Acorde, Psyché escrita por Nynna Days


Capítulo 1
... E escute nossa história novamente


Notas iniciais do capítulo

Baseado no conto de Eros e Psyché



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Não deveria estar espionando, só que aquele impulso era mais forte do eu. Fiz uma careta com as folhas que ameaçaram entrar em meus cabelos recém-cortados. Equilibrei meu corpo no grande e firme galho, cravando minhas unhas longas e postiças no tronco. Respirei fundo, tentando entender que rumo minha vida havia tomado para chegar naquele ponto.

A leve impressão de alguém me chamava me fez levantar os olhos da revista ATTITUDE! e encarar minha secretária, Dorothy. Eu deveria estar trabalhando em alguma novidade para a próxima edição da GARB!, mas nada me vinha a mente. E que jeito era melhor do que comparar com o trabalho de seu rival?

“Sua mãe está te chamando”, Dorothy informou, fazendo-me revirar os olhos. “Ela disse que é urgente.”

Joguei a revista em cima da minha mesa e suspirei antes de levantar. Para minha mãe, Ariana Foster, tudo era urgente. Isso que dava ser a filha da dona da principal revista de moda de Los Angeles. Meus saltos estalaram contra o assoalho do corredor enfeitado por quadros que valiam o dobro do salário de metade dos funcionários.

Desde que o número de vendas da revista GARB! diminuíram, minha mãe vem tido surtos de ideias mirabolantes. A maioria delas sempre tinha o princípio de colocar fogo na sede da ATTITUDE! nossa maior rival. Ignorei os olhares curiosos na minha direção e me inclinei na direção do secretário de Ariana.

“Oi, acho que tenho uma reunião de última hora com minha mãe.”, sorri.

O secretário, Stephen, deu um aceno nervoso e pegou o telefone com as mãos trêmulas. Era mera formalidade. Se eu quisesse, poderia entrar na sala sem nenhum anuncio e sem reclamação alguma.

Só que não gostava de ser esnobe com quem trabalhava ali. Deveria ser esse o motivo principal para que, mesmo sendo a filha da dona, não conseguisse abandonar meu lugar como escritora do “Acorde, Eros”, a coluna de amorosa. Não sabia o motivo, porém aqueles casos de amores mal resolvidos ou complicados sempre me interessaram.

“Pode entrar, Senhorita Foster.”, Stephen me informou com um fio de voz.

Sorri agradecida. Segui o corredor parando em frente às grandes e pesadas portas de mogno com maçanetas douradas. Minha mãe não se poupava do luxo por nenhum segundo. A clássica música de Beethoven enchia a sala, dando um ar de calmaria antes da grande explosão.

Minha mãe estava sentada na sua cadeira presidencial, o corpo inclinado para frente enquanto estudava os porta-retratos ali. Suspirou saudosa, mal reparando na minha presença. Resolvendo esse tópico, encostei minha bunda na porta e a empurrei, fazendo-a bater com força. Ariana deu um salto da cadeira, desviando sua atenção totalmente para mim.

“Estava em um dos seus momentos de reflexão novamente, mamãe.”, ressaltei me sentando na cadeira do outro lado da sua mesa e quase sendo ocultada por seu computador. Quantas vezes havia insistido para que comprasse um notebook, só que ela tinha prazer em negar. “Se me chamou por conta de uma das suas ideias loucas...”

Ela arregalou os olhos escuros para mim e se levantou da cadeira, caminhando por seu chão encarpetado. Cruzei as pernas, movendo os dedos por meus cabelos escuros mal tocavam meus ombros, e esperei que ela soltasse tudo o que a incomodava. Quase conseguia ver as engrenagens girando em sua cabeça.

“Dessa vez vai dar certo.”, ela disse parando de andar e se virando totalmente para mim. Ergui uma sobrancelha. Ela deu um sorriso confiante. “Espero que tenha um vestido de baile separado.”

Eu deveria ter tido que não. Sinceramente, vindo da minha mãe em um ato de desespero, claro que tudo sobraria para mim.

Ainda sentada no galho, cruzei meus calcanhares temerosa que meus sapatos caíssem e desse uma pista do meu esconderijo. Todo o barulho que se originava do lugar onde eu estava vinha do vento contra as folhas. Não ousava nem respirar alto. Por isso tive que segurar o arfar quando os vi.

Contrariando meus planos inicias de apenas sentar e assisti, arrisquei-me ficar de pé e inclinar meu corpo na direção do casal. O pensamento de que o suor contra a palma de minhas mãos poderia me fazer cair fez meu coração se acelerar. Todavia, o pior não seria cair no chão.

