Do I Wanna Know escrita por sixtywattgloom


Capítulo 1
I want to love you again.


Notas iniciais do capítulo

Aqui estava eu me sentindo orfã de Clarina e enquanto revia as minhas cenas favoritas das duas juntas, acabei tendo essa ideia. Existem algumas coisas que vocês precisam saber para que não exista confusão. Marina e Cadu são irmãos, filhos do Diogo e sobrinhos do Ricardo. A Clara não é a filha mais nova da Chica, e sim a do meio. Essa é uma história que vai ser simultaneamente no presente e no passado. A maior parte dela vai acontecer agora, mas lá no fim do capítulo (da maioria, pelo menos) vocês vão ver um pouco do passado. Acho importante pra vocês entenderem direitinho as dinâmicas dessa história.Enfim, creio que não vai ficar confuso, mas se acontecer, dou um jeito aqui. Aproveitem a história.



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"I'm going to give you an opportunity: get out of this. Now. Before it gets so fucked up nobody could ever recover."– Charlie Barret - 'Suicide Kings'

A casa dos Fernandes parecia estar em festa. Ninguém ficava parado por muito tempo. Helena andava de um lado para o outro tentando ajeitar as coisas, Virgílio tinha desistido de tentar acalmar a mulher. Dona Chica dava ordens, Rosa tentava fazer exatamente o que a mulher lhe mandava fazer, mas era difícil quando suas ideias mudavam de dois em dois segundos. Clara observava a movimentação, do seu lugar ao lado do marido Cadu conseguia escutar a conversa que ele tinha com Nando, mas as palavras não pareciam fazer sentido em sua cabeça. Estava distraída, até Juliana tinha desistido de ter uma conversa com ela. Sua mente estava em outro lugar, ou melhor, em outra pessoa.

Quando Cadu chegou em casa dizendo ter uma novidade, a mulher não sabia direito o que pensar. Um emprego, talvez? Mais uma das suas ideias malucas de abrir um estabelecimento com dinheiro que ele não tinha? Ela esperava qualquer coisa quando se tratava de Carlos Eduardo, mas não conseguiu evitar a expressão de surpresa ao descobrir o motivo de toda aquela euforia. Eles iriam receber uma visita, alguém iria ficar hospedado na casa da família até se ajeitar no Rio de Janeiro.

Não eram exatamente uma família com renda fixa. Clara tinha feito faculdade, mas foram cinco anos de sua vida que ela poderia muito bem pedir de volta, nunca trabalhou na área em que se formou. Cadu vivia desempregado, seus planos de se tornar um chef sempre eram jogados mais para frente por conta da sua irresponsabilidade e da sua dificuldade em continuar num emprego por mais de três meses. A mulher já tinha até perdido as contas de quantas vezes teve que engolir o orgulho e a vergonha para pedir um dinheiro emprestado à irmã mais velha. Mas não era como se tivesse outra escolha.

Os dois eram pais de Ivan, um rapaz de oito anos. O garoto não fazia ideia das dificuldades que existiam em sua família, seus pais escondiam os períodos ruins e ele não estranhava a frequência em que Cadu mudava de emprego, ou as suas ‘férias’ que sempre aconteciam entre um e outro. E apesar da falta de atenção do homem, principalmente nos últimos anos, ele era uma criança feliz.

Mas a preocupação de Clara em relação à visita não era o fato de que ela traria novos gastos, ou mesmo que fosse atrapalhar a rotina do casal. Sua maior preocupação era em relação à identidade da visita, ou melhor, da mulher.

Cadu não parecia perceber nada de errado quando falou sobre a ligação que recebeu do seu pai, Diogo. O homem sempre tinha sido muito ocupado, o pouco tempo que tinha de folga não era usado para visitar ou ajudar os filhos, ele preferia suprir a sua necessidade de caprichos. Tinha capital, era dono de uma grande empresa com sede na Europa, mas com filiais em todos os continentes. Passava a vida viajando, ainda que o lugar que chamasse de casa fosse fixo, em Londres.

