A Garota na Janela escrita por Kaito


Capítulo 1
A Garota na Janela


Notas iniciais do capítulo

One-shot muito rápida que me privou de uma noite de sono q
Esse ship é bem popular, pelo que me parece.
Devo milhões de agradecimentos a Erulissaë pela betagem da fanfic. Muito obrigada!!



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Quando uma nova garota se mudou para a casa ao lado, eu fiquei apreensiva. Seus cabelos eram negros; seus olhos, esverdeados. Vivos como esmeraldas, e apesar de puxados, se destacavam no rosto inteiro. Uma cor de olho que não era esperada de se encontrar numa japonesa natural, mas estava lá por um motivo qualquer. Eu me perdia naqueles olhos. Eles tinham a cor do gramado da minha casa. Meus olhos também eram coloridos e tinham a cor do céu. Por causa deles, eu era bem popular na idade de seis, sete anos, mas foram um presente da genética mesmo - minha mãe era alemã e meu pai era japonês.

Além da pontada de ciúmes que senti quando vi que já não era a única com olhos "especiais" a morar no bairro, ainda tinha de me enfurecer ao saber que a nova vizinha ocupara a minha base secreta. Uma casa de aspecto tão nojento não deveria ser vendida assim, sem mais nem menos. Deveria continuar sendo meu lugar de esconde-esconde, de refúgio e de solidão. Não tinham outras casas assim, mofadas, sujas, cheias de teias de aranha e grama tão alta que chegava aos meus ombros. Eu precisei observar a lenta e dolorosa reforma da casa antes de receber a família nova. Todos os dias, eu via a grama sendo cortada e substituída por flores; as minhas amigas aranhas sendo expulsas; a poeira sendo varrida; a madeira sendo polida; as telhas do telhado sendo trocadas; e as paredes sendo pintadas de branco.

Eu já não podia entrar mais na casa, pois os moços da construção não permitiam.

Quando chegou a garota, os meus pais me fizeram ir até a sua casa para lhe entregar um bolo. Ela me cumprimentou e parecia muito inocente; aquele olhar ingênuo de uma criança mais nova que você. Aos sete, eu já me via crescida, e quem quer que fosse menor do que eu era muito inferior na minha mente de menina moleca. Ela era muito mais baixa, tinha umas bochechas enormes e apesar de puxados, os olhos também eram enormes. A boquinha era pequena, com o coraçãozinho definido no lábio de cima, e seus cílios eram enormes. Ela devia ter uns cinco anos e me olhava com curiosidade. Seus cabelos negros e curtos tinham uma única mecha presa com uma fita decorada e fofa. A mecha balançava e estava de pé, tombando para um dos lados da cabeça. O corpo dela era magro e ela usava um vestido verde.

Contrastava comigo. Seus pais me confundiram com um garoto da primeira vez que me viram. Meus cabelos eram curtos, mas não tinham um corte "feminino", como os da menina. Eu os jogava para todos os lados. Minhas roupas estavam sujas de lama, o outfit do dia incluindo um hoodie com as mangas encolhidas até os ombros e um capuz jogado para trás, bermudas vermelhas que cobriam meus joelhos, meias brancas visíveis apesar dos tênis gastos e velhos de tanto correr. Ignorei quando os ouvi comentar com a filha "Está vendo, Miku? Seu novo vizinho veio nos cumprimentar!", e só esperei minha vez de me apresentar como Megurine Luka, da casa ao lado, para ver a reação constrangida dos pais. A menina, com cinco anos, mais ou menos, encarava tudo com grande curiosidade e se recusava a se pronunciar.

Eu notava que aquela garota raramente saía de casa, mas sua figura assistia as brincadeiras dos garotos através das janelas recém-colocadas da casa. No inverno, ela trazia sempre um paninho para limpá-la quando sua respiração embaçava o vidro. Parecia muito empenhada em nos ver. Foi assim por pelo menos um ano, e eu tinha mais e mais raiva daquela menina a cada dia que se passava. Se queria nos ver tanto, que descesse de uma vez! Mas eu só a ignorava, não querendo abrir espaço àquela que via como uma patricinha em meu grupo de garotos.

