Chamar a si todo o céu com um sorriso escrita por Aphrodite Laclair


Capítulo 1
e te ame muito mais do que verdadeiramente


Notas iniciais do capítulo

achei por acaso essa fanfic que escrevi pra MOMENTO DE EMERGÊNCIA do chal do twitter
é renascença!ua



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Chamar a si todo o céu com um sorriso

.

e que eu não faça nada de útil
e te ame muito mais do que verdadeiramente
nunca houve ninguém tão louco que não conseguisse
chamar a si todo o céu com um sorriso

— e. e. cummings —

.

Um movimento sem pensar e a lua se levanta no céu. Você a observa subir por longos, tristes minutos. A sua volta, as estrelas. Reluzem pequenos, minúsculos pontinhos ao redor do astro magnâmico. Você suspira, os dedos entrelaçados em frente ao colo. Pensa que talvez seja melhor entrar, os tempos — os tempos são loucos e você pensa que é tão melhor ficar segura no ateliê.

Você então suspira profunda e repetidamente — uma, duas, três vezes — e prefere se ater aos fatos. Repete-os em voz baixinha. Seu nome é Margaery Tyrell. Você é uma pintora. Você é abertamente hostilizada em meio aos seus colegas de profissão, porque você é uma mulher. Talentosa, sim, talentosa, definitivamente, mas mulher. Você se perde, se confunde por intermináveis segundos, antes de voltar a respirar, o ar enchendo seus pulmões.

Você tem vinte e dois anos. Você se isola nas escadarias de Florença, nos jardins e nas rosas; você corre com o orvalho das flores que enfeitam todos os cantos da cidade.

Sansa Stark é ruiva e tem enormes e gelados olhos azuis. Ela é sua modelo favorita. Seu ateliê está cheio de enormes, diversos quadros dela. Você nunca vendeu nenhum.

Em um deles, os cabelos trançados se perdem nas azaleias, a pele se confunde com a luz do sol, os olhos tem um insaciável brilho de desilusão. Sansa cobiça a tristeza. Cobiça a infelicidade que lhe imobiliza os braços e pernas e a impede de sorrir. Em nenhum dos quadros ela parece feliz, nenhum dos quadros ela esboça uma curva de lábios. Margaery também não teve coragem de profanar sua imagem com uma felicidade de mentira.

Você acredita em realização? a voz dela tem um sabor amargo dos amores perdidos. Porque eu não acredito. uma pausa, Margaery está imóvel. Você não parece acreditar em nada. (um piscar de olhos, bater de cílios, o esforço de todos os ossos do corpo dela saindo do lugar no esforço da respiração) Eu acredito que, nesses quadros, talvez eu vá durar para sempre. Sou sua modelo por esse motivo egoísta — eu tenho um insano, desesperador medo da morte por esquecimento.

Quando Margaery enfim entra o sol já se ergue, timidamente, colorindo toda coisa de uma cor de rosa etéreo. Sansa, ela se lembra, adorava essa cor — era a cor dos amores correspondidos, enquanto o pôr do sol alaranjado eram os amores contrariados; um brilho feliz em seus olhos-muralha e mil palavras que nunca foram ditas. Agora, Margaery se arrepende. Agora ela pensa: há tantas coisas que poderiam ter sido ditas!

Sansa, cuja a pele se confundia com a neve; Sansa cujo sorriso só habitava nos olhos, nas palmas das mãos; Sansa cuja a alma se igualava a um triste pássaro que nunca mais pôde cantar ou voar; Sansa cujo amor era quente e queimava, queimava, queimava, e você deixava queimar, orava para que você pegasse fogo, para que talvez em outra vida você pudesse ser feliz.

Na cama, os cabelos castanhos colorem o lençol de forma monocromática. Antes o vermelho se misturava — e, subitamente, explosão. Antes elas eram outras pessoas, e quem sabe antes Margaery era mais Sansa e Sansa muito mais Margaery?

A solidão é dolorosa, gelada e brutal. É como a lenta sensação de congelar, seus órgãos morrendo antes que você propriamente registre a morte. A sensação de, por agonizantes minutos, saber que vai morrer antes de, de fato, morrer.

Nas paredes os quadros respiram, transpiram vida. Margaery espera que Sansa, mil Sansas, se levantem dos quadros-memórias e se deitem ao seu lado, silenciosas e com enormes olhos arregalados, imóveis plantas fazendo fotossíntese.

.

que o meu pensamento caminhe pelo faminto
e destemido e sedento e servil
e mesmo que seja domingo que eu me engane
pois sempre que os homens têm razão não são jovens


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