Dentro do Espelho escrita por Banshee


Capítulo 34
Nascida Para Morrer


Notas iniciais do capítulo

Antepenúltimo Capitulo ;-;



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/526031/chapter/34

– O que você...? – Tento dizer, mas as palavras não saem – Eu pensei que... Jamais te conheceria ou, sei lá, eu não sei.
A pequena Glass sorria. Não era um sorriso tímido de uma criança de oito anos que parecia ser, não era algo travesso ou ruim. Era como conhecer uma tempestade perfeita e um de seus relâmpagos cruzasse o céu num semicírculo. Seria algo bonito de ver, porém estranho.
– Eu tentava me comunicar a muito tempo, mas é bem complicado quando se está fugindo pela vida. – Ela diz, agora sei que sua voz não é aquele ruído macabro de uma legião de demônios, mas algo belo e doce – Os corvos eram enviados meus, espécies de mensageiros, como anticorpos. Eu tentei avisar.
– Mas por quê? – Pergunto – Por que só agora? Por que não antes? O que te impedia de verdade?
– Agora tudo está quieto, mas não sei dizer o quê. Havia algo antes que me impedia de me comunicar, mas esse eco, esse algo, se calou. Como Hope e Alaska possuem seus próprios significados para você, eu também possuo, a inocência e a pureza eram a esfera do meu poder dentro da sua psique. Eu deveria estar morta – Ela diz – Esse seu poder, estes seus dons são quem você é, e acima de tudo, são aquilo que você pode se tornar ou deixar de ser. Tanto eu quanto Hope, Alaska ou as outras... Nós somos seu potencial filosófico.
– Vocês são o quê? Outras?
– Nós somos seu potencial, Skye. – Alaska explica – Pense num ovo. Em ato o ovo é o que ele é, uma incubadora para uma vida. Mas nesse mesmo ovo há uma potência, ou potencial, uma parte oculta que está contida nele, um basilisco. Antes mesmo de o ovo ser chocado, já está dentro dele, em potência, uma criatura viva. Mesmo que esse ovo nunca venha a ser eclodido, ainda assim a potência está lá, aguardando as condições ideais para, nesse caso, eclodir.
– Pessoas são ovos, Skye. – Glass completa – Nascemos pequeninos, feios, enrugados, banguelas, analfabetos e pelados. Em ato, um recém-nascido nada pode compreender da linguagem dos outros humanos que o cercam, mas está lá, dentro daquela “carinha de joelho” a potência da fala.
– Somos capazes de mudar tudo ao nosso redor. – Hope diz, o que acaba me surpreendendo – Podemos ser o que quisermos, desde assassinos em potencial até escritores, filósofos, professores... Cada um nasce com um potencial, seja ele bom ou ruim.
Nosso potencial é aquilo que podemos nos tornar, isso não quer dizer que é o que queremos nos tornar.
– Eu não entendo. – Digo – Não faz sentido.
De repente uma mulher sentada há algumas poltronas da gente fica em pé. Seus cabelos são negros e compridos com mechas roxas, mas não consigo ver seu rosto. Ela se vira... Seu rosto, sim, seu rosto é exatamente igual ao meu, mas seus lábios são pretos, seus olhos eram heterocrômicos e cheios de sombra e rímel, ela tinha uma argola no nariz e quilos de pó na face, deixando-a mais pálida do que já era. Uma versão minha, só que gótica, emo, satânica ou seja lá o que fosse.
Fico de pé, porém tropeço, me seguro num dos acentos com minha visão ser tornando turva, era como se visse por dentro de um espelho quebrado.
Senhorita, você precisa sentar.; dizia uma mera voz de fundo.
Eu vi outra pessoa se colocando de pé, seu rosto era o meu também, mas ela não usava maquiagem, não usava brincos, mas sua pele era bonita. Ela tinha um brilho em si, junto com sua coroa de flores e cabelos brancos, suas bochechas estavam sujas de barro e suas roupas floridas de um brechó qualquer. Uma hippie.
Uma Skye vestida de branco surgiu da porta da cabine do piloto, suas roupas típicas de uma prostituta, só que pior do que as de Hope, rasgadas e imundas, vulgares sem nem se dar o trabalho de ser sexy. Seu olhar era felino e o batom da sua boca era borrado, do canto de seus lábios escorria um liquido branco. Não precisei de muito para saber o que era.
Várias, sim, várias delas idênticas a mim surgiam. Usavam todo o tipo de roupa e quando me dei conta, eram todos os passageiros da primeira classe. Todos eles, todas elas, eram eu. Diferentes Skye’s falando ao mesmo tempo coisas que não conseguia entender, mas reconhecia as suas vozes, seus tons, de meus sonhos e dos meus pesadelos.
Tampei meus ouvidos para não ouvir, mas parecia ficar mais alto. Era coisa da minha cabeça, era coisa da minha cabeça e não tem como se abafar pensamentos. Corri pelo corredor da nave até o banheiro, bati e bati na porta. Trancada. Ajoelhei-me ali mesmo, em posição fetal, sentia que as lágrimas escorreriam pela primeira vez nesse pesadelo, mas as impedi de novo. Não poderia agradar minha própria insanidade, então pus minhas mãos nos ouvidos, de cabeça baixa para evitar tudo aquilo, entretanto mesmo de olhos fechados ainda conseguia ver a cena, como se minhas pálpebras tivessem sido furtadas e a escuridão não mais pudesse ser vista.
– São o seu potencial, Skye. – Disse Glass – Você pode ser qualquer uma delas, você pode ser Hope, você pode ser Alaska... Isso é ser uma Cristal! Eles não podem te controlar, te tornar uma escrava ou um entretenimento... É você quem escolhe para onde vai e o que quer se tornar.
As vozes continuavam, dissociavam-me da realidade. Eram grossas, agudas, sopradas, suaves, amargas, distorcidas, hediondas, demoníacas... Eu não queria ser nada daquilo. Sufocava um grito dentro do meu ímpeto para manda-las embora.
Senhorita, está tudo bem com você?; dizia a voz de fundo.
Eu queria estar morta, eu ainda quero estar morta. Não quero continuar fazendo isso, mas estou. É assim que eu me sinto e, se fosse d’outro jeito, então não desejaria uma coisa dessas, ficaria assustada em saber que a morte se aproximava, mas agora... Agora nada faz sentido.
Eu gritei. Dentro do avião de número 3127 eu gritei, com todo fôlego, com toda a força, pois não queria chorar e troquei as lágrimas pela voz.
Queria ser uma garota insana, mas sempre me senti como se tivesse nascido para morrer.