Se eu caísse, seria em cima deles.

“Creio que trouxe tudo o que eu pedi.”, ela disse estendendo as mãos na direção dele e com os olhos brilhando em vitória.

Os ombros dele estavam curvados, cansados e desistentes. Meu peito se apertou com aquela visão. Saber que tudo era culpa minha fazia minha cabeça latejar e explodir em dor. Ele estendeu um envelope pardo na direção dela, que agarrou sem hesitar, faminta pelas informações ali contidas.

“Melhore essa cara, Emma.”, Sidney disse batendo seu ombro levemente contra o meu. “Sua mãe só pediu para que você se infiltrasse na festa da ITTITUDE! Não que você matasse alguém.”

Tentei seguir a linha de pensamento de Sidney – já que ela sempre foi sensata – e relaxar. Só que toda vez que conseguia acalmar as batidas do meu coração, algum olhar inquisitivo era focado em mim. Não que estivessem me reconhecendo. Era uma festa de máscara, comemorando a centésima edição da revista. Esse era o plano de minha mãe. Colocar-me como espiã.

Obviamente, não iria fazer isso sozinha. Se dependesse de mim, viraria a noite encarando o vestido de gala até que a noite fosse substituída pelos raios preguiçosos do amanhecer. O que nem Sidney e nem eu ousamos comentar era o final daquele plano doido. Um final que me recusava a executar.

“Sua mãe é doida, mas ela tem um pingo de razão.”, Sidney disse me guiando até uma parede afastada e pegando uma das taças de champanhe. “Quero dizer, olhe ao seu redor.”, gesticulou para o salão lotado de pessoas conhecidas no meio da moda e repórteres. “Isso é um paraíso.”

“E eu estou sendo jogada ao purgatório.”

Sidney revirou os olhos claros.

“Está exagerando.”, pôs um dos pés contra a parede, fazendo seu vestido dourado realçar suas longas pernas. “Ela não te mandou matar o Papa.”, repetiu a piada. “Só que me trouxesse para seduzir o editor chefe e fazê-lo abrir o jogo.”

“Isso tudo sem revelar nossas identidades.”, acrescentei irônica. Bufei. “Belo plano o da minha mãe.”

“Talvez ele seja gay.”

Sidney riu, tomando um gole de sua bebida. Imitei o gesto com o intuito de aliviar minha garganta seca. Meu nervosismo era palpável. Se aquilo não fosse prova de amor, nada mais seria.

Os olhos de Sid se desviaram para a multidão até que se focaram em alguém. Ela se engasgou com o líquido, me obrigando a bater em suas costas. Estávamos tentando ser discretas, mas com as grasnadas e tossidas de Sidney – iniciadas no exato segundo em que a música se abaixou – toda a atenção foi focada em nós.

“Vamos ser expulsas.”, sussurrei com premência.

“Cale a boca e olhe para o moreno no bar.”, ela disse com a voz rouca. Franzi o cenho, confusa. “Acho que é o nosso alvo.”

Ergui a cabeça, procurando por entre a multidão – todos já tinham se entediado de nós – e olhando na direção que Sidney havia indicado. Minha boca pendeu aberta e meus olhos escuros se arregalaram.

Era a personificação de Adônis me encarando. Seus olhos dourados – quase que totalmente ocultos pela máscara – brilhavam em minha direção, me instigando a aproximar. Seus cabelos castanhos eram quase do tamanho dos meus, algo que me surpreendeu. Era sexy e tão pouco usado. Passou a mão pelo queixo, fazendo-me desviar a atenção para sua barba por fazer e suas grandes mãos.

“Deus, dessa vez o Senhor caprichou.”, Sidney murmurou ao meu lado, totalmente recuperada. “Se esse não for o meu alvo, finja que é. Podemos dizer á sua mãe que Patrick Stewart quebrou a perna quando estava descendo as escadas ou qualquer coisa do tipo.”

Despertando-me do encanto, hesitei sentindo minhas bochechas corarem. Ele poderia ser um deus, mas deveria ter a intenção de um demônio. Reparei que não era a única á fitá-lo com atenção. Só era a única que era encarada de volta.

A vontade de pular aumentou a cada segundo, mas resolvi esperar. Queria ver até onde aquela transação iria. Desde que Dorothy havia me contato da primeira, havia seguido pistas que me levassem até o motivo primário de tudo aquilo. Deveria ser algo muito sério para que aqueles dois se juntassem.

