Everything Is Wrong escrita por Miranda Thompson
Uma certa vez eu e Melissa pedimos aos nossos pais para brincarmos com algumas garotas depois da escola e eles negaram. Mas nós fomos fomos mesmo assim e ao chegarmos em casa quase de noite dissemos que ficamos de detenção por não termos feito a lição de casa. Eles não acreditaram e ligaram para a escola. Ao serem informados de que nossa versão era mentira, ficamos de castigo pelo resto da semana. Lembro-me que a sensação de ser pega naquele momento fora terrível. E nem eu, nem Melissa éramos boas mentirosas.
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A sensação que senti naquele momento, quando Melissa passou pela porta do quarto de Tobias e nos viu fazendo o que estávamos fazendo, era mil vezes pior. Ela estava ali, parada, nos encarando sem dizer uma palavra, quando percebo que Tobias não a viu.
Cutuco seu peito com os dedos, o empurrando para frente.
– O que foi? - Ele pergunta e ao ver o olhar de espanto em meu rosto se vira, avistando Melissa.
– Ah... - Ele diz com desânimo.
– "Ah"? - Ela repete com ar de deboche. - Você me liga e pede para eu vir aqui ajudar nossa amiga que se encontra de ressaca e quando chego e vejo vocês aí ... E tudo o que você tem a me dizer é... "ah"? - Ela faz aspas com os dedos.
Eu e Tobias ficamos imóveis apenas a observando. O que ela quer dizer com tudo isso? Será que está furiosa conosco? Bom, se fosse eu, ficaria.
Melissa cai na gargalhada e Tobias me encara, confuso.
– É disso que eu estou falando! Eu sabia que vocês iriam se entender. Só não sabia que seria assim... - Diz ela apontando para nós. Nesse momento percebo que eu e Tobias ainda estamos em sua cama, envoltos em um emaranhado de lençóis e me ajeito. Tobias faz o mesmo, se levantando.
– Tudo bem, isso é estranho... - Diz Melissa. - Vocês transaram? - Ela diz essa última palavra com um pouco de sarcasmo na voz.
– O que? Não! Claro que não. - Respondo no ato.
Tobias começa a rir e logo Melissa também. De princípio não entendo a graça, olho para ele com raiva, mas ele apenas balança os ombros. Logo, caio na gargalhada também.
Quando estávamos apenas Tobias e eu, não havia pensado em como essa situação poderia ser constrangedora com Melissa, mas talvez não seja assim. Melissa sempre teve o dom de transformar uma situação aparentemente impossível em algo ao menos suportável e agora, juntos, não vejo porque seria diferente agora.
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– Eu preciso te falar uma coisa. - Diz Melissa mordendo a almofada do polegar. Não gosto nada quando ela faz isso.
Depois de ensinarmos Tobias a segurar uma panela e prepararmos algo para comer, Melissa estava me levando para casa. Segundo ela, eu não estava em condições de dirigir ainda. Eu concordo com ela, mas isso não tem nada a ver com o álcool do dia anterior, e sim com tudo o que aconteceu hoje.
Por mim, eu poderia passar outra noite na casa de Tobias, eu realmente não iria me importar nem um pouco, mas papai já havia ligado e pediu para que eu fosse para casa. Não sei bem o porque, ele geralmente não se importa quando passo meu tempo com Melissa e Tobias.
– O que foi? - Pergunto.
– Eu deveria ter te contado antes, mas...
– Melissa! - Digo a repreendendo.
Uma das coisas que sempre fizemos e prometemos nunca deixar de fazer, é contar tudo uma para a outra, não importa o que. Foi isso o que levou Melissa a me falar sobre Nicolas. Eu só fui burra o bastante para não acreditar nela.
– Tudo bem. Por favor Savannah, sei que deveria ter dito antes, mas eu não sabia como, e também teve essa coisa toda com Tobias e Nicolas e... Eu só...
Eu a encaro. Céus!
– Tem um garoto... Justin! Um dos... Amigos de Tobias. Eles andam juntos.
Um garoto... É claro.
– Vocês...?
Ela assente.
Melissa é alguns dias mais nova que eu e sempre a tive como uma irmã caçula. Quando éramos pequenas e ela se machucava, eu tomava toda a responsabilidade para mim, sabia que tinha de protegê-la e eu estava certa. Melissa precisava daquilo mais do que imaginava. E eu a ajudava mais do que imaginava. E agora ela estava ali, me falando sobre um cara. Embora ela fale sobre caras constantemente, ela nunca se envolveu com um de verdade. E agora ela está aqui, ao meu lado, me dizendo que está namorando com ele!
