Ela poderia nunca se lembrar de mim, mas eu sempre me lembraria dela...

O que foi isso? O que foi essa imagem que acabou de passar em minha mente? Era uma garota? Sim, era. Eu já a vi antes? Não sei...

Voltei a encostar a cabeça no banco onde eu estava deitado, Nora estava ocupada e como eu estou sem um Shinki não posso trabalhar.

Ao cair à noite eu entro em um dos tempos do velho Tenji, passei o dia todo tentando lembrar quem era a garota, mas só o nada vinha a minha mente.

Gostaria de lembrar quem é você... Esse foi meu ultimo pensamento antes de ser tragado para um sono pesado, talvez eu conseguisse me lembrar...

Eu havia bebido muito, isso era fato. Eu não conseguiria voltar para casa desse jeito. Encontrei uma festinha de crianças riquinhas no parque, se não tivesse muitos bebês seria um bom local para eu parar. Havia muitos brinquedos uma casinha era o único que não tinha uma criança dentro ou por perto. Ficarei por aqui mesmo, não deve aparecer nenhuma criança por aqui. Pensei comigo mesmo, entrei na casinha e me deitei, cochilei rapidamente quando voltei a acorda o céu estava mais escuro do que antes, isso significava uma passagem de tempo moderada, estávamos perto do final da tarde. Minha barriga roncou, eu não comia havia alguns dias.

- Você parece que esta com fome – Virei bruscamente, finalmente notando uma garotinha de cabelos castanhos escuros e olhos entre rosa e roxo, ela sorriu para mim. – Quer? – Falou oferecendo um sanduiche que estava no prato que ela segurava.

Não respondi, apenas peguei o sanduiche, ela voltou a sorrir e levantou e saiu.

- Eu deveria te agradecido – Murmurei enquanto terminava de comer o sanduiche, fazia tempo que eu não comia algo tão bom e fresco.

O pequeno sanduiche não havia enchido meus estomago, mas já era um bom começo...

- Eu voltei... – Falou a garotinha voltando a entrar e me assustando novamente. – E eu trouxe comigo isso... – Falou estendendo as mãos e nelas estava um grande prato cheios de coisas: sanduiches de vários sabores, alguns cup cakes coloridos e alguns docinhos. Ela me entregara o prato e puxou outra coisa, três latinha de refrigerante, me entregou duas e ficou com uma. – Não diz para minha mãe que eu bebi refrigerante, ta?

Confirmei com a cabeça, voltei a comer e ela ficou me observando, quando terminei ela perguntou:

- Estava bom?

- Você não comeu?

- Minha mãe não deixa.

- Então...?

- Sim estava uma delicia. – Respondi e seus olhinhos brilharam.

- Onii-san, por que você esta dormindo aqui?

- Eu estava muito cansado para andar até a “minha” casa. – Ela não notou a ironia que eu usei quando “minha casa”.

- Por que não pediu para o seu papai vim te buscar?

- Longa história...

Ela não falou mais nada, mas continuava a me observa, então eu observei ela também. Eu não sou nenhum lolicon, mas ela é linda! Os cabelos castanhos que estão mais ou menos na metade das costas esta ornamentados com um grande laço rosa. Usando um vestido cheio de babados (também rosa), com uma meia calça branca e uma sapatilha também rosa. Os olhos se destacavam no rosto, um tom que combinava com a roupa e com ela, bochechas coradas e um rosto rechonchundinho. Daqui a alguns anos estaria destruindo muitos corações...

- Sua mãe deve gostar muito de rosa... – Comentei.

- É ela gosta...

- Quantos anos você tem?

- Estou completando cinco anos hoje.

- Ah, então você é a aniversariante. – Ela confirmou.

Voltamos a ficar em silencio, ela ficou tão quieta que parecia que eu estava sozinho.

- Você não parece esta feliz. – Comentou.

- Você também não e é o seu aniversario. – Revidei.

- É... Eu não queria meu aniversario aqui... Queria ter ido para o zoológico com o papai, a mamãe e o Onii-chan.

- E por que você não disse isso para eles?

- Mamãe não ia ficar feliz. – Falou olhando pela janela.

Então ela é do tipo que pensa primeiro na felicidade do outro do que na dela...

- E a sua felicidade, como fica? – Perguntei. Uma garota tão pequena não deveria carregar tanto peso em costas tão pequenas.

- Eu fico feliz com a felicidade dela.

É por causa de pessoas como ela que eu tenho ainda mais vontade de ser reconhecido como um Deus. Pensei.

- Onii-san, você não tem uma pessoa assim? – Perguntou.

- Não tenho... – Apartei minha mão direita contra meu peito, estava vazio de afeto e de carinho, algo que eu nunca recebi de ninguém...

- O coração do Onii-san está todo despedaçado e eu consigo ver isso, e isso me deixa triste, dói muito no coração da Hiyori... – Sussurrou a garotinha de olhos gentis - O Onii-san é sozinho, isso é triste... – Ela se aproximou de mim e sentou ao meu lado. – Se você quiser, eu ficarei com você. Cuidarei de você e alimentarei você. – Rimos disso durante um tempo.

- Você acha que eu sou um bicho de estimação? – Falei fingindo magoa. – Eu sei que eu sou lindo e tudo mais, mas eu ainda não tenho nem orelhas e nem rabo de gato.