Não eram muitas as vezes em que o cozinheiro recebia ligações do pai, o homem nem mesmo conhecia o neto, a última vez em que colocou os pés em solo brasileiro tinha sido quando se separou da sua mulher, indo embora com a filha para o seu novo lar. Nem mesmo enviava dinheiro para Cadu, acreditava que ainda que tivesse todas aquelas riquezas, não poderia deixar que seus herdeiros sentassem no sofá enquanto o dinheiro crescia em suas contas. Diogo tinha começado seu negócio aos dezesseis anos, e virou um dos homens brasileiros mais ricos por conta própria, sem precisar da ajuda de ninguém.

A ligação que recebeu não foi apenas uma tentativa de reaproximação, ou uma forma de matar as saudades que deveria sentir do filho. Não, Diogo tinha pedido um favor para Cadu, um favor que deveria ser feito em nome da sua irmã.

Então quanto seu marido se sentou no sofá com um sorriso sonhador nos lábios e disse que sua irmã iria passar algumas semanas na casa deles enquanto se estabilizava na cidade, Clara quase derrubou o vaso que tinha em suas mãos. Ela olhou incrédula para o marido, seu cérebro ainda tentando digerir a informação.

“O que você disse, Carlos Eduardo?” perguntou tentando manter o tom da voz firme, mas calmo. Não queria deixar que nenhuma emoção transparecesse, boa ou ruim.

“Carlos Eduardo? Por acaso estamos brigando?” perguntou em tom divertido, mas com receio de que eles realmente estivessem iniciando uma discussão, ainda que o motivo fosse desconhecido. “Eu disse que o meu pai ligou hoje pedindo pra gente abrigar a minha irmã por algumas semanas. Eu não sei realmente os detalhes, acho que ele só liberou um dinheiro pra ela iniciar os negócios aqui, ela vai precisar de algum tempo para arranjar um canto.” finalizou se encostando nas almofadas espalhadas no sofá, o semblante de quem estava cansado agora dominava o seu rosto.

“E ela vai ficar aqui? Na nossa casa?” a mulher passou a mão no rosto, fechando os olhos por alguns segundos e em seguida respirando fundo, seu olhar encontrando o do marido que se mantinha imóvel.

“Bom, ela poderia ficar com o Tio Ricardo e a Dona Chica, mas eles precisam de um pouco de privacidade, não é?”

“E nós não precisamos,” ela completou cruzando os braços. “É isso que você quer dizer?”

“Clara, não precisa complicar tudo. Olha, ela é minha irmã, eu não vejo ela há mais de dez anos, isso é verdade, mas nunca deixou de ser. Se for um problema tão grande assim, tudo bem, eu falo com o meu pai, ela se muda pra um hotel. Eu só imaginei que você não botaria tanta dificuldade assim.”

“Não é isso, Cadu. É só que...” procurava palavras em sua mente, qualquer coisa que justificasse a sua atitude. “Você sabe como as coisas estão difíceis para nós três. Ainda vamos colocar uma terceira pessoa?”

“Ela trabalha, Clara. Ela tem dinheiro, mas não conhece o Rio, somos a única família dela aqui. Me deixa dar pelo menos um mês em um lar de verdade pra ela, depois procuramos um apartamento.”

E ela não teve outra escolha. Cadu tinha razão, sua irmã não conhecia um lar de verdade, ou pelo menos tinha esquecido o que era um durante os últimos anos. Depois que foi embora de Goiânia com o pai, pouco antes de todo o clã Fernandes e Cadu se mudarem para o Rio de Janeiro, ela teve que fingir viver um conto de fadas em Londres, quando tudo o que ela queria era uma família de verdade.

E agora ali estava Clara, sentada naquele sofá, vendo todos arrumarem as coisas para que a convidada chegasse. Até mesmo Juliana que não conhecia direito a garota estava animada, ansiosa para ter alguém famoso respirando o mesmo ar que eles.

