Brazilian Horror Story: Campus escrita por Math Green


Capítulo 1
Episódio Piloto: Substituta


Notas iniciais do capítulo

teaser:
http://s1288.photobucket.com/user/matheusgreenburg/media/teaser-i-nid-ur-luv_zpsa1wobv4r.mp4.html

visite meu perfil no photobucket para ver outros teasers e pôsteres



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/531021/chapter/1

http://i1288.photobucket.com/albums/b485/matheusgreenburg/Mobile%20Uploads/2014-07/A397D0CF-BBB3-4D54-AD78-CF94653A4B58_zpstwqm3tjd.jpg

1705

O grito cortou o ar como uma bala de canhão, zunindo por toda a parte e se espalhando em ecos pelo Engenho. Os escravos que cortavam a cana ouviram, assim como as mulatas que lavavam roupa no córrego e os animais da mata ouviram. E ouviu também João da Fonsceca de seu escritório. Não precisou ouvir o negrinho que adentrava o cômodo para saber - seu primogênito e herdeiro estava à caminho.

Fátima ainda mantinha a expressão de dor que fizera ao gritar. A criança (apesar do pai afirmar ser um menino, ela não tinha certeza) abria caminho por suas entranhas, forçando passagem. A dor era lancinante - a senhora de engenho delirava enquanto a parteira lhe incentivava a contrair a barriga. Nunca imaginara que poderia doer tanto - parir, algo tão velho quanto a própria humanidade. Se sentia bruta, suja, uma gata fertilizada à força por um macho que a abocanhou por trás, e agora arcava com as consequências. Carregara a criança por meses. Comera muitas bananas e carne, para ter um filho forte como touro. Mas a própria era tão fraca e frágil que mal aguentava o parto.

O pai entrou no quarto como uma ave e pousou ao lado da cama que Fátima estava. Segurou-lhe a mão.

– Força, querida. Você consegue - ele a incentivou - Vamos, Fátima. Nosso garoto! - Ela teve força. Empurrou, delirou, suou frio. E, por fim, cuspiu aquilo que seu marido havia semeado em si.

– É um menino! - exclamou Vera, a parteira, o seu sotaque rústico em português. O pai mal acreditou, correndo para perto da criança. Finalmente, pensou Fátima. Sua família estava completa e perfeita, como sua mãe lhe dissera que um dia seria. Permitiu um suspiro final. - Agora, Madame, o sinhozinho precisa mamar - ela disse. A coitada da mãe estava fraca, fraca e murcha de leite. Nem sequer uma gota para por na boca da criança que se esgoelava de fome.

– Traga uma ama de leite, Vera. Agora! - disse o marido, pegando o filho nos braços. O menino, todo ensebado e sujo de sangue, era pequeno nos braços do pai, porém um grande troféu na cabeça dele. Um merecido prêmio, que ele mesmo fizera, sua obra de arte.

– Deixe-me vê-lo, João. - pediu a mãe. João aproximou-se da mulher e exibiu seu prêmio. Prêmio também dela. A criança era símbolo do sucesso de ambos.

Vera entrou no quarto, puxando consigo uma escrava índia. A mulher tinha fartos seios que pendiam para fora do blusão. Era uma índia dona de tamanha beleza - traços selvagens que enlouqueciam qualquer homem. A escrava, toda curvas e movimentos graciosos, pegou a criança no braço e pôs-se a amamentá-lo.

– Como ela se chama? - perguntou João à Vera.

– Flor.

– Flor será responsável por amamentar e cuidar de nosso filho, e por isso estará sempre conosco em casa - decretou o patrão. A escrava concordou com a cabeça e aquietou-se. Fátima, um pouco incomodada, pediu ao marido para se retirar.

– Querido João, tu terás muito tempo para apreciar teu menino. Deixe Vera limpar o quarto, sim?