Conforme o tempo passou, nós duas passamos a frequentar uma escola que, convenientemente, era próxima o suficiente para que só fosse necessário descer a rua. Nosso bairro era cheio de escolas, então minha turma se separou. Eu tinha que ficar logo com essa menina, mas já com meus onze anos eu passei a não ligar muito para ela. Éramos cada uma no seu canto. Eu me perguntava se ela iria falar comigo, me contar por quê sempre nos olhava da janela; me perguntava se iria bater em minha porta para pedir ajuda com seu dever de casa ou se iria me chamar de Megurine-senpai, mas nada disso jamais aconteceu. Nada foi como eu imaginava. Foi assim que me interessei por ela e passei a achá-la intrigante. Ela havia me deixado curiosa por tantos anos, e mesmo agora, que estávamos unidas pela mesma escola além casas lado-a-lado, eu nunca obtivera respostas para as perguntas que me fazia sobre ela. Ao invés disso, só surgiam mais e mais dúvidas.

A pré-adolescência me separou de meus amigos de infância. Pelo bem daquilo que era estereotipado como "feminino", meus cabelos cresceram, meu senso de moda começou a aparecer e, de repente, eu estava obcecada por conjuntos pop ocidentais e assistia a reality shows e séries. Quando comecei a me empenhar demais nos estudos, abandonei todos esses gostos, mas nunca deixava de ouvir as minhas bandas preferidas e cantarolar suas melodias. Minha vizinha, já com nove anos, não tinha mais nada para encarar na rua, mas ela estava frequentemente regando as plantas ou fazendo qualquer coisa perto da janela enquanto eu cantava. Eu me perguntava se ela estava ouvindo, se estava gostando da minha voz.

Foi apenas em um dia desses, tão normal quanto hoje e ontem, que eu a ouvi. Parei para me perguntar se eu já a presenciara falando alguma vez. Ela cantava afinada e lindamente a uma das músicas que eu gostava. Não deveria saber a letra, mas reproduzia um "la, la, la" com o rosto virado para a janela. A dela estava aberta, a minha, fechada. Eu a abri como quem não quer nada e brinquei com um besouro que, por sorte, estava pregado em seu peitoril. Eu retribuí seu "la, la, la" com a letra real da canção. "Ooh, oh. Ooh, I'm radioactive, radioactive…" Ela parecia feliz, e logo fomos alterando em perfeita harmonia para as nossas músicas de preferência. Ela me encarava com admiração. Apesar de estar sem-jeito para retribuir o olhar, eu prestava muita atenção nela, e notei imediatamente que estava cantando sozinha quando ela virou o rosto para trás. Deveria estar sendo chamada. Ela se virou novamente para mim, piscou e foi embora.

Desde então, eu não a ouvi cantar mais nenhuma vez. Ela não tornou a olhar pela janela e nós crescemos separadas quando eu me mudei. Quando fui transferida para a escola nova, no ensino médio, conheci uma garota chamada Rin, que me apresentou ao seu clube de música. Naquele clube eu participei de festivais, trazendo orgulho, honra e mérito para a escola. Sentia-me deslocada por só poder cantar. Apesar de ser a melhor nisso entre os cinco membros, todos faziam também, e tocavam alguma coisa. Por causa disso, aprendi a tocar violão; um pouco por conta própria e um pouco com a ajuda de Rin. Em uma de nossas lições, o restante do clube nos fez uma visita surpresa. O ano estava acabando e o festival estava se aproximando. Os dois meninos mais velhos, Kaito e Gakupo, iriam dar o seu adeus depois de sua formatura, e por isso o clube tornaria a ter só quatro membros. Precisávamos decidir o que fazer para substituir os dois garotos notavelmente talentosos.

