Diário de uma Judia escrita por Contadora de Histórias


Capítulo 1
Pagina 1 - Desabafo


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo é um prólogo e apresenta elementos importantes da história. É só um pouco do que virá em breve.Boa leitura.



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Dezember

Começar a escrever algo é mais difícil do que pensei. Nunca mais havia pegado em uma caneta ou papel. Me lembra até da escola e de o quão legal era minha vida. Sinto até certa estranheza. Parece outra vida, um passado distante, que com certeza não voltará. Uma certa angústia até se instala em meu peito quando penso no passado, mas não pretendo desistir, senão enlouquecerei. E, no momento, minha sanidade é tudo que me resta.

Este diário está sendo escrito por uma garota sob uma cabana caindo aos pedaços, em cima de uma mesa de madeira maltratada pelos cupins, no final do ano de 1939, na Alemanha Nazista. Só para o caso de alguém encontra-lo algum dia, em alguma outra era melhor que essa e achar interessante lê-lo.

Meu nome é Rachel, muito prazer. Há até seis meses, eu era uma garota alemã de 18 anos que morava com os pais e vivia relativamente feliz na cidadezinha de Kahl. Kahl não tem lá muitas particularidades, sei que há um grande lago ao norte, ao sul fazendas grandiosas, ao leste o lanterna (local onde se vende e se compra de tudo) e onde se tem o maior conglomerado de casas, ao oeste há mais algumas casas. E no inverno tudo é coberto por um imenso manto branco de neve. Não sei ao certo o mapa da cidade, descobri essas coordenadas recentemente enquanto lutava para sobreviver.

Bom, vamos aos fatos: A Alemanha perdeu a Grande Guerra. Não sei o motivo dessa guerra, porém, muitos pela cidade falam dela e de como nosso país foi humilhado. É como se todos exalassem pelos pulmões a palavra vingança. A força dessa expressão foi tão grande que os deixou cegos dentro de um jogo desleal entre o superior e o inferior. É fácil, o superior sempre vence enquanto o inferior é eliminado. Literalmente.

Regras do jogo: Pele escura não é permitida, assim como ser judeu ou ser homossexual. Somos os inferiores. Sim, estou no lado que vai perder.Que sorte a minha, não?

E são por esses motivos que tenho de lutar pela minha sobrevivência. Estou em desvantagem nesse jogo, então, tenho que arrumar artifícios para não ser eliminada tão cedo.

Alguns anos atrás, um certo rabino chamado Cohen me explicou a importância dos verbos, “Deus nos abençoa com o dom de amar. Mas, o que seria o verbo amar se não houvesse o odiar? E o que seria a vida se, logo após ela, não existisse a morte?”. Na época, não entendi muito bem, não sabia nem o que era verbo e nem porque ele estava me falando aquilo. Para falar a verdade, meu forte nunca fora alemão, sempre preferi os números e suas aplicações. E eu só estava tendo aquela conversa com ele porque havia socado a cara de uma colega de turma. Por que eu fiz isso? Bem, ela me xingou e eu simplesmente revidei com um soco.

– O que você fez? - as pessoas ao redor perguntavam, chocadas - Sua maluca!

Eu adorei a sensação. O verbo odiar é extremamente, como posso dizer, tentador...

Quando ouvi seus xingamentos e maus agouros, ele veio ensurdecedor e alucinante alastrando-se pelo meu cérebro e sendo espalhado violentamente pelo meu corpo até se concentrar no meu punho direito impulsionando o soco que fora tão forte a ponto de derrubar a menina ao encontro do piso liso e gelado daquela escola. Depois, tudo ocorreu em câmera lenta, pois, com a mesma rapidez que se alastrou,elese esvaiu de mim levando toda a minha força consigo. Petrifiquei quando percebi o que tinha feito. Eis o problema do odiar, ele é bom somente até o momento em que você consegue extravasá-lo. E se você não souber como extravasar, acaba fazendo idiotices como a minha. Por isso lá vai um conselho: Não tente extravasar o verbo odiar, espere ele sair por si só, senão você fará idiotices como a minha.

Depois que o efeito alucinógeno do ódio passou, a sensação fora terrível. E as consequências também. Fui expulsa da escola e levei uma surra dos meus pais. Obrigaram-me a pedir desculpas à garota e não fui mais autorizada, pelos meus pais, a voltar a estudar em escola alguma. Eles eram muito conservadores e não me queriam estudando, de qualquer maneira acabei facilitando as coisas sendo expulsa. Não tornei a ver a garota. Não tornei a ver ninguém que não fosse minha mãe, pai e as pessoas que frequentavam a sinagoga. Passei três anos da minha adolescência trancafiada dentro de casa.

Hoje, acabei aprendendo que o verbo odiar sufoca os bons sentimentos que carregamos conosco como o amor e abre caminho para muitos outros piores como: o matar. Só que o rabino Cohan não teve o trabalho de me explicar como este funciona, pois outra pessoa o fez.

Imagine um baixinho com o cabelo partido de lado, o bigode minuciosamente quadrado, a pele branca, o terno, o olhar tirano, de raça ariana e o pior de tudo: um dominador de verbos. Esse dominador insolente dita as regras do jogo em que fui obrigada a participar por culpa dos verbos ser e estar, se é que me entende. Na vida, às vezes você só é o que não devia ser no lugar errado e na hora errada.

Que desprazer tenho eu de conhecer um grande dominador que me odeia e me quer morta. E quer saber a verdade? Eu também o quero morto.


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Notas finais do capítulo

Aprecio comentários. Até a próxima.



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