▲ POV Harley Queen ▲

Preciso de ajuda para descobrir quem primeiro estava chegando à linha de chegada, eu estava na corrida, meus pés não poderiam falhar agora, me levariam ilesa até a margem. Eu estava correndo o mais veloz possível, mas eu, eu me sentia como se não pudesse sair do lugar. Alguma coisa dentro do meu peito doía a cada passo, como se fosse quebrar... O que eu estou esperando? Que os portões do Paraíso se abram e um anjo desça e diga que eu consegui cumprir meu papel terreno? Eu nunca soube o que realmente fiz.
Edgar Pholberg já estava à vista, rodeado de vários homens com terno, usava uma grande coroa dourada na cabeça, destacando enormes e penetrantes olhos azuis. Parecia calmo, Teresa estava ao seu lado usando uma coroa feita de espinhos e mais homens a rodeando.
Sentia-me como um dos soldados de Julio Cesar, prestes a jogar os gladiadores para lutar contra as bestas no Coliseu. Por que me sentia mal com isso? E por que agora?
Arrastando Raven num carrinho de mão, meu amado Baphomet me seguia, fitava tudo e todos com seus enormes e penetrantes olhos cobalto. O meu destino já estava traçado, como um desenho nas constelações e eu deveria aceitá-lo, pelo amor de Hades, Ares e Éris... Era essa quem eu deveria ser e me tornar.
Há quatro metros de distancia estavam àqueles homens que, literalmente, me pagariam por entregar Raven e os outros à morte.
Às vezes o amor não é o suficiente quando o caminho se torna triste, há dez passos do meu verdadeiro futuro.

