Uma mulher, nervosa, andava pelas ruas de Cardiff à noite, com um homem em seu encalço. Nem de perto, notava-se que a mulher, na verdade, estava grávida. Ele perguntava-se como diabos ela conseguiu aparatar.

Claro, a distância entre Cardiff e Somerset era considerável.

"Lilian, não é longe o bastante. Não basta."

"Por hora, basta, tem que bastar, bloody hell!" A mulher, Lilian, retorquiu, irritada. Se desculpando logo em seguida, por tal grosseria.

Era uma jovem doce, mas naquela situação qualquer um ficaria estressado, até nervoso. A segurança de seu primeiro filho, Harry, era garantida, mas a garota que esperava estava em risco. Tinham que a esconder, a menina, até que os tempos sombrios terminassem.

Até que eles ficassem em paz. Não ligavam para a morte ou a vida, o homem e a mulher, apenas se preocupavam com o mundo que a nova geração viveria.

Era preciso. A Potter, sobrenome do casal, mais nova seria um segredo se algo os acontecesse, mas o foco do momento era:

E se algo acontecer, acontecer com ela?

Dumbledore ou até mesmo a Ordem da Fénix (com exceção de poucas pessoas), não foram informados sobre a gravidez. Frank Longbottom os dissera para não confiar em ninguém, As pessoas estão confusas. Você estará dando-as duas chances para acabar conosco, e comprometendo a vida da criança.

Com qualquer outra família, quaisquer outros bruxos, não teria essa situação. Mas Lilian e seu marido tinham enfrentado o Lorde das Trevas três vezes, além de sofrerem uma tentativa de recrutamento e uma profecia que envolvia seu primogênito. Não estavam seguros, não mesmo.

Algumas semanas depois do que houve naquele dia, no dia da sua conversa com Longbottom, o caro foi torturado junto com sua esposa, até se tornarem insanos.

James, o nome do homem, não estava lá. Muito menos sua esposa. A família que se formara em Hogwarts, estava sendo destruída. Não tinham tempo.

A mulher apressou o passo, agarrando a mão do marido. Vez ou outra ele entrava em um beco errado (pobre senso de direção), mas no final, chegaram até o destino.

Era uma residência antiga, em estilo neoclássico, na cor branca. A arquitetura daquele lugar encantava Lilian, mas não tinha tempo para admirar o local. Subiu os degraus, dando de cara com a porta da frente. James tocou uma, tocou duas e tocou até três vezes a campainha.

Estava prestes a esmurrar a porta de madeira branca, até que uma mulher loira à abriu, parecendo em alerta. A escuridão disfarçava as expressões do casal, então Beatrice abriu a porta.

Deixou-os entrar, oferecendo uma xícara de chá como cortesia. Eles negaram educadamente, fazendo alguns gestos de descaso e agradecendo.

Já estavam na sala de estar da moça, que acomodou Lilian em uma namoradeira limpa. James permaneceu em pé, ao lado da jovem.

"Sentimos muito Beatrice, por incomodá-la a essa hora." Lily se pôs a falar, ansiosa. "As coisas mudaram..." Fez uma pausa, suspirando. "Estamos esperando uma criança, então é muito importante que você nos ajude."

Fora revelada sua barriga, que mostrara claramente uma gestação de uns oito meses. Era um tanto difícil e perigoso esconder aquilo, mas era necessário.

Beatrice Tonks apenas assentiu calmamente. Abraçando-a e reconfortando-a por longos minutos, até que Lily estivesse calma. A situação fora-lhe explicada, mesmo Tonks não a compreendendo completamente.

"A Ordem já sabe, Lil?" Perguntou, assumindo uma postura séria na namoradeira.

"Decidimos manter em segredo, por tanto tempo, sim. Moony e Padfoot já sabem, Wormtail não anda muito acessível." James passou os dedos pelo cabeça de forma irritadiça, bagunçando-os logo em seguida. "E então, acha que pode fazer isso? Digo, criá-la caso algo dê errado? Sei que é pedir muito, mas achamos que podemos contar com você."

Beatrice era uma mulher boa, apesar de seus caprichos. A jovem jornalista tinha herdado isto de seu irmão, Edward, então não conseguiria negar o pedido. Viu os olhos de James e Lilian, viu como eles estavam cansados, pediam por socorro, por assim dizer. Passaram algumas horas longe do filho, mas um par se escondendo dos sequestradores, esse era o resultado. A viagem custou muito deles.

"Sim, farei tudo que eu puder. Até um voto perpétuo, se necessário." Afirmou firme, encarando-os decidida.

E naquela noite, em 1981, foi selado um acordo.

✖

No dia 1 de Outubro, naquele mesmo ano, assim nasceu a segunda filha de Lilian e James Potter. A estadia em Gales não foi estendida, ainda corriam de certo um grande risco, mas ainda sim conseguiram se comunicar por algum tempo, utilizando um espelho-de-dois-lados.

