Capítulo 12: Um Gigante no Mar

Durante quatro longos dias o majestoso Black Pearl navegou rumo ao Oceano Atlântico, tendo como companhia nocturna o fantasmagórico Holandês Voador. Até agora nada de estranho tinha aparecido diante dos olhos dos piratas. Ao quarto dia, a tripulação do Pearl trabalhava nos afazeres do navio, mas sempre atentos a qualquer sinal "sobrenatural".

- O que é que aconteceu à Alicia? – Jack controlava o leme. Lara encontrava-se encostada ao parapeito do convés superior, olhando para Alicia no convés inferior.

- Não sei. Depois da conversa que teve com o Will ficou naquele estado melancólico e quase não fala. – Lara demonstrava preocupação.

- Se calhar deu uma "tampa" à Alicia! – Jack sorriu, mas Lara olhou para si de forma dura e reprovadora.

- O Will não seria capaz disso. Pareceu-me boa pessoa. – Lara olhou novamente para Alicia.

Alicia encontrava-se apoiada no parapeito do navio olhando o movimento das águas à passagem do navio. A sua face não demonstrava o entusiasmo que sempre a caracterizou, pelo contrário. Will continuava a vir à superfície durante a noite, mas não aparecia no Pearl. A última vez que o vira tinha sido à dois dias atrás, quando este se encontrava no timão do Holandês e olhou para si.

- Não sei porque toda gente acha Will um verdadeiro cavalheiro! Não passa de um morto-vivo. – Jack resmungou.

- Que deve estar num enorme sofrimento. – Acrescentou Lara. – Ele ama a Elizabeth de verdade não é?

Jack olhou para Lara, pensou um bocado e fez uma careta.

- Que ele goste dela eu acredito. Mas que ela goste dele… - Jack olhou Lara pelo quanto do olho, fazendo esta se aproximar.

- Porque diz isso?

- Digamos que não acredito que Elizabeth fique 10 anos parada no mesmo sítio. E depois de certos rumores que ouvi… - Jack tornou a interromper a conversa, mas Lara encontrava-se perdida em pensamentos. – Passa-se alguma coisa?

- Ensine-me a lutar! – Exclamou deixando Jack bastante surpreendido. – Se vamos enfrentar algo tão poderoso, não quero ficar parada. Não quero ser apenas a donzela em apuros que se refugia e tenta não ser morta. Ensine-me a lutar com a espada e a disparar! – Disse num tom que mostrava clara determinação.

- Mr. Cotton! – Jack chamou o velho homem que apareceu num ápice acompanhado do seu papagaio. – Tome conta do leme.

Cotton obedeceu e Jack aproximou-se de Lara. Tão próximo que Lara sentiu a sua respiração.

- Já alguma vez pegou numa espada? – Perguntou.

- Não. – A verdade era essa. Lara sempre tentou tirar um curso de defesa pessoal, mas fora sempre proibida.

- Para lutar com uma espada como deve ser, demorará imenso tempo. No entanto, posso ensinar-lhe a trabalhar com uma pistola. – Retirou a pistola da bainha das calças e começou a rondar Lara.

- Está à espera do quê para começar? – Perguntou Lara bastante impaciente.

Jack começou a andar pelo convés superior como um cão quando fareja algo e dirigiu-se ao convés inferior.

- Aonde vai? – Lara pensou que este tivesse mudado de ideias, mas Jack fez sinal que esperasse.

Entrou na parte interior do navio, para surgir de novo, mas desta vez com uma maçã verde na mão e Barbossa atrás.

- Quem pensas que és para entrares sem pedir licença e roubares a minha maçã? – Bufou Barbossa.

- O capitão do navio. – Respondeu Jack rapidamente.

- Somos os dois capitães deste navio e por isso temos de nos respeitar! – Exclamou Barbossa.

- E eu respeito-te na medida do possível, só te peço a maçã emprestada! – Jack subiu as escadas e voltou para junto de Lara. Colocou a maçã no parapeito interior e chegou-se para Lara.

