Escolhas...! escrita por JL Yújó


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Tenham uma excelente leitura!!
...
:D



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*

Porque eu estou aqui? O que estou fazendo? Como cheguei a isso?

***Flash Back on**

- E então

- Deu... P-Positivo!

Rafael olhou-me confuso por um momento, mas seu olhar castanho, que tanto me enfeitiçou há pouco mais de quatro meses, agora demonstrava frieza e um pouco de medo. Eu podia sentir meu corpo estremecer, talvez do choque por descobrir uma gravidez não desejada e pouco oportuna.

- Você não pode levar isso adiante! – as palavras dele tiraram-me do meu transe e meu coração começou a bater rápido.

- O que quer dizer? – indaguei com um nó na garganta e a boca seca.

- Se meus pais descobrirem irão cortar a minha mesada! – ditou começando a andar em círculo na sala do apartamento dele, que era bancado por seus pais.

- Estamos falando de uma vida, Rafael! Como pode falar assim? – mesmo que eu estivesse dando esse sermão nele, eu mesma não conseguia pensar naquele amontoado de células como meu filho.

- Pare de fazer cú doce, Sabrina, vai dizer que não está pensando a mesma coisa? – indagou brusco. Apenas desviei o olhar. Não poderia negar. – Está vendo! – exclamou vitorioso. Senti lágrimas queimarem meus olhos e ele suspirou. – Estamos no segundo ano da faculdade, Sabrina, de fato, mal acabamos de iniciar este ano! Teremos toda uma vida pela frente! Eu não quero desperdiçar meu futuro com uma criança que eu nem vejo como meu filho!

O que eu poderia responder? Meu desespero me fez tomar a decisão que víamos como a melhor para todos... Exceto para a criança que não tinha culpa de nossa irresponsabilidade.

- Está bem, Rafael, farei o aborto! – declarei, enquanto uma lágrima solitária descia por minha face.

***Flash Back Off***

Olhei em volta. O ambiente era estéril, igual o meu coração naquele momento. Na sala de espera, perto de mim, havia mais três jovens. Nenhuma aparentava querer estar ali. E, assim como eu, estavam sozinhas.

A enfermeira, com aparência medonha, chamou um nome... Não era o meu. Soltei a respiração que nem percebi que havia prendido. O nó que apareceu em minha garganta há três dias pareceu apertar um pouco mais, dificultando minha respiração.

Olhei para os cartazes que estavam em exposição nas paredes, que um dia foram brancas. Um deles chamou a minha atenção. Era de um pequeno bebê apoiado e dormindo na palma de uma mão, a frase que acompanhava o cartaz: Não me mate, não tenho culpa por ter sido gerado! Diga não ao aborto!

Parecia até uma ironia do destino ter um cartaz assim logo ali, naquela clínica clandestina.

Cedo demais, a mesma enfermeira voltou, mas não havia nenhum sinal da jovem de antes.

- Sabrina Roberta Reis!

Levantei-me trêmula e dei um passo à frente, mas quando ergui meu pé para dar o seguinte meu corpo não obedeceu. Comecei a chorar sem perceber e saí correndo porta a fora. Corri até meu corpo protestar e exigir que eu descansasse.

O que eu faria agora? O Rafael não iria gostar disso, mas eu não me importava mais com ele.

Enquanto caminhava até o meu dormitório no campus da faculdade tomei uma decisão: Eu teria essa criança e a entregaria para a adoção! Não iria negar-lhe o direito à vida, mas não ficaria responsável por ela, tampouco.

No dia seguinte, informei a minha decisão ao Rafael. Ele apenas me mandou fazer o que quisesse, desde que eu não o perturbasse mais com aquilo.

Passei dias me perguntando o que eu vira nele afinal. Por fim, decidi que eu deveria estar carente... Muito carente para sair com ele.

Eu contei para os meus pais sobre a gravidez, mas antes que eu revelasse que iria dar a criança para a adoção meu pai já foi me expulsando de casa e me insultando de nomes que prefiro nem pensar mais. Doeu muito. Eles eram os meus heróis, deveriam ficar ao meu lado nesse momento que mais preciso deles.

Felizmente, eu não dependia deles para a faculdade, pois eu tinha uma bolsa de estudos, entretanto, tive de sair do dormitório do campus. Crianças não eram permitidas lá.

Porque ninguém entendia que eu não iria ficar com esse bebê?