♫ POV Alice Lidell ♫

Não, o trajeto não demorou tanto indo numa velocidade que nenhum controle observador de aviões aceitaria. Eu vi o Sol nascer no leste, bem em frente aos meus olhos e me senti como uma Cinderela fugitiva no século XXI, com algumas poucas reflexões filosóficas... Algumas pessoas acordam com medo de viver seus sonhos, elas se contentam com qualquer coisa. Alguns querem viver em um mundo retocado, como a capa de uma revista, porém eu já acreditei em feitiços e fadas.
Era como viver numa ilusão, dentro do corpo que não era meu e me sentir bem com isso... Usando um vestido dado por uma fada madrinha e sapatos de cristal, tentando de toda forma ser notada pelo príncipe encantado, mas... Aquela não era eu. E quando todos aqueles que amavam Liz a olhavam nos olhos, eu rezava para que ela não fracassasse de novo, então ela batia os saltos e dizia que estava num conto de fadas.
Se eu fosse Cinderela na próxima noite, não conseguiria sair pela porta à meia-noite e deixar tudo que conquistei para trás. O fim da minha noite está chegando, mas não me importo, estou dançando no baile da vida até o amanhecer da semana seguinte, pronta para impacto da queda. Quero ficar acordada à noite toda para ver a luz e me sentir real.
Algumas pessoas se perdem olhando para o céu e esperando por estrelas cadentes para fazerem seus pedidos e os verem se realizar, já outras nunca tiram seus olhos da calçada, nunca dão um passo muito longo, mas eu acredito que os planetas e estrelas se alinham.
Às três da manhã irei correr para o jardim, às quatro da manhã falarei com o porteiro e colocarei Diana Vickers para tocar e às cinco dançarei na esquina, bem na hora de ver o Sol nascer.
Eu não sabia na época se Skye já havia descido ou onde estava, mas aquele era o nosso confronto final, o encerramento do pesadelo com um toc do despertador sendo jogado contra parede. Entretanto, havia alguma coisa dentro de mim que dizia onde todo o espetáculo deveria rolar, satisfaríamos o imperador de Roma, deveríamos correr para o Coliseu das bestas e ver o desenrolar da trama.
Ela iria para Azazel, o mesmo lugar em que os Monarcas provavelmente estariam.

♦ POV Skye Delevingne ♦

Demorou cerca de meia-hora, mas driblamos minha situação. A aeromoça me deu um calmante até o fim da viajem, eu estava apagada.
– Senhorita, você tem algum tipo de problema psicológico ou neurológico? – Ela perguntou, antes que eu caísse num sono profundo.
Sim. Quando tinha alguns meses de vida, minha família biológica foi torturada e morta e cresci com fanáticos religiosos e mentirosos; fui estuprada várias vezes quando criança e vi meu único irmão ser exorcizado brutalmente; com doze anos assassinei meu pai, que a propósito, era meu estuprador; fui torturada física e psicologicamente pela minha mãe fanática até os dezessete anos, quando comecei a ter visões de sombras, corvos falantes e palhaços demônios; apagava e acordava suja de sangue; fui presa num hospital psiquiátrico onde meu psiquiatra na verdade queria me ver morta; assassinei várias pessoas, inclusive uma das minhas melhores amigas, para descobrir que, no fim, eu era fruto da seleção natural e dotada de poderes, incluindo memória fotográfica e força para destruir paredes de concreto, que a propósito, não conseguia usar. Agora mesmo, estou indo atrás dos meus últimos amigos que me restam antes que me mate ou coma uma torta ide amora intera no café da manhã.
– Não. – Respondi por fim, antes de ser devorada pela escuridão.
Agora mesmo estou saindo do avião, com minha mala em mãos. Não sei ao certo o que fazer, estou de volta em Nerfoni, o único do lugar do planeta que sempre quis evitar. Não sei ao certo para onde irei, mas meus pés já se moviam mecanicamente.
Estou indo pra casa, ou melhor, pra residência Delevingne.

