Púrpura escrita por Sah


Capítulo 9
Capítulo 9 - A Cobaia




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Paro de falar e observo todas essas pessoas. Eu nunca poderia imaginar que eu iria conversar com tantas pessoas de verdade.

— Para que cor o mar mudou? – Volto a perguntar.

O mar sempre foi a minha referência de liberdade. Histórias sobre piratas e ilhas paradisíacas inundam meus sonhos.

Elliot hesita um pouco.

— Ele está ficando negro.

— Como o lago?

— Sim como o lago.

O velho me disse que um dia o lago já foi verde. Como uma esmeralda no centro da cidade. Mas alguma coisa aconteceu com ele. Nem o velho soube explicar, ele disse que isso não deveria acontecer.

— Por que isso aconteceu? – Pergunto para Elliot.

— Isso ainda está em debate. Não se sabe ao certo. Mas eu tenho uma teoria de que a matéria orgânica contaminada faz isso com a água.

Muitas palavras. Normalmente eu sei o significado de muitas, mas as coisas que ele fala ainda são um pouco misteriosas para mim.

Sinto sede. Eu havia esquecido de beber água hoje.

— Vocês por acaso teriam um pouco de água? – Pergunto

Eles olham aflitos para mim.

— Lamento. Mas até chegarmos ao quartel você não poderá tirar essa roupa. E como consequência não há como te fornecer água.

Olhei para baixo.

— Você consegue aguentar até chegarmos lá?

— Consigo.

Não dava para saber quanto tempo havia passado. Eu não tinha o sol para me informar isso. Mas várias pessoas olhavam sempre para uma tela numérica.

— Já iremos pousar. E aquele é nosso temporizador – Falou Elliot como se estivesse lendo minha mente.

Comecei a respirar profundamente. Eu estava nervosa. Finalmente eu veria o mundo.

Atingimos o chão e eu pude sentir o baque.

Me levantei com dificuldade, o traje ficou pesado conforme o tempo passou.

Quando a porta foi aberta uma luz que eu nunca havia visto iluminou o interior do avião. Pessoas com trajes parecidos como o meu entraram no avião rapidamente e me cercaram, afastando todas as outras pessoas.

— Você será levada para a descontaminação. Não precisa ter medo. – Elliot disse calmamente.

Mesmo ele me dizendo o que iria acontecer, um medo que eu nunca havia sentido se empossa de mim.

— Eu não quero ir.

— Você precisa ir Hope, não tem como você sair desse avião assim.

— Eu não me importo. Me leve de volta.

O olhar dele muda. Volta a ter aquele aspecto frio e assustador .

— Agora você não tem opção.

Duas pessoas pegam os meus braços com força. Sinto a dor do aperto. Eles são fortes e me arrastam para fora. Ninguém diz nada e nem tenta me ajudar.

A luz de fora é cegante. Olho com dificuldade ao redor. Não da para ver o céu. A luz vem de quadrados de vidro no que eu imagino ser o teto. O lugar é gigante. Há outros aviões e diversos tipos de veículos que eu nunca havia visto em qualquer livro.

Sou quase totalmente arrastada até um carro. Tropeço várias vezes e sinto os meus dedos pulsarem de dor.

Essas pessoas nunca me olham no rosto. Lágrimas salgadas fazem o meu rosto arder.

O trajeto no veículo dura muito pouco. Sou arrastada para fora novamente. A luz ainda dificulta a minha visão. Sou jogada com força em algum lugar, atinjo as paredes e despenco no chão. O traje não consegue me proteger. Sinto o cheiro metálico e sinto o sangue quente escorrendo nos meu joelhos.

O que está acontecendo? Por que eles estão em ferindo assim? Aonde estão aquelas pessoas gentis do avião?

Caída no chão me levando devagar. Eu não quero mais ficar com essa roupa. Acho um fecho mas ele está travado. Forço e ele não se move. Fico frustrada. E tento de novo com muita raiva. O fecho quebra e finalmente eu consigo me livrar do traje. Um dos meus joelhos está com uma mancha escura. Meus braços estão doloridos e onde eles apertaram manchas roxas brotaram nos últimos minutos. A dor e a única coisa que me impede se desabar em lágrimas. Ele sabia, ele disse que as pessoas de fora não se importam, elas são egoístas e não ligam para o bem estar ou vida dos outros. Eu deveria ter escutado o velho.

Eu estou em um lugar essencialmente branco. Há uma estrutura metálica no meio. Parece uma cama, mas não há qualquer tecido ou colchão nela. O chão é liso e frio. Três das paredes parecem com o chão, mas uma delas está negra. Me aproximo e vejo que é um vidro. Bato algumas vezes para confirmar.

Apesar de ser mais quente que o traje eu sinto uma sensação que eu nunca havia sentido. Eu começo a tremer involuntariamente.