- Vai tentar atirar naquela maçã. – Jack deu a pistola a Lara e esta apontou-a à maçã. Jack colocou-se atrás agarrando na cintura de Lara, deixando-a sem jeito.

- Escusa de me agarrar. Eu não caio! – Disse sorrindo nervosamente. Apontou mais uma vez e concentrou-se. Tentou agarrar a pistola com firmeza e disparou. A maçã ficou feita em pedaços, deixando-a atónita.

- Bela pontaria! – Jack sorriu com o seu jeito sempre sedutor.

- Foi sorte de principiante! – Exclamou Lara. Mas o tiro já não lhe ocupava os pensamentos. Estavam tão próximos que os lábios se tocaram, mas o inevitável não chegou a acontecer. Novamente um berro interrompeu-os.

- Há qualquer coisa na água! – Gritou Alicia.

- Eu vou começar a matar todos que me interrompam! – Sussurrou Jack entre dentes.

- Há outras oportunidades! – Lara piscou o olho e deixou Jack com cara de parvo.

Alicia encontrava-se debruçada olhando nervosamente para a água. Pintel, Raguetti e Gibbs debruçaram-se também.

- Eu vi uma sombra. Era enorme! – Alicia tremia de uma maneira que não sabia explicar.

- Não se vê nada. Não será que confundiu com uma baleia? – Perguntou Gibbs.

- Não era uma baleia. Tinha uma forma esquisita… como se fosse humano. – Disse em voz baixa.

- Talvez o Holandês tivesse passado por baixo de nós! – Tentou Pintel.

- Não. O Holandês navega a grande profundidade. – A voz de Jack fê-los voltar a cabeça.

- Não será que foi imaginação tua? – Lara colocou a mão sobre o ombro de Alicia.

- Eu não imaginei! – Exclamou com um tom de desespero na voz. – E o Will disse que havia algo certo?

Alicia deixou a tripulação a coçar a cabeça. Mas as dúvidas começaram a se dissipar quando Barbossa os chamou.

- Jack! Vocês todos. – Chamou. – Há algo na água e não deve ser boa coisa. Apontou para o lado contrário e todos correram para o parapeito de bombordo. No meio da água um amontoado de algas e fios brancos ondulavam serenamente.

- O que será aquilo? – Barbossa olhava pelo binóculo, mas não distinguia nada, além do visível.

- Uma coisa é certa: não tem tentáculos! – Exclamou Jack mostrando-se radiante. No entanto a sua expressão mudou quando toda a tripulação olhou para si.

- O verde são algas, certo? Agora o branco, não entendo o que seja. Será uma anémona? – Perguntou Lara.

- Talvez sim, talvez não. – Murmurou Barbossa.

- Cabelos. – Alicia falou distraidamente.

- O quê? – Perguntaram Lara, Jack e Barbossa ao mesmo tempo.

- Aqueles fios brancos parecem cabelos! – Exclamou Alicia.

Mas ninguém teve tempo de processar a informação. O Pearl balançou violentamente e o amontoado de algas e "cabelos" ergueu-se das águas, deixando a tripulação completamente muda.

A figura que se encontrava à frente dos piratas era descomunal. Efectivamente, Alicia tinha razão. Os fios brancos eram mesmo cabelo que caía da cabeça gigante até às costas. Uma figura humana encontrava-se à sua frente, no entanto as características que ostentava não eram normais. Além da altura que fazia lembrar um titã, o homem gigante possuía tronco, cabeça e membros superiores humanos, mas do cabelo branco emaranhado em algas emergiam chifres. Os seus olhos não tinham cor, sendo totalmente brancos e a condizer com o cabelo comprido, ostentava uma grande barba branca.

- OK. Quando contar até três, fugimos! – Jack já se encontrava em posição de fuga, mas foi travado por Barbossa.