...

Em algumas noites eu me sentia enfeitiçada, e aquelas musicas de fundo apenas pioravam isso. Outras noites eu me sentia livre, então fechava meus olhos e contava até três. Eu jurei a mim mesma que na noite do baile de inverno meus pés se movimentariam no ritmo dos holofotes, mas meu romance digno de Carrie sempre foi muito difícil.
Algumas garotas querem brilhar, outras beijar na chuva e outras... Morrer. É uma vida difícil e um caminho nada fácil de traçar, mas as vozes me dizem que é o certo.
Bati na porta, bem forte, bem mais forte e quando ninguém a atendeu, simplesmente a abri... Estava destrancada, Teresa jamais faria isso.
– Mãe? – Chamo, mas ninguém responde – Teresa? Você está aí?
Entrei pelo corredor, os moveis estavam exatamente nos mesmos lugares que me lembro, entretanto, alguma coisa parecia ter mudado, mas o quê?
Virei a casa de cima a baixo, porém não a encontrei. Nada.
Fui à residência de Tony, no outro lado da rua, mas o carro de seus pais não estava na garagem. “Vende-se”; dizia a placa. Meu coração parou por dois segundos.
A palavra ecoava pela minha cabeça. O que estava rolando?
A rua era deserta, eu nem ao menos poderia pedir informação.
– Eles o pegarão. – Disse Glass – Você sabe disso.
Sim, eu sabia. Lá dentro, no ímpeto, eu tinha a sensação, mas negava-me a aceitar. Eles tiraram minha família e meu irmão, tiraram minha humanidade e sanidade, tiraram a vida de Faith que, mesmo não conhecendo, era mais considerada mãe do que Tess. E eles... Tiraram-me Diane. A culpa da morte dela era atribuída a eles, eu sei.
Estava prestes a ter um ataque de pânico.
– Onde eles estão? – Pergunto furiosa – Cadê eles?
– Não temos como saber, Skye. – Disse Alaska – Não somos adivinhas.
– Os Monarcas são místicos, adoram ironias e coisas assim. – Glass disse – Para onde acha que iriam?
Não conseguia pensar. Não fazia sentido o fato de terem levado Anthony, e se realmente levaram, qual o motivo da placa de vende-se?
– Eu não... Eu não sei.
Mas assim que disse, eu sabia. Todo aquele misticismo e ceticismo rondavam apenas um lugar, o mesmo lugar em que fui reprogramada e que tudo começou.
Azazel Circus.
A minha vida inteira eu venho lutando uma guerra, eu não consigo conversar. O meu coração acelera quando mencionam o meu nome, por que eu simplesmente não o reconheço mais. Alaska, Glass, Skye... Hope? Qual delas sou eu? Isso não vai funcionar.
Porque eu sempre pensei que cresci para ser admirada, para ser notada como Hope, mas quando estou afastada... Simplesmente penso que não vai funcionar.
Eu sou como um interruptor de luz que liga e desliga igual a um eclipse lunar, posso te dizer que quando as luzes se acenderem eu vou estar pronta para isso. Isto corre no meu sangue, é como átomos que se colidem diante dos meus olhos, como correr uma maratona ou uma montanha que escalo sem pensar no tamanho.
Eu estava com medo das pessoas que estavam lá fora só para me verem no chão, para me fazer cair e depois rirem de mim, mas eu aprendi a não me calar numa sala quieta com ninguém por perto para não me encontrar...
Mas no fundo, todo aquele misticismo ainda me faz mal. E eu sei onde estão, eu sei para onde foram e sei quem levaram. Tessa, Raven, Tony, talvez até a pobre Gaby... Tudo por mim e por uma maldição que deveria ser benção.
Um trovão soou no céu.
– Você sabe o que fazer... Não sabe? – Perguntou a Skye hippie que vi no avião.
Todas elas estavam me rodeando, não sei de onde vieram, mas estavam ali. Exceto uma: Hope.
– Onde... Cadê a Hope? – Pergunto, mas nenhuma delas me responde, como se nem ao menos soubessem a resposta e permanecem quietas.
O vento da tempestade que se aproximava ficou mais forte, vi casas fechando janelas e portas, enquanto caminhávamos pela estrada menos percorrida. Agora consigo sentir a fênix dentro de mim, enquanto marcho sozinha em uma batida diferente, lentamente engolindo meu medo. Adequando-me para a batalha do meu coração, este teste é a cruz que devo carregar, mas eu chegarei lá... Eu acho.
Nunca é fácil ser escolhida, Glass me disse, nunca é fácil de ser chamada. Agora estou de pé na linha de frente, quando as bombas começarem a cair eu conseguirei ver os céus, porém ainda ouço as chamas chamando meu nome... Os nomes de todas elas.
As nuvens no céu já não eram nuvens, eram corvos se multiplicando, voando velozmente para Azazel.
Eu consigo ver a escrita na parede, não posso ignorar essa guerra. No final de tudo, por quem estou vivendo?

