Ressurgente escrita por Carolina Rondelli


Capítulo 6
Capítulo 5


Notas iniciais do capítulo

Escrevi esse capítulo me inspirando com a música "I know places" do álbum maravilhoso 1989 da Taylor Swift. Espero que gostem!



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Tobias

— O quê?! — quase todos exclamam.

— Eu achei que a vi, e pensei que fosse coisa da minha cabeça, mas agora que um homem disse que a viu...

— Quatro — Christina começa, suavemente —, Tris está morta. Nós vimos o corpo dela. Você viu. Espalhou suas cinzas.

— E mesmo que ela estivesse viva, o que é impossível — Zeke acrescenta —, por que ela decidiria se mostrar só agora?

— Se ela estivesse viva, ela estaria aqui — diz Caleb, suas palavras caindo como chumbo sobre meus ombros.

Eu sei que Tris morreu, vi seu corpo, espalhei suas cinzas pela cidade, mas uma parte de mim ficou tão esperançosa quando viu aquela garota que pensei ser Tris. O que eu não daria por outro beijo, outro abraço, ou uma oportunidade olhar nos olhos dela novamente? Acho que daria minha vida por isso. Não quero me dar a chance de me lembrar de Tris do jeito que só eu posso me lembrar dela, porque, se eu o fizer, posso entrar em um poço de tristeza e pesar que não acredito ser capaz de sair. Preciso me obrigar a empurrar as lembranças mais intensas para o fundo da mente para o bem da minha sanidade.

Ficamos um momento em silêncio, até que Shauna o quebra:

— Vocês têm alguma ideia do tamanho do estrago que causaram hoje?

— Não, mas quando saímos de lá estava pegando fogo — explico. — E outra boa pergunta seria quem causou aquilo.

— Tem alguma ideia de quem tenha feito isso? — Liv demora um pouco para perceber que minha mãe fala com ela. Ninguém tinha se dirigido a ela até então.

— Oh, não, eu não faço ideia.

— E quem é você, afinal? — Christina indaga.

— Liv — ela responde. — Olívia Williams.

— Não, eu quero dizer quem realmente você é — Christina insiste —, apareceu do nada e salvou a vida de Tobias. Quem é você?

— Ela é a nova vice-prefeita.

Christina me olha com incredulidade.

— Você já viu essa garota antes de hoje?

— Não, mas eu só estava... — Liv começa.

— Eu não estou falando com você — Christina interrompe.

— Chega. Eu sou o prefeito agora, e se eu decidi que ela é a melhor para o cargo, então ela é a melhor para o cargo — digo.

— Enumere cinco coisas sobre ela.

Antes que eu possa começar a pensar para contra-atacar esse bom argumento, meu celular toca. Pensei que ele tivesse caído, mas ele está bem aqui em meu bolso. Olho para a tela e vejo que é um número desconhecido.

— Alô? — digo.

— Tobias? — ouço uma voz familiar do outro lado, Anthony, um dos cinco que dividiam a mesma tarefa que Richard. — Ufa, você está vivo! Ninguém achou você, e nem seu corpo, ficamos imaginando o que poderia ter acontecido...

— Sim, sim, estou vivo e bem. Alguém me ajudou a sair de lá. — Olho para Liv, que sorri.

— Você está em um lugar seguro? — ele pergunta.

— Sim, o apartamento da minha mãe — respondo.

— Não me parece tão seguro, se quisessem descobrir onde você está, seria fácil.

— Não acredito que eles vão me caçar pela cidade. Fizeram uma arruaça, mataram pessoas do Governo, mas não acredito que vão fazer disso algo pessoal.

— É, sim, você tem razão. Provavelmente não vão.

— Quantos de vocês... sobreviveram? — pergunto cautelosamente.

— Apenas eu e John, que está hospitalizado, ele foi baleado. Richard, Michael e Paul foram assassinados.

— Droga! Eu sinto muito — digo com sinceridade. — Sabe quem fez isso?

— Temos algumas testemunhas, eles estão na delegacia. Mas não temos ideia da motivação que levou pessoas a fazerem isso. Por incrível que pareça não conseguimos prender ninguém.

— Rebeldes, talvez?

— Contra o quê vão se rebelar, Tobias? — ele diz com uma voz cansada e meio desesperada. — A cidade está bem, sem distinção de genes. O que mais essas pessoas querem?

— Eu realmente gostaria de saber — digo.

— Mas temos que focar em qualquer ameaça que você possa sofrer. Então, não saia do apartamento de sua mãe até que eu diga. Isso são ordens, entendido?

— Entendido — respondo.

— Ótimo. Até breve.

— Anthony, me mantenha informado sobre a situação de John. Até breve.

— É claro. — E ele desliga.

— O que ele disse? — minha mãe pergunta.

— Aparentemente estou em prisão domiciliar aqui — digo. — Três representantes do Governo foram mortos, um está hospitalizado, Anthony não pode se dar ao luxo de perder mais ninguém que diz respeito à administração da cidade.

— Então você é bem vindo — minha mãe diz. — Só gostaria de te receber aqui em outras circunstâncias.

Assim que ela acaba de falar, alguém bate na porta. Dessa vez é Christina quem vai atender.

— Quem é?

— Amar — o meu ex-instrutor da Audácia responde.

Quando Christina abre, Amar entra e nos cumprimenta. Ele ainda está vestido com a roupa que foi à cerimônia, sem traje policial.

— Quatro, preciso que responda algumas perguntas. O certo seria levá-lo até a delegacia, mas Anthony disse que não pode sair...

— Tudo bem, eu respondo.