O único integrante da família que não estava presente era o seu irmão mais novo, Felipe. O rapaz tinha ido buscar a garota, era um dos poucos que ainda tinha contato frequente com ela visto que eram grandes amigos quando mais novos. Clara também tinha se tornado próxima nos últimos anos em que conviveram juntas, mas o contato foi cortado no momento em que um oceano passou a dividir as duas.

"Ivan, não corre assim. Você vai acabar quebrando alguma coisa." falou preocupada com o menino que passava correndo na sua frente, provavelmente brincando com o cachorro que vinha logo atrás dele.

"Deixa, Clara. É bom que dá uma folga pra Rosa." Helena falou com uma voz serena, seus olhos atentos procuravam por qualquer coisa que estivesse fora do lugar.

"Eu não entendo tudo isso. Nem quando eu voltei do hospital tive uma recepção dessas" Cadu disse tomando um gole da sua água, se lembrando da época em que fez uma cirurgia que quase tirou a sua vida. E no final das contas, lhe devolveu anos que poderia ter perdido.

"Ciúmes, Cadu? Da sua irmã, ainda." comentou Ricardo em tom divertido, tinha chegado minutos atrás com as compras de última hora que a sua mulher tinha pedido.

"Não, não me incomoda ver vocês paparicando ela. Vai precisar de suporte mesmo, ainda mais agora que está em uma cidade nova." seu comentário rendeu uma nova conversa entre todos os presentes na sala, com exceção de Clara que continuava procurando razões para fugir daquele lugar.

Não estava com má vontade, sabia que tinha colocado dificuldades para aqui acontecer, mas nunca deixaria um parente do seu marido desamparado, ainda mais alguém que também era próximo dela. A mulher só estava preocupada com o encontro que iriam ter, com a reação da outra ao ver o seu rosto mais uma vez.

O barulho na porta interrompeu qualquer pensamento que ela pudesse ter no momento, como todos os convidados estavam presentes, aquilo só podia significar uma coisa.

“Família?” ouviu a voz do seu irmão mais novo antes de enxerga-lo, mas logo viu o rapaz entrando na sala, duas malas em suas mãos que pareciam pesar mais do que ele mesmo, mas o sorriso jovial continuava em seus lábios. “Olha só o que eu trouxe!”

Clara sabia o que iria acontecer. Era obvio, a única pessoa que poderia entrar por aquela porta era a última e ao mesmo tempo a única pessoa que a mulher queria ver naquele momento, mas nenhuma preparação era o suficiente. Prendeu a respiração quando a nova convidada entrou na sala, um rosto que tinha mudado durante os anos, mas que ainda lhe fazia lembrar dos velhos tempos em Goiânia.

Seus olhos tinham um longo caminho a ser percorrido. Marina usava uma sandália rasteira, provavelmente sabia que iria ficar muito tempo com aquele calçado e não iria usar nada que lhe tirasse o conforto durante todas aquelas horas de viagem. As pernas descobertas traziam lembranças que Clara jurava ter esquecido depois de todo aquele tempo, mas que ainda lhe traziam calafrios. As coxas eram cobertas por uma saia jeans, enquanto ela usava uma camiseta branca com os dizeres “keep calm and click on” em preto, uma imagem de uma maquina fotográfica na parte superior da peça.

Mas o que realmente lhe trouxe uma inquietude foi o rosto da mulher na sua frente, aquelas expressões que ela queria ter esquecido. Os lábios cobertos pelo batom vermelho eram uma marca que a mulher já tinha tomado como sua, não tinha ninguém que lhe conhecesse e não soubesse do seu gosto por essa cor. No rosto os óculos de armação preta lhe davam um ar mais jovem, e quase imediatamente trouxeram um sorriso aos lábios de Clara que tentou de todas as formas conter. Não podia se deixar ser enfeitiçada por aquela mulher, por aqueles olhos. Ah, os olhos de Marina.

Clara soltou um suspiro alto quando a mulher olhou em volta daquela sala repleta de pessoas e finalmente parou os olhos nela, uma expressão indecifrável em seu rosto. Não sabia dizer de era tristeza, desapontamento ou indiferença, só sabia que não gostava de ser olhada daquela forma. A voz de sua mãe quebrou momentaneamente o contato visual, mas a mulher continuava encarando a outra.