♫ POV Alice Lidell ♫

Caminhei devagar pelos portões de Azazel. Tudo era calmo antes do primeiro trovão avisar sobre a tempestade, a cabeça já não doía, meu corpo não doía, porém meu coração estava mais rápido que nunca. As lonas e os trailers estavam perto de mim agora, mais perto do que lembrava. Pessoas comuns chamariam de trauma, uma sensação que me impedia de fazer alguma coisa, pois esse mesmo ato me prejudicou... Entretanto, onde estava o trauma? Entrei sem dificuldade, ninguém me parou, nenhuma força psicológica me impediu como se aquele lugar não significasse nada. Por que nós mesmos ainda tentamos nos enganar?
Eu não conseguia ver nada realmente importante nos dez primeiros passos, até avistar há alguns metros alguém sentado numa cadeira. Seu vestido negro era comprido e sua boca estava tapada com alguma coisa. Era Raven.
Quando se está numa guerra e alguém aponta uma arma para seu rosto, e você olha pra baixo e enxerga uma faca no chão, já não raciocina. O extinto animal da sobrevivência sempre fala mais alto que a razão, e foi por esse motivo que corri até a Wicca sem nem ao menos pensar duas vezes. Meus pés foram mais rápidos e quando dei conta já estava ajoelhada e desatando os nós que a prendiam na cadeira, ela puxou seus punhos com força para tirar a fita adesiva da boca e gritou em alto e bom som:
– PRO CHÃO!
Ela abraçou meu pescoço com força, perdi a consciência por dois segundos, retornando a mim quando ouvi o som de um disparo, e outro e mais outro.
– Pensa rápido! – Digo, empurrando-a e correndo agachada para dentro de um dos trailers, consigo me esconder, mas uma bala me acerta de raspão.
– Pelo amor de Deus, me diga que você trouxe reforços. – Raven pergunta, surgindo ao meu lado.
– O quê? – Exclamo – Quem eu poderia trazer?
– Tony? Seu motorista? Skye...?
– A Skye não está aqui? – Pergunto quando uma bala quebra uma das janelas – Ela deveria ter chegado, o que houve?
– Não sei, mas Tessa está com eles.
– Onde?
Uma bala faz um estrago na cabine, um dos vasos quebra me fazendo perceber que aquela é a casa de Faith.
– Se tudo der certo, Gabriella estará aqui em breve. – Digo.
– Ela já está aqui. Aquela vagabunda é um deles!
– O QUÊ?
O som das balas do outro lado me fazem gritar, não temos muito tempo. Várias e várias armas estão disparando, eu tenho que pensar rápido.
– Como assim ela é um deles? – Pergunto o mais alto que consigo.
– Ela era uma traidora e seu nome é Harley, ela tem um cachorro com nome de um demônio e me sequestrou, quando acordei estava aqui.
Não fazia sentido. Nada mais fazia sentido.
– Use seus poderes. – Digo, me colocando embaixo da mesa e trazendo comigo agora que o casco do automóvel se enchia de furos.
– Eu os perdi, fizeram algo comigo.
Ah! Prefeito! Perfeito mesmo!
Minha visão fitava todos os cantos, todos os moveis, todos os furos que já possibilitavam ver os dorsos das pessoas do outro lado. Tinha que ter uma saída.
– Sabe, minha filha. É quase impossível dançar com o Diabo no seu pé, então você precisa se livrar dele. – Disse Faith, na ultima vez que nos vimos.
Diabo; pé; não fazia sentido.
– Abaixa! – Raven grita, me empurrando mais baixo ainda quando uma bala acerta um dos pés da mesa. Teria atingido em cheio a minha testa.
Meu corpo estava contraído contra o chão, meu ouvido colado no aço do “piso” do trailer e consegui ouvir o eco, o som de passos debaixo da gente, mas não deveria ter nada lá embaixo... Ou deveria? E se tivesse... Se tivesse, o Diabo estaria sob nossos pés.
– Rápido, me ajuda a procurar um alçapão. – Digo, arrastando-me pelo chão.
– O quê?
– Cala a porra da boca e me ajuda.
Juntas, arrastávamos pelo convés atrás de qualquer abertura, espaço em branco, furo ou coisa do gênero, até que, sob o carpete imundo encontrei alguma coisa.
– Me ajuda aqui. – Peço.
Juntas, conseguimos rolar o tapete até a borda e encontramos uma maçaneta. Puxei-a e a girei, um enorme cano estava abaixo dos nossos pés.
Alguém tentava arrombar a porta da cabine com muita força, o baque surdo dava a entender que estava conseguindo.
– PULA! – Gritamos em uníssono, entrando pelo cano e fechando a abertura atrás de nós.

