Muitos diziam que eu era abençoada por Deus, por ter conseguido escapar várias vezes da morte. Já outros, diziam que eu era um demônio, por conseguir me comunicar com os lobos. As que diziam que eu era abençoada, também falavam que as outras pessoas estava com inveja, por eu ser uma "abençoada", e por isso inventavam mentiras ao meu respeito.

Eu já acho que isso é uma maldição. Eu nunca quis essa coisa comigo. Eu já sou estranha o bastante sem ele, o que dirá com ele. Além do mais, ele é cruel, arrogante, mesquinho, e várias outras coisas. Ele destrói tudo que está em seu caminho, ou seja, no meu caminho. Tudo que o impeça de ser meu dono ele destrói! Meus amigos, minha família, e qualquer pessoa que se aproxime de mim. E não adianta quantas vezes, e de quantas maneiras eu tente me matar, ele sempre está ali pra me salvar. Por isso que eu ganhei a fama de "abençoada", mas ele só me salva porque se eu morrer ele vai junto, e ele não quer isso.

O fato de eu poder falar com lobos é porque Allan, esse é o nome da minha maldição, é um lobo. Mas não um lobo qualquer, ele tem cinco metros de alturas, é negro como a noite e seu olhos são de um vermelho bem intenso. Por mais que eu possa falar com lobos, é muito raro disso acontecer, porque a maioria não se aproximam por causa de Allan, ele é tão possessivo que não deixa eles nem passarem perto de mim, e os que chegam ficam só por uns minutos e se vão. E eu nunca mais os vejo.

Ultimamente alguma pessoas do vilarejo, que antes me olhavam com um sorriso no rosto, estão me olhando e tratando deferente. Alguns me olham com medo e outros com um pouco de raiva, como se eu tivesse feito alguma coisa, sendo que eu não fiz nada. Eu não faço nada, eu fico a maioria do tempo em casa ou na floresta. Então porque eles estão me tratando assim? Como as outras pessoas que me chamam de demônio?... Será... Será que elas estão começando a me ver como um?!

– Que foi Allan? Dá pra parar de ler meus pensamentos?! Eu odeio quando você faz isso, e você sabe muito bem! - Nossa como eu ODEIO isso, mas não adianta falar, ele nunca me respeita.

– Você sabe que eles abriram os olhos. E agora estão te vendo como um demônio. Então porque fica ai martelando a cabeça pensando o porque deles te tratarem assim, em vez de bolar um plano para acabar com eles?! - Um doce sorriso diabólico brotou em seus lábios, parecia que ele tava com sede de sangue. Ele quer vingança sem eles terem feito nada, ele é mesmo um psicopata.

– O que?! Você está louco!? Eu não posso acabar com o vilarejo inteiro! E NEM VOCÊ! Eles... Eles não fizeram nada comigo. ELES NÃO FIZERAM NADA QUE POSSA TE COMPROMETER DE SER MEU DONO ALLAN! ENTÃO PARA! Você não vai machucar aquelas pessoas inocentes! - Se ele acha que eu vou deixar ele machucar o vilarejo inteiro, ele está muito enganado.

– Não pode, ou não quer?! Ou será que você quer, mas tá com medo?! Porque no fundo você sabe que eles não são tão inocentes, e que uma hora eles vão te machucar. Então porque não acabar logo com isso antes que eles decidem fazer algo?! E isso está mais perto do que você imagina! - Ele é tão idiota. Eu não sou que nem ele, não quero machucar essas pessoas, elas nunca me fizeram mal, elas só falavam de mim, e eu não me importo com isso. Então... Então porque eu quero que Allan faça alguma coisa?! Allan?!

– PARA ALLAN!! PARA DE ENTRAR NA MINHA MENTE E CONFUNDIR MEUS PENSAMENTOS! PARA! E-eu...não quero machucar essas pessoas, então PARA com isso! E se você fizer alguma coisa com elas, eu...