“Marina, minha querida. Olha só você,” disse a mulher se aproximando da artista, arrancando um sorriso verdadeiro da mulher mais nova. Não importava o tempo que tinha ficado fora, sempre teria um carinho muito grande pela mulher que sempre lhe tratou como uma filha. “O que eles lhe dão para comer na Europa? Está tão magra!”

“Ei, Dona Chica, já vai começar” falou Felipe em tom brincalhão, colocando as malas que carregava em um canto do cômodo.

“Deixa ela, Felipe. Pode ter certeza de que não me serviram nada que se vê na casa dos Fernandes, ou eu certamente teria que aumentar o meu número de calça para algumas dezenas acima.”

“Pode ter certeza de que a Chica vai fazer questão de te engordar um pouco” Ricardo falou divertido, indo ao encontro da sobrinha e lhe dando um abraço apertado, as ligações que trocavam não tinham sido o suficiente para que ele matasse as saudades de que tinha da mais nova. “Você demorou demais para nos ver, me espanta ainda lembrar-se de todos.”

“Que grande exagero, Tio. Como se eu pudesse me esquecer da minha família!” disse se afastando do homem e indo na direção das outras pessoas, cumprimentando Juliana, Nando, Helena e Virgílio. “Eu fui embora e você era só uma garotinha. Olha só pra você agora!” exclamou ao ver Luiza, tinha visto fotos da garota ao longo dos anos e ainda assim se surpreendia por ela ter se tornado aquela jovem tão bonita.

“Dez anos não são dez dias, Marina.” foi a voz de Cadu que quebrou o seu contato com a jovem na sua frente, a voz do homem parecia carinhosa, mas trazia um remorso escondido por todo aquele tempo sem contato.

A verdade era que Marina se comunicava com Ricardo, Felipe, Chica e até mesmo Helena mais do que falava com Cadu, ainda que os dois fossem irmãos. O homem achou estranho quando ela anunciou a sua viagem para Londres, ainda mais quando tinham feito planos de comprarem apartamentos em um mesmo prédio quando fossem morar no Rio. Cadu era cinco anos mais velho que ela, mas os dois serem se deram bastante bem. Claro que brigas aconteciam, e nos últimos anos tinham ocorrido com uma certa frequência, a irritação da garota se tornava sempre presente, mas eles eram unidos. Foi por isso que o anuncio da sua mudança foi tão doloroso e repentino.

Ele achava que ela estava escondendo alguma coisa dele, o seu motivo real. Querer uma aproximação com o pai era uma coisa natural de qualquer filho, mas se tratando da sua irmã, ele sabia que não tinha sido o fator fundamental. Muitas tinham sido as vezes que ele se pegava pensando se tinha pecado em alguma coisa, se perdeu algum acontecimento na vida deles que pudesse ter influenciado na sua decisão. Mas nada. Nunca. Nem imaginava. Também, ninguém poderia lhe culpar por não imaginar que a real razão estava do lado dele, era casada com ele.

“Eu sei quanto tempo eu fiquei fora, Cadu. Não preciso que ninguém me lembre.” deu um breve sorriso antes de se virar para o homem, mastigando o lábio inferior na intenção de segurar as lágrimas.

Queria ter mantido contato com ele, queria ser mais atenciosa e parecer mais interessada quando ele lhe falava sobre os seus planos de montar um restaurante ou sobre o passeio que tinha dado com a mulher e o filho pela manhã. Até tentou parecer uma irmã atenciosa, perguntando os detalhes dos fatos que ele lhe explicava, concordando nos momentos certos e respondendo da maneira que lhe parecia ser a mais adequada. Mas não tinha talento para o teatro como tinha para a fotografia, interpretar um papel em algum momento iria lhe deixar cansada. E foi mais rápido do que ela esperava.

