O retorno do menino do espaço escrita por Celso Innocente


Capítulo 8
Check'up




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/537573/chapter/8

Segui acompanhado pela doutora, até um ambulatório médico, no edifício da NASA, que fica próximo ao hotel. A primeira coisa que ela fez, foi realmente colher meu sangue, onde, apesar de quase nem sentir a agulha, fiz tamanha careta, que ela mesma caçoou:

— Nem parece ter dezessete anos de vida!

— Olha só o bracinho do homem! — Justifiquei.

— Agora você tomará seu café da manhã.

— Obá! — gracejei — A melhor parte!

Pelo interfone, solicitou à garçonete, que era uma moça de uns vinte anos, também morena e muito gentil, que me levou até o refeitório, situado no mesmo prédio, me colocando a postos, diante de uma mesa e me serviu um excelente café.

Retornando ao ambulatório médico, a doutora me levou até uma sala em separado e pediu:

— Tire a roupa...

— Oh, owh! — Tímido como sempre fui, me espantei.

— Oh, owh... Por quê? — Riu ela — Pode ficar de cueca!

— O que vai ser agora? — Perguntei indiferente.

— Precisamos fazer uma tomografia! Mas não se preocupe, é um exame simples.

— De cueca? — Emendei.

— Homenzinho? — Riu ela.

Já estava ficando habituado a estes pedidos, em me despir, que já nem sentia tanta vergonha. Tirei a roupa e estando de cueca ela pediu:

— Este adereço em seu pescoço, também precisa sair!

— Se tirá-lo, não entenderei mais o que a senhora fala.

— Então é isso! Seu segredo mágico! — Insinuou ela, segurando o aparelhinho — Não tem problema! Não precisamos nos comunicar durante o exame.

— Nada de venenos em meu sangue.

— Só um pequeno contraste, pra podermos separar seus órgãos e glóbulos.

— Nada feito — neguei convicto.

— É inofensivo! Lhe garanto!

— Não pro meu organismo! Que não envelhece e não consegue eliminar o que recebe.

— O contraste será um intruso em seu organismo — tentou explicar ela. — Quando isso ocorre, os anticorpos travam uma guerra, eliminando-o.

— Nessa guerra, quem sairá perdendo, com certeza serei eu!

— Tudo bem — se convenceu ela. — Faremos tal exame, sem contraste.

Então retirei o aparelhinho, colocando-o sobre uma mesinha. Ela fez sinal para que me deitasse sobre uma mesa grande, então ligou um aparelho que me envolveu o corpo, fazendo uma leitura lenta e geral:

— Let your brain!

Ela se esqueceu que eu não podia entendê-la.

— Thyroid... trachea... aorta...

Será que alguém vai plantar alface em mim?

— Now your heart and lungs.

Fiquei na mesma. Alguma coisa do coração.

— Spleen, liver, gallbladder...

— ...kidneys, stomach.

Só entendi estômago.

— Small intestine... large intestine.

Acho que são intestinos.

— Bladder, prostate, urethra, testicles.

Êpa! Acho que é meu negócio de fazer xixi!

Poucos minutos depois, tendo concluído o exame, mandou me levantar e me vestir. De posse de meu aparelhinho, então lhe disse:

— Não entendi patavina do que me disse: Intestines, heart, stomach…

— Não importa! — Negou ela — Quero que você beba bastante água.

— Bastante?

— Uns dez copos, pelo menos.

— Não consigo.

— Não precisa ser de uma vez! Beba aos poucos e não faça xixi.

— O que vai ser agora?

— Faremos um ultrassom.

— Acha que estou grávido?

— Pode ser — riu ela.

Assustei-me. Ela percebeu:

— É brincadeira Regis! O exame é pra ver alguns órgãos internos seu. Os exames que fizemos nos mostraram algumas alterações e precisamos de mais detalhes.

— O que se passa?

— Só queremos mais detalhes, de o porquê de você não envelhecer e até quando.

— A senhora conseguirá me dar respostas, de até quando?

— Estou tentando! Preciso contar com você.

— Tudo bem!

