A Verdade Sobre Nós escrita por sayuri1468


Capítulo 1
O Início




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Naquela época tudo o que eu queria era me tornar alguém. Só pensava em meus estudos e no futuro trabalho que me aguardava, desejando ardentemente ser bem sucedida nos sonhos que eu construí. Quando fui aceita na faculdade, meu coração vibrou. Tudo aquilo pelo qual havia lutado estava a um passo de se realizar, e agora, após tantos esforços, o trabalho de verdade começava. A faculdade nunca foi fácil, e eu nem esperava que ela fosse, mas graças a Deus, tudo ocorreu conforme eu planejara. Eu estudei mais do que qualquer coisa, não só por ser minha obrigação, afinal, eu amava o que queria fazer, amava o que estudava, e havia batalhado muito para poder me focar somente nisso. Tudo o que meus colegas achavam chato e insuportável, eu achava maravilhoso, e quanto mais sabia, mais queria saber.

Nunca fui um gênio ou algo do gênero, mas não era burra. Estudava até tarde e lia muitas vezes mais do que os professores pediam. Isso me deu certa reputação na faculdade. Não que eu achasse ruim, ao menos era conhecida por alguma coisa, já que não tinha o hábito de falar com quase ninguém. Antes de me formar, consegui um estágio graças ao meu professor, Sr. Stanford, no hospital da faculdade. Ele já sabia qual seria a minha especialização - não era segredo pra ninguém – e por isso, já me encaminhou para o necrotério. Seria a assistente temporária de um dos legistas na época. Eu estava ansiosa, meu sonho, após tantos anos de esforço e estudo, se realizou.

Foi nessa época que comprovei a veracidade de uma frase de efeito, dessas compartilhadas indiscriminadamente pelas redes sociais: “Quando um sonho se realiza, outro surge!”. E ele, de fato, surgiu. Só que dessa vez era um sonho esbelto de pele pálida, olhos azuis e cabelos cacheados.

Não foi algo gradual, foi imediato. No exato momento em que o vi, no exato momento em que ele me disse seu nome, meu coração parou por alguns segundos. Eu não conseguia encará-lo, eu não conseguia olhar em seus olhos. Era demais pra mim. Passei toda a conversa fitando o chão e tentando controlar minha respiração acelerada. Que poder era esse que ele exercia sobre mim, eu jamais saberia. Mas sei que permanece até hoje.

Deus sabe todas as estupidezes que fiz. Rio de mim mesma toda vez que penso nas vezes que liguei para perguntar alguma besteira, ou quando me arrumava para chamar sua atenção. Ou quando lia sobre algum assassinato somente para puxar assunto. Não era fácil estar apaixonada por Sherlock Holmes.

Eu percebi do jeito mais difícil que ele não era uma pessoa atingível. Ele estava acima do amor e da paixão. Não era o tipo de homem que possuía relacionamentos, ao menos, não possuiria com alguém tão comum quanto eu. Talvez com alguém que estivesse em seu nível, e eu, certamente não era esse alguém. Como eu disse, eu não era uma gênia, eu estudei e me esforcei bastante para obter o conhecimento que tinha. Ele era inteligente demais, e tenho certeza que, coisas que demorei cinco horas lendo em um livro para aprender, ele aprendeu apenas observando em cinco minutos. Com o coração partido, aprendi que Sherlock não era para mim, e eu não era para ele.

Segui em frente, fingindo que aquele sentimento não existia mais. Namorei outras pessoas – ou ao menos tentei – mas nenhum deles tinha o brilhantismo que eu tanto havia admirado em Sherlock. Nenhum deles tinha feito meu coração parar no primeiro encontro, como ele. Mas eu tentei, tentei de todas as formas seguir em frente e achar alguém. Sei que não é correto usar uma pessoa para esquecer outra, mas eu estava sozinha há tanto tempo, e já estava cansada de estar sempre tão sozinha. Sentia falta de ter com quem conversar, de ouvir alguém contando seus problemas e compartilhar os meus também. Sherlock e eu costumávamos fazer isso, quando dividíamos o laboratório. Mas eu sabia que ele não estava me ouvindo, embora eu o estivesse.