O Senhor de Engenho saiu do quarto do casal e caminhou para a sacada da casa. Neste lugar, poderia observar todo o seu pequeno reino. O Engenho do Meio. A plantação de cana-de-açúcar, sua riqueza, sendo cultivada pelos escravos, assim como toda a mata, o lago e o córrego, tudo um dia iria pertencer ao seu filho. Era um homem ambicioso, o João da Fonseca. Não era bonito. Casara-se já velho, com Fátima, que tinha apenas 15 anos. Depois de todo este tempo, a mulher engravidara finalmente. Já estava preocupado em precisar trocar de esposa. Porém, ela fizera o serviço bem feito. Não era boa de cama, nem muito experiente, mas isso não é nada que as escravas não pudessem o satisfazer. Ela era branca, o que importava, e agora ele tinha um herdeiro, para poder reinar tudo aquilo que ele via. Se achou um homem de sorte naquele momento, e torceu para se encontrar com Flor quando entrou novamente em casa.

1960

Era o dia de voltar ao colégio. Todos os alunos, delinquentes ou pobres ou estudiosos, estavam reunidos na frente do prédio com suas malas, esperando para entrar e passar mais um ano letivo confinados. Era um prédio baixo, porém espaçoso, com paredes de tijolos aparentes e janelas de vidro gradeadas em todas as sala, lembrando uma prisão. Talvez fosse, uma espécie de gaiola de ratos de laboratório onde estagiários perversos vinham de vários lugares e aplicavam suas técnicas terríveis nos pobres e indefesos ratinhos. A paisagem era salva apenas pelas árvores e o lago, ambos resquícios do antigo engenho que já fora ali um dia, onde hoje é a Universidade Federal de Pernambuco.

Naquela paisagem, estava Amanda, ao lado de três pequenas malas onde estavam todos os pertences que seriam usados durante o ano, enquanto observava descaradamente Lucas e Aline se esfregarem publicamente. Seus corpos pareciam querer ser um só. Mais colados. Pele com pele, bocas e bocas, mãos e quadril. Não podia deixar de imaginar como seria se, no lugar de Aline, ela estivesse com seu amado, sentindo cada centímetro do seu corpo colado no dele enquanto demonstravam o seu amor para todos presentes no local. Ele era tão lindo, com as covinhas preenchidas por beleza angelical, e o seu cabelo loiro, perfeitamente penteado, era o mais estiloso do ano de 1960. E seus movimentos quando dançava eram incríveis. Todo seu corpo era uma sinfonia que a atraia mais e mais... O que o tornava ainda mais inalcançável por Amanda.

No dormitório feminino, Amanda jogou sua bolsa na cama sem cuidado. Sentou-se e encostou a cabeça na parede, seus cabelos dourados fluindo no movimento. Em seu dormitório também estava Aline cercada por uma firme proteção de amigas e popularidade. Amanda não se misturava. Aquilo era uma elite em que ninguém é virgem, de nenhum jeito. A garota tinha outros princípios. Gostava dos discos de música, de livros, e se concentrava pra fazer a diferença entre garotas que eram brinquedinhos dos meninos. Ou seja, ela era a excluída.

Aline despiu sua blusa de modo descuidado, porém propositadamente sedutor, enquanto conversava com as amigas, ficando só de sutiã.

– Eu estou com muito calor, sabem - Ela disse. - Estava me lembrando das brincadeiras que Lucas e eu fizemos no verão! - As amigas riram, invejando o namorado da líder do grupo - Ele apertou meus seios e me lambeu toda... Me senti puro desejo. Me beijou do pescoço - E então ela traçou uma linha com os dedos do pescoço, passando pelos seios, a barriga, o umbigo e chegando por fim na calcinha - até aqui - falou forçando um sorriso inocente - E então ele não parou mais. Fico molhada só de pensar...- E então ela se massageou numa lembrança, sem nenhuma vergonha ou pudor.

– Que vadia! - exclamou Amanda de sua cama, não aguentando mais a conversa. - Você não passa de uma vadia, uma puta, né, Aline? Passou o verão todo se dando pro Lucas. Quantas outras será que ele tem além de você? Aline fitou-a por um instante, seu olhar puro veneno.

Levantou-se e andou até a cama de Amanda.

– Que inveja, Amanda. Só porque ainda é virgem? Também, assim, quem vai te querer? - As amigas riram da garota. - Tão pequena e sem graça... Quem sabe não dá sorte no convento? Ou então num cabaré, que nem a sua mãe. - E então ela cuspiu as últimas palavras como balas de um revólver. Devagar, mas perfurando o ego da outra - Sua filha da puta.