Naquele momento, o clube estava realmente unido. Eu me senti próxima de todos, e ao invés de realmente pensar em como promover o clube, nós só derramamos lágrimas e tomamos sorvete quando pensamos na separação. Aqueles eram os meus verdadeiros amigos. Foi quando Len, o irmão gêmeo de Rin, deu a ideia de fazermos um CD para fechar o ano com chave de ouro. Um tio de Gumi, outra integrante do clube, tinha um pequeno estúdio no porão de sua casa, onde poderíamos dar um ar profissional sem precisar pagar um preço caro que não teríamos como repor. Nosso álbum não precisaria ser nada muito impressionante para o resto do mundo, contanto que tivesse sua importância no clube. Queríamos eternizar esse grupo, e, quando estivéssemos formados, seguir com a carreira musical juntos.

Naquele dia, parecia um sonho possível, mas a partida de Kaito e Gakupo somente nos deixou mais confusos. Mesmo assim, o CD saiu, e ficou bem popular entre os alunos do colégio. Nós vendemos bastante, e isso atraiu novas pessoas ao clube. Precisamos fazer testes para não enchê-lo, optamos por abrir apenas duas vagas - o que era mesmo o plano inicial -, e ambas deveriam ser ocupadas por vocais masculinos, que nos fariam falta, mas além de Yuuma, um garoto de visual exótico, apenas uma garota entrou. Seu nome era Aoki Lapis.

Não demorou para que Len e Gumi caíssem nos encantos dos dois novos integrantes, que tinham vozes harmoniosas e muito talento na guitarra e no piano. Len e Aoki começaram a sair e eu vi alguma graça em Yuuma, mas não cheguei a me apaixonar. Foi quando percebi que Rin estava muito sozinha. Apesar de seu irmão não ter mesmo firmado um relacionamento com a nova colega, ele estava mais distante. O grupo estava mudando e se tornando algo que não era antes. Rin me visitou e chorou em meu ombro, contou das saudades que sentia. Nós ouvimos o CD muitas vezes. Não sei quanto a minha amiga, mas eu, pessoalmente, passei a me perguntar qual era o significado por trás da letra de cada música. Cada membro se responsabilizara pelo poema e melodia de duas faixas. Uma das minhas falava de aceitação; a outra falava sobre a menina que me observava pela janela. Eu não pudera esquecê-la, e seu rosto curioso nunca deixara minha mente. Eu sabia seu nome; Hatsune Miku. Mas isso não adiantava de nada se eu não sabia onde encontrá-la. Rin estava em meus braços e eu a abraçava com força enquanto ela chorava, mas esse nome específico não deixou minha mente. Peguei-me tendo pensamentos bobos, desejando que ela estivesse no lugar de minha melhor amiga. Como será que estaria hoje?

Sem que eu percebesse, eu e Rin nos aproximamos. Enquanto eu a confortava, nós nos beijamos. Foi uma sensação um pouco estranha, mas ela parecia estar realmente apaixonada por mim. Frequentemente me pegava pensando se eu sentia o mesmo, mas correspondia cada carícia, cada beijo como se tivesse certeza de meus sentimentos e minha sexualidade. Nós assumimos um namoro que só foi anunciado no nosso clube de música, e talvez esse tenha sido o estopim. Afinal, agora a nossa "banda" tinha um casal lésbico tomando parte! O quão revolucionário e rebelde isso não é? As duas meninas que escondem seus desejos de todo o resto da sociedade… Foi assim que fomos interpretadas. Eu acho que adolescentes não entendem muito sobre a homossexualidade. Eu mesma não entendo. Pratico, mas não entendo. Mas na época, eu e Rin fomos tratadas como um tipo de protesto a sociedade homofóbica e machista, e assim nos aceitamos sem reclamar.