Mas tudo bem, consegui um apartamento pequeno, tinha apenas um quarto, sala/cozinha e um banheiro, mas era barato e perto da faculdade. Também consegui um emprego de meio período como garçonete em uma lanchonete perto do apartamento. Eu não iria sentar e desistir. Iria entregar o bebê para ser criado por uma boa família, terminarei o curso de administração, farei minha pós-graduação em marketing e vencerei na vida.

Eu serei uma vencedora!

Os meses foram passando e logo após a fase dos enjôos, que eu quase soltei fogos quando acabou, veio à fase de comer de tudo que me aparecer na frente. Eu tomei até suco de melancia e eu detesto melancia.

Eu já estava de seis meses. Rafael me ignora completamente e finge que não me conhece. Há dois meses fiquei sabendo que foram perguntar a ele se o bebê que eu estou esperando era dele, o cafajeste teve o desplante de dizer que eu era uma puta que nem sabia quem era o pai. Ele foi o primeiro com quem transei... E o último, também. Argh!

Homens são a escoria da Terra! Quando o meu bebê nascer irei ensiná-lo que... Espere! Não é meu bebê e eu não irei ensiná-lo nada!

Esses pensamentos perturbadores vêm sempre, sempre invadindo a minha mente no último mês, precisamente, desde que o bebê começou a mexer e chutar. Eu estou fazendo todo o pré-natal direitinho, aos cinco meses pude vê-lo pelo ultrasson, era um menino. A médica pediu para que eu dissesse o nome para que ficasse impresso na foto do ultrasson e eu, por impulso, respondi: Ângelo.

Não sei se fiz bem ou mal, mas desde então, sempre que eu me pego conversando com a minha barriga estou dizendo: Eu não posso mais ficar em pé o dia inteiro, Ângelo, acho que você está ficando muito pesado! Ou: Pare de chutar, Ângelo, a mamãe precisa dormir!

E em todas essas vezes sinto meu coração bater mais rápido e uma estranha felicidade me envolver.

Aos oito meses minha médica avisou que o nascimento estava previsto para a semana do natal, o que seria bom, pois as provas já teriam acabado. Ângelo seria o meu presente de natal, mesmo que tivesse que entregá-lo para outras pessoas. Eu sei que não posso criá-lo com a minha atual condição financeira. Isso seria cruel para uma criança. Quando ele se fosse eu estaria sozinha.

As vésperas de eu completar os nove meses, recebi a notícia de que Rafael sofrera um acidente de carro e queria me ver no hospital. Seu estado era crítico. Pensei em não ir, mas minha consciência não me deixou em paz. Assim que entrei no hospital fui direto ao balcão de atendimento e lá me informaram para onde deveria ir.

As salas de espera em hospitais particulares eram um verdadeiro luxo: poltronas confortáveis, paredes impecavelmente brancas, um quadro que deveria valer mais do que eu ganho no mês todo. Mas eu não estava interessada nisso naquele momento. Vi um casal chorando abraçados, deveriam ter por volta dos cinqüenta anos de idade, mas suas aparências eram impecáveis ou deveriam ser desde que ambos estavam sofrendo com o acidente do filho. Esse pensamento me fez acariciar a minha barriga dilatada, como se com isso pudesse proteger Ângelo de todos os males do mundo. Também havia um rapaz muito parecido com o Rafael, sentado em uma das poltronas do canto. Ele pareceu notar minha presença enquanto o observava. Ele franziu o cenho quando percebeu meu avançado estado de gravidez. Também percebi que ele era o David, irmão mais velho de Rafael. Vimo-nos umas duas vezes quando eu, ainda, namorava o seu irmão.

- Sabrina, que bom que pôde vir! – ele levantou-se, como se forçasse a si mesmo a sair de um transe. – Sinto muito por incomodá-la em seu estado atual! Você veio com o pai do bebê?

Apenas neguei com um meneio de cabeça. Pelo visto, Rafael não contara para a família que eu estava grávida dele. Típico. Pigarreei.

- Você me ligou e pediu para que viesse até aqui! Quão grave é o estado do Rafael? – indaguei com um aperto no peito. Ele era um cafajeste, mas ainda era o pai do meu filho.

- Os médicos disseram... Eles disseram que... – David respirou fundo para poder continuar falando. – O Rafael queria te ver uma última vez, Sabrina! – ele ditou por fim e recomeçou a chorar.

