Eu passei um dia todo encostado na parede, apenas gritei para minha mãe que não estava bem, ela quis entrar no quarto, mas eu disse que não precisava, então ela me deixou e eu fiquei lá, sem comer, sem beber, sem ir ao banheiro, sem ao menos mover um músculo com medo do que poderia acontecer caso eu viesse a encará-la de novo.

Eu sentia sua presença forte, e sabia que ela não estava ali de fato, era minha mente criando uma fantasia, mas essa fantasia me mataria se tivesse a chance.

Entre alguns momentos, perdido nos pensamentos, eu acabei dormindo, e ali era o lugar que ela dominava, o lugar de Alice. Minha mente não era mais minha, muito menos meu destino, e isso me assustava mais que qualquer coisa.

No outro dia, após mais torturas da visitante em minha cabeça, a escola era inevitável, e como toda sexta feira, os alunos estavam ansiosos e dispersos em suas brincadeiras. Como sempre a minha pessoa se colocou na última cadeira da sala e esperou o tempo passar, até ouvir a conversa que estava por perto.

— Hey, vocês viram os novos vídeos? Foram demais. — Como alguém poderia falar aquilo de alguém que morreu? Pensei comigo, mas uma pequena parte de meu cérebro concordou com aquilo, e até achou engraçado, mas eu deixei isso pra lá.

— Eu vi, aquele vídeo da Catharina, cara achei o maior desperdício uma gata daquelas se matar, mas também, foi bem original. Eu vi mais três vídeos que imitam o Jeremias, esse povo não tem mais criatividade pra fazer coisas novas. — Eu não podia acreditar no que eu ouvia, por isso peguei meu MP3 que sempre levava a escola, já que não me arriscava a levar o celular e perdê-lo e coloquei a primeira música.

Me surpreendi ao não reconhecer a mesma, por isso fui dar uma olhada no nome, Suicide of My Mind - Araxas.Nem mesmo nos sites que eu procurava por músicas eu havia visto aquilo, então simplesmente passei para a próxima, mas toda a lista de reprodução estava alterada. Não me lembrava de ter baixado aquelas músicas, mas elas estavam ali, e eu não sabia explicar como.

Deixei de implicar com isso e coloquei um capuz com os fones de ouvido, abaixei a cabeça e fiquei pensando se poderia dormir por alguns minutos sem interrupções, afinal mal havia dormido aquela noite. Antes de terminar o segundo motivo das negações, adormeci e só fui acordar a hora que todas as aulas tinham acabado, com o professor me chamando e repreendendo pela falta de interesse na matéria.

Sem ligar para o que ele dizia, peguei minha mochila e fui para casa, como que automaticamente liguei o computador na página dos "vídeos". Em toda minha vida não havia visto tantos nomes, os símbolos de "novos" piscavam sem parar em toda minha tela, e um deles se destacou, "Catharina".

O conhecido reprodutor de vídeos se mostrou e demorou um pouco até o vídeo se iniciar, talvez pelo grande número de acessos que o site estava tendo.

Ela realmente era linda, seu cabelo negro tocava a ponta dos seios arrebitados, a face lisa deixava espaço para o brilho dos olhos amendoados e a boca de morango, o nariz nem um pouco imperfeito era apenas um acompanhante na valsa sincronizada de sua perfeição, e eu amei sua beleza.

"Olá a todos vocês." Ela falava baixo, como com medo de alguém escutar. "Provavelmente meu nome é apenas algum que ficara perdido entre milhares do seu site, e sei ainda mais que o impacto disso no mundo será efêmero." Não seria, eu sabia, teria impacto em mim. É óbvio que eu tinha noção do que aconteceria, mas sua beleza era tão grande, que minha mente me dizia que eu mudaria aquilo, apenas por pensar na possibilidade.

Não, você não pode gostar dela ela, é de mim que você deve gostar, e apenas de mim. E nunca ouvira aquilo na minha vida, uma voz baixa e lateral, mas vindo de dentro da minha cabeça. Eu não tinha tempo para aquilo.

"Meu nome é Catharina, sou de São Paulo. Tenho dezessete anos e estou no último ano do colégio. Vocês podem não saber, mas alienígenas invadiram o nosso mundo há algum tempo atrás, e tem assumido nossas personalidades e corpos. Eu sei disso pois todos que conheço foram trocados, e um deles tenta tomar conta do meu corpo agora."

Ela tinha algum problema, eu só não sabia definir qual, mas isso não afetava o que eu achava dela, ou o que eu achava que era meu amor. Devo confessar para vocês que eu também tenho um problema, tenho dificuldades em ter memórias de longo prazo, sendo assim mal consigo saber o que fiz há um ano. Isso se deve a um acidente na minha infância, de acordo com meus pais, e também explica o porque de eu nunca ter amado alguém.

"Meus antigos amigos e familiares, todos eles ainda se parecem com os reais, e agem como eles agiam, mas eu sei, eu sei que eles não são eles.

"Já tentei isso antes, e eles me impediram, obviamente porque um deles está em meu corpo, apenas tentando tomar o controle, e eu quero terminar isso. Alice, eu sei que quando eu for para o seu mundo, me livrarei desses seres malignos, e por isso quero apressar minha viagem.

"Digo para quem quer que seja que estiver me assistindo que eu, Catharina, vou me encontrar com Alice e nós estaremos esperando vocês."

Vocês já devem sabem o que aconteceu nessa hora. E eu odiava quem quer que estivesse editando esses vídeos e colocando as vozes dessas pessoas sobre a dela.

"Eu não quero ser dominada por eles, não quero perder meu corpo e ser suprimida por um ser de outra galáxia, por isso vou dar fim para nós dois. Como os métodos convencionais não funcionam com eles, por sempre eles conseguem curar este corpo, apesar de eu já ter me cortado bastante, eu vou fazer algo incurável."

Ela pegou a câmera, que era móvel e separada do computador e montou numa base pendurada em algum lugar, então se sentou embaixo dela e girou para trás, logo então girando a câmera.

O que se via era o chão, cinquenta metros abaixo dela. Um prédio, pensei, é claro, algo incurável e um prédio, mas isso não mudou minha reação quanto ao seu leve adeus e uma lágrima que vi quando ela pulou para baixo escorrendo em seu rosto.

Mas tudo foi compensado no sorriso que se formou em sua face virada para cima pouco antes de bater no chão. E seu sorriso me levou a repetir o vídeo durante toda a tarde.

Eu já amava sua beleza, agora também amava sua morte.

Seu idiota, você não pode se apaixonar por ela, você deve vir ao meu mundo, e amar a mim. Se você vier a ousar amá-la também, eu o banirei.

Eu o perdôo pelo passado meu amor, eu o perdôo por tudo que aconteceu naquele tempo, e te farei lembrar também se você esqueceu, mas venha até mim, e me encontre, eu já não agüenta te esperar, preciso de você aqui. Tudo o que fiz foi por você, para te encontrar de novo, aquele tempo foi verdadeiro, embora não se lembre dele.

Minha amiga: Catharine