O Telefone escrita por Feeds


Capítulo 1
Capitulo Único O início, meio e fim


Notas iniciais do capítulo

Uma menina escrevendo sobre um fato muito triste da sua vida, ou não tão triste assim, depende do ponto de vista.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/54358/chapter/1

 

A minha história não tem nada de extraordinário, pelo menos não pra vocês. Na verdade eu estou deitada na cama agora, com o telefone tocando sem parar, com lágrimas descendo dos meus olhos e escrevendo porque eu preciso desabafar, por isso, me perdoem se eu escrever algo errado, ou incoerente porque as lágrimas estão meio que empatando a minha visão e estou com uma baita dor de cabeça.

Tudo começou com um telefonema, sim, um telefonema.

No meu quarto tem um telefone rosa que minha tia comprou pra mim uns quatro anos atrás, tem um número próprio então se alguém ligar pra mim, não tem risco de alguém na sala interceptar a ligação. Ele já caiu diversas vezes, eu já joguei ele do outro lado do quarto, mas mesmo assim ele funciona até hoje. Eu queria que não fosse assim.

 Mas eu acho melhor parar de enrolar e contar logo o porquê de eu estar chorando e escrevendo...

Um dia, a exato um mês e meio atrás, quando cheguei da escola recebi uma ligação. Eu não ia atender, já era noite, eu estava cansada e ainda estava carregando um monte de livros que tinha pegado na biblioteca, adoro filosofia, matemática e fisiologia. E como eu estou no 3º ano do ensino médio eu tenho que ler sobre isso porque eu ainda não sei qual profissão seguir, estou em dúvida entre ser professora, médica ou administrar empresas. Então com tudo isso, eu resolvi mesmo não atender o telefone, mesmo sendo importante, eu estava cheia de coisas na mão. Mas a ligação era importante e eu deveria ter atendido.

Se eu tivesse atendido o telefone eu iria falar com a minha melhor amiga que estava com dúvida em uma questão de matemática, o que era muito importante, e provavelmente ficaríamos vários minutos conversando e eu não atenderia o outro telefonema, porque o telefone estaria ocupado. Mas a vida não é perfeita.

Larguei os livros que estavam na minha mão em cima da mesa de cabeceira, tirei a mochila das costas e joguei-a no chão. Quando ia sentar na cama para tirar os sapatos, o telefone tocou novamente. Então eu pensei:

“ Acho melhor atender, porque se for a mesma pessoa que ligou antes, deve ser mesmo muito importante!”

Eu fui atender ao telefone. Era importante e eu não deveria ter atendido, mas atendi.

Do outro lado da linha uma voz de um homem, na verdade um garoto, achei tinha mais ou menos da minha idade.

— Alô? – Ele não falou, meio perguntou.

— Olá. – falei. – Quem é.

— Eu...eu... – foi aí que eu percebi que ele estava chorando.

— Quem é? E porque está chorando?

— Eu... meus pais, eles, estão brigando de novo, brigam todo dia, eu não agüento mais, eles dizem que vão se separar, mas eu não quero isso...

— Calma. – desisti de perguntar quem era, eu só queria ajudar. – Não fique assim tá, isso acontece com muitas pessoas, não adianta ficar assim.

— Eu sei, mas eu não consigo...

— Quantos anos você tem?

— 17.

OK, um rapagão chorando porque a mãe e o pai iriam se separar. Mas não era hora de censurar.

— Olha, não fique assim, tudo vai se resolver tá bem! E não adianta você chorar ou ficar triste, porque não vai resolver nada! Você tem que manter a calma, respirar fundo e enfrentar o que tiver de acontecer com a cabeça erguida OK!

— Obrigado. – ele falou mais calmo – Qual o seu nome?

Agora ele queria saber meu nome... “mas espera aí” pensei “e se for um maníaco maluco falando comigo?” Eu não podia falar meu nome verdadeiro, então menti.

— Fr.. Francineide.

— Francineide, nossa, que nome engraçado. O meu é Thiago, obrigado tá!

Lembrei que conhecia esse nome de algum lugar...

— De nada... quem sabe não é melhor você conversar com os seus pais sobre o que você sente?

— Tenho que ir agora, tchau. – ele falou bruscamente, e o outro lado da linha ficou mudo.

OK, isso tinha sido muito estranho, mas o que no mundo não era estranho?

 

No outro dia eu já nem lembrava mais do que tinha acontecido, minha mente havia sido tomada por cálculos, atividades, redações, revisões... O meu colégio era muito puxado, mas os alunos que estudavam nele eram iguais a qualquer outro colégio, sempre os mesmos grupos. As patricinhas, os vagais, os idiotas, os populares e o meu grupo, os nerds.

Nesse outro dia, o telefone tocou novamente, e era ele novamente, Thiago.

— Alô. – dessa vez o “alô” dele soou mais forte. – Francineide?

— Sim.

— Sou eu novamente, Thiago.

— Ah, oi! Como você tá?

— Na verdade muito bem. Eu queria dizer obrigado pelos seus conselhos e pedir desculpas por ter desligado bruscamente é que minha mãe tava entrando no quarto.

— Não tudo bem...

— E desculpe também por ter ligado pra você, deve estar achando que eu sou um maníaco maluco não é?

Sério?

— Na verdade... eu pensei isso mesmo.

— Já sabia. Olha, ontem eu estava meio... transtornado sabe, então peguei o telefone, disquei alguns números, e você atendeu. Eu só queria ouvir outra voz, só queria um pouco de paz.

— Tudo bem. Mas ia aí, funcionou o que eu te disse, sobre conversar com os seus pais?