— Poderemos fazer o exame de contraste? Você disse que não quer, mas é pro seu bem.

— Exame radioativo?

— O nível de radiação é muito baixo e seu organismo o eliminará em poucas horas.

— Meu organismo é diferente dos outros organismos. A senhora mesma confirmou isto, vendo que não envelheço.

— Mesmo assim, como já lhe disse, quando algo estranho invade esse organismo, ele reage imediatamente, o expulsando sem trégua.

— Preciso ver com mamãe.

— Fale com ela durante o almoço ou à tarde. Garanto que é pro seu bem.

Retirei-me e bebi de uma vez, dois copos de água. Parece pouco, mas estávamos antes do almoço e sou pequeno. Afastei-me, indo para o pátio e para o jardim, caminhando sempre em busca de alguém conhecido.

— Regis! — Chamou-me uma voz conhecida.

Virei-me e reconheci o senhor Charles, um pouco mais velho do que há sete anos:

— Senhor Charles! O senhor continua por aqui?

— Claro garoto! Aqui é meu lar! E você? Como tem passado? Viajou muito durante esse tempo?

— Estive fora novamente.

— Estou sabendo — o confirmou.

— Fui fazer uma pequena viagem — ironizei com sorriso maroto.

— Pequena? — Riu ele.

— Sim! Um mundo vizinho da Terra. Irão me entrevistar novamente?

— Com certeza! Temos um encontro às dez horas de amanhã. Como vai indo seus exames médicos?

— Vou fazer um ultrassom. Queremos saber o sexo do nenê.

— Então tá! — Riu ele — Depois você me conta.

— Vou beber mais água.

— Muito bom! Amanhã a gente se vê.

Já ia me retirando, quando ele tornou me chamar e perguntou:

— Quem é o pai?

Fiz gesto de “sartei de banda”, igual a Zé Coqueiro, no filme “O menino da porteira” e voltei ao bebedouro, onde consegui beber mais dois copos de água. Já começava a sentir a bexiga cheia. Abri uma geladeira tipo frigobar e apanhei uma garrafa de meio litro de água e lentamente me afastei novamente ao jardim, caminhando até um grande açude que existe dentro do complexo, um pouco afastado do ambulatório médico.

Esperava encontrar mais algum conhecido, inclusive, quem sabe, meus familiares; mas como o complexo é muito grande, não encontrei ninguém.

Enquanto caminhava, sempre bebia um gole de água e quando estava admirando o açude, a garrafinha já estava praticamente vazia; minha bexiga, porém, estava lotada e já sentia vontade em esvaziá-la, então, caminhando um mais rápido, retornei ao ambulatório, aonde cheguei suado e ofegante. A secretária da doutora Wendell, percebendo, perguntou:

— Está pronto pro exame?

— Acho que sim!

— Vou chamar a doutora.

Retirou-se, voltando dois minutos depois com a doutora, que perguntou:

— A bexiga está cheia?

— Se beber mais água, ela vai explodir!

— Então vamos ao exame. Venha comigo.

A acompanhei até uma sala de ultrassom, idêntica às nossas do Brasil. Embora eu jamais tivesse visto uma. Tirei a camiseta e deitei-me. Ela baixou um pouquinho meu short e cueca (sem me despir); levantou meu pescoço, retirando meu aparelhinho tradutor, esfregou um gel gelado sobre toda minha barriga e iniciou um exame, onde alguma coisa de dentro de meu corpo aparecia em um aparelho de tevê, tipo monitor de umas quinze polegadas, sem comentar o que se passava.

Conforme forçava minha barriga, talvez forçando minha bexiga com aquele aparelho, que com certeza, deveria existir uma câmera que gravava em raio xis, me dava uma vontade doida de fazer xixi, fazendo com que o danado chegasse até a porta de saída e parasse por ali.

Cinco minutos depois, terminando o exame, apanhou uma toalha de papel, limpou o gel de minha barriga, normalizou minha cueca e short, então pediu que me levantasse, devolvendo meu aparelhinho:

— Muito bem! — Disse ela, com leve sorriso — Me acompanhe.