Não iria dizer que era estranho. Depois do que tinha descoberto naquela festa, decidi reservar a palavra estranho para algo que fosse realmente além do meu entendimento e da minha realidade atual.

Senti sua presença antes que sua voz ressoasse em meus ouvidos. Minhas mãos apertaram o beiral da sacada e o vento afastou alguns fios rebeldes de meu rosto. Sidney me alertou que ele me seguiria. Só que eu duvidei.

“Você me ignorou.”, ele disse ao meu lado se recostando no beiral para poder olhar em meu rosto. Tinha um meio sorriso convencido nos lábios. “Isso não acontece com muita frequência.”

“Por causa da sua beleza?”

Ele gargalhou.

“Posso dizer que esse é um dos motivos.”, estendeu a mão na minha direção. “Patrick Stewart.”, apertamos as mãos. Permaneci em silêncio. “Não terei o prazer de escutar seu belo nome?”

Pigarreei. Não deveria revelar minha identidade á ele. Minha mãe me mataria. O plano era apresentá-lo á Sidney e deixar que ela usasse toda a sua sedução para arrancar alguns segredos podres. Simples, certo? Tirando a parte que quem estava sendo apresentada era eu.

Desviei o olhar para o grande jardim que rodeava a mansão e fechei os olhos, respirando fundo. Era tudo tão romântico. Minha mãe tinha sido esperta ao colocar Sidney para executar aquela façanha. Eu era uma romântica incurável. Tinha um dom para apresentar as pessoas certas, porém incapaz de ir para a cama com alguém, apenas para obter um propósito obcuro.

“Tímida, não é?”, ele suspirou e passou as grandes mãos pelos longos cabelos, puxando-os para trás e fazendo-os cair desarrumados por seu rosto. “Não sou nenhum tipo de rico perseguidor e rei do sexo que as mulheres mentalizam.”, ele riu, me fazendo dar um pequeno sorriso. “Estou mais para um amaldiçoado pela beleza.”

“Amaldiçoado?”, questionei cética. “Acho um exagero.”

Ele deu de ombros.

“Estou falando a verdade.”, assentiu consigo mesmo. “Tenho dois irmãos mais velhos casados e com filhos, que sempre se gabam por terem nascido com uma beleza mais conservadora.”, ele pausou sorrindo. “Palavras educadas para se definirem como feios.”, riu novamente enchendo o lugar com aquele som. “Fui amaldiçoado com a beleza. Poucas mulheres tem coragem de se aproximar de mim. E quando conseguem, desistem facilmente por acharem que sou demais para elas.”

“Igual ao conto de Eros e Psyché.”, divaguei comigo mesma. Ele levantou uma sobrancelha, me instruindo a continuar. Envergonhada, fixei meu olhar em seus longos dedos. “Psyché tinha uma beleza que invejava á muitos e que desencorajava os homens a cortejá-las. Afrodite tinha inveja dessa beleza e mandou seu filho Eros fazê-la se apaixonar por uma fera, que a mataria. Só que um descuido de Eros e uma das flechas acabou o ferindo. Como consequência, se apaixonou por Psyché.”

“Bela história.”, ele destacou. Dei-lhe um olhar de canto. “Acho a maioria da mitologia grega não acaba em um final feliz.”

“E essa também não acabou.”, eu concordei. “Eros deu tudo o que Psyché queria, mas em troca pediu sua confiança. Não mostraria seu rosto á ela em nenhuma ocasião, temeroso que Afrodite descobrisse sua traição.”

Fui interrompida novamente.

“Com certeza ela quebrou as regras.”, ele deduziu. “Mulheres e sua curiosidade.”

Sorri na sua direção.

“Você que quer saber meu nome, Psyché.”

Patrick colocou uma das mãos sobre a minha, fazendo com que seu calor fosse transmitido para a minha pele. Esquecei-me totalmente de que Sidney poderia estar procurando por mim após o seu retorno do banheiro – ela foi retocar a maquiagem para destacar seus principais atributos.

“Prometo confiar em você, Eros.”, ele sussurrou em meu ouvido.

Sabia que viver aquele romance proibido com Patrick seria arriscado. Minha mãe subjugava as mulheres com sexto sentidos. Ela parecia ter oito. Sidney foi a mais fácil de convencer. Tinha outros peixes no mar, como ela sempre ressaltava. E noite após noite que passava com Patch – seu apelido de infância – mais o peso daquela mentira me tomava.