De repente, todos no clube estavam adotando um visual mais ousado. Eu e Rin não fomos exceções. Ela e Len, talvez por serem gêmeos, decidiram assumir as suas semelhanças físicas e se arrumar para se parecerem mais. Ela cortou o cabelo, antes na altura dos ombros, deixando-o do mesmo comprimento que o de seu irmão, que usava um rabo de cavalo. Os dois pintaram os fios de louro-dourado, recebendo minha aprovação e também a do resto do grupo. Gumi também tinha cabelos longos, usava óculos de aro vermelho e realmente se parecia uma nerd, mas cortou tudo isso ao repicar o cabelo e tingi-lo de verde, inventar lentes coloridas e mudar o visual. Yuuma já tinha um estilo colorido e apenas Aoki não cortou os cabelos, mas pintou-os de vários tons de azul diferentes e passou a usar um penteado característico - que eram as marias-chiquinhas.

Esse penteado me lembrava Hatsune Miku, a menina da janela. Ela usava marias-chiquinhas com alguma frequência. Ela jamais me reconheceria agora. A menina moleca, que antes da puberdade realmente se parecia com um garoto, tinha deixado crescer os cabelos, ganhado peso no busto e nos quadris e passado a vestir roupas curtas. A magia de minha aparência estava em meus olhos naturais, mas não deixei que eles tomassem conta de toda a atenção quando pintei meus cabelos de rosa. Agora, sim, ela não me reconheceria, e eu temia por isso de certa forma. Talvez nosso reencontro fosse me divertir. Eu poderia agir como se não a conhecesse e começar tudo de novo. Talvez ela me reconhecesse pelos meus olhos atípicos ou minha voz. Melhor ainda, talvez eu não a reconhecesse, mas nós nos uníssemos e eventualmente nos identificássemos ao falar do passado. As fantasias iam surgindo e fluindo em minha mente sem nunca parar, e mais músicas foram surgindo para o sucesso da banda. Eu e Rin assumimos nossa relação publicamente, e na mesma noite em que fizemos a platéia berrar com um beijo nosso, nós tomamos bebidas que não eram para nossa idade e tiramos a virgindade uma da outra.

Nem tudo é um mar de rosas.No ano que vem, eu e Yuuma partiríamos. No auge de nosso sucesso, tocando músicas originais em festivais e vendendo CD's fora de escola, seríamos obrigados a deixar o clube. Todos temiam pela falta de uma guitarra que se igualasse a do menino, ou, pior ainda, da voz harmoniosa e letras bonitas que eu tinha. Percebi com isso que aquele clube seria um eterno ciclo vicioso, até que Rin e Len se formassem também e ele fosse deixado a membros completamente novos, que nunca fizeram parte da formação original. Nós iríamos continuar perdendo o que tínhamos se não nos uníssemos novamente.

O professor que era responsável pelo nosso grupo, Kiyoteru-sensei, mantinha sua distância dos problemas do grupo. Apesar de ser de grande ajuda na parte técnica e profissional, demonstrava apenas preocupação, mas nunca atitude quanto a esse tipo de conflito. Ele trouxe para mim, com ar eufórico, alguns cartões de caça-talentos que haviam entrado em contato conosco. Eles queriam ver tanto a mim quanto a Rin mais de perto. Assim, nós duas começamos a decair. Eu achava uma ótima oportunidade em minha frente sem sequer ter deixado a escola, mas sabia que dependia da minha namorada para alcançá-la. A platéia me amava por beijar uma garota na frente de todo mundo. Em compensação, ela não concordava. Achava que nossa relação devia ser só nossa e que não podíamos vender algo assim. Não queria mudar, só ia se fosse com o grupo original. Nós tentamos contatar Kaito e Gakupo, mas os dois estavam ocupados com a faculdade de medicina.

Afinal, eu e Rin terminamos depois de muitas brigas e um olheiro me convidou para uma carreira solo.