- Você poderia ser um gatinho, Onii-san ai eu pediria para mamãe para cuidar de você.

- HIYO-CHAN! O QUE VOCÊ ESTA FAZENDO AQUI? - Um rapaz apareceu na entrada da casinha.

- Eu to aqui conversando com o Onii-san. – Falou ela apontando para mim. Ele olhou em minha direção e não viu nada, obvio.

- Hiyori... – Ele suspirou e já ia embora. – Se você não queria ficar na festa era só avisar. – ele suspirou e foi saindo - Eu volto mais tarde.

- Eu não estou mentindo! Por que ele fingiu que não pode te ver? – Ela ficou meio emburrada e as bochechas rosadas passaram para um vermelho.

Ela levantou e sentou no meu colo e falou:

- Ei Onii-san, que tal se fizermos um acordo? – Ela encostou a cabeça no peito e suspirou. – Eu amo o cheiro do Onii-san. É quente.

As palavras dela me deixaram quentes, mas não de uma forma maliciosa e sim carinhosa, meio como se ela fosse uma mãe que diz palavras gentis para um filho que foi machucado. Era como se ELA fosse a mais velha, a adulta. E eu me sentia confortável com ela, era como se a conhecesse desde sempre.

- Qual acordo? – Finalmente respondi, apoiando minha cabeça em cima da dela o que a fez rir.

- Que não importa o que aconteça, vamos ficar juntos. Que mesmo que passem anos você vai vim me encontrar. – Começou.

- Você irá aparecer no momento que eu mais precisar e virá me salvar. – Completei.

- Onii-san você não precisa mais machucar ninguém, eu estarei com você para todo sempre, não deixarei que machuquem mais você.

Segurei seu rosto entre suas mãos e senti as lágrimas escorrendo pelo meu rosto.

- Suas palavras me deixam muito feliz, Hiyori, mas infelizmente não será possível.

- Por quê?

- A mente humana, principalmente a memória, é algo fácil de ser modificado, nada fica para sempre. – Suspirei. – Você vai me esquecer, porque eu não nasci para ser lembrado, eu nasci para ser esquecido.

- Mas você não quer ser esquecido.

- Não, não quero. – Passei a mão em seus cabelos. – Eu sou um teimoso, por isso que nos últimos quinhentos anos eu estive lutando para não ser esquecido, para ser lembrado, mas os Deuses da Calamidade são fadados a esse fim, o esquecimento.

Ela ficou encolhida no meu colo e poucos minutos depois eu escutei o som de seu choro.

- Sinto muito Hiyori. - Eu não deveria ter dito essas coisas, mesmo com tanta maturidade ela é ainda uma criança, mas pelo menos eu sei que logo ela ira esquecer-se de mim... Esse pensamento me apertou o coração, mas era a verdade, logo a pequena garota no meu colo esqueceria se de mim.

- Eu... Nunca... Esquecerei... Você... – Ela falou entre soluços. – Mesmo que a minha memória falhe por um tempo, eu estarei ao seu lado, Onii-san. Irei procurar por você mesmo sem saber, estarei te procurando para sempre. E no dia que eu te reencontrar eu chamarei seu nome e você saberá que eu estou ali para tirar você dessa prisão invisível que você fez em volta de si. – Ela finalizou sua frase me dando um leve beijo da bochecha.

Ambos caímos no sono e quando eu acordei, ela já não estava lá.

Com um aperto no coração eu me levantei e vi que a festa já havia acabado, deveria ser umas nove da noite.

Um pouco antes de sair eu voltei para onde estava, e no chão havia duas coisas, um pedaço de papel e um tecido meio azulado, mas um azul bem clarinho. Peguei o papel e nele ela havia escrito algumas coisas. Ela tem uma caligrafia bonita, bem melhor que a minha.

Para o Onii-san.

Eu tive que ir embora.

Eu te disse, não fique com medo, eu nunca irei te esquecer. Pode demorar um tempo, até vários anos, mas eu voltarei para ficar com você. Porque o Onii-san não merece ficar sozinho e a Hiyori fará de tudo para que ele não se sinta mais solitário.

Com amor, Hiyori.

- Eu irei te esperar Hiyori...

Acordei abruptamente, lembrando de todo o sonho... Será que foi sonho?

Passei a mão no pescoço onde ficava o meu “cachecol fofinho”, o mesmo do sonho só que mais velho. Na verdade eu não lembrava como havia conseguido ele...

- Preciso trabalhar! – Ao longo do dia eu fui esquecendo o sonho, até quase não lembrar mais dele.

Fui para uma das ruas principais colar cartazes com a foto de Ue-sama – o gato de um garotinho que havia feito o pedido para que eu achasse o gato.

Continuei a gritar por ele na rua e depois atravessei para colar mais cartazes do outro lado, quando eu passei na frente de um trio de colegiais que riam sobre a mãe de uma delas, a terceira estava mais afastada e quando eu passei ela olhou para mim...

.. Foi à única coisa que eu consegui pensar, mas a minha atenção foi tragada para o gato branco com machinhas pretas que estava sentado na pista.

- UE-SAMA! - Corri em direção a ele vendo que um ônibus se aproximava, mas sem me preocupar – até por que eu não posso ser machucado por ele.

Senti um empurrão nas costas que me fez cair na calçada.

Olhei para a garota que estava gritando ao meu lado. “A garota de antes!”.