♣ POV Teresa “Tess” Delevingne ♣

Santíssima Trindade, Pai, Filho, Espírito Santo, adoro-Vos profundamente e ofereço-Vos o Preciosismo Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Jesus Cristo, presente em todos os sacrários da Terra, em reparação dos ultrajes, sacrilégios e indiferenças com que Ele mesmo é ofendido.

E pelos méritos infinitos do Seu Santíssimo Coração e do Coração Imaculado de Maria, peço-Vos a conversão dos pobres pecadores. Amém.

Já não tenho mais esperanças de sair viva, o que me resta é a reza. Vários e vários homens ao meu redor, todos usando mascaras e roupas de uma festa à fantasia. Minhas mãos doem devido às algemas, não posso falar devido à mordaça, não posso me mover devido as correntes nem andar devido à cadeira. Como um pássaro alado preso numa gaiola.
– Skye já não deveria ter chegado? – A palhaça perguntou. Harley era seu nome – Pra inicio de conversa, o que te faz ter tanta certeza de que ela virá? Qual é, a gente ta no subsolo, não tem como ela saber que estamos aqui, muito menos como entrar.
– Paciência arlequina – Disse o homem de olhos azuis que vestia uma coroa – Ela vai aparecer, uma hora ou outra ela vai. Agora sente-se e aprecie a cena.
A cara sentou-se num banquinho ao lado de um dos vários espelhos do local, parecia emburrada como uma criança que não ganha o presente desejado no natal.
Estávamos na sala de espelhos do Circo de Azazel, a maioria se encontrava quebrado e a iluminação do lugar era precária, o que deixava a aura mais macabra ainda.
Estava rezando principalmente para que Skye realizasse seu sonho e fugisse de mim.

