Misguided Angel escrita por Katsumi Liqueur


Capítulo 17
Capítulo 16


Notas iniciais do capítulo

A voz. E sua dona.



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          Ela deu algumas voltas ao redor de um carro estacionado, precisava se acalmar. Precisava. E não estava conseguindo. Todo aquele ódio que não era seu e, infelizmente, agora também era, parecia querer consumi-la. Parou de andar ao redor do carro, não estava adiantando. Baixou seus olhos, procurando seu reflexo na janela, procurando o reflexo das marcas em seu pescoço, mas uma voz a interrompeu. Uma voz antiga, que preferia ter esquecido. Era impossível. Aquela voz feminina, melíflua. Maternal. Aquela voz que a tinha abandonado, após ter lhe dado tanto. Antes, nunca tivesse aparecido. Mas ela apareceu e voltava agora, soltando, cuspindo palavras que preferia não ouvir.

  

            - Finalmente revidou...

 

- ...

 

- Não me dê esse tratamento silencioso, criança. Fico feliz que tenha revidado. Mas devia ter feito logo e devia tê-lo matado. Não há sentido deixá-lo ferir seu corpo, você pode evitar isso.

 

- Não vou ceder a esse impulso outra vez, a esse ódio que não é meu.

 

- Esse ódio é seu. Está em seu sangue, é verdade. Mas também em sua alma. Ele é justificado, não há porque controlá-lo. Seu ódio é uma ferramenta que a deixa ainda mais forte. O poder se diluiu na família, mas você é forte. Você é capaz de acabar com esse massacre.

 

- Massacre? Ha, minha família nem é tão grande assim. E você, meus pais... São todos muito exagerados.

 

- Agora, pode ser que nossa família seja pequena. Mas há quantos séculos eles vêem nos caçando? Há quantos séculos, ele... – E havia um ódio tão forte nessa singela palavra, um ódio muito mais forte do que Anna sentia, do que Anna seria capaz de sentir sem perder a razão. - ... das sombras, comandando o extermínio da minha família. O que a tornou tão insensível, minha filha?

 

Queria gritar que tinha sido o abandono dela. Muito mais presente que sua avó viva ou o fantasma de sua mãe. Nos sonhos, ao seu lado, sempre presente, ensinando-a, mas nunca contando o suficiente, o que realmente acontecera. E, então, o abandono completo. O silêncio, os sonhos sem companhia. Anna imaginava que se pelo menos a outra tivesse dito que iria embora, teria sido mais suportável. Fora uma dor diferente, não se comparava a perder a mãe verdadeira. Não, aquela voz a tinha abandonado e aquilo não podia ser perdoado. Por causa disso, odiara o que aprendera, odiara a sua pseudo-linhagem que nem entendia direito. Odiava ela.

 

Decidiu ignorá-la e olhar as marcas eu seu pescoço. Não estavam tão ruins assim, na verdade, pareciam ir desaparecendo rapidamente.

 

- Logo sumirão. Sabe muito bem que se cura rápido. Se quisesse, sua mão teria se curado em instantes. Por que se nega a usar o que é seu?

 

Era difícil ignorá-la, tudo que desejava era encará-la. O ódio parecia ter sido redirecionado, mas, agora que pretendia segurá-lo, parecia escapar-lhe por entre os dedos.

 

- O que aconteceu? O que ele fez com você? – James logo havia sentido o cheiro de Eric ali, boa coisa não podia ser. E Anna estava se olhando no espelho, massageando seu pescoço.

 

A garota escutou a voz dele e seus passos se aproximando, mas outro ruído chamou sua atenção, um ruído que tentou ser sufocado, mas não foi possível. Um ruído de surpresa. Anna segurou sua respiração e virou-se, não olhou para ele, seus olhos foram na direção daquela voz, daquele estranho ruído. E lá estava ela. Etérea. Linda. Não havia dúvidas que a dona daquela voz estava morta, mas ao contrário de todos os fantasmas que já tinha encontrado, os olhos dela eram visíveis. Eles a assustavam quando era criança. Aquelas pupilas tão avermelhadas e a íris rosa. Albina. Não sabia o que era isso quando era criança e tinha medo. Depois, começou a questionar porque logo os olhos dela poderiam ser vistos.

 

Albina. Ainda com seu cabelo liso, longo e emaranhado. Ele não era loiro claro, era branco. Olhos vermelhos, cabelo branco e a pele tão pálida. Aquela mulher invadira seus sonhos com sua voz e aparência diferentes, aquela mulher acompanhara sua infância e sumira sem motivo. Imperdoável. Mas com ela ali, olhando a ruiva ao seu lado, tão frágil e etérea. Seu corpo era baixo, tinham quase a mesma altura. Mas os músculos dela eram totalmente definidos. E os rostos também eram parecidos por isso a mulher tinha sumido. Tornava-se mais e mais doloroso ver aquela criança crescer para se tornar uma cópia sua, apenas com os cabelos e olhos diferentes. Rostos parecidos, mas o da mulher continha traços mais fortes, mais salientes e agressivos. Ela já tinha passado por muita coisa.

 

Anna a olhava intensamente. Fazia tempo demais. Um fantasma que não era um fantasma. Um fantasma com olhos, com sombra. Mesmo na ausência do sol, aquela sombra. Anna deixou seu olhar cair, deixou seus olhos encontrarem aquela sombra. Era um lobo, antes achava que era um cachorro, mas ao vê-la agora e lembra-se da de James, notou seu erro infantil. Aquela sombra era um lobo.

 

James achou que Anna iria se virar para ele, bem, ela se virou em sua direção, mas seu olhar estava fixo em algo atrás de si.  A princípio, ignorou. Se tivesse alguém, sentiria. E a marca no pescoço dela a atraia e o repelia. Raiva e impotência. O vampiro pagaria. Pensou perguntar para ela, mas o que havia em seu rosto a impediu. A garota quase chorava, pressionava seu maxilar com força para impedir isso. E, ainda, parecia realmente observar algo. Como Anna não se movia, James achou por bem verificar o que a deixava com aquela expressão tão incomum.

 

Não havia nada no ponto que ela fixava tão intensamente seu olhar. E, por outro lado, havia. Qualquer criatura sobrenatural seria capaz de ver um fantasma, ele não poderia se revelar para uma pessoa não para a outra ao lado, se ambos pudessem vê-lo. Então, na concepção de James, não podia ser um fantasma. Mas havia algo ali. Não é que conseguisse enxergar algo específico, porém era como se, em alguns instantes, o vento se tornasse visível, pois James podia ver pequenas ondulações. E, como estava prestando tanta atenção, pode sentir o cheiro, outro cheiro que o fez vomitar. Correr para trás de um carro e vomitar compulsivamente, mas dessa vez, de nojo. Sangue. Morte. Cripta. Sexo. Humanos. Lobos. E vômito e mais sangue e mais cheiro de morte, tudo misturado. Não apenas misturado, mas se concentrando há tempo. Tempo demais.


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Notas finais do capítulo

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