Eu não pude segurar algumas lágrimas de minha própria autoria. Ângelo pareceu sentir a minha tristeza e deu-me um chutinho como se me dissesse que ficaria tudo bem. Sorri com esse pensamento e respirei fundo.

- Onde ele está? – indaguei um pouco mais recuperada.

David tomou um pouco de água e respirou fundo, quando se sentiu capaz, levou-me por todo o corredor até uma sala, onde eu tive de passar por um procedimento de esterilização e vestir algumas roupas de hospital por cima das minhas como a touca, pró-pés, luvas e uma bata. Pouco depois, seguimos para a UTI.

Rafael estava todo machucado. Seus braços, tórax e pernas estavam enfaixados. Uma mascara de oxigênio o ajudava a respirar e, apenas, o “bip” contínuo dos aparelhos mostrava que ele ainda estava vivo. Nem de longe lembrava o rapaz vivaz e engraçado que conheci há pouco mais de um ano.

Vi seus olhos abrirem-se devagar, como se percebesse minha presença.

- S-Sabrina... – murmurou por baixo da máscara. Aproximei-me da cama, mas não ousei tocar-lhe em parte alguma. Não havia onde tocar sem machucá-lo mais.

- Estou aqui, Rafael!

- Perdoe-me! Perdoe-me! – murmurou repetidas vezes. Como se fosse um mantra.

- Está tudo bem, Rafael! Não há nada para perdoar! – ditei para acalmá-lo. Meu rosto estava molhado novamente devido às lágrimas. David havia se aproximado pelo o outro lado da cama.

- O que ela teria de perdoar, Rafael? – David exigiu suavemente.

- E-Eu não a apoiei q-quando ela mais precisou de mim! Eu n-neguei m-meu próprio f-filho! – respondeu fraco e choroso.

- Seu filho?! – David indagou confuso e encarou-me, depois encarou meu ventre e eu pude ver o conhecimento brilhar em seus olhos castanhos.

- Sim... Meu! Cuide deles, David... Proteja Sabrina e meu filho! – suas últimas palavras saíram ofegantes e sofridas. Os aparelhos começaram a apitar como loucos.

Eu ouvia a voz desesperada do David ao longe, chamando pelo irmão. Sentia meu corpo dormente. Não sei como, mas consegui sair do hospital sem sofre qualquer acidente. Tomei o ônibus de volta para a minha casa e em nenhum momento eu chorei. Assim que entrei em meu pequeno apartamento, olhei em volta e fui sentar em meu único sofá de dois lugares. Ângelo chutou a minha barriga e isso me trouxe de volta a realidade. Rafael havia acabado de morre à minha frente. Meu filho nunca teria a oportunidade de conhecer o pai.

Passei os braços, o quanto pude, em volta de meu ventre dilatado e chorei.

Chorei pelo o que poderia ter sido. Chorei por meu bebê já ser um órfão de pai. Chorei por uma vida tão jovem ter sido ceifada de uma hora para outra.

Acordei com meu corpo dolorido. Eu havia pegado no sono em meu sofá. Olhei ao meu redor, as luzes estavam todas apagadas, a única iluminação era a que vinha de fora e entrava pela janela. Os acontecimentos do dia invadiram minha mente e eu suspirei. Havia chorado até dormir.

Levantei-me e fui me arrastando para o banheiro tomar um banho. Depois fui preparar algo para comer, para, só então, ir dormir de verdade. Meu último pensamento antes de me entregar ao sono foi: Eu não irei entregar meu bebê para outras pessoas criarem! Ângelo era meu... E apenas meu!

Os dias foram passando. Fui me despedir uma última vez de Rafael. Seu enterro estava repleto de familiares, amigos e conhecidos, mas eu não fazia mais parte daquilo. Pelos atos de Rafael eu não tinha mais amigos na faculdade, realmente, minha única família era Ângelo e eu estava bem com isso.

David implorou-me para permitir que ele e seus pais pudessem fazer parte da vida do meu filho, ainda por nascer. Não pude negar. Tanto por eles quanto por Ângelo, meu filho merecia ter alguém mais por ele, além de mim.

