Era só uma manhã qualquer, Wilson obrigou-se a lembrar.

Talvez, em circunstâncias totalmente diferentes, Wilson pudesse se convencer de que a manhã que nascera há umas poucas horas fosse mesmo como outra qualquer, mas com toda a expectativa que tinha para o dia isso era praticamente impossível.

Deu uma última olhada na sala iluminada pelo sol matutino e suspirou. Sentia-se um tanto incomodado por House se mudar pra lá. Para o apartamento que era de Amber. Mas tinha conversado com o Dr. Nolan e haviam concordado que House precisaria de muito apoio agora que a reabilitação havia finalmente acabado. E quem melhor para apoia-lo do que o próprio Wilson?

Não queria admitir, mas sentia falta do grisalho e seria bom tê-lo perto novamente. Onde o moreno podia cuidar e ficar de olho nele.

Inclinou-se contra o sofá e apertou o tecido macio com a palma da mão. House teria que dormir ali por um tempo, não tinha, de fato, algum quarto disponível para o grisalho. Nem ao menos sabia quanto tempo o amigo ficaria no apartamento.

Jogou o corpo ali e esperou que o tempo passasse, sem saber se preferia que os minutos passassem mais rápido ou mais lentamente.

Fitou a janela aberta, desejando que o medo, que se instalara em seu peito no dia em que as portas de Mayfield se fecharam atrás de House, fosse embora em uma brisa fria.

Tinha medo de errar com House, medo que apenas ele não fosse o suficiente para que o grisalho permanecesse firme e longe do Vicodin.

Tinha medo dos erros de House. Medo de que os meses que ele havia passado longe não tivessem adiantado. Medo de crer que apenas estar ao lado dele, bastaria pra que tudo ficasse bem. E isso era tudo o que ele queria. Que House estivesse bem e que ele pudesse ficar ao lado dele, como sempre fora.

Conhecia o suficiente de House pra saber de suas tendencias para fingir que nada estava errado. Que não precisavam conversar sobre nada e que nada havia mudado. Mas Wilson sempre vira seus erros, e isso o assustava. Se pudesse apenas acreditar nas palavras dele.

Tinha medo de que as coisas não mudassem e que elas mudassem completamente. Desejava o novo House, mas rezava para ele ser o mesmo de sempre. Era essa contradição que o deixava tonto. Querer vê-lo o mais rápido possível e, ainda assim, torcer para que o ônibus que o traria de volta quebrasse no meio do caminho.

Sentiu a pele se arrepiar com o vento frio que atravessava a janela aberta e teve um sobressalto quando focou os olhos no relógio de parede. Eram 14h16min. Quando o tempo passara tão rápido? House com certeza já estava chegando, isso se o bendito ônibus não tivesse mesmo quebrado.

Mal se pôs de pé ouviu batidas sonoras vindas da porta da frente. Em um pulo sua pele deixou o tecido quente e seu coração passou a bombear uma quantidade exagerada de sangue para o seu corpo. Viu-se olhando o próprio reflexo no espelho que era o vidro na janela, os dedos apressados esticando as roupas que usava e penteando os fios castanhos que portava sobre a cabeça.

O "toc-toc" impaciente soou mais uma vez antes de Wilson perceber o quão ridículo estava sendo. Respirou de forma calma e foi atender a porta como o adulto que era, mesmo que não se sentisse assim por dentro.

E ele estava ali. De volta para Wilson, de certa forma. Estava com o cabelo muito mais curto que há meses atrás, mas ele tinha a mesma barba por fazer. Ele ainda tinha a mesma expressão cínica e o mesmo sorriso irônico entortava seus lábios muito finos. E ali, do lado de sua perna direita, a mesma bengala apoiava o peso de seu corpo.

Mas algo parecia diferente. Tudo pareceria igual, se não fosse por seus olhos.

Os azuis o fitavam com uma intensidade nova, como se House visse Wilson de verdade pela primeira vez sem um véu para lhe tampar o rosto. Tinha um brilho a mais em seus olhos e seu sorriso parecia irradiar calor.

Wilson teria passado muito tempo tentando decifrar aquelas mudanças inesperadas, mas o grisalho estava bem ali, parado no batente da porta, mala na mão e uma expressão que Wilson poderia descrever como "muito sedutora" apenas alguns minutos depois.

–Quer uma cerveja? - perguntou com uma casualidade que não sabia ter no momento.

House sorriu em resposta. Um sorriso sacana que já lhe era característico, mas seus olhos transbordavam alívio e novos sentimentos.

Wilson deu a passagem necessária para que o grisalho passasse e o observou, com um sorriso nos lábios, enquanto House entrava em sua vida mais uma vez.

Percebera que os erros nunca haviam importado, os passados e mesmo os futuros. Sabia as consequências de uma vida partilhada com House, mas isso também não importava. Apenas porque percebera que tudo ficaria bem no final, desde que ele nunca o abandonasse. E, agora, ele só queria tomar uma cerveja com o seu melhor amigo.