Amanda pulou da cama como uma águia em voo e caiu sobre Aline, e as duas reviraram pelo chão enquanto arranhavam e mordiam a adversária. As amigas de Aline incentivavam, gritando estímulos para Aline e palavrões para Amanda. Por fim, com um corte no lábio, Amanda foi vencida. Pegou suas coisas e correu para longe. Despiu-se lentamente verificando se não havia ninguém no vestiário. Limpou o corte na boca, agora inchado, deixando-a com lábios falsamente carnudos. Parou na frente do grande espelho e se forçou a olhar para seu corpo nu, à procura de formas. Não tinha um corpo bonito. Era muito magra, sem os seios que Aline tinha. Desejou tê-los. Desejou sê-la. Apesar de ser uma rival, Amanda a idolatrava, por sua vida e sorte, por sua audácia e sensualidade. Mais que tudo, Amanda odiou a si mesma quando olhou-se no espelho, sabendo que teria mais um ano letivo onde seria excluída, motivo de risos e chacota, que enfrentaria tudo de novo e de novo. Não era a primeira vez que confrontava Aline. Não seria a última, afinal, ela tinha um legado a seguir. Mas ela não queria ser assim. Ela queria ser como Aline. Bonita, formosa, popular, a rainha para os olhos de Lucas. Ela quis ter aqueles olhos azuis, os cabelos aveludados, os seios, aquela vida. Se odiou e se esmurrou no espelho. Partiu sua imagem em cacos, fragmentos, e cortou o punho. Ela deveria se punir por ser assim. Mas, no fim, o espelho ainda estava lá. Correu para o vaso sanitário e vomitou a antiga Amanda.

As mãos dadas dos dois eram um laço que eles não queriam desatar. Colados, para sempre. Não era só contato. Eles se entendiam e se completavam, como um quebra-cabeça. Até quando se enrolavam pelo carro de Lucas, eles eram donos de uma sincronia de movimentos que faziam total diferença.

Aquele era o último por do sol das férias, e ele estava se pondo no lago. Deitaram na grama e começaram sua dança, as bocas ora juntas ora não, a respiração ofegante, os sussurros de prazer. Eles se amavam a cada instante, cada vez mais, cada vez mais, mais... Aline se deixava levar por Lucas, e o prazer dele a dava prazer, e vice-versa. Ele gostava de vê-la sussurrar e agarrar a grama em seus movimentos, e ela gostava de ver sua imagem oscilando no ato. Aline virou a cabeça para o lago para observar a paisagem e transformar o prazer carnal numa soma com o prazer espiritual. O lago, uma superfície dourada e avermelhada, e na superfície, boiando, estavam...

Um grito de pavor escapou da boca dela antes que ela pudesse se conter, e ela se levantou com o corpo contraído de pânico e correu em meio a tropeços para longe do que vira. Lucas não compreendia. O que fizera de errado? Correu atrás dela com as calças semi levantadas, buscando entender. Aline se encostara numa árvore, a boca aberta em um "o" perfeito, pronta para gritar, mas sua imagem estava congelada assim como seus olhos que, ainda vidrados, olhavam fixamente para algum ponto a sua frente. Escorregou lentamente pelo tronco, apavorada. Lucas levantou-a, sussurrou em seu ouvido:

– Calma, amor... O que foi? - mas ela não respondia. Lucas a abraçou, e beijou-a delicadamente no pescoço, tentando cessar seu pânico, e fez isso constantemente tentando acalmá-la. Escapou então, sussurro fraco e quase inaudível:

– O la-lago! - Ele se virou a tempo de ver três corpos humanos boiando como troncos na superfície ensanguentada do lago, antes do sol se por de vez e uma grande escuridão tomar conta de tudo.

Jessica segurava um meio copo de uísque em uma mão e a garrafa na outra há meia hora. Aparentemente, o seu copo era simples enfeite: já havia dado vários goles na boca da garrafa. Olhava para o nada na parede e tentava afogar algumas mágoas do passado na bebida - coisa que tentava afogar há três décadas, quando começou a beber. Sua companheira no cigarro era Petúnia, a professora (segundo Jessica, inútil) de artes do colégio. Ao contrário de elegante Jessica, com seus topetes de Hollywood e lingerie aparecendo por baixo do decotado vestido, Petúnia havia reformado seu guarda-roupa após ir à Índia de barco. Mas ambas combinavam que um cigarro no fim de tarde era tão bom quanto um cochilo após o almoço. Não eram amigas. Tinham uma relação de presença. Uma física, outra hippie. Apenas queriam se sentir acompanhadas.

