Fábulas de Sangue escrita por Van Vet


Capítulo 7
Branca de Neve




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Dois dias se passaram após o caso “Cigarra”. Branca de Neve ligou para Rosa Vermelha no fim da segunda noite apenas para descobrir que a fujona desaparecera de fato. O interrogatório feito pela irmã na comunidade da Fazenda não estava sendo produtivo, ninguém ouviu ou viu nada de incomum sobre a tal fábula.

A vice-prefeita tomou o elevador na manhã do terceiro dia e caminhou pesadamente para o escritório da prefeitura como era seu costume. Lá dentro tudo encontrou as escrivaninhas vazias e Bufkin cochilando numa pilha de livros grossos.

— Bufkin! — o chamou enquanto colocava sua bolsa e um pacote de doces em cima da mesa. — Bom dia.

O macaco alado abriu os olhos remelentos e bocejou. Ergueu-se desajeitadamente e bateu as asas fazendo um voo pequeno.

— Quer um docinho? — Branca tirou uma rosquinha açucarada do pacote e passou para as mãos deles.

— Passou na doceria já? — Bufkin objetivou mordendo a massa apaixonadamente. — Voc-cê e di-maes, Branca. — elogiou-a de boca cheia.

— Só tá me bajulando porque contribuo para sua glicemia matutina. — retorquiu apossando-se do copo de café.

O secretário símio pegou algumas dezenas de papéis e depositou a pilha diante dela.

— Tudo isso?

— São as reclamações que chegaram entre as cinco da tarde e oito da noite de ontem.

Branca bufou e se endireitou na poltrona para avaliar melhor a papelada. Príncipe Encantado aprovara o aumento das taxas sobre o glamour fabricado pelas bruxas, provavelmente porque levaria uma boa parte para si. Diversos membros da comunidade que precisavam se disfarçar pela poção seriam prejudicados pelo reajuste tributário. Em alguns casos, mandá-los para Fazenda nem era uma opção, pois ofereciam serviços que beneficiavam o fluxo da cidade.

Outras reclamações tinham origens menos preocupantes, entretanto eram igualmente ridículas. O prefeito queria que fosse construído um bordel de dois andares próximo a região boêmia. Enquanto isso, Dr. Coração de Suíno enviava sua vigésima carta implorando mais recursos mágicos, que eram totalmente ignorados pelo Príncipe. Ao menos nisso ela poderia ajudar, assim que os lucros do baile Falcão Valente entrassem.

Pensava em formas educadas e esperançosas de responder aos apelos para mais tarde encarar seu ex-marido sobre as reclamações, quando a tesoureira entrou.

Bela caminhava dentro de um terninho bege, muito elegante. Os cabelos caiam em fartos cachos dourados abaixo dos ombros. Dentre as princesas, Branca sempre a achou a mais vistosa. Não compartilharam o mesmo marido, como acontecera a Bela Adormecida, Rapunzel e Cinderela, e quem sabe fosse a felicidade de não ter se apaixonar pelo intragável Príncipe que a fizera mais bonita.

— Branca, bom dia. — saudou-a serenamente sentando na cadeira em frente a sua escrivaninha. — Como estão as coisas por aqui hoje?

— Digamos que o trabalho está unidirecional nessa manhã.

— Isso é...

— Unidirecional, focado somente em responder as reclamações.

— Oh... — Bela fez um muxoxo, consternada. — Onde está o prefeito?

— Ele gosta de chegar depois das nove. Se bem que já passou um bocado do horário.

— Precisamos conversar. — murmurou inclinando o corpo para frente — Bufkin...? — olhou desconfiada procurando o macaco.

— Ele foi para o fundo do escritório dar de comer aos seus canários. — Branca a tranquilizou. — Não pode nos ouvir.

— Canários? — Bela franziu o cenho.

— O Garoto Azul deu a ele de presente. Abandonados não sei em que lugar... mas não importa. O que houve?

Bela diminuiu ainda mais a distância entre elas, apoiando os cotovelos na mesa.

— Ontem o prefeito veio me perguntar sobre o pagamento de Frau Totenkinder para o baile. Disse que conversou com a bruxa sobre outro projeto da prefeitura e a velha deixou escapar que estava recebendo bem menos do que dizemos a ele que receberia para fornecer sua mágica durante o evento.

— Porque ele tem de se intrometer?! — Branca crispou os lábios.

O grande trunfo para arrecadar dinheiro vinha sendo dizer a ele que tinham de pagar mais pelos serviços para a organização do baile. Bela e Branca uniram-se para omitir diversos valores e até então não houvera nenhuma desconfiança...

— Eu disse que ele deveria ter entendido errado, ou Totenkinder. A verdade é que eu fiquei estática, Branca.

— O que ele fez?

— Me olhou de um jeito...

— ...de um jeito que só um mentiroso consegue reconhecer o outro! Bela, contate os outros prestadores de serviço, peça, implore, leve Lorde Fera para ameaçar, qualquer coisa, mas tente fazer com que mais ninguém abra a boca. Príncipe Encantado vai investigar sobre isso. Não me admiraria se o atraso dele hoje tivesse esse motivo.

Bela concordou e saiu com os olhos perturbados perante a nova missão dada pela vice-prefeita. Branca esparramou-se na poltrona, levando uma mão ao rosto, imaginando as desculpas que inventaria para tentar enganá-lo.

O telefone gritou num toque agudo tirando sua concentração. Pediria para Bufkin atender se o secretário estivesse ali. De certo era alguma fábula irada querendo descarregar sua reclamação diretamente nos ouvidos da prefeitura. Pesarosamente pegou o fone:

— Prefeitura.

— Branca?

A ligação estava baixa, com interferências, mas ela reconheceu a voz da irmã:

— Sou eu. O que houve, Rosa?

— Encontramos algo aqui na Fazenda.

— Sobre a Cigarra?

— Talvez...

— Fale logo. — ficou impaciente.

— Seria melhor que viesse ver. Tem como viajar para cá hoje ainda?

— Estou indo!


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