Aos vinte anos, lá estava eu, de cabelos cor-de-rosa, tocando com uma banda de improviso em um bar. Eu me encontrei com Kaito e Gakupo por aí, e só assim começou a minha motivação. Gakupo estava começando com a carreira de medicina e Kaito dava aulas na mesma faculdade que frequentara, e os dois estavam com vinte e dois anos. Quando tinham férias, nós nos reuníamos em trio e cantávamos músicas antigas por diversão. Em algum momento, eu me envolvi com Gakupo. Foi por uma noite só, mas foi intenso para mim. Eu estava bêbada, mas não tanto quanto ele, e acordamos na mesma cama de casal da casa de Kaito, que precisou explicar ao amigo o que tinha acontecido. Nós dois coramos, e eu passei a me perguntar se iríamos continuar com aquilo. Já não questionava minha própria sexualidade; sou "o que der e vier", concluí. Mesmo com a tensão que se formara entre eu e Gakupo, o apoio dos meninos era enorme. Nós nos reuníamos sempre na casa de Kaito e tocávamos, ouvíamos os CD's antigos, víamos fotos e comíamos pipoca. Passei a escrever músicas sobre os velhos tempos, tudo graças a nostalgia que os dois trouxeram a mim.

Mesmo com todos esses momentos bons, sentia-me bamba em minha carreira. Eu gravava CD's que não tinham nenhum significado e tocava em bares sem nunca ter um verdadeiro show. Minha carreira só avançou de verdade quando criei meu canal no YouTube. Publiquei músicas antigas, recebi comentários de antigos colegas que logo me promoveram pela internet. Em um piscar de olhos, eu era reconhecida na rua. Quando já estava com meus vinte e cinco anos, a fama que eu tinha como parte do antigo clube de música da escola se uniu com aquela que eu começava a ganhar como Megurine Luka, e assim eu fui um grande sucesso. Minhas músicas novas tinham um estilo diferente, mas foram aceitas pelo público.

Em uma noite qualquer, deitada nos braços de Gakupo e assistindo um filme enquanto Kaito estava no supermercado, eu me vi posta contra a parede de uma vez por todas. O garoto me fez a pergunta que não queria calar na mente de ninguém: quem te inspira ao escrever suas músicas? Eu logo respondi que eram meus queridos amigos, mas quando ele mesmo cantarolou em sua voz grossa algumas de minhas melodias antigas, mas também algumas das mais recentes, eu percebi que elas tinham algo em comum. Tudo que eu cantava era para Hatsune Miku. Dada a nossa relação "enrolada", eu não quis explicar isso a Gakupo, uma vez que eu não entendia meus sentimentos por essa menina misteriosa. Talvez eu estivesse apaixonada por ela, mas talvez eu realmente só a achasse intrigante; talvez eu só quisesse as respostas das perguntas que fazia a mim mesma havia tanto tempo, ou que uma de minhas fantasias se realizasse. Se eu a encontrasse, como seria? Como eu prosseguiria?

Apesar disso, eu me senti livre para contar tudo isso a Kaito, desde o começo. Antes de tudo, ele se tornou meu confidente. Não tínhamos a menor vontade de nos envolver, mas parecíamos mesmo um casal. Era como um amigo gay - que nesse caso, tinha uma amante do sexo feminino, muito obrigada. Eventualmente, ele e dita amante, Meiko, trocaram alianças e deveriam se casar. Minhas noites de confissões e desabafos, minhas tardes de música, pipoca e nostalgia e minha grande fonte de conselhos se ausentaram. Eu senti muita falta dele por um tempo. Eventualmente, eu e Gakupo começamos a sair. Não houvera um pedido sério. A internet estava louca para saber quem era o rapaz de cabelos longos e roxos com quem eu agora era vista saindo. Afinal, eu não era lésbica?