Quando Jessica pendeu a cabeça para o lado esquerdo, a sala dos professores foi invadida por Aline. A garota estava aos prantos e gritos: não conseguia formar uma palavra sequer.

Puta merda, essas crianças de hoje! Cala a boca, Aline. - Ralhou a professora de física. Tragou seu cigarro - Tenho alguns ano a apagar aqui, e essa garota me aparece com essa gritaria no último dia das férias! Dê uísque à ela, Petúnia. Eu tinha essa idade quando provei.

Petúnia foi mais gentil. Retirou seu xale e abraçou a menina, numa tentativa de diminuir seu tremor.

– Pelo Amor de Deus, o que aconteceu com você, Aline? - perguntou Jessica, que continuou sem resposta. A professora de artes falava baixinho com a garota.

– Ela está choque, Jessica. Vou levar ela para seu quarto. - e com isso retirou-se da sala.

– Leva ela pra bem longe, mesmo. Enfim só, Jessica respirou fundo e depositou o copo na mesa, ao lado da garrafa. Retirou da perna o revólver que levava consigo. - Há quanto tempo não tenho você, hein, amigo? - perguntou ao revolver. - em todas as horas que precisei, você estava lá. Grande amigo, grande amigo... Vou precisar de você em breve. O revólver desfocou e a mulher caiu no sono.

Todo aquele sangue. Aline não conseguia esquecê-lo. A água do lago, vermelha, manchou sua mente. Além disso, os corpos. Era a coisa mais aterrorizante que ela poderia ter visto. Aline não conseguia raciocinar direito. Ela apenas revia, e revia aqueles braços e pernas e troncos e cabeças. E sangue. Por toda parte. Ao se deitar na cama, após Petúnia ter saído, ela não conseguiu dormir. Na janela, uma sombra projetava uma caveira. Passou horas e horas na mesma posição, até que ela mesma se sentiu um corpo boiando em sua própria poça. Quando amanheceu, com um grito terror seguido por um choro descontrolado, percebeu que se encontrva em meio a lençóis encharcados de sangue.

Jessica o viu através das pálpebras dos olhos. Contra a luz, só poderia existir uma pessoa capaz de de acordá-la. O diretor. Abriu os olhos e os fechou rapidamente, por conta da luminosidade. Disse:

– Diretor Fonseca. Que lástima encontrá-lo... Em meu estado. Em que posso ajudá-lo?

– Creio que possa me acompanhar até o refeitório e tomar café da manhã. Que acha, Jessica? Ou eu posso acompanhar você até a rua.

– Não pode me demitir. Sou professora efetiva. Além do mais, eu não fiz nada.

– Ninguém falou em demissão. - ele disse, afastando-se. - Ponha os óculos, Jessica, e venha tomar café. É ótimo para ressaca. - chegou à porta e se virou para a professora. - Não irei aturar sua bebedeira esse ano, professora Souza. Saiba disso. - girou os calcanhares e fechou a porta atrás de si.

A professora levantou-se da cadeira, xingando o colega de trabalho que insistia em perturbar a todos. Pegou o par de óculos escuros redondos. Modelo original, ótima qualidade. Sentiu então que faltava algo.

– Meu bebê! - tateou a mesa, a cadeira. - Onde pode estar? Procurou por toda parte na sala dos professores, e nada. - Pegaram meu revólver. - falou baixinho. - E minhas três balas.

No dormitório das meninas, todas ficaram horrorizadas quando viram os lençóis de Aline.

– Você menstruou?

– Forçou muito?

– Tá cortada?

– Tá doendo?

Porém ela não parecia ouvir. Ela estava aterrorizada. Chorando, encolhida na cama, enquanto todos observavam. Ninguém sabe o que ela viu ou o que a deixou assim, mas todas as amigas dela riam pelas costas.

