The 69th: For What I Believe In escrita por Luísa Carvalho


Capítulo 18
Centro


Notas iniciais do capítulo

Coro de vozes angelicais, pode soltar a palavra que todos queremos ouvir: Aleluia! Minhas aulas acabaram e eu prometo escrever muito, muito mesmo agora que estou de férias (na medida do possível, é claro). Espero que gostem do capítulo!



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(POV Burton)

Não quero te perder, eu disse a ela assim que avistamos o Centro e, como sempre, o absurdo tumulto que costuma vir de brinde.

A princípio, não notei o duplo sentido no que disse; depois de alguns segundos, porém, uma espécie de déjà vu invadiu minha mente e recordei todos os momentos em que, assistindo às transmissões ao vivo da Arena, não evitava pensar o mesmo.

Além disso, minhas palavras foram as mesmas que seu irmão Cameron dissera antes dos Jogos. E não é pouca coisa colocar-me nesse patamar.

As memórias automaticamente guiam-me em direção a um pensamento que eu não tenho há algum tempo: o que somos, afinal? Nós dois? Concordei em dar a June o tempo necessário para que pudesse voltar a confiar de fato nas pessoas; no caso, em mim. Mas desde o retorno da Turnê dos Vitoriosos nem sequer tocamos no assunto.

Só me resta torcer para que June não tenha se esquecido de que estou à sua espera, porque meus sentimentos não mudaram nem um pouco desde o trem.

– Terra chamando Burton - June me desprende do que parece ter sido um pequeno transe -, está tudo bem?

Faço que sim com a cabeça, balançando-a levemente como se para me ajudar a despertar.

– Desculpe - digo, sem graça -, fiquei meio perdido por alguns segundos.

Vejo que ela olha levemente para baixo em direção à minha mão, que por sinal ainda segura com força a sua.

– Pelo menos você não soltou minha mão. Imagine se alguém me empurrasse para o meio daquela multidão enquanto você estivesse desligado?! Segurança em primeiro lugar. Gosto disso.

Sua fala irônica me faz rir, o que acaba sendo bom para disfarçar meu semblante inevitavelmente envergonhado.

– Muito engraçado, piadista - respondo, então finalmente avançamos em meio às pessoas e em direção ao Centro.

Já estou bastante acostumado àquele trajeto e acabo me espremendo nos espaços vazios sem muita dificuldade. Noto, porém, que a expressão de June é de extremo desconforto.

– June? - chamo sua atenção na metade do caminho.

– Não se preocupe - ela me assegura -, estou bem, só um pouco claustrofóbica.

Vendedores de rua e sem-teto nos abordam praticamente a cada segundo pedindo dinheiro ou divulgando mercadorias dos mais diversos tipos. Recuso-as educadamente e busco pedir desculpas aos que pedem algumas moedas. Depois de mais algum tempo, conseguimos atravessar a multidão e chegamos à fachada do Centro. Assim que nos desvencilhamos da maioria das pessoas, June apoia uma mão sobre a cabeça e respira fundo e com calma.

– Tenho que confessar que fiquei um pouco tonta agora.

Eu rio baixo.

– Bom, é melhor se acostumar a isso, infelizmente - é o que respondo a princípio. - Esse vai ser seu dia a dia, mas prometo que parecerá familiar logo, logo.

Porém, ela realmente não parece sentir nada além de uma leve tontura.

– Não se preocupe comigo, Burton, de verdade. Sei o que estou fazendo aqui.

É claro que quero ajudá-la - em outras palavras, quero que ela precise de minha ajuda. Ainda assim, a determinação de June me alegra de certa maneira. Não me canso de pensar no quanto cresceu em tão pouco tempo, em como parece ter certeza de todas as decisões que toma.

– Sei que sim, June - afirmo, enfim.

**

– E aqui - digo, por fim, assim que chegamos ao setor mais vazio de todo o estabelecimento do Centro - é onde fica tudo o que o distrito recebe em grande quantidade: embalagens com mais de um quilo de alimento, farinha, carvão... Acredito que as coisas daqui sejam as que mais valerão a pena para nós.

June caminha em volta das pilhas dispostas sobre o chão enquanto corre os dedos por cada um dos sacos.

– Essas embalagens têm poeira sobre elas, Burton. Ninguém compra nada daqui?

Nego com a cabeça.

– A maioria das pessoas daqui não tem dinheiro para mais do que alguns gramas de alimento por dia, quem dirá quilos.