Acho que Sherlock era o principal culpado por eu não conseguir ninguém naquela época. Fora a comparação inevitável que fazia involuntariamente, meu coração ainda nutria uma fagulha esperançosa, e cada vez que Sherlock me solicitava, era apenas questões de segundos para que eu o atendesse. Quão ingênua eu era, ainda fazia tudo pela sua momentânea atenção.

Foi naquele dia que tudo mudou.

Naquele Natal, a pessoa que achei que era inatingível, que jamais se relacionaria com ninguém, arrumou alguém, e não era eu. A realidade me atingiu como um tapa, e ficou marcado no meu rosto por vários meses. Ela devia ser especial para ele , eu senti que era. Apesar da minha consciência me dizer que eu já sabia e esperava por isso, aquela fagulha de esperança nutriu em mim sonhos que eu pensei que pudessem se realizar, se eu apenas mantivesse minha paciência. Tantos anos ao lado dele, e ela apenas havia chego há poucos dias. Não, era eu que não interessava o suficientemente. Encarando a realidade, levei o restante dos pedaços daquilo que um dia foi meu coração, para casa.

Meses se passaram até que eu tivesse colado tudo o que havia se partido em mim. Me reergui através dos estudos e do trabalho, procurei fazer mais amizades e sair mais vezes de casa. Foi uma época divertida, e só então percebi tudo o que havia perdido durante a época da escola e da faculdade. Talvez, se tivesse aproveitado naquela época, não teria me sentido tão sozinha. Conheci rapazes que me admiravam e gostavam de mim, e minha autoestima foi restituída.

Mas era só ele aparecer que a dificuldade voltava. Eu tentei me afastar dele, o máximo que pude. Mas como fugir de alguém que vem atrás de você todas vezes? Embora eu tivesse notado, naquele dia ele estava estranho. Parecia triste, abatido, não exalava sua segurança e confiança habitual. Foi naquele dia que pela primeira vez, exteriorizei como me sentia: “Eu não conto!”. Era assim que vinha me sentindo desde que o conheci. Sabia o motivo pelos quais ele vinha falar comigo ou me pedir ajuda. Eu era fácil, eu era apaixonada e fazia tudo por ele. E ele sabia, não importava quem eu namorasse, ele sabia que ele era o único.

Eu não podia mais ficar ali depois de confessar meu sentimento mais profundo. Aquilo era minha mágoa, e eu me odiei por ter dito. Eu não havia pensado, eu apenas disse, em um impulso. Eu não queria sua pena, eu não queria que ele visse meu coração, não naquele momento. Era me rebaixar demais, mais do que já vinha fazendo até então. Senti medo de voltar ao laboratório, mas reuni toda a coragem e força que possuía para poder encará-lo novamente, como se nada tivesse sido dito. Um misto de decepção e alívio se formou em meu peito quando vi que ele havia ido embora.

Naquela noite, organizei a bagunça que havíamos feito no laboratório e antecipei alguns trabalhos que deveria entregar pela amanhã. Cansada física e emocionalmente, me preparei para ir pra casa, quando ele reapareceu repentinamente.

– Você está enganada! – ouvi sua voz em meio à escuridão – Você sempre contou e sempre confiei em você!

Sua voz estava embargada. Será que ele realmente havia se incomodado com a minha confissão?

– Mas você está certa, eu não estou bem!

Ah, ali estava o motivo! Ele iria pedir um favor, como sempre. Sempre fazendo me sentir especial para poder pedir algo. Eu já sabia.

– O que você precisa? – perguntei querendo ir direto ao ponto. Não precisava que ele usasse minha amargura para me pedir um favor, não queria que ele usasse.

– Se eu não fosse tudo aquilo que você acha que eu sou, se eu não fosse tudo aquilo que eu penso que sou, você me ajudaria mesmo assim?