– Deixem ela. - Amanda disse. Se aproximou da outra, que não demonstrou nenhum sinal por sua proximidade. - Ela deve ter dado tanto, que estourou! - E, pela primeira vez, se sentiu satisfeita ao ouvir as risadas das outras garotas no dormitório. Humilhando, e não sendo humilhada.

Aline continuou chorando, sozinha, até o dormitório esvaziar. Então levantou-se, tremendo, e tirou a saia e calcinha, toda manchada de sangue. Não conseguia entender porque sangrara.

Os pelos de sua nuca eriçaram quando ela trocou de roupa. Uma presença. Podia sentir que não estava sozinha no quarto. Seu coração acelerou quando ela se virou para trás, pronta para ver o mal que surgia. Nada.

Estava sozinha no quarto.

Quando Aline entrou no refeitório, fez se silêncio. Aparentemente, o boato do acontecido se espalhou por toda a escola. Lucas surgiu de alguma mesa, segurou em seu antebraço e ajudou-a a caminhar. Não sentia fome. Na verdade, estava com um mal estar, uma sensação que precisava por algo para fora. Após por poucas coisas na bandeja, os dois se sentaram numa mesa. Não trocaram palavras enquanto comiam, apenas seguravam as mãos como na noite anterior. Petúnia chegou por trás de Aline e pôs a mão em seu ombro.

– Você está melhor, querida? - perguntou. Aline então olhou para ela e depois, para a janela. Por instante ninguém entendeu, mas a janela que ela estava olhando mostrava o lago. Finalmente, todos viam o que aterrorizara Aline. Gritos de terror ecoaram pela sala enquanto a garota era levada para a sala da professora de artes.

Petúnia fez duas xícaras de chá de ervas, servindo a si e à aluna. A garota finalmente despertara do transe e revelara tudo que havia acontecido.

– Ah, querida. - Disse - Isso acontecia direto comigo no Ganges! Claro que eu não estava nas mesmas circunstâncias que você - ela deu uma risadinha - mas um vez eu fiz amor na beira do Senna. Ah, foi como ir à Lua!

Aline apenas bebericou seu chá. Ela queria apenas esquecer o que tinha visto. Na verdade, nem sabia o que fazia na sala daquela desorientada. A professora se sentou e segurou sua mão.

– Fique tranquila. - disse - Você não viu nada demais. Logo os corpos serão retirados e as coisas seguirão normalmente. - Apertou carinhosamente a mão de Aline, que deu um sorriso fraco.

– Obrigada pelo chá, professora. - Disse, ficando de pé - Preciso ir para as aulas... Me distrair...

– Claro, com certeza. - respondeu Petúnia. - Volte sempre! - gritou quando Aline já fechava a porta. Silenciosamente, andou até sua caixa de remédios, e engoliu a seco um comprimido pequeno. Fechou os olhos, e respirou fundo.

A primeira aula da manhã era de biologia. As aulas de biologia aconteciam no laboratório, onde haviam vários vidros com animais mortos, um esqueleto e várias naqueles do corpo humano. Amanda sentou-se na bancada da frente, fascinada com o primeiro contato com a matéria. O professor entrou na sala, silenciando a turma. Caminhou até a frente, e no quadro escreveu "reprodução celular". Tinha mãos delicadas, barba mal feita e olhos intimidadores.

– Muito bem, turma. Ouvidos abertos. Eu falo e vocês escutam. Atenção. Reprodução celular. Vocês devem saber que as células se reproduzem por meiose, onde está se divide. Muito diferente da reprodução humana. - E então, apenas para provocar, ele começou a narrar uma reprodução sexual - A reprodução humana é composta por vários factores. É o que faz se reproduzir valer a pena. - ele caminhou até o esqueleto e passou a mão pela face do crânio. - Primeiro, é preciso um contato. As mãos falam; e arrepiam. Então o beijo, uma apresentação. Cada vez mais intensos, vão acumulando excitação de ambas as partes, e então o contato pele a pele começa. Só assim há o prazer. E os humanos fazem frente a frente, para poder ver os rostos uns dos outros no coito. E aqui, como sabem, o homem já está completamente excitado, e a mulher está toda molhada, pronta para recebê-lo. Ele encaixa seu membro, e então é só prazer, que cresce cada vez mais. Por fim, explode. Então há a liberação do esperma na mulher, recebendo um pedaço de seu amado. Agora, tudo depende de seus espermatozóides. Se algum deles conseguir fecundar o óvulo, bingo! Mas, se não... Já se pode começar de novo. - Ele finalizou a fala com um sorriso cafajeste. Nesse momento, Amanda já se sentia tão excitada que já estava no terceiro estágio.

