Aquele era um dia diferente, por mais que a garota tentasse não se importar.

Tinha algo diferente no ar, algo diferente nos raios de sol que lhe atingiram os olhos naquela manhã, algo diferente na maneira como sentia o pano leve do lençol em suas pernas, algo diferente nas linhas de seu pijama.

E algo diferente no usual beijo de Bom Dia que recebia na testa do moreno que dormia ao seu lado.

Estava diferente.

E ela não sabia como reagir a aquilo, pois já fazia muito tempo desde a última vez que se sentira assim. Para ser exata, desde que ela era uma garotinha e ainda segurava na mão de seu pai.

Aquele pensamento a chateava, por isso a garota preferiu trancar as suas lembranças e se esquecer completamente – de propósito dessa vez – daquele dia.

O dia do seu aniversário.

Ela fazia ideia de o porquê aquela sensação voltara, no entanto. Tinha quase certeza que um certo rapaz de olhos verdes era o culpado.

Porque ele a fazia se sentir tão leve, tão calma, tão despreocupada ao ponto de deixar sua guarda baixa e voltar a sentir algo que há tempos pensara ter esquecido:

Estar feliz por ser o dia em que ela nasceu.

Mas, de novo, não sabia como reagir.

Por isso, resolveu que era melhor seguir seu dia normalmente e já esperando ganhar algum presente que Naegi provavelmente passara um bom tempo tentando escolher – e que devia ter chegado ao ponto de pedir conselhos a Asahina e Fukawa para não cometer nenhum erro.

A jovem de cabelos longos deixou-se sorrir com aquele pensamento enquanto atravessava a sala de estar do pequeno apartamento deles. Realmente, o moreno era uma pessoa absurdamente fácil de ser lida, mas ela adorava esse fato.

Entretanto, a mesma só percebeu tarde demais quando um cheiro desconhecido penetrou suas narinas. Kirigiri piscou e olhou na direção da cozinha.

Era bom. ... Era doce?

A mesma levantou de seu lugar na mesa e se dirigiu até o cômodo, ao parar perto da porta, percebeu o garoto mexendo em algo no fogão. Ele estava concentrado ao ponto de não ouvi-la chegando.

-Makoto-kun.

A reação foi uma espátula voando e um moreno contorcendo-se até virar completamente para ela e assim cobrindo o que quer que estivesse atrás dele.

-K- K- Kyouko-san!! – Naegi exclamou antes de olhar rapidamente para trás, voltar a olhar para a garota, por as mãos atrás das costas e sorrir de maneira sem graça. – O- Olá.

-Olá.. – Kirigiri entrou na cozinha e apoiou as duas mãos no balcão que ficava a frente do fogão. Tombou levemente a cabeça para o lado. – O que está fazendo?

O garoto piscou e olhou para o lado.

-... Jantar.

-São 16:23 da tarde.

-N- Nunca é cedo demais para já deixar o jantar pronto, sabe? E- Eu decidi me adiantar dessa vez.

-Hm... – A garota respondeu e se afastou do balcão, depois se moveu na direção do mesmo que não percebeu a aproximação por estar olhando para outro ponto. – É mesmo?

-S- Sim! Não precisa se preocupar com na- AH! – No momento que Naegi decidira voltar a olhá-la, encontrou olhos violetas perto demais dos seus verdes e pode sentir a respiração quente da jovem sobre os seus lábios. – Ky- Kyouko-san?!

-Que foi? – Ela se aproximou mais e quase sorriu ao ver a coloração das bochechas de seu namorado mudar drasticamente.

-E- Erm... Você...

-Hm?

-T- Tá muito perto...

-Uhum. – Seus narizes se encostaram e ela pôde senti-lo tremer levemente.

-K- Ky...

-Ei, Makoto-kun. – A garota levantou o braço e ergueu seu dedo indicador.

No minuto seguinte, havia se afastado a uma distância razoável e tinha o que parecia ser um pedaço de glacê na ponta do dedo. Kirigiri rapidamente o comeu e pôs o dedo limpo sobre o queixo.

-É de baunilha?

O moreno a frente dela piscou diversas vezes antes de seu rosto ficar completamente vermelho e sua boca abrir em uma expressão indignada.

-Kyouko-san!

A garota deixou-se sorrir outra vez e agradeceu de bom grado o calor confortável que se espalhou por seu ser.

Não tinha porque sentir-se culpada, não tinha porque pensar demais no assunto, não tinha porque rejeitar aquele dia.

Pelo menos, não mais.

Kirigiri só precisava aproveitá-lo ao lado do garoto – do único garoto – que a fazia se sentir tão bem e que era capaz de mandar todas as suas preocupações para o espaço tão rápido quanto às batidas descompassadas em seu peito ou a velocidade que o sangue corria em suas veias.

Felicidade era realmente algo viciante. Por que ela um dia a negara mesmo?

-Desculpe. Vou esperar pelo bolo pronto. – E se aproximou mais uma vez para beijá-lo na bochecha. – Mas obrigada.

Naegi coçou as costas de sua cabeça e sorriu de volta para a garota da mesma maneira.

-De nada. Feliz aniversário, Kyouko-san.