Homem de areia contra a maré escrita por 0 Ilimitado


Capítulo 1
HOMEM DE AREIA CONTRA A MARÉ




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Há coisas que eu podia simplesmente esquecer, o primeiro beijo, a primeira namorada, a primeira vez que matei uma mosca e fui logo contar para minha mãe, a primeira vez que me achei másculo, eu queria que essa vontade fosse tão grande que me fizesse explodir, ou simplesmente fizesse eu voltar uns 80 anos atrás com a minha mãe me dizendo: “calma filho, foi só um pesadelo, quer deitar com a mamãe?”.
Tão irônico, lembro de quando era jovem, daquela mania de ter casos de um dia só, que foi apelidado por nós mesmos de “ficar”, eu me sentia o maioral por cerca de 3 dias por ter me consagrado com alguma garota, e agora eu estou aqui, enrugado, com a pele pesada parecendo ceder, fazendo ondas em todo o meu corpo.
Meus olhos verdes eram tentadores, eu sabia disso, ficava olhando nos olhos do meu alvo e deixava ele fazer o trabalho, loiro de olhos verdes, tão convencido, tão iludido, o que posso dizer? Eu tenho catarata, sou quase cego de um olho e meus cabelos agora são nulos, não posso mais usar garotas e jogar fora.
Eu estava sentado num trono de sujeiras, na escola roubava canetas e lápis dos meus amigos, só por brincadeira e ostentação, fazia esportes e me achava forte, amarelava sempre em jogos amistosos, havia pensamentos bons na minha cabeça, eu sabia refletir, mas logo esquecia, era inteligente por 5 segundos e ignorante por mais 55 segundos.
Nono ano na escola, minhas primeiras decepções posteriores as decepções amorosas que ocorreram durante o ano, a despedida dos amigos foi dolorosa, chorei como uma criança ou como um velho revendo as fotos de quando era novo, agora estou emoldurado, lembrando de como diziam: “Não precisa chorar, o ano acabou mas podemos ficar juntos, marcarmos para sair.”, eu devia ter chorado mais, nunca mais vi eles.
Meu sonho na juventude era ter alguém com quem conversar, alguém que eu pudesse contar meus segredos mais sórdidos e ler as minhas histórias mais bobas e idiotas, naquele tempo eu já me enjoava das pessoas mesmo tendo essa aspiração, e a ideia de virar psicólogo era confundida com a vontade de virar escritor.
Tantas aspirações, tantos sonhos jogados fora, eu nunca quis ter uma família, achava que traria muitos problemas, e até hoje por não tentar, não sei se seria um bom pai.
Mantenho minha palavra ao meu pai que nunca usaria droga e nem beberia nada que me entorpecesse, disso me orgulho, poderia passar a noite toda nessa poltrona marrom falando dos meus problemas, mas até os anjos dormem, já é hora.
Eu só queria fazer uma questão a mim mesmo e responder com convicção... Sabe por que os falecidos recebem flores? Porque o remorso é maior que a gratidão. Queria terminar com uma risada, com uma gargalhada, todavia não tenho alguém para dizer eu te amo, então prefiro nem abrir a boca, cadê meus pais? Meus avôs nessa hora? Há alguns metros de altura se Deus quiser, na melhor parte que exista nesse céu, nessa parte pura, onde vai as pessoas boas, onde eu desejo que repouse minha família. Não queria chorar, mas vou dormir com os olhos inchados essa noite, mais essa noite.

FIM
25/11/2013


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