Redrum escrita por Eduardo Mauricio


Capítulo 2
Capítulo 01 - O Chamado




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Sarah permanecia deitada em sua cama, mesmo após o despertador tocar. Ela o programa para tocar 10 minutos antes do horário correto, para que ela pudesse organizar-se e, como ela mesma dizia, “criar alguma coragem para se levantar”.

Ficou encarando o teto por um instante, em seguida olhou para os lados, para as paredes acinzentadas de seu quarto e uma réplica de A Persistência da Memória, de Salvador Dalí. Alguns segundos depois, ela se levantou, ainda meio cansada, e caminhou até o banheiro.

O cômodo era extremamente claro por conta de pequena janela no canto superior, por onde entrava a luz do sol, iluminando as paredes brancas. Seus olhos demoraram alguns instantes para se acostumar à claridade e ela os esfregou. Escovou os dentes e em seguida, começou a se despir para tomar uma ducha, seu dia começava ali.

***

40 minutos depois, ela estava caminhando pelo estacionamento do prédio, levando em uma das mãos a chave do carro e na outra, pendurada em seu antebraço, sua bolsa. Vestia calças sociais pretas e uma blusa com um tom bege, seus cabelos estavam amarrados em um “rabo de cavalo” e seus saltos faziam um leve ruído a cada passo que ela dava. Estava vestida basicamente como sempre se vestia para trabalhar em seu consultório no centro de Londres.

A alguns metros de seu carro, ela o destravou com um clique em um botão na chave. Em seguida, entrou no veículo, colocou sua bolsa no banco ao seu lado e deu partida.

***

Quando o carro estacionou em frente à uma pequena e elegante clínica, Sarah pegou sua bolsa, saiu e em seguida andou pela pequena passarela de pedra até a porta de entrada. Ao entrar, encontrou sua recepcionista, Anna, sentada, fazendo algo no computador.

– Bom dia – Disse ela.

– Ah, bom dia, Anna – Respondeu Sarah, sorridente.

– O seu primeiro paciente já está esperando na sala ao lado.

– Oh, obrigada.

Ela caminhou por um estreito corredor de piso e paredes brancos e entrou na sala à esquerda. A sala de espera.

Havia uma mulher sentada em uma das confortáveis cadeiras, folheando uma revista de moda.

– Bom dia, Kate – Disse a psicóloga, atraindo a atenção da mulher, que estava concentrada em algo na revista.

– Ah, oi doutora – Ela respondeu.

– Vamos lá?

– Vamos.

***

Por volta de meia hora depois, Kate saiu da sala, com sua bolsa preta pendurada no ombro. Cruzou a sala de entrada, despedindo-se da recepcionista, e depois foi embora.

Sarah estava em sua sala, organizando alguns papéis. Dava uma olhada nos horários dos próximos pacientes quando o telefone tocou. Ela atendeu e ouviu a doce voz de Anna falar:

– Há uma ligação de um orfanato de Frankshire, querem falar com você.

– Um orfanato? Que estranho... Pode passar a ligação.

– Ok.

A outra voz que ela ouviu na ligação era de uma tranquilidade imensa. Uma mulher.

– Dra. Sarah Ives falando.

– Oh, olá, eu sou Lana Fowler, do orfanato Overlook.

– Em que posso ajudá-la?

– Eu queria saber se você atende a domicílio.

– Bom, em casos especiais, sim.

– Então eu acho que tenho um caso especial aqui – Ela disse – Houve um acidente aqui e resultou no óbito de uma das crianças.

– Oh, deus, eu sinto muito.

– Foi uma grande tragédia, as outras crianças estão agitadas e muito chocadas com o acidente, nós pensamos que talvez você pudesse ajudar-nos.

– Sim eu posso, apenas preciso do endereço e estarei aí em algumas horas.

– Obrigada.

***

Algumas horas depois, por volta das três horas da tarde, ela estava dirigindo em direção ao orfanato Overlook, localizado na ilha Frankshire, que ficava a uma hora ao leste de Londres. Havia até mesmo cancelado duas de suas consultas.

No banco ao seu lado estava sua bolsa, como sempre. Ela passava agora por uma pequena ponte, abaixo e ao lado dela, estava o Mar do Norte, gracioso em sua imensidão azul. Alguns segundos depois, após cruzar a ponte, ela pôde ver a praia. A primeira construção, no entanto, era o orfanato Overlook, enorme e elegante com suas paredes de pedra e grandes janelas.

Quando saiu do asfalto da ponte, ela entrou em uma ampla estrada de pedras. Estrada essa que se estendia para algum lugar mais à sua direita, o qual ela não visitaria, pelo menos não hoje. Seu destino era aquele enorme prédio.

Os grandes portões de ferro não tinham proteção, nem uma guarita com um porteiro, então ela pressionou a buzina, que emitiu dois breves sons agudo antes que uma mulher surgisse na grande porta. Vestia uma blusa branca sem estampas e uma longa saia colorida. Ela cruzou o jardim, passou pela grande fonte de sereia e abriu o portão.

Sarah estacionou embaixo de uma grande árvore ali perto e desceu do carro, com sua bolsa em mãos.

Caminhou até a mulher e deu um sorriso.

– Boa tarde, eu sou Sarah Ives – Disse ela, estendendo a mão para cumprimentá-la.

– Boa tarde – A mulher respondeu e em seguida segurou a mão de Sarah – Sou Lana Fowler, nos falamos pelo telefone.

– Oh, srta. Fowler, me desculpe, eu não reconheci sua voz – Sarah sorriu, envergonhada.