— Vou servir alguma coisa para vocês— minha mãe diz. — Christina, me ajuda?

Christina olha para Liv e depois dá um sorrisinho sínico para minha mãe:

— Claro. — E ela diz mais baixo: — Qualquer coisa para sair daqui.

— A Liv estava lá, ela pode ajudar. Ela salvou minha vida.

— Então venha aqui — Amar chama, e, quando ela se aproxima mais, ele cumprimenta: — Sou Amar, chefe da força policial.

— Olívia Williams, senhor.

Eu, Liv e Amar vamos nos sentar no sofá perto da TV, longe de Shauna, Zeke e Caleb.

— Preciso de um relato diferente do que todos estão me passando — Amar começa. — Tem várias pessoas que sobreviveram na delegacia, mas só conseguem falar sobre as diferentes formas que viram alguém morrer. Preciso de algo mais.

— Desculpe, mas eu não vi quase nada — digo. — Quando Richard foi baleado, eu corri para o meu escritório para deixar o prédio por uma saída secreta, mas quando cheguei lá...

Olho para Liv, seus olhos imploram para que eu não conte a Amar sobre o fato de ela ter matado o homem. Mesmo que por legítima defesa, mesmo que para me proteger, aquilo foi um crime.

—... Liv estava procurando a saída do meu escritório.

— Espere — Amar diz, indicando com a mão para que eu pare de falar. — Como ela sabia daquela saída?

Eu não estava esperando por essa pergunta, mas parece que Liv estava:

— Eu ouvi um homem dizer na hora da correria. Ele disse: “saia pelo escritório de Tobias” e eu não sabia o que estava acontecendo, não sabia, até então, que só estavam prendendo pessoas do Governo. Eu entrei em pânico e corri para o escritório dele.

Seus olhos se enchem de lágrimas. Ela é uma ótima mentirosa.

— Eu mostrei onde era a saída e expliquei que estavam deixando gente normal passar — digo, percebendo que também minto bem. — Ela se ofereceu para dar a volta e ver se tinha alguém esperando na saída do meu escritório, que eu só sairia quando ela batesse quatro vezes na portinha.

— Quando eu saí e dei a volta, tinham dois caras lá — ela continua —, mas parece que eles desistiram depois de uns minutos. Fui até lá e bati na porta quatro vezes para que ele pudesse sair e corremos até aqui.

— Se ela não estivesse lá eu teria saído sem hesitar e os encontraria lá. Provavelmente estaria morto.

— Sorte sua encontrá-la — ele diz. — Mas então você deve ter visto alguma coisa, srta. Williams. Algum rosto que possa descrever...

— Não, eu não vi nada — ela responde. — Eu saí correndo, ouvi alguns sons de tiros, pessoas caindo, mas não me lembro de nada.

— Tudo bem, tudo bem — Amar diz —, é normal, deve ter esquecido por causa do choque. Mas, se você se lembrar de alguma coisa, Quatro tem meu telefone. Fico feliz que estão bem.

— Obrigado — respondo.

Amar recusa o lanche que minha mãe iria servir educadamente, dizendo que tem muito trabalho a fazer.

Quando ele sai e fico sentado com Liv, ela pergunta:

— Quatro?

— Sim, parece estranho, não é? — Sorrio. — Você não era daqui quando a cidade era um experimento, era?

— Não — responde.

— Bom, nós tínhamos que passar por uma espécie de teste para enfrentarmos nossos medos. As pessoas geralmente têm vários medos, eu só tive quatro, uma coisa meio rara, então o nome ficou. Algumas pessoas como Christina e Amar não se acostumariam a me chamar de outro jeito.

— Entendi — ela diz. — Se não for invasão de privacidade, quem era Tris?

Sinto que me encolho um pouco ao ouvir seu nome novamente.

— Ela era minha namorada. Morreu um tempo depois de descobrirmos que nossa cidade era um experimento. Foi baleada.

— Sinto muito, desculpe ter perguntado.

— Não, está tudo bem. Quero dizer, não está, mas como você poderia saber?

— Realmente acha que a viu?

— Não mais — respondo. — Por um momento, eu tive total certeza, mas agora parece uma coisa tola.

— Eu entendo.

— Não, você não...

— Sim, eu entendo. Sei como é perder alguém que se ama. Toda a sensação de inutilidade, de saber que não pode salvar aquela pessoa. O sentimento forte de querer, de qualquer jeito, aquela pessoa de volta e se prender a qualquer mínima e tola esperança de que ela pode voltar, de que você vai acordar do pesadelo que é viver sem ela, de que a pessoa vai estar bem e ao seu lado, sorrindo, te abraçando e fazendo tudo como sempre fez, como se nada tivesse acontecido. Só que aí você percebe que aconteceu sim alguma coisa, e que não pode voltar atrás, que nenhum abraço, beijo ou sorriso vai ser igual. Eu sei como é chorar porque você falhou tantas vezes com uma pessoa e não pode corrigir esses erros. Você teria gritado menos, brigado menos, abraçado e beijado mais. Só que o buraco que essa pessoa preenchia vai ficar vazio, para sempre, sendo apenas um buraco onde você sofre diariamente.

Olho para ela, perplexo. Porque, pela primeira vez, eu sei que alguém sente o mesmo que eu, que me entende. Ela descreveu exatamente tudo que venho sentindo todos os dias.

Em nenhum momento, desde que Tris morreu, minha dor diminuiu tanto como agora.


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Notas finais do capítulo

O que acharam?? Comentem o que acham preciso tirar ou acrescentar, o que estão mais gostando na história, qualquer coisa! Até o próximo capítulo, xoxo.



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