Era algo sério, ele jamais falou assim antes. Parecia vulnerável e solitário. Tinha mesmo algo errado.

– Do que você precisa? – repeti, esperando que isso respondesse a pergunta que ele havia me feito.

Ele se aproximou. Seus olhos pareciam surpresos e gratos. Ele nunca havia me olhado assim antes, ou ao menos, não que eu houvesse notado. Aquele silêncio, aquele olhar, tudo isso era agoniante, por que ele simplesmente não falava o que tinha que falar?

– Você! – foi à resposta dele.

Respirei fundo, tentando não cair no jogo dele. Não havia necessidade de brincar comigo assim, ele sabia que o que significava pra mim, eu jamais deixaria de lhe dar auxílio.

– Sim, mas o que eu preciso fazer? – minha respiração acelerada me denunciava, e eu sabia disso. Ele estava cada vez mais próximo e seus olhos não desviavam dos meus por um único instante.

Então, Sherlock fez algo que eu jamais pudesse imaginar que faria. Ele me abraçou. Seus braços enlaçaram firmemente minhas costas, uma de suas mãos foi para meus cabelos, enquanto sua cabeça se depositava suavemente em meu ombro. Na hora eu só fiquei imóvel, surpresa com aquele gesto que jamais pensei que fosse acontecer em outro lugar que não meus sonhos.

– Eu não menti, você conta! - a voz estava falha, seria possível que ele estivesse...chorando?

– Sherlock, está tudo bem...- tentei dizer após me recuperar do susto.

– Não, Molly! – ele me cortou, sem desfazer o abraço ou retirar sua cabeça do meu ombro. – É minha culpa que você não saiba, mas você precisa saber! Talvez eu não possa dizer isso de novo!

Eu realmente estava preocupada agora. O que estava acontecendo para que ele me dissesse essas coisas? Era algo grave, deveria ser! Sem que eu notasse, eu estava chorando também!

– Não chore! – ele pediu, levantando seu rosto em minha direção.

Olha quem fala, pensei, seus olhos estavam marejados e seu rosto estava vermelho. Ele estava chorando também.

– Me diga o que está havendo! – pedi.

Então ele me contou toda a armação de Jim, todo o plano que ele e Mycroft haviam elaborado para pegá-lo, e de como ele temia ter que morrer a essa altura do campeonato. Contou do plano que tinha feito para poder fingir sua morte e qual era a minha parte nele. Enxugando as lágrimas que ainda teimavam em cair, eu sorri aliviada.

– Ah Sherlock! É claro que eu consigo fazer isso! Isso é o de menos! – Eu sabia, e ele também, que eu iria infringir regras que não poderiam ser quebradas. Seria anti-ético e correria o risco de perder o emprego que durante anos trabalhei duro para conseguir. Mas eu não me importava, ao contrário, estava feliz por poder ajuda-lo e estava feliz, que apesar das regras violadas, o problema era fácil de se resolver. – Vou descer até o necrotério e procurar o corpo imediatamente! – falei mais animada, mas a mão dele me deteve.

– Não essa noite! – falou – Fique comigo esta noite!

– Mas Sherlock...

– Por favor! Tem mais coisas que eu preciso dizer! – ele pediu tão friamente que eu pude sentir os sentimentos engasgados em sua garganta. Minha preocupação voltou, será que não era tão simples quanto pensei?

Ele pegou minha outra mão e segurou as duas com cuidado. Seus olhos me encaravam com ternura e um inesperado sorriso se formou em seus lábios.

– Molly, me desculpe!- começou – Sei que não sou a pessoa mais suportável do mundo, sei que te magoei inúmeras vezes, mesmo quando queria mostrar o quanto você era importante pra mim! E fracassei até nisso, pois você acha que não significava nada para mim!

Não, ele não precisava fazer isso, eu pensei já sentindo as lágrimas rolando pelos meus olhos novamente. Por favor, não faça. Não sinta pena de mim, por favor, não diga essas coisas.