June engole em seco. Sinto que a situação se apresenta mais clara para ela a cada passo que damos no distrito. Tenho uma vaga noção do choque de realidade que está sofrendo, pois me lembro de como foi quando comecei a viver na Vila dos Vitoriosos. É claro que meu lar ainda era num distrito e eu ainda estava cercado pela mesma realidade de pobreza e fome de antes, mas minha vida tornou-se outra. Em meu novo mundo, eu não precisava preocupar-me em ter comida posta sobre a mesa todos os dias ou dinheiro no bolso para o que fosse necessário; e foi assim que June viveu sua vida inteira.

– Vamos - resolvo chamá-la -, tem alguém a quem eu gostaria de apresentar você.

Faço nós dois voltarmos ao canto em que estão os pequenos comerciantes, aqueles que vendem antiguidades ou artesanato. A barraca que procuro, porém, é especifica e, por sorte, está vazia quando nos aproximamos dela.

A mulher que toma conta da pequena pilha de objetos à sua frente parece concentrada em uma quantidade de moedas de bronze que conta, uma por uma, embaralhando-se vez ou outra com as somas.

– Espere só um minutinho, querido - diz, dirigindo-se a mim -, deixe-me só contar essas moedas e...

Mas não hesito em chamar sua atenção colocando minha mão sobre seu pulso, forçando seu olhar para cima na direção de meu rosto.

– Burton! - ela grita assim que me reconhece. - Ah, meu Deus! Quanto tempo que não vejo você, rapaz... Como você está? E os Jogos desse ano? Quando voltou para cá? Sua mãe não me disse nada, eu...

Não contenho uma risada ao perceber seu entusiasmo.

– Estou bem, tia. Também é muito bom te ver.

Ela dá a volta com passos rápidos e apertados até prender-me em um abraço apertado.

– Senti sua falta, Burton, não vejo você por aqui faz anos! Ando contando com os convites de sua mãe à Aldeia dos Vitoriosos, mas também faz tempo desde a última vez que vi Saya... Por sinal, como vão as coisas na vila?

Encosto em seu ombro como um gesto de calma e confesso que me sinto um pouco mal em interromper sua animação; parece que ela não consegue fazer somente uma pergunta por vez. Colocar as novidades em dia, porém, não é minha prioridade no momento.

– Eu adoraria contar tudinho para você, tia, mas na verdade eu vim até aqui hoje para te apresentar a uma... Amiga. - Hesito ao pensar em como me referir a June naquele momento. Ouço uma risada sem graça e percebo que ela notou minha dúvida.

Até mesmo minha tia parece expressar um sorriso tendencioso.

– “Amiga”… - repete. - Bom, quem é a menina de sorte?

June, que estava atrás de mim até então, entra em minha frente e estende a mão de forma educada.

– June Haylon, prazer.

A resposta de minha tia, porém, não é das que se ouve todos os dias.

– Ah, querida, você dispensa apresentações! - exclama, então dá uma risada. - Pode ter certeza de que toda Panem sabe seu nome.

Olho imediatamente para June esperando pelo tom avermelhado que seu rosto adquire sempre que fica sem graça. E é exatamente isso o que acontece.

June nem sequer responde, tamanha é sua vergonha no momento.

– Sou Constance, por sinal - minha tia se apresenta, finalmente, provavelmente tendo notado a expressão envergonhada de June. - E, caso não tenha ficado claro, sou tia do Burton. É um prazer.

Depois de constrangedores segundos silenciosos em nosso núcleo de conversa, percebo que devo intervir.

– E as senhoritas por acaso não estão interessadas no porquê de eu querer apresentar uma a outra com tanta urgência?

Ambas assentem.

– Na verdade - Constance comenta depois de alguns segundos -, achei que ter sido mentor da Vitoriosa já seria motivo suficiente para você me apresentar a ela. Mas, pelo jeito, esse não é o único, então vamos ouvir.

Sorrio, pois tenho um súbito pressentimento de que as coisas se encaixariam como peças de um quebra-cabeças a partir de então.

– Por que não continuamos essa conversa em sua casa, tia? - Pergunto objetivamente; então, viro-me para June. - Ela mora a menos de dez minutos daqui.

As duas concordam novamente. Nem me sinto culpado por ter sido tão direto com minha tia; não teria feito tal "convite" se não tivesse certeza de que a conversa seria longa.


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Notas finais do capítulo

Hm, sobre o que seria essa tal conversa, afinal?!



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