- E abandonar o Pearl? Mas é que nem penses! – Barbossa virou-se para a figura mítica e aterradora. – De certeza que com diálogo tudo se resolve. – Disse engolindo em seco.

Toda a tripulação tinha recuado e não sabia como proceder contra este perigo. O gigante não perdeu tempo e abriu a boca emitindo um aterrador rugido.

- Ok, prepara-te para deixar este Mundo! – Exclamou Lara que se mantinha encostada a uma encolhida Alicia.

- TUDO PARA OS CANHÕES! PEGUEM NAS ARMAS DE FOGO! AS ESPADAS NÃO ADIANTARAM DE NADA! – Barbossa berrou alto para a tripulação, que aos tropeções consegui se ordenar.

- Lara, Alicia, vocês não vão ficar aqui… - Jack ia começar mas Lara cortou-lhe a palavra.

- Nem penses. Eu não vou ficar encolhida num canto. – Retirou a arma a um pirata que passou rente. – Se é para morrer, então que seja a lutar!

Alicia concordou com Lara e ambas foram se colocar na proa do navio, deixando Jack parado no meio do navio.

- Porque é que as mulheres querem ser como os homens? – Perguntou.

- Elas não querem ser melhores que os homens. Simplesmente são melhores que tu! – Exclamou Barbossa. Com o mosquete na mão atirou em direcção ao gigante, acertando-lhe no braço. O ferimento quase não fez moça, mas o gigante devia ter sentido, já que emitiu outro rugido e ergueu uma espécie de cauda em forma de serpente. Bateu na água com tanta força que o navio ficou inundado.

Tiros de canhão e de armas de fogo tentavam lutar em vão. As balas eram como pipocas quando atingiam o gigante.

Passados alguns minutos de luta infrutífera, as raparigas tornaram a voltar para junto de Jack e Barbossa.

- Nada está a resultar. O melhor é abandonar-mos o navio e deixá-lo entreter-se com ele! – propôs Alicia perante o olhar horrorizado de Barbossa e Jack.

- Aquilo não é humano, por isso precisamos de ajuda divina! – Exclamou Barbossa.

- O queres dizer com isso? – Questionou Jack, mas Barbossa não lhe respondeu e desceu as escadas até ao porão.

De repente, o gigante ergueu uma das mãos e apanhou um dos piratas que gritava freneticamente. Lara disparou e acertou na mão pesada. O gigante deixou cair o homem, mas concentrou as atenções em Lara. Voltou a enfiar a mão no navio, abanando-o violentamente. Jack agarrou Lara, mas Alicia não teve a mesma sorte. Sentiu uma enorme pressão no corpo e quando olhou viu que tinha sido apanhada. O gigante levou-a até bem perto do seu rosto, e olhou demoradamente para Alicia que gritava e esperneava freneticamente.

No mesmo instante, outro navio rompeu as águas e chamou a atenção do gigante. Virou-se de frente para o Holandês rugindo de novo. Os canhões triplos do navio assombrado atingiram-no no abdómen e fizeram-no largar Alicia que caiu no mar. Ao princípio, sentiu a água fria gelar todos os seus membros, congelando-lhe as forças para voltar à superfície. Sentiu algo a envolvê-la e quando respirou de novo, viu o rosto de Will.

- Will, vieste! – Exclamou exausta.

- Parece que o meu destino é passar a eternidade a salvar-te! – Disse, sorrindo levemente.

Will nadou até ao Pearl puxando Alicia sem o mínimo sinal de cansaço. Subiram a bordo, vendo os estragos que os abanões tinham provocado. O mastro da mezena estava tombado e a tripulação não sabia o que fazer.

- Jack, temos de fugir daqui! – Exclamou Will.

- Obrigado pela dica, mas não vejo como isso seja possível.

- Cuidado, ele tem uma arma! – Lara gritou e apontou para o gigante. Este último erguia um enorme tridente dourado. Estava prestes a destruir o Black Pearl, quando uma voz feminina se fez ouvir.