– Não chore, por favor! Estou dizendo a verdade! Acredite em mim, por favor!

O que estava havendo com ele? Estava mais vulnerável do que eu, e jamais pensei que veria ele nesse estado. Uma de suas mãos abandonou a minha e foi em direção ao meu rosto, enxugando as lágrimas que caíam.

– Molly, você é a pessoa mais incrível que eu já tive o prazer de conhecer! Por mais que não demonstre, eu adoro ouvir as histórias que você me conta da sua cidade, de quando era pequena, dos seus pais e da sua época da faculdade – então ele realmente prestava atenção ao que eu dizia, conclui surpresa – Nessa vida cheia de mistérios e vilões, você é meu refúgio! É só com você que eu consigo relaxar e limpar minha mente!

Ele parou, e um silêncio se fez. Ele estava sendo sincero, eu sabia, e me surpreendi com os sentimentos que jamais pensei que ele pudesse sentir por mim. Me senti estranha. Estava feliz e grata por isso, mas ao mesmo tempo, sabia que não sairia disso.

– Sherlock, obrigada por me contar isso! – falei colocando um sorriso no rosto. Ele se aproximou para beijar minhas bochechas, como sempre fazia. Mas estranhamente, parou no meio do caminho e murmurou:

– Só dessa vez!

Então seus lábios foram da bochecha para meus lábios, e um beijo tímido e cuidadoso se formou. Ele estava nervoso, parecia ser o primeiro beijo dele. Apesar de ser um beijo desajeitado, eu retribui, e o ensinei aos poucos os movimentos corretos. Depois de algum tempo, nos separamos, e ele olhou diretamente em meus olhos, como vinha fazendo durante toda aquela noite. Nenhum de nós disse alguma coisa. Eu sorri e ele sorriu de volta, provavelmente sem saber o que fazer em seguida. Meu coração estava disparado e eu só sentia que podia sair voando a qualquer momento. Daria tudo pra saber o que ele estava sentindo também, e não me contive.

– Como foi?

Ele riu, meio encabulado.

– Talvez só mais uma vez! – murmurou de novo, e puxou meu rosto para outro beijo. Agora mais seguro e menos tímido.

Quando nos separamos, tanto eu quanto ele estávamos ofegantes. Demoramos para abrir os olhos, e eu abri antes dele. Permanecemos com os rostos próximos, sem dizer absolutamente nada por alguns segundos.

– Molly, se eu te confessar uma coisa, promete que jamais vai repeti-la ou que vai mencionar o assunto novamente? – perguntou ainda com o rosto colado ao meu. Eu assenti e ele prosseguiu - Eu amo você, Molly Hopper!

Eu sorri ao mesmo tempo em que uma tristeza invadia meu peito. Sherlock Holmes acabava de me beijar e dizer que me amava, e eu deveria fingir que nunca aconteceu? Me afastei de seu rosto, ainda sorrindo, disfarçando como aquele pedido me afetara. Como ele podia fazer aquilo comigo? Apesar de tudo, eu vi a tristeza em seus olhos. Naquele momento eu entendi o que aquela confissão significava, assim como o ato de não mencioná-la. Suspirei resignada, se era assim que ele queria, assim seria.

– Melhor eu aproveitar que não tem mais ninguém no necrotério e procurar pelo seu sósia! – disse fazendo menção de sair, e dessa vez ele não me impediu. Atitude que eu agradeci imensamente, pois naquele momento, novas lágrimas começaram a cair. As últimas lágrimas que eu derramaria por Sherlock Holmes, pois aquelas lágrimas não eram por mim, mas sim por ele. Foi naquele momento que eu percebi a que destino ele estava se fadando. Viver sozinho, essa era a decisão que ele estava tomando. Mas por quanto tempo duraria? Será que ele se arrependeria mais tarde? Ficou imaginando os sentimentos que o invadiriam quando notasse que era tarde demais!


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