As Páginas Acinzentadas de A.G escrita por marina bogoeva


Capítulo 11
"You are my sunshine, my only sunshine..."




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/527778/chapter/11

"Algum mês

Depois de conversar com a Dr. Lane Mi novamente, pude saber que o enterro será depois de amanhã. Tentei arrecadar dinheiro para comprar uns presentes para os pais dela, porém, nada deu certo. Elisa me deu este novo caderno de desenho mas parece que eu não me ligo à ele. É estranho, bem estranho. É como se ele não me entendesse. Simplesmente não é a mesma coisa. Meus rabiscos que antes se transformavam em ondas enormes, hoje não passam de gotas. Minhas flores que pareciam exalar mesmo um perfume, hoje já não possuem traços fortes. Meu amor desenhado com prioridade, hoje já não existe. Com alguns desenhos mal feitos pude conseguir algumas moedas, o bastante para comprar um buquê simples. Preciso fazer um desenho para que ela o leve consigo para além túmulo.”

Chegou o dia. Dra Elisa soube do enterro e logo correu atrás de Alex. Comprou-lhe um terno, colocou mais flores em seu buquê e o levou até o cemitério. Esperou no carro a despedida do rapaz.

Alex se aproximou da cova, o caixão estava ao lado desta. Apenas um menino estava diante do caixão, com as mãos juntas, a cabeça levantada e os olhos fechados. Sem querer interromper sua prece, Alex foi sorrateiro até a nova cama de Constanza e a observou novamente, pelo vidro que exibia seu “rosto de porcelana”. O outro garoto, percebendo a presença de mais alguém, assustou-se e abriu os olhos.

–Puxa, você me assustou- Riu ele.

–Perdão –Respondeu Alex.

–Quem é você?

–Sou... –Neste momento não soube que palavra usar, o que dizer. Então entoou preciso- Sou alguém que a amou muito. E você?

–Sou alguém que a amou muito.

–Co-como?- Gaguejou Alex- Você quis dizer namorado dela?

–Não, claro que não. Eu era... Perdão, eu sou o melhor amigo dela.

–Oh –aliviou-se.

Você quis dizer namorado dela? –Sorriu malicioso.

–Não. Quer dizer, sim. Bem, ela não me conhecia.

–Hm...

–Onde estão os familiares dela? –Perguntou desconfortável, sob o olhar examinador do outro.

–Eles não estão em condições de vir. É que eles são um pé no saco. Não tive oportunidade de conhecê-los pessoalmente, e para falar a verdade nem quero.

–Como assim?

–Ah, provavelmente a mãe dela surtou novamente e o pai deve estar com a amante latina de sexta feira.

Ouvindo aquilo, Alex não acreditou em tanta sujeira. Mas se recompôs. Sentiu naquele garoto uma confiança que nunca havia sentido em alguém. Logo chegou o coveiro que colocou o caixão dentro daquele buraco imenso. O desenhista, então, jogou sobre a proteção de madeira da garota diversos desenhos dela em várias situações tranquilas, na paz que ela parecia nunca ter tido. A terra começou a ser jogada, onde sobre a mesma havia apenas um buquê de rosas brancas e vermelhas, lírios e margaridas. O melhor amigo dela colocou apenas um girassol sobre seu túmulo, talvez, a fim de fazê-la nunca perder o caminho do Sol mesmo entre as nuvens mais sombrias.

Todos se despediram e o Adeus tomou conta do lugar. Paolo, o tal melhor amigo, disse que partiria aquela noite de volta para Itália onde tentaria a vida como ator. Deixou com Alex nada além de um nome, “Paolo Dittarggio Disonza”. Disse que quando quisesse conversar sobre tudo, bastava procurá-lo na internet. Assim que saiu do cemitério, uma forte tempestade tomou conta do lugar, no qual alguns repórteres diziam ser a chuva mais forte dos últimos cento e cinquenta anos, causando tufões em várias partes do país.

Alex, então, querendo fugir do tal tufão, correu como louco para dentro do carro de Elisa e pediu para que ela o deixasse no começo de tudo: no café.

–Mas Alex, está chovendo muito, aquele lugarzinho deve ter desabado até!

–Não importa! –Gritou- Preciso ir até lá, doutora. Será a última coisa que fará por mim.

Elisa concordou, contanto que ele ligasse para ela quando precisasse. Grato ele prometeu ligar e mandar e-mails sempre. E depois de muita procura, acharam-se e despediram-se em frente ao pequeno e agora vazio café. Ali foi o seu começo do fim. Bem ali.