Lily chorava baixinho à noite, já James dormia ansioso. O resquício de alegria era restaurado pelo primeiro filho, consolando a “perda” da garota.

A Potter que tinha apenas alguns dias (e contando) de vida, possuía uma grande característica: era silenciosa, não chorava em momentos inoportunos. Mas naquele dia, berrava alto, agitada. Não deveria estar acontecendo, Tonks tinha acabado de alimentá-la (até a trocou e pôs de ninar), então o pânico tomou conta de seu corpo. Conseguiu uma conversa rápida com Lilian, mas aquilo não a acalmara de nenhuma forma.

A mulher loira aninhou a pequena ruiva em seus braços. Tinha a pele pálida da mãe, do pai somente herdou a textura rebelde de cabelo (com a coloração ruiva de Lilian) e os olhos castanho-esverdeados.

Era linda.

Continuou chorando, em desespero, com a face e o cobertor molhado.

Shh, está tudo bem. Tudo vai ficar bem, ‘lil’, tudo..." Beatrice sussurrou atordoada. Colocou a mão na nuca da garota e a apertou contra si, balançando-se de um lado para o outro.

Beatrice Tonks ainda era jovem, mas muito experiente com crianças. Estudou na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts, se tornando uma corvina e uma aluna brilhante, além de ter ganhado uma família de amigos nesse período (como Lilian e Remus). Era uma jornalista novata no Daily Prophet

Então checou mais uma vez o espelho de dois lados, com o mesmo pressentimento ruim. Era noite, da última vez que viu os Potters, eles estavam com Harry na sala de estar, se divertindo.

Apenas o silêncio. Um silêncio tenso, Beatrice ansiava por qualquer sinal deles. Não, não, não! Agora escutava gritos, gritos e sussurros, sim. Tinha alguém gritando, outra pessoa chorando. Se assustou, deixando o espelho cair e se quebrar. Rapidamente colocou a bebê numa cadeira de balanço. Voltou ao local e se agachou, se aproximando do espelho e tentando enxergar algo por trás dos pedaços.

"Lilian, pegue Harry e vá! É ele! Vá! Corra, eu o atraso..."

Ouvi sibilos, sibilos semelhantes a voz de James. Franziu o cenho, existia alguma interferência. Logo em seguida ouviu uma voz aguda, seguida pela maldição da morte. Beatrice colocou a mão no coração, assustada, procurando sua varinha logo em seguida. Iria conjurar um patrono e mandar à ordem em direção a Godric’s Hollow. Mas parou de repente, ouvindo mais sibilos.

"O Harry não, o Harry não, por favor, o Harry não!"

"Afaste-se, sua tola... afaste-se agora."

"Harry não, por favor, não, me leve, me mate no lugar dele..."

"Este é meu último aviso..."

"Harry não! Por favor... tenha piedade... tenha piedade... Harry não! Harry não! Por favor... farei qualquer coisa..."

"Afaste-se garota, afaste-se...."

E ouviu, ouviu mais uma maldição da morte e um grito desesperado. Sufocou um grito e rapidamente invocou um patrono corpóreo, em forma de lince.

"Lily e James estão sob ataque! Repito, Lily e James estão sob ataque, a residência em Godric’s Hollow foi invadida!" Passou a mensagem para o patrono rapidamente, que se pôs a fazer seu trajeto até a sede da Ordem.

Rapidamente passou a mão pelos cabelos loiros, bagunçando-os, nervosa.

O feitiço Fidelius foi recitado. O fiel do segredo não poderia tê-los traído... poderia?

Algo tinha mudado. Beatrice sabia, Beatrice era intuitiva. Mal notou, que a pequena parou de chorar na “cadeirinha”. Apenas dormia calmamente, ela tão se arrastou concentrada até o bebê. Pegou-a nos braços e rapidamente se balançou para um lado do outro, sussurrando cantigas pouco antigas.

Independente de algo ter mudado, Beatrice também sabia que aquela garota precisaria do dobro do conforto, dobro do amor e dobro do cuidado. Tinha ficado órfã e era apenas uma recém-nascida. Talvez as memórias dos pais, a voz de Lilian e as brincadeiras de James, sim, as brincadeiras de James:

Elas não permanecerão por muito tempo.

Foi um daqueles momentos que tudo pareceu ficar claro, a calmaria antes da tempestade. Lily e James? Mortos. Tonks poderia ser a próxima, a viagem a Cardiff poderia parecer inofensiva, mas não depois daquele dia. E naquela noite, algo frio se instalou em Gales, Cardiff para ser exata.

Três vidas foram mudadas, e duas destruídas.

It is not enough to be dumbstruck

(Can you fill this silence?) You must have the words in that head of yours

And oh, oh, can you feel the silence?

I can't take it anymore

'cause it is not enough to be dumbstruck, oh