Everlong escrita por Larissa Irassochio


Capítulo 2
Capítulo 2




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Os dias passaram tão rápido que agora neve caía do céu, cobrindo o gramado do castelo com uma espessura branca e gelada. Era bonito, porém um mal sinal. Dias ruins estavam por vir.
Já fazia algum tempo que não via o Charlie. Ele sumiu, não apareceu mais para nossas travessuras e nem o via andar pelo gramado ou na cozinha. Talvez, tivesse se esquecido de mim, encontrado algo melhor para fazer.
Eu estava sentada na escadaria a espera das carruagens dos reinos. Meu pai sempre dizia "Seja amigo dos seus inimigos" e era isso que ele estava fazendo hoje, convidando seus inimigos a passar alguns dias no castelo. Ótima ideia, ótima. Ouvi leve passos e vozes, uma delas era a voz rouca do meu pai.
– Irá congelar se continuar aqui no frio. - ele disse com tanta calma que eu chegava a inveja-lo
– Eu gosto do frio. - respondi com o tom de voz baixo.
Ele suspirou e sentou ao meu lado com um gemido seguido de "estou ficando velho". Depois de longos minutos em silêncio, ele disse:
– Isso não vai amenizar a dor.
– Eu não estou sentindo dor. - as palavras saíram ainda mais baixas.
– Eu sei que você está, sei que sente falta do Charles.
Eu não queria falar sobre aquilo com ele. Não queria sentir nada, só queria que tudo amenizasse por segundos, então, meu pai me fez esquecer aquilo por algum momento. Ele me abraçou.
Três carruagens entraram pelo portão de ferro, cavalos fortes e negros carregavam-nas sem esforço. Nos levantamos e os seguidores do meu pai se postaram ao lado dele, abrimos longos sorrisos falsos.
Da primeira carruagem desceu o rei de Cabrion, sua esposa e dois gêmeos pequenos que deveriam ser seus filhos. Eles apertaram as mãos de cada pessoa, sorrindo nervosamente, lançou um olhar preocupado ao meu pai e adentrou o castelo.
Um homem alto e encorpado desceu da segunda carruagem. Ele estava sozinho - quando nos cumprimentou explicou que sua mulher tinha pegado uma gripe e não podia sair da cama. Ele era quieto e fechado, como se não gostasse de nós.
Na última carruagem, um senhor já com a barba esbranquiçada desceu. Carregava uma bengala e mancava, logo atrás desceu seu filho. Era um garoto alto e fisicamente magro, suas madeixas eram muito loiras, tão loiras que eram quase brancas. Mas tinha algo naquele olhar, era vazio. O pai dele nos cumprimentou, tossia muito. O filho se limitou a olhares.
Depois, seguimos para a sala do piano. Sentamos nos sofás, silenciosos e calmos. Papai sorriu para mim, como um pedido.
Meus dedos dançavam sobre as teclas, um som bonito ecoava. Como se as notas me puxassem para mais perto do instrumento, me fazendo querer tocar mais a cada segundo. Então, todos me aplaudiram e eu senti que era hora de parar, sorri e me afastei do piano.
– Por que não vai fazer um passeio no gramado, filha? perguntou aquilo praticamente me obrigando a levar os filhos dos outros reis comigo. Não que eu não quisesse passear um pouco, na verdade, eu queria sim! Queria poder encontrar com Charlie no caminho mas o medo daquele filho do rei de Sywn era tão grande.
Aquele garoto não era normal, eu juro. Os olhos dele, não tinham cor, eram vazios de sentimentos. Ele era...apavorante.
Os dois gêmeos iam a minha frente, mexendo em tudo o que podiam - bem, isso aqui não era um museu -, o jovem Sywn ia ao meu lado mas a uma distância razoável. Ele mantinha as mãos no bolso, olhando para o chão. Já eu, ia atenta a tudo a minha volta, queria ver Charlie Raupp, abraça-lo e dizer que ele era um idiota.
Passamos a manhã toda andando nas redondezas do castelo, atolando nossos pés no gelo. Os pequenos pareciam se divertir com aquilo, fazendo guerras de bola de neve. O jovem inimigo preferiu se sentar abaixo de uma árvore e observar.
Depois de algum tempo, eu percebi meu pai nos observando da janela. Eu acenei, ele não retornou.
Parecia estar caindo um mundo de conspiração bem em cima da minha cabeça. Eu tinha certeza de que a guerra que estava por vir era minha culpa, que Charlie não falava mais comigo e eu era, praticamente, obrigada a aguentar dois gêmeos que não aquietavam a bunda.
Meus pés afundaram na neve quando dei os primeiros passos em direção as casas dos criados. Me dirige a casa que eu conhecia bem, minhas mãos geladas tocaram a maçaneta abrindo a porta. Me senti incrivelmente bem, acolhida e familiarizada.
A sala e a cozinha eram juntas, absurdamente pequenas. Várias cortinas penduradas no teto, chamavam atenção por serem as únicas coisas coloridas no lugar. Os móveis já não eram novos e demonstravam que precisavam ser trocados, mas eu sabia que a mãe de Charlie não tinha condições.
Depois de algum tempo parada no meio da salacozinha resolvi chamar.
Alguém?
Nada. Nenhuma resposta.
Suspirei e esfreguei minhas mãos, estava realmente frio ali. Então, segui em direção aos quartos. Empurrei a cortina que servia de porta e dei de cara com um quarto modesto. Uma luz fraca entrava pela janela, iluminando o ambiente.
Olhei para o chão. O tapete já estava velho e surrado, sem cor, sem vida mas o que me fez aproximar foi o que tinha sobre ele. Abaixei, até meus joelhos encostarem no chão e eu tocar o corpo frio da mãe de Charlie. A Sra.Raupp estava sobre o tapete em posição fetal, uma fina linha de sangue escorria do nariz dela.
Ela estava morta.
Fui me afastando lentamente até poder correr até o castelo. Subi as escadas pulando dois degraus por vez, até Rosmerta me barrar com olhos arregalados.
–Aprontando novamente, Madley?
–A Sra.Raupp... ofeguei, subindo mais alguns degraus ela está morta.
Rosmerta levou a mão a boca escancarada, estava apavorada. Ela não me proibiu de continuar correndo escada a cima já que estava muito ocupada em correr escada abaixo.
Agradeci a todos os reis ao chegar no corredor do salão papai disse que estaria por lá a tarde toda antes que eu pudesse empurrar as grandes portas, papai saiu. Nunca tinha o visto daquela forma. Pálido...parecia com medo.
–Pai... eu murmurei.
–Corra. interrompeu-me Você ouviu, corra. Vá para a floresta e não volte.
–Como assim não voltar? perguntei, incrédula.
–Só corra Madley. beijou minha testa. Eu amo você.
Um estrondo. Gritos. Guerra.
–Vá pelo porão. Vá. meu pai disse enquanto corria em direção as escadas, a espada em mãos.
Naquele momento eu quis abraça-lo, queria que ele dissesse que tudo iria ficar bem ou que era apenas um sonho ruim. Mas era real, inevitável, as mortes aconteceriam.


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