Yan Yan ajoelhou-se rente ao seu baú e indicou a Yu Mai que fizesse o mesmo.

Ela o abriu novamente, desta vez, mostrando cada segredo que guardava naquele lugar.

– Este anel, eu ganhei do meu primeiro cliente – disse orgulhosa, mostrando uma elegante joia libanesa, que ostentava um pesado jade em seu centro.

– Estas pulseiras de ouro eu ganhei quando me apresentei pela primeira vez.

E assim, sucessivamente, Yan Yan passou horas fazendo a cabeça da pequena Yu Mai, tentando-a com os numerosos presentes que havia recebido ao longo dos anos naquele lugar. Anéis, colares, brincos, tiaras, pulseiras e tornozeleiras, além de seus trajes bordados a ouro, feitos da mais fina seda indiana e utensílios de porcelana fina.

– Você pode ganhar tudo isso Mai, afinal, é para isso que está aqui.

Yu Mai pensou em repreender Yan Yan novamente com um ‘’Você não me entende’’ mas decidiu que não queria ouvir mais histórias tristes. De certa forma, queria cultivar seu drama sozinha, sem mais ninguém.

Yan Yan chamou sua atenção para uma maleta cheia de substâncias coloridas aberta em sua cama.

– Depois de nos perfumarmos e antes de nos vestimos cuidamos da maquiagem. Mai, você tem que saber que os homens gostam de olhos marcantes, mas, mais do que isso, gostam de lábios marcantes.

– Lábios? – perguntou curiosa.

– Sim, percebeu que todas aqui têm os lábios pintados? Os homens acham isso atraente, eles querem que você deixe sua marca na pele deles. Eles querem sentir a sua boca.

– Certo.

Então a cortesã lançou um olhar debochado para ela.

– Você já beijou alguém, Yu Mai?

– O queee? Mas é claro que não! – repreendeu imediatamente – Que tipo de pessoa acha que eu sou?

– HAHA! – riu a mulher – Irá ser um desastre... Mas, não se preocupe, tente o impressionar com a sua música. Ele vai acabar não ligando para os seus beijos desastrosos.

Yu Mai deu de ombros e voltou à atenção nas próximas dicas.

Um divertido acorde de harpa foi tocado em um tom alto, indicando que a hora do almoço havia chegado.

– Para onde devemos ir agora, Yan Yan?

– Para a casa de chá.

Enquanto elas seguiam para o local, Yu Mai perguntou:

– Nós podemos comer lá?

Yan Yan riu.

– Do contrário dos quartos, podemos usar a casa de chá para nossas refeições. Nós também sustentamos esse bordel, sabe?

Encontraram o salão já cheio. Era tão diferente da mistura silenciosa de perfume e arte que Yu Mai vira mais cedo. Ficou um pouco desorientada com tantas pessoas, mas se habituou rapidamente, sentando a um canto com Yan Yan e mais outras duas garotas.

– Meu Guzheng¹ está quebrado – reclamou uma cortesã de vestido verde – Aquele cliente horrível... Arrebentou-lhe todas as cordas!

E então Mai observou a outra, de quimono amarelo responder:

– Dome os clientes eufóricos com bastante vinho, Ming, eles vão lhe pagar sem ter feito nada!

E então Yan Yan largou seu chá de jasmim para se intrometer na conversa.

– Perceberam que temos uma novata aqui? – perguntou mal humorada.

Li e Ming, as duas cortesãs em vermelho e verde deram um olhar avaliador de poucos amigos na jovem Yu Mai.

– Eu a vi na casa de banho mais cedo. É essa que tem medo de mostrar o corpo? Hahaha! – disse Ming, desafiadora.

Yu Mai piscou os olhos lentamente, contemplando com raiva o rosto pintado da cortesã.

– Me desculpe se não nasci para ser uma prostituta como você.

Yan Yan se surpreendeu, mas depois de alguns segundos, repreendeu Yu Mai com um forte peteleco ao pé da nuca.

– Não seja mal-educada!

A mulher ofendida levantou-se, olhando a jovem com desprezo. Deixou a mesa rindo da garota.

– Desculpe-nos Li, ela é só uma novata... - disse Yan Yan, cansada.

A mulher riu, admirada com a coragem de Yu Mai.

– Uma cortesã rebelde é boa para os negócios! Além do mais, Ming anda muito rabugenta ultimamente – disse com um tom divertido, dando um trago em seu cachimbo chinês.

– Ela deveria admitir de uma vez que não é a cortesã que dá mais lucros por aqui – falou Yan Yan, tomando um pouco de chá.

Yu Mai fez o mesmo, tentando manter-se calma, alheia a mais provocações.

– Qual o nome da novata, Yan Yan?

– Yu Mai – respondeu – Ela era de uma família rica.

Quando Mai percebeu que era o assunto da conversa se sentiu um pouco desconfortável. Encheu a boca de arroz e peixe para que a ela não fosse perguntado nada.

Li entendeu o recado e também não falou mais sobre isso.

O almoço correu pacífico, com Yan Yan e Li conversando sobre maquiagem e truques para ganharem mais dinheiro dos clientes. Algumas vezes Ming e sua trupe de seguidoras passaram pela mesa de Yan Yan rindo de Yu Mai, porém nada mais de interessante aconteceu.

Depois da refeição, ambas voltaram em silêncio para o dormitório. Yan Yan deixou a garota dormir, e enquanto isso começava os preparativos para a gloriosa estreia de Yu Mai, a exímia tocadora de pipa, vinda das frias florestas de cerejeiras.

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¹ - Guzheng = Harpa chinesa.