No começo ela dava desculpas. Dizia que não podia viajar para o Brasil por causa dos trabalhos da faculdade, não foi para o casamento do seu irmão por conta de uma grande exposição que iria ter no mesmo dia, faltou a formatura do melhor amigo por conta de um trabalho que tinha conseguido em um outro país. Ligações não eram retornadas por falta de tempo. As desculpas eram esfarrapadas, nem a pessoa que ouvia e nem a pessoa que as dizia acreditava, mas para evitar qualquer problema, eram engolidas. Marina foi aos poucos se retirando da vida de Cadu, e ao mesmo tempo o retirando da sua. Era o caminho mais fácil.

“Mas pelo visto precisa que alguém te lembre que tem família,” as palavras do homem ecoaram pela sala, a tensão ali era palpável e ao mesmo tempo quase que insuportável.

“Então de você eu só ganho broncas, nada de abraços?” a mulher falou em um tom tranquilo, um sorriso se formando nos seus lábios apenas para tentar quebrar o clima. Se mostrou o suficiente para que Cadu abrisse os braços e fosse de encontro a ela, dando um beijo da sua cabeça e lhe aconchegando no seu peito.

“Seja bem vinda, eu senti a sua falta” falou em voz baixa de forma que ninguém além de sua irmã pudesse ouvir as suas palavras.

“Também senti sua falta, idiota.” se separou dela, dando um soquinho no seu ombro como costumava fazer quando eles eram pequenos. Lembranças do passado eram algo que ela gostaria de deixar onde estavam, lá atrás, mas não parecia conseguir evitar que elas passassem em sua cabeça.

“Trouxa,” respondeu o homem dando espaço para que ela falasse com os dois últimos integrantes da família que ainda não tinham tido a chance de falar com ela.

Marina congelou ao se aproximar de Clara e do filho. Seus olhos desviaram por um segundo da figura mais alta para encarar o menino de cabelos loiros que minutos atrás estava inquieto, mas que agora parecia perfeitamente contente se escondendo atrás da mãe, apenas observando toda a movimentação. Seus olhos voltaram para a mãe e ela deu um longo suspiro, sabia que não podia ficar calada por muito tempo ou iria dar bandeira para os outros da sala de que havia algo de errado ali. A última coisa que ela queria era levantar alguma dúvida sobre a sua relação com Clara, ainda que o passado das duas fosse conhecido de duas pessoas na sala.

A fotografa limpou a garganta, olhou para o irmão que parecia querer lhe apressar para falar alguma coisa, não aguentando todo o mistério que se fazia presente com aquela estranha interação entre as duas mulheres da sua vida. Ela lhe ofereceu um breve sorriso antes de virar os olhos na direção da outra mulher mais uma vez, agora com o rosto mais relaxado, ainda que as mãos estivessem suando.

“Clarinha,” começou sem saber exatamente o que fazer ou falar, seus braços queriam envolver a mais velha em um abraço, mas ao mesmo tempo queriam esconder o seu rosto que ficava vermelho a medida que o silêncio continuava. “Quanto tempo!” completou sem jeito, dando um passo pra frente e lhe dando um breve abraço, provavelmente um dos mais desconfortáveis que já tinha dado.

“Marina” sussurrou o nome que tentou esquecer por tanto tempo, o cheiro intoxicante da mulher lhe fazendo lembrar da primeira vez que a viu.

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“No one believes in love at first sight until that special person comes along and steals your heart.” – Unknown

Aquele jantar tinha deixado Clara nervosa. Cadu tinha lhe falado que seu pai estaria na cidade, tinha passado em Goiânia para resolver alguns problemas da casa e em um momento de interesse disse que gostaria de conhecer a namorada do filho. Ela sabia que a relação dos dois não era muito boa, e ainda que eles estivessem juntos à apenas cinco meses, também tinha entendido que era muito importante ter a aprovação do pai. Cadu podia não confessar para ela, mas parecia querer um bom convívio com o velho.

Era também a sua chance de conhecer a irmã mais nova do rapaz, Marina. Só tinha ouvido falar que ela era mais nova que eles, deveria ter quinze anos, e era apaixonada por fotografia. O namorado lhe mostrou algumas fotos que ela tinha tirado, o orgulho claramente estampado em seu rosto. Clara nunca tinha tido a chance de conhecer a garota, mesmo que ela morasse com o tio e o homem agora namorasse sua mãe, Dona Chica.