— Posso me vestir?

— Ainda não.

— Quase que a senhora me fez fazer xixi nas calças!

Levou-me até outra sala, onde existia um tipo de vaso sanitário no chão, com alguns cabos ligados.

— Já que é assim, então faça seu xixi neste vaso. Esvazie toda a bexiga.

Papai me contara um dia, que já fizera um exame destes. O computador vai medir a velocidade e força do jato de urina, pra saber principalmente se a pessoa tem algum problema de infecção urinária ou de próstata. Então resolvi perguntar:

— Este exame não é feito só por pessoas mais velhas do que eu?

— Como você sabe? — Admirou-se ela.

— Não seria pra ver coisas de adultos?

— Realmente! E não é tão necessário pra você! Mas como você já está com a bexiga cheia, não custa nada fazer! Ou você prefere não fazer?

— Quero fazer xixi!

— Então está na hora! Só espere-me sair da sala e deixá-lo à vontade.

Ela se retirou e eu esvaziei minha bexiga. Parecia que não queria mais parar e a sensação era realmente muito boa. Acho que despejei uns cinco litros de urina.

Voltei à sala da doutora, que já em poder desse resultado, se levantando, disse:

— Este está muito bom! Venha comigo.

Voltamos à sala de ultrassom, onde me mandou deitar e ao repetir o ultrassom, perguntei-lhe:

— Outra vez?

— É só pra ver se você realmente esvaziou a bexiga.

— Tenho certeza que sim! — Ri.

Ela esfregou o aparelhinho sobre minha barriga e confirmou:

— Está excelente! Levante-se, se vista e venha comigo.

Vesti a camiseta, voltei com ela à sua sala e então, sentei-me à sua frente. Ela me olhou firme e séria, então falou[1]:

— Vou lhe fazer algumas perguntas. Não é brincadeira e é pro seu bem. Para uma criança de nove anos, são perguntas desnecessárias. Mas em seu caso, você tem dezessete e precisamos de dados reais. Tudo bem?

— Que mistério! — Assustei um pouco.

— Você já se masturbou alguma vez na vida?

— Quê? — Me envergonhei, principalmente por ser pego de surpresa com tal pergunta indiscreta.

— Ou pelo menos, depois de ter ido ao outro planeta?

— Nãão! — Neguei convicto, sem gostar de tal pergunta intrometida.

— Já eliminou algum líquido diferente pelo pênis?

— Como assim? — Perguntei sem olhar para ela.

— Algo que não seja xixi.

— Nunca! — Neguei muito tímido.

— Alguma vez já teve um tipo de sonho e acordou molhado, com algo que não seja xixi?

— Como? — Continuava tímido.

— Um tipo de líquido grosso?

— Nada disso! — Neguei sem olhar para ela.

— Você às vezes se... excita?

— Pra que estas perguntas tontas?

— Preciso descobrir se você é criança ou adolescente.

— Até os bebês se excitam às vezes! — Insinuei bravo.

— Está bem, Regis! — Concluiu ela, rindo de leve e se levantado — Desculpe-me as perguntas bobas.

Levantei-me também e a acompanhei até a saleta da secretária.

— Não temos mais exames pra fazer! Falaremos amanhã cedo.

— Descobriu algo sobre mim?

— Vou rever todos os exames e falo com você amanhã. Mas só pra lhe tranquilizar, lhe garanto que tens uma saúde de ferro!

— Terei filho um dia?

— Por que pergunta isso? — Se admirou ela, já sabendo a verdadeira resposta.

— O senhor Frene me disse que eu jamais serei papai!

Ela se abaixou diante de mim e segurando em meus dois braços confirmou:

— Lamento informá-lo, mas acho que infelizmente ele tenha razão. Venha comigo.

Voltamos a seu consultório, sentei-me novamente diante dela, que me disse:

— Vou rever seus exames com atenção e lhe conto as novidades, mesmo que você já tenha voltado ao Brasil. Mas a princípio, posso afirmar que existe um tipo de bactéria ou vírus, alojado em seu sangue e organismo. Esse vírus não é maligno. Pelo contrário: ele impede suas células de envelhecerem e se multiplicarem. Com isto você não envelhece e não cresce. Não posso afirmar até quando este vírus permanecerá em seu organismo, pois ele não está sendo eliminado em hipótese alguma. Você não deverá tão cedo ter barba, nem pelos embaixo dos braços, ou no peito.

