar interesse?

- Sempre mostro. Sabe, sempre estou ao seu lado.

- Hum.

- Nico.

- O que foi?

- Você não imagina quem seja?

Nico estava com as mãos suando. Will Solace se levantou, aproximando-se do filho de Hades, ajoelhando na sua frente para poder ficar a altura do garoto sentado. Ele sorria cansado.

- Isso responde?

Will beijou Nico. Dava para ver que estava nervoso. Era um beijo suave, que passava confiança.

- Desculpa. Nossa, eu sou um idiota.

Will se levantou bruscamente, o sorriso desaparecera. Seu cabelo loiro estava embaraçado na franja.

- Will, espera.

- Não. Nossa, Nico, desculps. Você não deve gostar de garotos, claro. Deve me odiar agora.

- Will.

- Acabei de destruir nossa amizade. Sou tão imbecil.

- Will. – Nico se levantou, aproximando-se de Will. É, ele não era tão alto assim. Faltava pouco para Nico completar quinze anos, e estava crescendo tão rápido que assustava. Nico colocou sua mão esquerda no ombro do filho de Apolo. – Eu gostei.

- S-sério?

- Sério. Pode parecer estranho, mas filhos de Hades também têm sentimentos, e os meus melhores sentimentos são relacionados a você. Esperança, confiança, animação, amor. Só estava com medo da possibilidade de não ser recíproco.

Então Nico o beijou. E dessa vez foi melhor, mais intenso. Ele se sentia seguro ali, com Will Solace. O tipo de pessoa mais improvável para Nico di Angelo. Mas nada disso importava. Nada mais importava.