Vasculho minha mente e tenho a vaga lembrança de Justin pelos corredores da escola, vez ou outra conversando com Tobias.
Ele é bonito. Um típico garoto loiro, de olhos azuis e músculos de academia.
– Quero conhecê-lo. - Digo.
– Quer o que?
– Conhecê-lo. E papai e tio Daniel também vão.
– Nem pensar... - Ela começa a dizer mas eu a interrompo.
– Está discutindo comigo? Você realmente acha que eu vou sossegar antes de conhecer esse cara? Então está enganada. - Digo e começo a rir.
Ela ri e concorda com a cabeça. Ela abre a boca para dizer algo, mas é interrompida pelo toque constante de seu celular tocando Wake Me Up When September Ends. Ela se abaixa para pegar o celular e tira os olhos da estrada por um momento e eu vejo. Eu vejo a luz branca e insistente caminhando. Vindo exatamente em nossa direção. Eu vejo ela se aproximar bem à nossa frente.
– É papai. - Ela diz olhando para o visor do celular.
Percebo que preciso falar alguma coisa. Abro a boca, mas minha voz não sai. Junto todas as forças que consigo:
– Melissa, - Tento dizer, mas minha voz sai rouca. Quase um sussurro. - Melissa! - Repito, dessa vez mais alto e ela olha para mim.
– O caminhão. - Digo e ela vê, mas já é tarde demais. Ela tenta desviar, mas o caminhão já está perto demais. A luz já está perto demais.
◄►
Quando tínhamos sete anos, nossos pais resolveram nos ensinar a andar de bicicleta. Eu tive facilidade, mas Melissa demorou mais tempo que eu. E levou mais tombos que eu.
Eu tomava conta dela, segurava o banco enquanto ela pedalava.
– Não me solte Savannah, por favor. - Dizia ela.
– Não vou soltar. - Eu a tranquilizava.
Num dia eu achei que ela já estava pronta e a soltei enquanto ela pedalava. Ela continuou indo muito bem, mas quando percebeu que eu não estava mais ao seu lado, perdeu o equilíbrio e caiu.
Eu me senti culpada por dias.
◄►
Numa fração de segundos sinto o impacto do caminhão no carro. O rádio dispara, e começa a tocar My Immortal do Evanescence.
I'm so tired of being here. Suppressed by all of my childish fears ♫♪
É isso, está feito.
And if you have to leave I wish that you would just leave, because your presence still lingers here and it won't leave me alone ♫♪
Por um momento, não sinto nada, mas logo em seguida a dor me atinge. Uma dor lancinante em meu braço direito e não consigo movê-lo.
These wounds won't seem to heal. This pain is just too real ♫♪
Tento o esquerdo. Levanto a mão e a levo até minha cabeça. Está sangrando.
There's just too much that time cannot erase ♫♪
Reflito por um tempo: além de meu braço direito provavelmente estar quebrado e da dor de cabeça constante por causa do corte, estou bem. Mas me sinto tonta. Procuro por Melissa.
When you cried i'd wipe away all of your tears ♫♪
Sua cabeça sangra. Mais que a minha, com certeza.
When you'd scream i'd fight away all of your fears ♫♪
Sua cabeça está em um ângulo estranho, mas apesar disso seus olhos lutam para ficarem abetos.
And i've held your hand through all of these years ♫♪
Tento dizer seu nome, mas não consigo.
But you still have all of me ♫♪
Não tenho forças.
You used to captivate me by your resonating light. But now i'm bound by the life you left behind ♫♪
Ao invés disso, a ouço dizer o meu:
– Savannah...
Your face it haunts my once pleasant dreams. Your voice it chased away all the sanity in me ♫♪
Sua voz soa fraca e quase num sussurro.
These wounds won't seem to heal ♫♪
Sua boca mal se abre.
This pain is just too real ♫♪
Mas ela disse.
There's just too much that time cannot erase ♫♪
Ouço o som das ambulâncias de resgate ao longe.
I've tried so hard to tell myself that you're gone. But though you're still with me I've been alone all along ♫♪
Depois disso, minha visão escurece e não me lembro de mais nada.
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