O garoto completamente ensopado e determinado põe sobre a maçaneta do lugar seus finos e brancos dedos que ameaçam girar, porém nada fazem. Apenas fica ali, parado, com a mão na porta prestes a entrar. Assim que vira a maçaneta um centímetro para a esquerda, um vento descomunal faz sua blusa voar. Bravo com a situação parecia querer brigar com a chuva. Bufava e fazia cara feia, como se tivesse certeza de que a tempestade não o queria dentro do café. Foi para o meio da avenida, incrivelmente vazia e se pôs a gritar contra o vento.

Descarregou todo o seu sofrimento em socos, tapas e chutes contra as gotas velozes que pareciam rasgar toda a sua pele. Mais uma vez seus joelhos o sustentaram sobre o chão, e ele gritou. Mas antes que pudesse pegar o fôlego para seu “rugido”, gelo caiu em seu rosto. Parou. Olhou em volta e diversas pedras minúsculas se chocavam contra o asfalto, produzindo barulhos titilantes, como música em xilofone. Assustado, voltou sua atenção para uma pedrinha. Uma pedrinha meiga que caiu gentilmente sobre seus lábios e se tornou liquida, espalhando-se sobre a boca dele. Fechou os olhos e imaginou que aquele era o beijo dela. Foi então que percebeu o que tinha de ter percebido há muitos meses atrás...

–Oh, Constanza. Então você esteve ai todo esse tempo, nos céus, acima de mim? Que tolo fui a acreditar que você não estava comigo. Esteve comigo todo esse tempo! Ahh me sinto tão feliz em poder realizar meu sonho de beijá-la... Obrigado. Mesmo. Sei que fez algo horrível, mas agora você está ai nas nuvens e isso é só o que me importa. Eu te amo, Constanza. Eu te amo.

Passando os dedos sobre os próprios lábios e lançando um beijo para cima, ele caiu sorridente, lembrando-se de todos os momentos que passou na chuva, no vento e no frio e mal sabia que era tudo obra de quem também o amava. Porém sabemos que nem toda história possui um final feliz. Ele conseguiria viver obcecado pelos céus? Aquilo era uma forma temporária de Constanza. Era época de ela conseguir se elevar e se libertar, para que possam ficar juntos em outro plano. A chuva foi a forma mais sensata de dizer adeus, a forma mais melancolia de dizer “eu também te amo”.

As pessoas não devem viver assim, presas a sentimentos de anos atrás guardados a sete chaves, dentro de uma caixinha no fundo do peito. Por não saber o que nos espera quando o coração para devemos aproveitar ao máximo enquanto ele pulsa e nos mantém vivos. Por isso temos escolhas, e essas escolhas indicaram nosso futuro. Não que ele não possa mudar, mas ele já estará pré-determinado ao concordar com esquerda ou com direita, com cima e baixo. Temos a escolha de sofrer ou fazer dar certo; de lutar ou se calar; de aprender ou cegar-se. E estas escolhas, ora ou outra irão afetar quem mais amamos. E essa hora chegou, não é, Constanza?

Um impulso fez com que Alex levasse a mão aos bolsos da calça, que não guardavam nada, exceto um pequeno guardanapo com a seguinte mensagem...

"Agora estou bem, meu amor.
Você está bem? :)
Vou te esperar e te amar para sempre."

Com as pernas e mãos trêmulas, seus olhos encheram-se de lágrimas ao ler aquelas palavras. Não, não importava de onde tinha saído. Era mais do que especial. E a chuva que permanecia constante cessou com o grito que ele deu, erguendo o guardanapo que se molhava e dissolvia-se com as gotas.

–EU TE AMO, CONSTANZAAAAAA! –E então, como se seus ombros fossem ao chão, suspirou aliviado –Onde quer que você esteja...

Mas, como era de se esperar, os sacrifícios e as boas ações tomam conta do ser. Deste ser que agora reina nos céus. Por seu coração partido inúmeras vezes, não aguentaria vê-lo partido mais uma vez quando todo aquele sonho se mesclasse com a dor e o sofrimento de não poder voltar para ele. Então, em um ímpeto de misericórdia, Constanza deu a Alex uma segunda chance para poder viver sem arrependimentos. O Sol, que não batia contra a pele e os olhos do rapaz há muito tempo, apareceram de uma forma súbita, clara e escaldante, iluminando todo o granizo abundante no chão, criando quase que milhares e milhares de relâmpagos, de tanta luz que era refletida. Isto, por fim, cegou por dez segundos o pobre desenhista apaixonado, fazendo-o perder a memória.

A garota, nos céus, conteve o choro. E ele, na terra, não conteve as perguntas.

–O que eu estou fazendo aqui ensopado? Oh, que dor nos olhos e na cabeça é essa? Haa, outra ressaca, não? Bem, acho que vou voltar pra casa agora.
É, voltarei para casa.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "As Páginas Acinzentadas de A.G" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.