Me sento em alguns dos cantos e espero. Seja o que tiver que acontecer será inevitável. Por isso eu preciso reunir todas as minhas forças para tentar sair daqui. Preciso voltar ao meu lugar de origem, o lugar da onde eu jamais deveria ter saído. Nada irá apagar o que eu estou passando.

Adormeço naquele lugar horrível. Sou acordada por mãos envolvidas em um material negro. Ela usa uma roupa amarela que parece um pouco frágil. Como uma folha de papel amassada. Suas mãos são coberta por uma espécie de luva preta e seu rosto fica protegido por uma cúpula de vidro.

Essa pessoa não diz nada. Apenas me olha por algum tempo. Ela está com uma maleta amarela. De lá ela tira algumas ferramentas de metal. Ela pega uma tesoura e corta a perna da calça que eu estou usando. Vejo um recipiente de vidro na sua outra mão. Ela joga o liquido no meu joelho machucado.

O sinto pegando fogo. Como uma queimadura recém feita. Tento gritar de dor, mas não consigo.

Por algum motivo eu não consigo me mover. Eu só posso olha-la. Fazendo o que quiser comigo. Ela corta toda a minha roupa e me deixa totalmente nua. Sinto um desconforto. Um calor irradia pela a minha pele.

De repente a parede negra fica clara. Consigo ver diversas pessoas através dela. Inclusive Elliot e Ruffalo. Posso sentir seus olhares. A pessoa de amarelo desaparece não consigo ver para onde ela foi.

Pouco a pouco consigo me mexer novamente. Faço de tudo para ficar encolhida e longe daqueles olhares cortantes. Olho novamente para eles. Rufallo não está mais lá, Elliot permanece, ele está conversando com uma mulher. Ela usa roupas brancas, seu cabelo é castanho e curto. Seus olhos apesar de serem de um verde bonito, mostram toda a sua frieza quando ela me encara.

Não consigo ouvi-los. Me sinto como um animal em um zoológico. Me sinto como uma aberração. Me sinto como uma nada. Começo a me arranhar, talvez a dor mande essa sensação embora.

— Hope? – Uma voz sai de todos os lados.

— Você pode me ouvir? – Uma voz aguda e feminina.

Tento ignora-la. Me encolho cada vez mais. Vejo que onde eu havia me arranhado uma pequena corrente de sangue negro começa a brotar.

— Não se martirize. Isso vai acabar logo.

Eu não acredito nas palavras dela.

Ouço passos fortes. Três pessoas entram na sala. Elas estão protegidas pelo mesmo traje amarelo. Elas estão com uma espécie de mangueira nas mãos. Mesmo comigo encolhida em um canto ela ligam a água. Forte e mais fria do que qualquer outra coisa. Sou forçada a levantar para tenta me proteger. Os jatos machucam e me força a ficar encurralada. Olho para o vidro com dificuldade. Elliot e a mulher ainda estão olhando para mim.

Isso é que ser humilhada? Eu nunca tive ideia de como era essa sensação. Eu tinha lido a sua definição do dicionário só não me imaginava estar sofrendo isso algum dia.

A água atinge o meu rosto. Tenho que fechar os olhos e prender a respiração. Conto os segundo e finalmente eles param.

Eles saem por uma porta que se abriu em uma das laterais. Não há maçaneta e nem nada que prove que havia uma porta ali.

A água do chão é sugada por um buraco no chão que eu só havia percebido agora.

Me encolho novamente.

— Vista as roupas que estão na cama. – Uma voz conhecida. Elliot diz de uma forma automática.

Me levando e vejo.

Na cama há uma sacola com roupas brancas. Uma camisa e uma calça há também uma toalha e nada mais.

Ignoro as roupas. Pego a toalha e me enrolo. Jogo as roupas em direção ao vidro como uma forma de protesto.

— Não dificulte as coisas Hope. Tudo isso é necessário. Você entenderá.

Não sei se era por causa do aviso dele. Mas depois de algum tempo eu pego as roupas novamente. Um pouco da vergonha vai embora e me visto. As roupas são feitas de um tecido grosseiro, mas elas são macias.

Com um pouco mais de dignidade eu finalmente o encaro. A mulher sorri parece que alguma coisa divertida está ocorrendo.

— Finalmente conseguimos baixar a sua radioatividade. E estou ansiosa para começar com os testes.

— Não seja tão direta Miranda. Temos que explicar para ela. Não será fácil passar pelo o que vai acontecer.

— Às vezes eu esqueço que você não é uma máquina, Elliot. – A mulher diz para ele.

Ele a ignora.

— Hope, você será a nossa esperança em acabar com essa guerra. Você no salvará, mas talvez isso custe a sua vida. – Ele diz de uma maneira melancólica.


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