- PARE! – a voz tinha vindo de uma figura feminina, que se encontrava de costas para a tripulação. Envergava um vestido em tons castanhos bastante esfarrapado e o cabelo negro caía-lhe pelas costas.

- Calipso? – Perguntou Jack com voz sumida.

- Jack Sparrow! Que saudades tinha desse rosto! – Disse a mulher virando-se de frente. Sorria sarcasticamente mostrando os dentes negros. – Mas se quiserem sair daqui com vida, o melhor é estarem calados. – Voltou-se de novo para o gigante.

- Pai, ouça-me uma vez na vida. – Pediu, chamando a atenção do gigante.

- O que queres, minha filha? – Perguntou com voz grave, que ecoou por todo o oceano.

- Quero que deixes em paz estes pobres coitados.

- Eles invadiram o meu território. Homem nenhum desafia um Titã e eles fizeram-no! – Exclamou erguendo a voz.

- Se me permite a intromissão… - Jack aproximou-se e fez com que Calipso lhe lançasse um olhar de morte. - … eu sou o Capitão Jack Sparrow, já deve ter ouvido falar de mim? – Perguntou orgulhoso.

- Nem por sombras. – Retorquiu o titã, deixando Jack bastante desconsolado.

- Pois bem. Nós não perturbamos o seu espaço e atacámos porque nos atacou também! – Exclamou Jack.

- Ousaram atravessar o meu domínio numa época proibida: quando a constelação Orion está plenamente visível. – O titã falou num tom severo.

- De certeza que podemos esquecer isso, pai! – Calipso falava numa voz doce. – Como disse, eles apenas tentam ajudar estas duas jovens a voltar para casa. Nunca quiseram perturbar o seu descanso eterno.

O titã ficou pensativo alguns segundos.

- Posso perguntar onde esses meros mortais e o encarregado de transportar almas… - o titã fitou Will, que se mantinha imóvel. - … vão?

- Em direcção ao Vértice Temporal, senhor dos mares! – Barbossa falou com certa vassalagem.

O titã voltou a ficar pensativo.

- Inúmeros tesouros vos esperam, piratas. Mas também outros perigos! – Alertou o gigante.

- Exactamente por isso, senhor meu pai! – Calipso olhava para todos os presentes. – Deixai-os passar e eles provaram a sua coragem enfrentando outros perigos à altura.

- Muito bem. Deixo-os passar. – Disse meio reticente. – Mas mais nenhum humano ousará me perturbar e só o faço porque pediste, Calipso. – O titã entregou um pequeno baú a Calipso. – Uma pequena pista sobre o próximo perigo. – Depois desapareceu nas águas, fazendo os navios balançarem.

- Como é que sabias que estávamos em perigo? – Jack perguntou a Calipso.

- Ora, vocês não sabiam? – Perguntou com um sorriso e encostando-se a Barbossa. – Ele chamou-me!

- Credo a mulher tem cá um gosto em homens! Primeiro o Davy Jones e agora o Barbossa. – Sussurrou Alicia a Lara.

- Vocês gostam tanto de se meterem em confusões! Foi uma sorte terem se metido com o meu pai! – Exclamou Calipso.

- Você é filha de um titã? – Perguntou Lara.

- Sou filha do titã Oceano, senhor do Oceano Atlântico e de todos os rios que correm no Mundo, e de Tétis, uma titânide. – Esclareceu Calipso.

- Esquecendo os laços familiares complicados, o que é isso que Oceano te deu? – Jack estava curioso em relação à caixa que Calipso tinha nas mãos.

Calipso abriu-a e retirou de lá um pedaço de pergaminho amarelado.

- "Aquele que for marcado, pelos sete pecados será fustigado". – Leu em voz alta.

- O que quererá dizer? – Perguntou Lara.

- Não sei. Mas quase de certeza tem a ver com os sete pecados mortais! – Explicou Jack, encolhendo os ombros.

Continua…