A menina sempre tinha uma prova no dia seguinte, uma festa de aniversário imperdível ou um ensaio da banda em que tocava por diversão. Foram cinco meses evitando encontros, mas parecia que finalmente tinham encontrado uma data em comum.

Deu o seu melhor para não parecer uma garota do interior que não sabia o que estava fazendo. Passou até mesmo o dia no salão, se preparando para aquele jantar. Não queria desapontar o namorado mesmo sabendo que ele não se importava com nada daquilo. De certa forma, não estava se arrumando toda para os olhos dele, e sim para os olhos da família.

O relógio logo deu sete e meia, e logo uma buzina na frente da casa lhe chamou atenção. Era Cadu com o carro. Se despediu da mãe e apenas sorriu para o boa sorte dado pela sua irmã. Cumprimentou o rapaz com um selinho, e em troca ele lhe disse o quão bonita ela ficava naquele vestido. A garota deu um sorriso bobo e mandou ele seguir, em pouco tempo os dois estavam no casarão dos Meirelles.

Clara nunca tinha ido ali, foi poucas vezes pra casa de Cadu, e o rapaz morava com o tio, Ricardo. Era muitas experiências novas de uma vez só, e a garota ficou com medo de se perder nelas. Cadu deu um sorriso confiante e saiu do carro, sendo seguido pela garota. Eles entraram na casa e logo foram recebidos pelo anfitrião, Diogo.

“Vejam só, essa é a garota de quem você tanto fala, rapaz?” perguntou observando Clara dos pés a cabeça e fazendo com que elas cruzasse os braços contra o peito, claramente envergonhada de ser analisada daquela forma.

“Pai, essa é a Clara.”

“Muito prazer, senhor Meirelles.”

“Educada, ela. Mas pode me chamar de Diogo, nada de formalidade quando estou em casa.” lhe deu um sorriso que parecia simpático, e que foi o suficiente para lhe tranquilizar um pouco. Seu maior medo era causar uma péssima primeira impressão no homem, mas parecia que tudo estava correndo bem.

“Diogo então.” sorriu sem saber direito o que falar, seus olhos agora correndo pela casa e observando os poucos objetos pessoais que se encontravam ali, parecia mesmo que aquela era uma casa só de ‘passagem’, utilizada por pouco tempo e logo depois largada.

“Você nos dá licença por um segundo? Preciso falar com o Cadu sobre uma coisa” um homem disse educadamente, pegando no braço do filho e indicando que eles fossem para um outro cômodo da casa, olhando em seguida para a garota que ainda se encontrava na frente deles.

“Claro.”

“Fique à vontade.”

Observou os dois homens saindo da sala antes de dar alguns passos na direção de uma prateleira. Alguns livros estavam espalhados por ela, títulos que Clara não se recordava e alguns que tinha ouvido falar, recomendações que recebera na faculdade, mas que nunca tinha posto em uso. Estranhava a falta de porta retratos, sua casa era cheia de quadros, fotos em família. Mas nada ali lhe fazia crer que uma família residia.

“Você deve ser uma ótima companhia para conseguir assustar o meu pai” ouviu uma voz aveludada, e se virou rapidamente na direção, dando de cara com um rosto que lhe assombraria por muito tempo.

Clara tinha visto fotos de Marina. Algumas eram antigas, nem tinha completado dez anos ainda, poucas eram atuais. Nos últimos anos, a garota mais nova preferia ficar longe dos holofotes, trocava facilmente um lado da câmera pelo outro. Gostava de ser ela controlando as fotos, escolhendo as paisagens e o que fotografaria. Ficar na frente das câmeras não era o seu forte.