– VOCÊ O QUE?! - Ele passou pra esse mundo tão rápido, que quando vi, ele estava rosnando em cima de mim me mostrando seus afiados dentes. - Em?! Você vai tentar se matar? Ou vai se mutilar de novo? Você sabe que nada disso adianta, e mesmo assim faz. Patético. Então Nicolle?! Vai fazer o que? - Ele deu um sorrisinho de deboche. Ele sabia que tinha "vencido", mas mesmo assim esfregava na minha cara.

– Sai de cima de mim Allan! - Já estava farta de brigar com ele. Nem sei porque faço isso, já que nunca leva a lugar nenhum.

– Não! Eu gosto de ficar assim. Faz parecer que você é minha bonequinha! E eu gosto muito de ser seu dono! - Disse se deitando em cima de mim. Ai já é demais. Minha paciência se foi nesse momento.

– SAI DE CIMA DE MIM! - Disse enquanto o jogava na parede, ele acha que eu não posso fazer nada é?! Ele está errado. Mas o pior de tudo isso, é a dor que vem depois de controla-lo, é tão forte e agonizante. Parece que enfiaram milhares de facas em meu coração, eu mal consigo respirar.

Então lá estava eu sentada no chão com o nariz sangrando, tentando controlar minha respiração, e me esforçando pra não desmaiar. Por mais que eu saiba que isso machuca, eu insisto em controla-lo, mesmo que por alguns segundos. Nesse momento Allan já tinha voltado pro outro mundo, e estava me olhando sofrer, ele só me ajuda quando eu estou quase morrendo.

"Batidas na porta."

– Já estou indo. - Me levanto um pouco fraca e vou atender a porta. Além de esperar eu morrer antes de me ajudar, ele ainda faz isso lentamente.

– Nicolle! V-você está bem!? - Laura, ela é uma das milhares de pessoas que nunca falam comigo, mas me "respeitam". Ela me olha de cima a baixo vendo que estou um pouco pálida, mais do que já sou.

– Eu estou bem. Mas, o que você quer?! - Sou logo direta. Não gosto muito de conversar com as pessoas do vilarejo, não quero que Allan as machuquem pensando que elas estão em seu caminho. Ele é tão possessivo, que as vezes dá até medo do que ele é capaz de fazer.

– É que hoje vai ter a festa da colheita, e queria confirmar que você iria. - Sério que ela veio aqui pra isso?! Ela sabe que eu sempre vou, mesmo que fique no meu canto.

– É claro que eu vou, como todo ano. Você sabe disso. - Ela ficou um pouco nervosa quando eu falei.

– Ah! Que bom. É que eu queria muito que você fosse! Ai só passei pra confirmar mesmo!! - Ela sorriu, o que me deixou um pouco desconfortável.

– Não se preocupe que eu irei. Agora, com licença que eu tenho coisas para fazer. - Eu tinha que faze-la ir embora. Allan estava começando a olhar pra ela. Um olhar nada agradável.

– Claro! Desculpe! Até à noite! - Ela me deu tchau e se foi.

Eu fechei a porta e quando me virei, Allan me olhava fixamente.

– O que foi?! - Eu não me sinto bem quando ele me olha assim. Parece até que está tentando me controlar com sua mente.

– Eu acho melhor você não sair de casa hoje. - Sua expressão estava séria.

– Porque?! - Eu fiquei com raiva. Agora ele não quer que eu saia de casa é!? - Você quer que eu viva dentro de casa agora é!?

– Aquela garota estava agindo muito estranha. Ela nunca falou com você. E agora veio perguntar se você ia na festa da colheita!?! - Ele me sufoca! Por isso que eu não falo com ninguém.

– Então porque você não a matou em?! Já que você está suspeitando dela!? Agora ninguém mais pode falar comigo é?!

– Eu não a matei porque não quero que o vilarejo pense que você é uma assassina! Mas não se preocupe que na primeira oportunidade, eu a mato! - Ele sorriu diabolicamente. - E ainda acho que você não devia ir a festa da colheita.

– Eu vou SIM a festa! E você não vai me impedir! - Se ele pensa que agora vai decidi aonde eu vou ou deixo de ir, ele está muito enganado.

Mais Tarde. Festa da Colheita.

Todos estava se divertindo e eu estava no meu canto comemorando do meu jeito, como sempre.