Mas um dia, um determinado, abençoado dia, ele me convidou para ir ao teatro, assistir a uma peça nova. O primeiro roteiro original de um grupo amador que acabara de começar. Seria um musical. Eu nunca me importei muito com teatro, mas não deixei de me identificar ali. Se nosso grupo tivesse dado certo, eu, Gakupo, Kaito, Rin, Len e Gumi estaríamos ali. Eu prendi meus cabelos em um coque e, apesar da escuridão, coloquei óculos escuros. Usando como desculpa o frio, me cobri com casacos e mais casacos. O mesmo fez Gakupo. Assim, pudemos ir ao teatro sem sermos reconhecidos. Os atores eram muito bons. O roteiro era intrigante e a platéia toda estava atenta. Todos os números musicais foram impressionantes. Contava a história de uma jovem garota que sonhava em cantar, e só realizou esse sonho ao crescer. Identifiquei-me muito com a protagonista do conto. O tempo inteiro, uma atriz mais jovem, de uns dezoito anos, interpretou a protagonista. Todos os personagens cantaram, mas salvaram a voz da principal para a última cena: seu primeiro show. Na metade da peça, a atriz da protagonista foi substituída por uma mais velha, marcando a passagem do tempo e o crescimento da personagem. Devido a um cuidado e tanto com o figurino, quase não pude perceber isso do lugar em que eu estava, que era nas últimas fileiras, mas a diferença de altura e idade era notável.

Então, a garota cantou. Foi emocionante, pois as duas atrizes que fizeram a protagonista em épocas diferentes contracenaram, uma como um fantasma do passado e a outra como o sonho realizado. Mas foi mais emocionante para mim do que para o resto do público. Aquela atriz maravilhosa, linda, com os cabelos enormes e presos em duas marias-chiquinhas era Hatsune Miku. Tinha que ser ela. Era a voz dela. Sim, estava mais madura do que me lembrava, mas eu a reconheceria em qualquer lugar. Nosso tão esperado reencontro estava para acontecer. Pedi, implorei a Gakupo que me deixasse tentar entrar no camarim, e quando eu não quis explicar o motivo, ele permitiu, entendendo que deveria ser importante. Deixei ele esperando do lado de fora e entrei.

A primeira pessoa que encontrei era aquela que fazia a menina mais jovem. Eu me apresentei a ela, que pareceu um tanto surpresa ao me falar que a autora da peça se baseara em mim para escrever a protagonista. Ela até mesmo se dera ao trabalho de fazer a principal pintar seus cabelos de alguma cor exótica. Os de Miku eram verde-água, mas os da menina com quem eu conversava eram pretos. Fui apresentada a dita autora, que era ninguém mais, ninguém menos do que Gumi. Ela me contou que acompanhara meu sucesso de longe e se lembrara do quão esforçada eu era, mas saiu do clube de música em seu último ano na escola, passando a participar do clube de teatro. Presenteou-me com notícias sobre o clube, que Rin estava cursando psicologia e Len, Aoki e Yuuma foram encontrados por um olheiro e estavam começando uma banda, com o show marcado; e assim o clube fechou. Retribuí com a notícia do casamento de Kaito e minha relação com Gakupo. Implorei a ela que me deixasse ver a atriz que viera procurar. Depois de passar por todo o elenco, cumprimentando alguns fãs que estavam entre eles, eu e Gumi finalmente encontramos a sala que procurávamos. Ela bateu na porta. A menina atendeu. Gumi anunciou minha presença.

Aquele não era o reencontro que eu esperava, e eu não tinha nenhum roteiro inteligente em mente; mas tudo bem. Assim estava bom. Engoli em seco, me perguntando se ela me reconhecia. Ela ainda tinha aquela expressão curiosa, mas agora seus olhos brilhavam, como se esperassem alguma confirmação.

– Boa noite, Hatsune Miku. - eu a cumprimentei. Finalmente entendia meus sentimentos. Eu queria abraçá-la e beijá-la ali e agora. - O meu nome é Megurine Luka. - ela assentiu. - Gostaria de parabenizá-la pelo seu número e… - eu mal sabia o que estava falando. - E convidá-la para cantar comigo. Você aceitaria?

– Prontamente. - ela me respondeu formal, mas sorriu abertamente. Levantou-se da cadeira giratória onde estava sentada, pegou minhas mãos, segurando-as com firmeza entre seus dedos; e então murmurou a melodia que cantamos juntas naquele dia, na janela. Dessa vez, tive o prazer de olhá-la nos olhos.

Ooh, oh. Ooh, I'm radioactive, radioactive.


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Notas finais do capítulo

Comentem! o/
Novamente, obrigada a Erulissaë por betar a fic :3.



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