Ando durante horas naquela floresta. Conheço cada canto dela, cada lugar onde Petey e eu passeávamos. Cada árvore que está cravada com nossas iniciais. Como eu sinto falta dele, do seu humor, do seu sorriso, da sua teimosia e de como ele sempre se esforçava para me ver bem.

Uma simples palavra, um simples nome, trouxe à tona o pior dos sentimentos, a pior das lembranças. A pior coisa que aconteceu em todas as minhas vidas.

Chuto as raízes que estão espalhadas pelo chão, fecho a mão em um punho e soco o tronco de uma árvore, o que faz meus dedos latejarem. Dou um grito tão alto que por um curto instante a floresta fica em completo silêncio. Lágrimas escorrem pelos meus olhos. Eu só queria ir embora, sumir daqui. Morrer.

As estrelas estão começando a aparecer no céu, cada vez mais brilhantes. Um único céu, repleto delas. Um único céu que une o mundo todo. Sento-me na relva, encostada no tronco de uma árvore. Cansada de tudo aquilo. Meus olhos começam a pesar e a última coisa que eu vejo antes de fechá-los completamente é uma estrela, a mais brilhante de todas, como se sorrisse para mim.

Abro meus olhos de pouco em pouco e percebo que estou acima do chão, e que estou nos braços de alguém. Sendo carregada por alguém. Levanto meu olhar e os olhos de Joe pousam sobre os meus. Ele está com uma expressão de dor, por conta da sua perna, claro.

– Pare. Me ponha no chão, por favor. – digo com a voz sonolenta e em seguida ele me põe no chão, me equilibrando pela cintura. – obrigada.

– Você não voltou, fiquei preocupado que algo tivesse ocorrido – ele diz tirando uma folha do meu cabelo – então vim lhe procurar. Mas quando a encontrei a vi dormindo, não queria lhe acordar, então carreguei... Bem, tentei.

– Mas, e a sua perna? – digo constrangida

– Está melhorando – ele diz sorrindo – daqui a alguns dias já poderei partir e você irá ficar livre de mim.

– Joe... – digo abaixando a cabeça – me desculpe... De novo. Eu, eu não sei o que me deu. É que... Uma pessoa muito importante me chamava assim... Como você me chamou. É besteira... Me perdoe.

– Tudo bem, Valentina. – ele diz e depois de um tempo levanta minha cabeça – não é besteira. Sei como é... Quando se sente especial ou único para apenas uma pessoa... Já é o bastante.

Eu sorrio e uma lágrima escorre dos meus olhos, a enxugo imediatamente.

– Obrigada, Joe. Foi a coisa mais legal e com sentido que você já disse para mim esses dias todos – digo rindo.

– É melhor não se acostumar, garota – ele diz e em seguida passa os braços pelo me ombro – anda, vamos voltar para a cabana, essa floresta me assusta de noite.

– Medroso. – digo e depois andamos de volta para a cabana.

***

– Então - Diz Pete quando acabamos de comer – O que vamos fazer hoje?

–Não faço a mínima ideia. – Penso em alguma coisa enquanto o Pete guarda as coisas dentro da mochila – Que tal ahm...

– Que tal eu ir ver onde você mora? A gente pode descobrir alguma coisa – Diz ele se levantando e pondo a mochila nas coisas. – Você sabe... Pra descobrir o porquê de você estar aqui.

– Não sei se quero descobrir quem eu sou na frente de alguém. – Digo em voz baixa. – Talvez eu esteja aqui por uma razão boa ou talvez eu tenha feito alguma coisa má.

– Ah... – Ele bufa. – Isso é bobagem, Tina. Talvez você só precise de um par de olhos diferentes pra ver o que realmente está acontecendo, talvez você esteja vendo a imagem muito de perto e não está analisando a imagem completa.

– É, você deve ter razão.

– E quando é que eu não tenho? – Diz ele rindo, ele anda alguns passos e depois olha para mim. – Então, onde é que você mora?

Andamos um pouco até começarmos a ver a cabana, quando Pete vê, ele sai correndo, corro atrás dele, e ele começa a rir e a pular.

– Essa cabana é muito legal – Diz ele e pula mais um pouco.