As aulas geminadas de biologia voaram, e o sinal indicando o fim soou. Enquanto todos saiam, Amanda permaneceu copiando o que havia escrito no quadro. Sentiu o professor encostar sua virilha em suas costas, e apoiar a mão em seu ombro direito.

– Não deveria ir para próxima aula, querida? - ele disse.

– Já estou saindo, professor. - Ele riu.

– Pode ficar à vontade, querida. Tenho muitas coisas que posso mostrar, se você quiser. - ele sorriu. Aquele sorriso cheio de segundas intenções, que assustava Amanda é a fez levantar.

– Obrigada, professor. Já vou. - retirou com pressa. Marcelo observou a garota saindo, com aquele corpo de criança que o excitava.

– Chamou, diretor? - Antônio, o faz-tudo, colocou a cabeça pela porta do escritório. Era calvo, tinha um bigode grosso preto no rosto, e estava acima do peso. Com um sinal de seu patrão, adentrou a sala e chegou perto da cômoda.

– Preciso que faça uma coisa, Antônio. - disse o diretor Fonseca, os dedos entrelaçados.

– Sim, senhor.

– Retire aqueles corpos do lago. Não posso permitir aquilo poluindo perturbando minha escola.

– Claro, senhor. - disse o homem, um pouco desapontado com a tarefa. - Alguma idéia do que foi aquilo, senhor? O que matou aquelas crianças.

– Sim. - respondeu. Levantou e deu as costas à Antônio, olhando o lago pela janela de seu escritório. - Mas é cedo para suspeitas. Pegue os corpos e livre-se deles.

– Devo contatar à polícia, senhor?

– Não! - disse, ríspido, virando-se. - A polícia só serviria para atormentar ainda mais os alunos. Além do mais, um caso não-resolvido é importante para dar uma lição a eles. Nada melhor para mostrar que esses delinquentes safados não devem passear pelo meu campus e trepar no meu lago!

– Senhor. Não é seu campus. Pertence ao reitor. - Antônio disse. O diretor olhou-o, sem entender no início. Então, sentou-se à mesa e disse:

– Não.

Antônio carregou o carrinho de mão até perto do lago e adentrou a água suja de sangue. Caminhou lentamente, torcendo o rosto por conta do odor fétido de podridão e morte, assim como todas aquelas moscas voando ao redor. Puxou um dos corpos pelo braço, que se soltou do corpo. Gemeu de nojo. Serviço completo, transportou todos os corpos para a porta do cozinha.

– Ruth! - chamou. - Ruth! Trouxe algo pra você. - A cozinheira, gorda e feia, saiu pela porta com o avental sujo de sangue, carregando o facão.

– Na hora certa, Antônio. Já estava cortando a carne.

Fernanda entrou em sua sala de aula e se sentou na banca, enquanto os alunos entravam aos poucos. Brincando uns com os outros, casais de mãos dadas. Ela tentou falar, mas foi interrompida pela entrada de um novo grupo de alunos. Sorriu timidamente enquanto eles entravam. Por fim, fez-se silêncio.

– Obrigada. - Disse. Tossiu, limpou a garganta e suspirou. - Eu sou a professora substituta de geografia. Me chamo Fernanda Teles. - Sorriu mais uma vez. Fez-se silêncio, uma espera de algo. - Vou... vou escrever no quadro.

Desencostou da mesa e virou as costas pela primeira vez.

E gritou.

Gritou, porque pela parede onde estava o quadro, havia uma fileira de negros, enforcados. Os corpos pendurados pelo teto, girando com o vento, o sangue escuro saindo da boca e escorrendo, os olhos esbugalhados. Só de calças, em farrapos, as costas feridas por chicotadas. Gritou mais uma vez, sem conseguir desviar os olhos. Pisou para trás, chorou por pânico. A visão viçou turva, e ela caiu no chão. Viu, por último, os pés de um negro, os calcanhares em carne viva. E desmaiou.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!