– Não tem problema – A mulher falou, sorridente – Venha, vamos entrar e conhecer as crianças.

– Seria um prazer.

Sarah a acompanhou a mulher até a porta de entrada do orfanato, observando a beleza do local, cheio de árvores e um grande jardim com a grama aparada. Tinha também um playground com coloridos balanços e gangorras. O ar fresco era revigorante.

O interior do orfanato era belíssimo. O hall de entrada tinha um piso de madeira bem polido e uma grande escada, a qual tinha sido o palco do acidente, mas ela não sabia.

– Vamos, por aqui – Disse Lana, virando à esquerda, em um amplo corredor cheio de grandes janelas, as quais ela tinha visto pelo lado de fora. No fim do corredor elas entraram à direita e instantes depois entraram em uma ampla sala cheia de brinquedos e com grandes janelas também. As crianças estavam lá, todas elas desanimadas. Um garoto brincava de carros violentamente ali perto, chocando-os uns contra os outros, deixando cair as peças de plástico pelo chão.

À sua esquerda, um garoto chorava desesperadamente, enquanto uma mulher tentava acalmá-lo oferecendo água.

O que ela via ali era um grupo de crianças tristes, algumas já apresentavam as reações comuns ao luto infantil. Agressividade e sofrimento. O segundo elas mantinham em segredo, mas era possível ver nas suas faces. Estavam extremamente perturbadas.

– Crianças – Disse Lana, em um alto tom de voz – Esta é a Dra. Ives, ela está aqui pra conversar com vocês, está bem?

Algumas crianças fingiram que não escutaram, mas a maioria olhou para ela e em seguida, para Sarah, que deu um sorriso.

– Eu vou deixá-la um pouco com eles, tudo bem? – Lana perguntou à Sarah.

– Tudo bem.

A mulher saiu da sala, junto com a outra mulher que tentava acalmar o garoto histérico. Bom, ele havia se acalmado, agora prestava atenção na psicóloga, ainda chorando.

Quando a porta atrás de si foi fechada, Sarah olhou para todas as crianças. Aquele seria o trabalho mais difícil de sua carreira, pois apesar de conhecer sobre o luto infantil, ela nunca havia trabalhado com crianças antes.

– Eu estava pensando – Ela começou, mudando sua voz de um jeito que ela mesma se assustou. Parecia outra pessoa. Uma pessoa descontraída e alegre – Seria legal se todo mundo sentasse no chão, não seria? – Ela perguntou e sentou-se no chão, colocando sua bolsa ao lado. Algumas crianças sentaram-se também, outras estavam achando estranho.

– Você é uma doutora? – Perguntou um garoto loiro, com timidez. Parecia ter por volta de seis.

– Não, eu sou só uma amiga de vocês.

– Mas a gente nem te conhece – Disse uma garotinha, dando um sorriso. Era incrível como as crianças podiam ser encantadoras.

– Então, que tal a gente se conhecer? Meu nome é Sarah, e vocês, quem são?

– O meu é Noah – Respondeu o garoto tímido.

– Eu sou Alicia – Disse a garotinha encantadora.

Pouco a pouco todas as outras crianças se apresentaram e eles conversaram por uma hora, sobre suas boas lembranças e memórias sobre o garoto que havia falecido.

***

Por volta das cinco e meia, ela estava sentada em um sofá na sala de estar das mulheres que trabalhavam ali. Era como uma casa.

Ela tomava uma xícara de chá, enquanto Lana a informava sobre o acidente.

– Foi o Julian que o encontrou – Disse ela. Seu olhar estava fitado na xícara de chá, mas sua mente estava de volta ao dia terrível em que o cadáver foi encontrado, com o um ferimento na cabeça – Ele gritou e nós corremos até ele. Eu não sei porque ele foi o primeiro a vê-lo, nós sempre nos acordamos primeiro, mas não nesse dia.

– Que horrível, deve ter sido um grande choque para ele.

– E foi, ele se recusou a comer, começou a fazer escândalos, berrando, você mesma viu.

– E as outras crianças?

– Bom, elas choraram muito, nós os confortamos, dizendo que ele está em um lugar melhor agora. Acha que fizemos errado?

– Não, de jeito nenhum, eles precisam saber a verdade, aprender a lidar com a morte, e é sempre melhor quando há o apoio daqueles próximos a eles.

– É, foi um choque tão grande para eles e pra nós também. Nós estávamos procurando confortá-los sem ao menos saber como confortarmos a si mesmos, entende?

– Sim.

– Você disse que ele tinha um irmão?

– Sim, Harry... Ele deve estar em seu quarto.

– Eu não o vi na sala de brinquedos.

– Ah não, ele já tem 18 anos... Na verdade, você ainda não conheceu todos eles, nós também abrigamos adolescentes aqui.

– Oh, sim.

– Foi muito bom você ter me procurado – Disse Sarah – Eu vou ajudá-los com essa tragédia, e, bem não precisa ser apenas crianças, se você ou qualquer outra pessoa quiser conversar, eu virei.

– Obrigada, você é um anjo.

Sarah sorriu gentilmente.

– Eu preciso ir agora, mas estarei aqui por volta das três horas, tudo bem?

– Sim.

– Ok.

Ela se levantou e pegou sua bolsa.

– Mais uma vez, Dra. Ives, muito obrigada – Disse Lana, segurando sua mão.

– Por nada, fico feliz em ajudar – Respondeu ela – Ah, e pode me chamar de Sarah.


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