Mas tem alguma coisa errada, eles estão diferentes. Não é como as festas anteriores, aonde todos bebiam até cair. Eles estão mais sóbrios que o normal.

– Tem alguma coisa errada Nicolle. É melhor a gente ir embora. - Allan também está diferente. Ele fica olhando atento cada pessoa do vilarejo, pronto pra atacar qualquer um que ouse se aproximar de mim.

– Não tem nada errado, para de paranoia! - Parece que a qualquer momento ele vai arrancar a cabeça de alguém. Ele não sai de perto de mim, e está mais possessivo que o normal.

– Oi Nicolle! Que bom que você veio!! - Laura se aproxima de mim com suas amigas, coisa que nunca fez.

–É! Eu falei que ia vim né!!? - Dou um sorriso sem graça. O que ela quer comigo?! Ela nunca se aproximou de mim.

– É! Você quer dançar com a gente!?! Você só fica ai parada, vamos nos divertir!! - Ela me puxou pra perto da fogueira antes mesmo de eu pensar em responder.

Quando vi, estava cercadas por ela e suas amigas, todas dançando. Allan olhava furioso de onde eu estava antes. Eu nem dei a minima e comecei a dançar também. Por mais estranho que seja elas falando comigo, eu gostei de não ter que ficar com Allan martelando minha cabeça. Não essa noite, hoje eu ia me divertir. E ele não é doido de atacar as meninas no meio de tanta gente(Assim eu espero.).

A gente estava dançando quando de repente sussurros vieram em minha mente. No começo pensei ser Allan, mas eram as pessoas a minha volta.

– Bruxa!

– Demônio!

– BRUXA!

– Bruxa!

– DEMÔNIO!

– Demônio!

– Bruxa!

Várias vozes ao mesmo tempo me xingando. Porque!? Eu quero sair daqui, mas eles me cercaram.

– Você achou mesmo que a gente queria ser suas amigas Nicolle?! Hahahaha...Você é mesmo muito ingênua! - Era a voz de Lara, mas eu não a via. Eles estava rodando em círculos, eu não conseguia distinguir quem era quem. E já estava começando a ficar tonta. Allan! Cade você!? Não era você que estava desconfiado?!

– Você sempre foi muito estranha! Vive sozinha na floresta! Sempre consegue escapar das mortes! E ainda tem a parada dos lobos!! Eu me pergunto como você consegue fazer isso. TODOS NÓS NOS PERGUNTAMOS! - Lara continuou a falar enquanto os outros continuavam me xingando. - Então o vilarejo chegou a conclusão que isso não é normal. E que VOCÊ só pode ser uma BRUXA!! E O QUE QUE A GENTE FAZ COM AS BRUXAS?!

– A GENTE QUEIMAAAH!!! - O vilarejo todo gritou. Eles querem me matar?! Mas eu não fiz nada.

– AH! A bruxinha tá chorando! - Sem que eu percebe-se , lágrimas começam a cair. E por mais que eu queira parar, eu não consigo. - Não vai adiantar se fazer de coitadinha. A gente não vai ter pena de matar um demônio que nem você!

ALLAN!! CADE VOCÊ?! Eu não o vejo. Ele se foi?! Ele me deixou sozinha?! Mas se eu morrer ele também morre.

– Vamos ver se você escapa da morte dessa vez!! - Eles me pegaram pelo braço e estão me arrastando pra fogueira.

– ALLAN!! ALLAN ME AJUDE!! - Pela primeira vez que eu quero que ele me ajude, ele não está aqui.

– Allan!? Quem é Allan?! É o seu...

– EU SOU O ALLAN! - Antes que ela pudesse terminar a frase, Allan aparece ao meu redor fazendo todo mundo se afastar com medo e pavor.

– Um Demônio!!

– Eu sabia que ela era uma bruxa!

Todos gritavam. E eu só conseguia me agarrar ainda mais em Allan, que olhava todos com bastante raiva.

– Desculpa ter demorado. - Ele sussurrou me olhando. - Você se machucou?! - Eu neguei com a cabeça. Ele me olhava com certa pena.