— Sim, fez eu me sentir melhor.

— E eles vão mesmo se separar?

Ele suspirou.

— Sim. Já entraram com o processo e meu pai saiu de casa hoje.

— Eu sinto muito.

— Não sinta... era só isso mesmo, obrigado viu!

— Nada, estou sempre à disposição.

— Então tchau.

— Tchau.

De alguma maneira eu fiquei feliz por ele estar bem e por meus conselhos terem dado certo, agora eu também estava pensando em fazer psicologia.

No outro dia me surpreendi por esperar que ele ligasse novamente, eu tinha gostado de conversar com ele, a voz dele era grossa, mas ao mesmo tempo delicada, com um tom leve... dava vontade de ficar conversando com ele por horas. Mas ele não ligou nesse outro dia, nem no outro, nem no outro. Mesmo estando triste por ele não ter ligado eu não falei nada pra ninguém, não desabafei com ninguém, não queria que ninguém se metesse na minha vida. e se eu ainda pensava que ele deveria ser um maníaco louco, esse pensamento já tinha se esvaído.

Eu já tinha me acostumado com o fato de que ele só queria mesmo um conselho e que eu esperar por mais era pura bobagem. Mas quando eu menos esperava, ele ligou de novo.

— Alô.

Eu quase pulei de felicidade quando reconheci a voz.

— Olá.

— Você deve estar se perguntando por que eu liguei de novo.

— Hum...

— É que eu queria ouvir sua voz.

Depois dessa eu tive que sentar no chão, ninguém, nunca, nunquinha tinha dito isso pra mim.

— É sério?

— Sim, eu teria ligado antes sabe, mas eu fiquei com medo de você achar que eu era um chato que estava pegando no seu pé.

— Não, na verdade eu queria ouvir sua voz também... quer dizer, pra saber se vocês estava bem...

— Ah, sério?

— Sim. – falei timidamente.

Depois desse dia, agente sempre se falava pelo telefone. Sobre como tinha sido o dia um do outro, sobre problemas, alegrias, tristezas, desafios...chegamos até a trocar algumas palavras de amor. Passamos um mês assim, ele até tinha me dado o número do telefone dele. Tudo estava indo muito bem, até que, por causa de uma série de coincidências, descobrimos que estudávamos no mesmo colégio.

— E em que ano você está? – perguntei.

— Terceiro.

— Impossível!

— Por quê?

— Eu também estou no terceiro.

— Sério? – eu já tinha percebido que ele tinha mania de falar “sério”.

— Sim... sabe, eu não sei bem se eu quero saber qual é a sua turma...

— E por que não? – ele perguntou meio triste.

— Não sei... vai que agente é da mesma turma e descubro que você é do grupo dos meninos populares – brinquei.

— E qual seria o problema disso?

— Na verdade nenhum...

— Ah... porque eu tecnicamente, eu faço parte do grupo dos populares.

— Sério? – dessa vez eu falei.

— Sim. Mas eu acho difícil você ser da mesma sala que eu. Não conheço nenhuma Francineide por lá.

Epa!

— Ah, então... na verdade o meu nome não é Francineide.

— Não?

— Não, é Paula.

— Paula? Você quer dizer Paula, a nerd da turma A?

Droga! Tudo clareou na minha mente.

— Sim, e você é o Thiago, o menino mais popular da escola e da turma A também. – Eu ainda não estava acreditando que eu falava toda noite com o menino mais popular e mais bonito da escola, e que ainda era da minha sala.

— Bem... é... nossa, isso é estranho. Você estuda comigo desde a 8ª e eu nunca falei direito com você. – ele falou.

— Na verdade, é desde a 6ª série.

— Hum... não sei porque eu nunca falei com você antes, você é legal.

— Ah, obrigada... mas isso muda tudo não é?

— Por quê?

— Você ainda vai continuar a falar comigo?

— Claro que sim. Agora me diz, por que você não me disse o seu nome verdadeiro?

Suspirei aliviada. Eu mal podia acreditar que eu agora era amiga do Thiago, e não um Thiago qualquer, o menino mais lindo do colégio. Nesse dia eu realmente achei que tudo tinha acabado bem... mas estava enganada.

No outro dia, no colégio, eu fui falar com ele, ele não falou comigo, na verdade, ele me ignorou.  Eu achei que era porque ele estava ocupado conversando com os amigos dele. Mas eu tentei novamente depois, e ele agiu da mesma forma. Resolvi esperar até a noite para falar com ele.

Ele ligou, e eu perguntei porque ele não tinha falado comigo naquele dia na escola. Ele falou simplesmente que ele nunca tinha falado comigo no colégio, e que não fazia sentido ele falar agora. Então eu entendi tudo. Ele ia continuar sim falando comigo, mas pelo telefone...  e porque? Simplesmente porque eu era uma nerd, sem graça e feia, e ele, lindo e popular.

Como eu poderia ter sido tão ingênua? A ponto de achar que ele gostava de mim, que tudo ia mudar por causa de uns telefonemas! Eu realmente gostei dele, mesmo não sabendo que ele era e fiquei feliz por ter descobrido quem ele era, mas isso não importava mais.

Acabei desligando na cara dele, do Thiago e agora aqui estou eu, chorando, sozinha e escrevendo.

Desculpem por ter tomado o tempo de vocês, é que eu precisava mesmo desabafar.

O telefone continua tocando, mas eu não vou atender, eu vou arrancar o fio e jogar o telefone no chão. Quem sabe assim esse maldito telefone não quebra de vez?


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

CApítulo único, espero que vocês gostem....