Mas nada se comparava a sua beleza. Nunca tinha visto alguém tão bonito, e agora entendia a preocupação que Cadu tinha quando os garotos se aproximavam demais dela. Tinha traços marcantes, era extremamente atraente ainda com pouca idade, e o seu olhar era expressivo, forte. Intenso. Aprenderia que essa era a palavra certa para descrever Marina Meirelles.

“Me desculpe, o quê?” voltou para a realidade, não entendendo as palavras da garota.

“Meu pai, Diogo, ele normalmente lhe apresentaria a casa contando todas as histórias que pudesse recordar, e algumas mentiras que conseguisse inventar. Mas eu não vejo ele em lugar nenhum, qual é o segredo para tirar ele do seu pé?” a menina perguntou se aproximando dela, um sorriso divertido enfeitando os lábios.

“Ele e o Cadu foram conversar. Já devem estar voltando” se limitou a falar, não sabendo inteiramente como se comportar na frente daquela garota.

“Uhm”

E o assunto morreu. Marina não fez questão de se apresentar para Clara, e nem de perguntar qual era o seu nome. Tudo bem, o irmão provavelmente já deveria ter conversado sobre ela com a garota, mas não seria educado falar alguma coisa? Nunca imaginou que iria ficar mais nervosa na frente de uma garota de quinze anos de idade, cinco anos mais nova que ela, do que na frente de um dos homens mais ricos do país. Mas ali, com Marina lhe observando, ela se sentir muito menor do que realmente era.

Não era como se a outra garota lhe olhasse com desdém. Ou qualquer outra coisa ruim. Esse era o problema. Marina lhe observava quase como se estivesse estudando todos os seus detalhes, todas as suas particularidades. Era quase como se ela fosse uma das suas paisagens, seus olhos atentos procurando a melhor forma de deixar sua beleza transparecer em suas fotos. Mas para a sua sorte, ela não sacou uma máquina. Clara teria afundado naquele chão se tivesse acontecido.

O charme dos Meirelles eram algo de família, tinha notado depois de ser apresentada aos outros dois. Junto de Cadu e Ricardo, Clara tinha certeza que eles podiam conquistar qualquer pessoa apenas com um olhar e um sorriso, sem que palavras fossem necessárias. E as sensações que ela estava tendo ao ser observada por Marina só confirmava esse fato.

“Eu acho que pela primeira vez devo dar parabéns ao meu irmão” a voz quebrou os seus pensamentos, e talvez tenha sido para o melhor.

“Como assim?” perguntou sem realmente entender onde a outra garota queria chegar, ficando ainda mais confusa conforme Marina dava passos na sua direção, se colocando na sua frente.

“Mulheres como você não são fáceis de achar, Clara. Eu só não entendo o que você está fazendo com ele.” deu de ombros, se afastando no momento em que os outros homens entraram na sala, o humor de Cadu parecendo ter melhorado um pouco. Deu um abraço de lado na namorada e olhando estranho para as duas.

“A Marina não disse nada de errado não, né? Falei pra ela se comportar.” perguntou no ouvido dela enquanto via a irmã dizer alguma coisa para o pai que balançou a cabeça e foi na direção da sala de jantar.

“Não. A sua irmã, ela é...” buscou palavras em sua mente que pudessem descrever aquele furacão que era Marina Meirelles, com aqueles quinze anos que enganavam qualquer pessoa. Como se adivinhasse que estavam falando nela, olhou para Clara e lhe deu um sorriso de quem estava planejando alguma coisa. Boa ou ruim, provavelmente descobriria em breve. “Adorável. Ela é adorável.” finalizou sem jeito.

“Você não vai achar isso por muito tempo” disse divertido, pegando na mão da namorada e seguindo a irmã que também estava indo para a sala.

“Hm.”

E realmente não iria.

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Música que serviu de inspiração: “Did I move too close? Will the wind blow her away?" Killing Me - The Kooks

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Notas finais do capítulo

Bom? Ruim? Muito ruim? Me digam se vocês se sentiram confusos com alguma coisa, juro que mais pra frente vai ficar interessante, no momento eu só preciso introduzir vocês ao universo Clarina dessa fic. Enfim, comentem para eu saber o que estão pensando de tudo.