O medo rondava minhas mente a cada segundo que passávamos juntos em algum quarto de hotel afastado da cidade. Culpa fazia meu estômago se revirar quando minha mãe perguntava se Sidney tinha tido algum avançado. Claro que ela não teria. Nem tinha tido a chance de se aproximar do alvo.

Minha paranoia chegou ao limite quando exigi que fizéssemos sexo á luz de velas. Patrick concordou naturalmente, sorrindo e ressaltando o quão romântico era aquilo. Só não percebia a verdade por trás de meu podre placebo. Quanto menos do meu rosto ele visse, menores as chances de me reconhecer.

Sabia que essa chance era remota, já que nunca concordei com interações sociais. Minhas fotos em colunas de fofocas ou qualquer mídia alcançável eram de antes da minha mudança brusca de visual. Sempre com longos cabelos cacheados e longos, maquiada e roupas da última estação. Diferente do que era atualmente.

Só que meu ego me cegou. Deveria saber que esse jogo de Quem é você? um dia cansaria Patch, desencadeando toda aquela confusão.

Os múrmuros de Patrick me despertaram. Abri um dos olhos, percebendo que ainda estava escuro e um pequeno sorriso surgiu em meus lábios. Talvez pudesse aproveitar algumas horas antes de ir embora. Sabia que minhas saídas noturnas magoavam Patch, porém era para o nosso bem.

“Já te enviei a foto, Noah.”, ele disse com a voz apressada e irritada. Ficou em silêncio por alguns instantes e rosnou. “Por que vai demorar? Eu só pedi um nome. Quero saber o nome dela. Hoje.”

Sem se despedir, desligou o telefone. Encolhi-me, fingindo estar dormindo. Em meio à escuridão fui capaz de ver sua silhueta. Seu corpo alto e másculo dando passos apressados de um lado para o outro, movendo as mãos pelos cabelos, exasperado. Todo o meu corpo estava tenso. Não era burra. Sabia exatamente de quem ele estava falando.

Fechei os olhos com força, retendo o choro. Fui traída diante dos meus olhos. Soltando o ar e aquietando os pensamentos, Patch veio para a cama. Mesmo no escuro, pude ver seus dentes expostos em um sorriso feliz. O colchão afundou recebendo o peso de seu corpo e seu nariz se moveu para meu cabelo.

Tentei ficar em silêncio, entretanto aquilo não fazia parte da minha essência. Afastei-me de seu toque, levantando-me agitada e catando minhas roupas pelo chão. Seus olhos dourados se arregalaram, surpreendidos por meus movimentos súbitos. Comecei a me vestir, aproveitando o seu choque.

Pena que não durou muito.

“Aonde você vai?”

Estava de costas para ele com os olhos abaixados, evitando que a secura em minha garganta, a ardência em meus orbes e o aperto em meu peito evoluíssem para um choque descontrolado. Estava terminando de fechar minhas calças quando suas mãos se fecharam meus antebraços e me viraram.

“O que está acontecendo?”, exigiu.

“Eu ouvi você conversando com seu amigo Noah.”, esclareci.

Isso fez com que ele me soltasse e desse um passo para trás, como se tivesse sido atingido. Abotoei minha camisa e calcei minhas sandálias. Patch tornou a andar de um lado para outro, talvez pensando em um jeito de contornar aquela situação.

“Entenda-me.”, pediu. Parei no batente da porta, vendo-o sentado na cama. Balançou a cabeça. “Não sei nada sobre você. Se tivesse um nome, pelo menos. Mas nada. Estava desesperado. Não posso estar apaixonado por uma desconhecida. Meus irmãos disseram que você pode estar tentando me dar o golpe do baú. Ou que fosse uma fugitiva da polícia.”

A sensatez me abandonou totalmente. Aquela palhaçada toda por conta de suspeitas implantadas por seus irmãos? Ele manteve a cabeça baixa, envergonhado por seus próprios atos. Se não estivesse queimando de raiva, meu coração poderia ter sido amolecido pela declaração de Patch.

Ao invés disso, eu disse:

“O amor não sobrevive sem confiança.”, e saí.

“Diga-me onde ela está, por favor?”, Patch implorou para minha mãe. Acreditando nas minhas habilidades agachei-me, ainda procurando por uma posição que me desse a acústica melhor. Os olhos de Patch brilhavam em arrependimento. “Eu fiz tudo o que você pediu. Separei as fotos da próxima edição, te forneci os tecidos, estraguei o almoço com um dos maiores patrocinadores da ATTUTIDE!. E agora estou te dando o contrato da minha melhor modelo.”

