Your Hunger Games II - Fanfic Interativa escrita por Soo Na Rae


Capítulo 6
Sophie Morgent


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura.



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Sophie Morgent

“As exterioridades estão sempre prontas a mascara hipócritas ou a desmentir infelizes” Camilo C. Branco

MØ – Waste of Time

Esperava que os desenhos fossem diminuir conforme o tempo passava, mas não foi isso o que aconteceu. Todos os dias o lápis diminuía mais, e precisou de uma caixa inteira para terminar os seis meses. Seu pai comprou o que pedia, mas mamãe sempre torcia o nariz. Sophie sabia que tinha de ir a escola, mas não lhe dava mais vontade de fazê-lo. Lá ela seria eternamente a Sophie meiga e delicada que está ainda chocada com a morte de sua irmã. Como se três anos não fossem o suficiente para apagar tudo o luto. Não totalmente. O que mais a irritava era ter de dizer todos os dias que não queria ir a escola, garantir a papai que não havia ninguém intimidando-a e prometer ir no dia seguinte a mamãe. Sua mãe ainda tinha vestígios de felicidade. Era apenas uma madrasta, mas nunca viu Dakota como alguém da família. Sophie nem se importava mais.

Sua barriga está roncando.

– Eu sei. – respondeu à voz. Fazia meses que ela não a vinha incomodar.

Vá comer algo, então.

– Não tenho fome. – sentia o gosto amargo do vazio, a saliva parecia inundar sua boca, como um oceano particular. Estava com fome. Mas não queria comer.

A Colheita é amanhã. Será que não está arrependida?

– Não. – jogou-se na cama, enquanto deslizava para o chão. – Não estou.

Você só tem quinze. Em dois meses completa dezesseis.

– Eu quero ir.

Bom, lá você me encontrará com mais frequência.

– Por quê?

A voz pausou, tão demoradamente que Sophie ponderou se tinha ido embora, mas era apenas um pouco de drama da parte dela.

Lá eu vivo mais.

O jeito como disse aquilo foi monstruoso. Quase doentio. Uma mistura de fadiga e cegueira, Sophie achou que a voz estava evaporando no ar, mas era apenas um som grave que nunca tinha ouvido junto com ela. Como um tambor ressoando, ou então... Com o canto do olho conseguiu vislumbrar uma mancha pálida e esbranquiçada próxima à porta. Virou-se para lá, mas só havia a porta e algumas pilhas de desenhos. Suspirou, duvidando se finalmente tinha ficado louca. Sophie já não sabia se estava viva ou se era apenas seu corpo que não havia percebido que sua consciência se fora. Pegava-se perambulando pelo quintal, dando voltas entre as roseiras de rubi e platina. Deitava-se sobre o telhado de casa, sem nem mesmo saber como subiu até lá ou como descia. Uma vez, de noite, abriu todas as torneiras da casa e ligou o chuveiro, trancou janelas e portas, inclusive do seu quarto e do quarto dos pais. Sentou-se com as pernas encolhidas sobre a cama e esperou, até que por baixo da porta a água começasse a infiltrar, metade do quarto já estava úmido quando papai exclamou e desligou as torneiras. Sophie se enfiou rapidamente nas cobertas e dormiu. Um sono tão profundo que quando acordou estava deitada na banheira.

Como se não tivesse controle sobre seu próprio corpo.

Sophie sentiu uma estranha sensação vindo da porta. De repente ela se abriu e o corpo de mamãe rolou para dentro do quarto, manchando o tapete com seu sangue. Seus olhos rodopiavam nas órbitas e ela vomitava os próprios órgãos, com ouvidos sangrando e mãos em carne viva. Ela cambaleou sobre os joelhos, até que eles se desfizeram em pó e finalmente ela guinchou, uma voz animalesca, agonizou, e morreu. E quando seu corpo se tornou imóvel, ela se tornou fogo, e o fogo a corroeu, sem queimar nada além dela. E já não havia mamãe, e sim cinzas. Sophie sentia a garganta fechada, com os olhos lacrimejando. A poça de sangue já não existia, os órgãos de mamãe queimaram junto dela.

Ninguém pode se aproximar de mim, Sophie. Apenas você.

– Mas...

Na Arena eu vivo. Você só precisa saber disso, e se me procurar com atenção, verá.

E a voz nunca mais falou. Sophie demorou minutos para finalmente levantar-se da cama e correr escada abaixo, em direção a cozinha. No balcão algumas cebolas e alho estavam picados, a panela no fogo fervia, salada pronta na mesa, uma garrafa de suco. Não havia sinal de uma mulher com avental encostada no batente da porta. Nem na sala, nem no quarto dos pais, muito menos no banheiro. Saiu para o quintal e rodeou a casa. Nada. Ela realmente evaporou? Queria se sentir feliz, mas só conseguia se sentir enjoada. O que aconteceu? Quem era essa maldita voz? E o vulto branco? Sophie agora sabia que o terror a dominava, estava com os pelos na nuca eriçados e os olhos vidrados. Olhava por cima dos ombros o tempo todo e temia que alguém invadisse a casa. Mas não havia pessoas. Papai estava trabalhando. Só voltaria no final da tarde. E o que falaria? “Ela evaporou, enquanto agonizava e se contorcia no chão”. Ele jamais acreditaria. “Ela fugiu sem me contar.”, talvez. “Você está na casa errada, meu nome é Jénifer”, terrível. Não sabia como mentir.