♥ POV Raven Enders ♥

A sala era escura, creio que bati minha cabeça na aterrissagem.
– Liz? – Murmuro – Liz? Cadê você?
– Liz não está no momento – Ela diz – Me chame de Alice.
– O quê? – Grito – VOCÊ É UMA DE...
A garota tapa minha boca e me empurra para trás de um espelho.
– Não, eu não sou uma deles. – Ela cochicha ao pé do meu ouvido – Olhe.
Olho fixamente para onde ela aponta e consigo distinguir várias silhuetas, quase não tinha iluminação, mas vi vários homens e um trono gigantesco com alguém sentado.
– COMO ASSIM ELAS FUGIRAM? – Uma voz masculina grita, e por alguma razão ela me parecia familiar – DUAS GAROTAS NÃO PODE DESAPARECER ASSIM! VOCÊS AS TINHAS NAS MÃOS E DEIXARAM ELAS ESCAPAR, SEUS ESTRUPÍCIOS!
– O que será que houve? – Pergunto.
– Não sei. – Ela diz – Mas são eles. Estamos perto, precisamos pegar a Skye e dar o fora daqui.
– Mas como? Nem ao menos sabemos se ela está aqui.
– Tem alguém amarrado na cadeira, só pode ser ela. Estavam nos esperando.
– Esperando pra quê...?
Sinto mãos puxando meu cabeço com força, um cheiro de carne podre invadiu minhas narinas quando me vi cara a cara com um cão enorme de olhos azuis.
– Ora, ora, ora. – Harley debocha – O que temos aqui?
Suas mãos seguram nossas cabeças com força, mais força do que uma garota da nossa idade deveria ter.
– É ela. – Digo a Liz, Alice ou sei lá quem seja – Ela é a Gabriella, ou deveria ser.
– Calada. – Exclama a palhaça – Gabriella era só um pretexto pra me aproximar de vocês e descobrir o que vocês planejavam, eu até fingi gostar da Liz quando na verdade ela era uma vagabunda. Liz... Ou Alice? Qual das tuas está ai, ein?
– Essa não era a hora que você deduraria nossa posição e depois eles no matavam? – Pergunto.
– Gaby, por favor. – Diz Alice – Eu sei que existe bondade ai dentro, não se deixe controlar por eles. Eu consegui vencê-los, você também consegue.
Harley chuta o estomago dela, quase consigo ouvir alguma coisa se quebrar La dentro.
– Se ta pensando o que? Que a gente ta numa fanfic e que o bem vai vencer o mal? Que tu pode simplesmente vir com esse papinho de “bondade dentro de você” e “você pode vencer” que irá ficar tudo bem? – A palhaça diz – Mas não, não vai ficar tudo bem, por que isso não é uma fanfic... Isso aqui é o mundo real, e sabe o que acontece no mundo real? EU MATO OS MOCINHOS! EU MATO!
Aquele grito tribal foi como um chamado, os outros Monarcas se aproximaram empunhando laminas e bestas.
– Olha só, o que temos aqui? – Disse o homem que deveria ser meu professor de historia, aparentemente era um deles também – Raven Enders, a Bruxa e Alice Lidell, a Índigo.
– O nome dela não é Alice, é Marlize. – Disse um homem negro ao lado de Pholberg – Marlize Devonne.
– O que foi agora Moiseh? Vai vir de sentimentalismo? Você já sabia que isso iria rolar mais cedo ou mais tarde. – Disse Harley, soltando altas gargalhadas – Liz está morta e você sabe disso.
– Ora sua putinha de esquina. – Exclamou Moiseh, estendendo o punho – Pra você é Visconde Devonne.
– Eu não vou falar “Visconde Devonne” sem rir, então fico com Moiseh.
– Parem os dois! – Exclama Pholberg – Agora que todos estão aqui, só precisamos da atração principal.
Escuto um gritinho agudo de dor e do meio da multidão duas pessoas são jogadas no chão ao nosso lado. Ele estava ferido, seu rosto escorria sangue e seus óculos não estavam na frente dos grandes olhos verdes. Era Tony, ao seu lado estava Tessa.
Um baque soou, vi um dos espelhos cair em cima de um dos soldados armados, numa batida estridente e ele já estava desacordado sob os cacos de vidro. A luz, que já era precária, apagou-se de vez e ouvi o som das espadas sendo empunhadas.
– Acho que a Skye “Cristal” Delevingne chegou pra nossa baladinha monstro. – Disse Haley.
A escuridão era densa demais, não dava pra ouvir nada além da respiração dos demais e o som dos pingos d’água em contato com poças e depois a risada de uma palhaça cortando o silencio.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Dentro do Espelho" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.