– Eles estão tramando um plano pra nos matar! VAMOS ACABAR COM ELES ANTES QUE FAÇAM ALGO!

– ÊÊÊÊÊ....

Todos foram pegar suas armas. Eu queria sair correndo dali, mas não conseguia me mover. Estava em choque com tudo aquilo.

– Fique aqui! Eu não vou deixar te machucarem. - Ele estava muito sério quando disse isso. E seus olhos estavam mais vermelhos que o normal.

– O que você vai fazer Allan?! - Eu estava preocupada, tenho medo do que ele pode fazer. E é impressão minha ou ele está agindo de forma "carinhosa" comigo!?

– Eu vou acabar com a raça desses idiotas! - Ele tem um sorriso tão diabólico. Parece o próprio Diabo.

– Allan nã...CUIDADO! - Ele se virou rapidamente e arrancou a cabeça de um deles. Todos os outros que estava atrás se assustaram a princípio, mas logo depois possuídos pela raiva, vieram pra cima de nós.

Allan estava em todo lugar. Matando sem dó todo vilarejo, impedindo deles se quer chegarem perto de mim. Eu estava sentada no chão imóvel. Lágrimas rolavam em meu rosto sem parar. Mas ao mesmo tempo que eu chorava por eles, tinha uma pequena parte de mim gostando disso. Eu me odeio.

– Chega Allan! Já é demais! - Parece que estou falando com o vento. Ele não me ouve. Só pensa em matar.

Todos que tentam se aproximar de mim, são arrastados até a morte por ele.

O chão do vilarejo que antes era branco, por causa da neve, agora está vermelho. E cheio de corpos mutilados.

É tando sofrimento que as lágrimas pararam de cair.

Eu me levanto e vou andando pra casa, não aguento mais ficar aqui. Mas antes que tenho que procurar Allan eu não me sinto muito bem quando ele está longe, ainda mais agora.

– BRUXA!!! - Me viro e vejo Laura correndo até mim com uma espada. Eu corro o mais rápido que posso.

Aonde Allan se meteu!? Eu....Quero que Allan a machuque?! Não! Eu só quero que ele me proteja. Mesmo que isso custe a vida dela.

– Ouch! - Eu tropeço a acabo caindo. Laura está me alcançando. Eu tenho que fazer alguma coisa antes que...

– MORRA SEU DEMÔNIOO.......Argh! V-voc... - Laura estava com uma espada em seu estomago, e era eu que a segurava. Porque!? Porque eu fiz isso?! Minha mão agora está cheia de sangue, que corre da espada.

– Nicolle! - Allan aparece. Seu olhar está meio triste. Ele vê Laura no chão ao meu lado. Ele sabe o que eu fiz e que a culpa é dele. - Sinto muito!

Essa é a ultima coisa que ouvi. Me lembro de me deitar na neve e então, tudo ficou escuro.

....

Corpos por todo lugar. Sangue por todo lugar. Não sobrou uma alma viva.

Todos estão me perseguindo. Allan! Cade você!?

Áh sangue em minha mãos. Fui eu que matei todo mundo!? Não! Foi Allan! Mas...Eu quis isso. Uma parte de mim gritava por isso.

Ele matou todo mundo. EU matei todo mundo. Não! Eu só matei Laura. Laura, eu não queria fazer isso. Mas eu gostei de fazer isso!

Aonde eu estou?! Mãe!? Pai!? Allan?! Isso é um sonho!? Ou um pesadelo?!

Todo mundo que eu conheço...Está morto. E é tudo culpa minha. NÃO! A culpa é DELE, foi ele quem os matou! Mas ele faz parte de mim.

Porque ele faz parte de mim!? Porque eu tenho ele comigo desde....Desde que eu nasci?! Mas eu não me lembro de nada antes dos treze anos! Então como eu sei que ele está comigo á tanto tempo!? E como eu sei que ele matou meus pai!? E como eu sobrevivi sem ninguém!?? Tá tudo muito confuso!

QUEM É ALLAN!? QUEM SOU EU!?

The Spirit - Recomeço.*