Assenti comigo mesma. Peguei-me comparando aquela situação com o que Psyché sofreu com Afrodite. E ela estava interpretando a Afrodite com perfeição. Quatro tarefas em troca da minha localização. Tudo para ganhar uma competição estúpida. Poderia ter se passado anos, mas o ramo da beleza nunca perderia seu enfoque.

Ariana pôs a mão no peito e gargalhou.

“Não sabia que iria ganhar com tanta facilidade.”, ela analisou Patch de cima a baixo com o nariz franzido, como se sentisse um cheiro ruim. “Mas trato é trato.”, ela suspirou e cedeu. Desconfiei, sabendo que minha mãe não era tão fácil. Um sorriso malévolo confirmou meus pensamentos. “O único problema é que não sei onde ela está.”

Rosnei entredentes ao ver o jogo doentio que Ariana tinha feito. Impulsiva, dei um passo para frente e gritei ao sentir a gravidade me puxando. Por um milésimo de segundo senti o olhar deles em mim. Fechei os olhos, aguardando o impacto.

Um impacto que, felizmente, não aconteceu.

“Você está bem, Emma?”

Abri os olhos com a voz assustada de minha mãe e percebi que cravava minhas unhas nos braços de Patch. Seus orbes dourados se fixaram em meu rosto, exalando alívio e afeto. Meu peito se contraiu, deixando que meu corpo tomasse noção da saudade que senti daquele homem.

“Estou ótima, mãe.”, respondi com a mente distante, divagando em um mar de sonhos longínquos. “Só pare de ser uma vaca vaidosa e ganhe crédito com seu próprio trabalho.”

Ariana arfou, estreitando os olhos para mim.

“Não acredito que você está dizendo isso.”

Revirei os olhos, afastando-me do encanto contrariada.

“Eu te amo, mãe. Mas tem vezes que sinceramente tenho vontade de te colocar em um hospício qualquer.”, pus meus pés no chão, ainda envolvida pelos braços de Patch. “Ao invés de tentar roubar a beleza de Psyché, Afrodite deveria tê-la usado com personificação humana ou uma mensageira.”, ela franziu o cenho, demorando a compreender minha linha de pensamento. Perifericamente, vi o sorriso de Patrick. “O que vocês dois não conseguem compreender é que são semelhantes e deveria se juntar. Parar de lutar com armas nulas.”

Minha mãe continuou me olhando como se eu fosse louca.

“Acho que o que Emma está tentando dizer é...”, Patch pausou, pensando na melhor maneira de interpretar minhas palavras. Escutar meu nome saindo de seus lábios pela primeira vez fez com que tudo no meu interior se acelerasse. “Que poderíamos parar de lutar e juntar nossas revistas.”

Balancei a cabeça, concordando.

“Exato. Só que menos poético.”

Ele me deu um olhar de canto.

“E menos confuso.”

Ariana colocou um dedo no queixo, ponderando sobre as opções.

Eu poderia mentir e dizer que ela aceitou a proposta com o maior sorriso do mundo. Só que se ela fizesse isso, não seria minha mãe. Primeiro ela me olhou como se eu fosse louca, para depois manter o ar de desprezo em relação a Patrick. A vaidade realmente a tinha cegado.

Ela foi embora sem dar nenhuma palavra e empinando seu nariz – cirurgicamente diminuído – como se fôssemos desconhecidos impertinentes. Com o contrato presos em suas unhas postiças.

“Isso foi...”

“Estranho?”

Concordei.

“Muito.”

Patch sorriu.

“Acho que está na hora de contar o final da nossa história.”, pegou uma mecha do meu cabelo e pôs atrás de minha orelha. “Eros voltou para Psyché?”

Retribui o sorriso.

“Sim. Depois que percebeu a quantidade infinita de amor que ainda carregava em seu peito, conseguiu perdoá-la.”, entrelacei nossas mãos. “Porque Eros também foi culpado. Não podemos amar quem não conhecemos verdadeiramente. E no final eles foram até Zeus que transformou Psyché em uma imortal, fazendo o amor entre ela e Eros ser eterno.”

Patch levantou uma sobrancelha.

“Quem poderia ser a personificação de Zeus para nós dois?”

Dei de ombros, fingindo indiferença. Entretanto ciente de que minhas palavras mudariam minha vida para sempre. Só que revendo o tanto de reviravolta que minha vida tinha dado em um curto espaço de tempo, percebi que estava pronta para dar esse tiro no escuro. Foi o que Eros fez ao escolher Psyché como sua mulher, certo?

Por isso respirei fundo, reunindo coragem, e respondi com determinação:

“Que tal um padre?”


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