O dia mais importante da minha vida havia chegado, e não poderia ter sido em um dia melhor. 25 de dezembro, às duas horas da manhã, comecei a sentir as primeiras dores que anunciaram que meu bebê estava a caminho. Eu havia passado toda a véspera com um incomodo na base da coluna, mas não dei muita importância, bem, não posso culpar meu filho por rebelar-se em plena madrugada, então. Afinal, ele passou todo o dia anterior tentando me avisar.

Sem saber o que fazer, liguei para o David. Ele socorreu-me rapidamente, mas Ângelo só veio nascer às seis e quinze. Ele era a minha estrela da manhã de natal.

Se eu já não tivesse decidido ficar com o meu filho, teria decidido quando o peguei pela primeira vez nos meus braços. Ele era o bebê mais lindo que jamais vira em toda a minha vida. Calmo, porém, exigente quando com fome. Um verdadeiro anjo.

Sim, meu primeiro presente de natal foi a melhor escolha que eu poderia ter tomado. Esse anjo iluminou e deu conforto não só a mim, mas aos familiares de Rafael, também.

**

Trinta e cindo anos depois...

*

- Aqui, mamãe, pegue-a!

Eu tinha lágrimas nos olhos de tão feliz que estava. Eu segurava nos meus braços um pequeno pacotinho envolto em rosa. Tão linda. Eu estava sendo avó pela segunda vez, e não cabia em mim de felicidade e orgulho.

Meu neto mais velho, Rafael, tinha cinco anos e era tão encantador quanto o pai em sua idade. Uma verdadeira cópia de Ângelo e do avô. Cabelos castanhos escuros, tom mais bronzeado de pele, porém, os olhos do meu filho e neto eram verdes claros como os meus.

Depois que decidi ficar com o meu filho, não vou mentir e dizer que foi fácil, porque não foi. Noites em claro cuidando de uma cólica ou febre por estar nascendo um novo dente. Freqüentar as aulas, mas nunca tirar da cabeça se ele estava bem, pois o deixava com a avó, que era um encanto com nós dois.

Continuar a trabalhar, mesmo com a ajuda do David e de seu pai, não queria ser sustentada. Queria mostrar a todos que poderia cuidar de mim e de meu filho.

Repito, não foi fácil. Teve momentos em que pensei em desistir, mas, então, respirava fundo e olhava para o sorriso feliz de Ângelo, que sempre ficava mais feliz em nosso pequeno apartamento de um quarto do quê na enorme mansão dos avos paternos.

Meus pais nunca voltaram a falar comigo, com o tempo acabei superando, mesmo que vez ou outra sentisse meu coração doer.

E, hoje, aqui estou eu. Uma mulher de cinqüenta e um anos, bem sucedida na carreira que escolhi. Sou considerada a melhor no ramo da propaganda, por isso, o presidente da empresa onde trabalho ofereceu-me uma sociedade há dez anos.

Um filho que decidiu seguir na mesma área de trabalho que a minha e agora assumiu o meu lugar na sociedade da empresa, permitindo que eu tivesse o meu merecido descanso, mas ele sempre me consultava sobre uma campanha ou outra. Ângelo casou-se com uma jovem que é um amor, chamada Melissa, há pouco mais de seis anos e juntos têm dois filhos: Rafael Ângelo Reis e a pequena que está em meus braços, que por sinal não sei o nome, ainda.

- E, então, como irão chamar essa princesinha?

Meu filho intercalou um sorriso amoroso com a esposa, que parecia bem cansada depois de dar a luz, mas, ao mesmo tempo, irradiava vida e felicidade. Rafael estava sentado ao meu lado no sofá do quarto particular, olhando para a irmãzinha com um sorriso acolhedor.

Ambos voltaram seus olhares para mim e responderam ao mesmo tempo:

- Sabrina Melissa Reis!

Senti meu coração falhar uma batida, mas logo disparou inundado de felicidade. Encarei o rostinho adormecido de minha neta e... Minha xará.

- Seja bem-vinda a família, pequena Sabrina! – declarei com a voz embarcada, porém, com um sorriso que demonstrava todo o meu orgulho.

*

A vida é feita de escolhas, algumas boas outras ruins, mas no fim são elas que irão definir o seu futuro. Minhas escolhas podem ter me feito sofrer no momento em que as tomei, mas foram elas que me levaram até esse momento precioso e, agora, eu posso declarar sem arrependimentos: Valeu a penas cada uma delas!


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Notas finais do capítulo

Gostaram?
..
Espero que sim!!
...
Xerim!! =^-^=



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