— O senhor Frene me disse tudo isso.

— Disse que você não sairá da infância? Que você não chegará à adolescência? Não produzirá espermatozoides? Não poderá ser papai?

Dei de ombros.

— Mas não quer dizer que não poderá namorar!

— Acho que estou apaixonado.

— Verdade? — Brincou ela — Quem é a felizarda em namorar o menino mais famoso do Universo?

— Se chama Elizabeth. É minha colega desde a escola e tem dezessete anos.

— Não está um pouco velha pra você?

— Ela disse que vai me esperar, mas sei que não será possível e terei que autorizá-la a namorar outro.

Ela pensou um pouco e concordou:

— Talvez seja melhor você tê-la apenas como amiga.

Deixei correr uma pequena lágrima.

— Você perdeu sua infância indo ao espaço. Talvez o que esteja acontecendo, seja uma forma de recuperá-la.

— Fora de meu tempo!

— Verdade! Mesmo assim, refaça seus amiguinhos e procure ser feliz.

— Não se preocupe. Gosto de ser criança! Só preciso me readaptar. Meus pais estão mais velhos. Meus irmãos caçulas, já não são mais caçulas. Trocaram de lugar comigo.

— Aproveite esta nova infância — pediu ela. —Ela deverá passar um dia!

— O senhor Frene prometeu me ajudar.

— Como ele poderá fazer isso? Está muito longe.

— Acho que me prometeu só pra não me desanimar. Eles também não têm filhos. Só um clone meu.

— O que você disse? — Se espantou — Um clone?

— Desculpe doutora Wendell — me arrependi. — Não deveria ter falado nisso!

— Mas é verdade? Existe um clone seu?

Acenei lentamente que sim e continuei:

— Promete não comentar com ninguém? Eu não havia falado nem mesmo com meus pais sobre isso!

— Não se preocupe. É seu segredo, eu não conto! — Se levantou e me abraçou amigavelmente — Como ele é?

— Idêntico à mim. Foi tirado de meu DNA.

— Ele está naquele planeta alienígena?

— Sim! Ficou em meu lugar. Como não conhece a Terra, não sente saudades e me substitui. É a única criança em Suster. Na verdade, eu também não o conheço pessoalmente. Só o vi uma vez. E assim mesmo, pelo vídeo.

— Regis, isso é ótimo! Aqui na Terra não existe clone de pessoas!

— Eu sei! O senhor Frene me disse.

— Como ele pode saber?

— Ele sabe tudo! O importante é que ele tendo o outro Regis, não mais me buscará na Terra.

— Você precisa contar a seus pais. Isso os tranquilizará mais.

— Temo que eles achem que o outro Regis, seja também outro filho deles. Eu o vejo como um irmão gêmeo.

— É complicado. Mas o clone realmente é possível! Aqui na Terra não existem! Mas é devido apenas a questões morais e religiosas.

Levantei-me e pedi:

— Posso ir agora?

— Sim, pode! Sabe voltar ao hotel, sozinho?

Acenei que sim e pedi:

— Jura por Deus não contar este segredo?

— Juro por Deus e por você, Regis! Só contarei no dia em que você me autorizar.

Deu-me um beijo na face e então saí, retornando ao hotel.

Apanhei um cartão magnético na recepção e subi pelo elevador até o sexto andar; andei alguns passos no corredor e apontei o cartão a um receptor eletrônico, próximo à fechadura da porta, no apartamento de número seiscentos e doze. A porta se abriu, entrei, deitei-me no sofá da sala de estar e liguei a televisão com o controle remoto.

[1] Desculpe-me o assunto tabu, mas faz parte das investigações médicas na estória.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Vai um comentariozinho aí? Vai: Por Regis.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O retorno do menino do espaço" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.