– Eu não gosto muito dela, ela não tem nada demais. – Digo tentando acalmar Pete. – Aposto que a sua é muito mais legal com a minha.

– Você tá doida? – Diz ele pulando pra dentro da casa. – Deve ser legal morar sozinha, eu vivo com um bando de irmãos, às vezes é chato ter que repartir tudo com todo mundo. – Diz ele gritando de dentro da casa.

– Você não tem ideia do que é viver sozinho na floresta. – Digo seriamente para ele.

– É, tá. Você está certa. Mas também não é legal ter muita gente morando com você, às vezes minha mãe se esquece de mim, mas ela é legal.

– Está bem Pete, agora que tal você parar de pular e começar a me ajudar?

– Tudo bem. Desculpa. – Disse ele saindo da casa. – Vamos procurar por cada lugar da casa, procure primeiro por roupas que não sejam suas, sapatos, pegadas de sapatos maiores que seus pés. Não sei, tem que ter alguma coisa que indique que você e mais alguém more aqui.

Concordo com ele e começamos a procurar. Estava procurando debaixo de minha ‘’cama’’ quando vejo entre as tabuas de madeira, um grande pedaço de papel branco, quase invisível se não estivesse visto de perto, puxo-o e vou até Pete. Ele está olhando para o teto, procurando alguma impossível pista grudada no teto. Rio da cara dele e então ele me olha e franze o cenho.

– Ah, muito legal da sua parte, Tina. Enquanto eu fico procurando as coisas você fica ai brincan... Ei, o que é isso na sua mão? – Diz ele mudando de expressão rapidamente.

– Isso aqui é só... – Digo rindo de sua reação. – Uma coisinha que encontrei de baixo da cama.

– Só? – Diz ele revirando os olhos. – Estamos procurando por horas aqui, e você me diz que SÓ achou uma coisinha? - Ele ri e pula para me abraçar. – Hora bolas, abra logo isso. Valentina.

Olho para o envelope branco e o abro. Dentro dele tem uma carta, abro-a e começo a lê-la, e me surpreendo percebendo que sei ler e também com o conteúdo da carta:

‘’Querida Valentina,

Deixo está humilde cabana e meus ensinamentos para que você possa desfrutar de sua nova vida. Espero que com tudo que lhe ensinei você possa viver adequadamente e feliz.

Peço que me perdoe por ter que deixa-la. Logo, eu espero que entenda o porquê que tive de fazer isso. Nunca se esqueça do que lhe disse. Espero que algum dia seja seguro para que possamos nos reencontrar. Sua mãe ficaria muito orgulhosa da moça linda e corajosa que você se tornou.

Deixo-lhe três coisas que poderão ser uteis ou apenas uma lembrança minha.

Com todo amor do mundo, Papai ‘’.

Dentro do envelope tinha mais alguns papeis, um lápis e o desenho de uma casa de madeira, ela tinha escadas do lado direito para o andar de cima, e no andar de baixo uma porta estreita.

Então é só isso? Toda a minha vida está em um pedaço de papel velho e uma casa estranha? E o que ele quis dizer com ‘Nunca se esqueça do que eu lhe disse’? É, meu pai me deixou aqui sozinha. Será que ele não me queria? É claro que ele me queria, ele disse que me ama. Não é?

– Então, Valentina – Disse Petey. – O que está escrito no papel?

Dou o papel para Pete, e saio da cabana, me sento no chão da frente da casa e começo a pensar outra vez, depois de alguns instantes olho para o céu e para a floresta, e as lagrimas começam a vir e os soluços altos, começo a ficar sem ar, tento me acalmar de vagar, enxugo algumas lagrimas e vejo pelo canto do olho Petey se sentando ao meu lado, ele olha para mim e coloca um braço por cima de meus ombros e começa a me abraçar.

Alguns minutos se passam, talvez uma hora tenha se passado. Petey beija minha cabeça e pede desculpas por ter que ir embora, relutante deixo-o ir.

– Amanhã será um dia melhor, Tina. Eu prometo. Agora é melhor você entrar, aqui fora está começando a ficar muito frio.

Concordo e entro na casa, deito-me na cama desconfortável e fico chorando pelo resto da noite.