Tomou então a crucial decisão de sair de casa. Era apenas um dia até a Colheita, não precisava se preocupar com comida ou roupas. Mas se obrigou a vestir algo branco, pentear os cabelos em um rabo de cavalo e agarrar o prato de salada do balcão. Foi embora, evaporando, assim como mamãe. Não queria imaginar o que seu pai faria quando voltasse para casa e não encontrasse as duas. Mas o que mais doía não era isso, e sim abandonar aquele desenho onde sua alma era refletida, a guerreira.

Enquanto tentava encontrar um bom lugar para ficar, vislumbrou alguns jovens voltando suados e sorridentes de seus treinos na Academia. Não havia participado ainda de um, embora já tivesse idade suficiente, ela nunca pensou nisso. Então uma ideia se passou por sua mente. Dakota treinava, não? Os mentores da Academia deveriam saber quem ela era, a acolheriam, com certeza. Caminhou em direção a Aldeia dos Vitoriosos, onde a Academia estava aberta a todos. Lá se encontrava crianças entre oito e nove anos e jovens adultos de dezoito e vinte. Muito não abandonavam os treinos, mesmo sem o risco da Colheita, outros se tornavam mentores e assim tudo continuava. Quando entrou, percebeu o tamanho de tudo aquilo. Muitos, muitos. Era capaz de todos do Distrito estarem ali dentro, mas aquilo era apenas metade. Não havia delimitação e assim o arco e flecha se envolvia com o gládio e o combate mesclava com a piscina improvisada.

Procurou algum homem que se parecesse com um mentor, e reconheceu um com mais de trinta anos, de barba rala e sobrancelhas louras. Os cabelos eram brancos como neve e grandes, embora não passassem das orelhas. Era baixo, não mais que Dakota, e magrelo. Parecia frágil, mas Sophie sabia que não podia subestimá-lo. Ele estava com os braços atrás das costas, zanzando entre os jovens, observando-os e às vezes dando dicas. Quando chegou até suas costas, tentou disfarçar, mas assim que se erguia para cutuca-lo no ombro, ele agarrou-a pelo pulso e o torceu para trás da costas, forçando-a a se virar e dobrar-se. Sophie ouviu algumas risadinhas do grupo que treinava atrás deles.

– O que quer, mocinha? Não sabe que é proibido invadir o espaço dos outros? Só faça isso quando quiser briga.

E a soltou sem gentilezas, mas também não a jogou no chão. Sophie se voltou para ele, com os grandes olhos azuis marejados.

– Eu queria um lugar para ficar.

– Acha que viramos creche? – novamente risadinhas soaram de quem os observava – O que uma garotinha toda pomposa veio até aqui? Fugiu de casa?

– Sim. – concordou com um meneio. – Sou irmã de Dakota Morgent.

– Ah, doce Dakota... Ela morreu tão detestavelmente... Lamento... Ninguém merece ter uma irmã como ela. Mas a mãe dela morreu há anos, acho que são apenas meia-irmã, certo? Que sorte sua.

– Como assim? – suas sobrancelhas se arquearam, desentendida.

– Ah, Dakota desistiu do combate como um cachorrinho assustado, se deixou morrer por um garoto do Distrito Menor. Não é honroso para nós isto. Não se sente envergonhada?

– Mas... Como?! – o entendimento lhe veio como uma bofetada. A raiva subiu pelo rosto. – Dakota lutou bravamente! Ela fez o máximo. Se morreu é porque não tinha mais forças.

– Então não tem vergonha de sua meia-irmã?

– Não – afirmou com intensidade.

O homem a encarou firme e então soltou um suspiro aliviado, como se tudo tivesse resolvido o problema mundial. Ele a cumprimentou com um leve aperto de mão e a convidou para tomar um café. Completamente desentendida, Sophie só podia imaginar o quanto aquele velho era um enigma.

– Fico feliz que ainda tenhamos jovens como você, querida. – ele comentou, enquanto entravam em sua sala privada. Cada mentor possuía uma, aparentemente. – Normalmente os garotos são muito ligados a honra e lutar até a morte. Enfim, então você era irmã de Dakota? Nunca a vi por aqui. Veio pela primeira vez?

– Sim. – respondeu, aceitando a xícara de café que lhe foi oferecida. – Dakota não queria que eu treinasse, ela dizia que estragaria minha doçura.

– De fato, estragaria. Mas me parece que foi contra as vontades de sua falecida irmã.

– Não vim treinar. Vim em busca de abrigo, como disse. Só até amanhã. – antecipou, quando viu a expressão do homem. – Vou me voluntariar e então...

Voluntariar? – ele arregalou os olhos – Mas por quê?

– Não sei. Eu quero.

– É loucura, garotinha. Se quer se matar, ao menos treine por uns dois anos ou três. Você tem quanto? Treze? Quatorze? Ainda é muito nova.

– Tenho quinze, e já esperei tempo demais por isso. Esta edição é especial, Jogos da Sorte, como bem sabe. – ela sorriu. – Vou me voluntariar, e já não me importo com o que você acha.

O homem refletiu com aquilo e digeriu, depois anuiu com a cabeça.

– Certo... Uhm... Mas dormirá fora das salas, nos colchonetes que usamos para as quedas.

– Não me importo. Só por um dia.

– Sendo assim, então tudo bem. Mas não conte aos seus amiguinhos.

Ela sorriu, sentindo animação.

– Eu já não tenho amigos.


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Notas finais do capítulo

Comentem! A rodada já está acabando!