Live until we die escrita por Alexa


Capítulo 2
A Colheita


Notas iniciais do capítulo

Dobradinha u-u



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O dia amanheceu, e meus olhos fechados ardiam por conta da noite mal dormida. A luz do sol brincava em minhas pálpebras, como se fizessem um sinal para que elas finalmente se abrissem. Espreguicei-me e esfreguei os olhos, sentando na cama. Fui até o banheiro e soltei meus cabelos, os deixando bagunçados e volumosos, e escovei meus dentes.

Era o dia, afinal. O dia em que eu choraria litros por uma pessoa desconhecida, que veria mais dois adolescentes irem para a morte certa, com poucas chances de sobreviverem. Senti meus olhos lacrimejarem, mas me contive.

Fui até o quarto de minha mãe e bati de leve na porta, ouvindo um grito de “pode entrar”. Adentrei ao quarto e a encontrei sentada na beira da cama, com a cabeça entre os joelhos. Seu rosto estava inchado de tanto chorar, e seus lábios tremiam. Eu me aproximei e sentei no chão em frente a ela, a observando.

– O que aconteceu, mamãe? – perguntei quando percebi que estava mais calma.

– Natália, você é a coisa mais preciosa que eu tenho. Eu trocaria essa vida maravilhosa que seu pai me proporcionou pela certeza de que tudo correrá bem, que você não tenha chance alguma de ser chamada hoje.

– Mãe, meu nome está poucas vezes lá. Você sabe que minhas chances são mínimas, nada vai acontecer comigo.

– Você é tão frágil, tão delicada, não sobreviveria um dia sequer dentro daquela Arena miserável.

– Eu sei me cuidar, mãe. Lembra que o meu pai me ensinou a lutar e lançar facas? Poderia usar isso caso fosse chamada.

Ela voltou a chorar, e eu a acalmei. Relembrei dos nossos momentos felizes, contei sobre minha experiência no dia anterior, a fazendo sorrir de orgulho.

Estávamos tendo um momento bom, finalmente. Porém, não durou muito tempo. Meu pai entrou no quarto mandando nós nos arrumarmos que logo teríamos que ir para a praça do Edifício da Justiça. Meu coração acelerou, mas o obedeci, indo para meu quarto me vestir.

Coloquei meu vestido azul escuro favorito, que tinha vindo direto da Capital para mim, um presente de quando meu pai se reelegeu prefeito. Coloquei os mesmos sapatos pretos de sempre e prendi parte de meu cabelo para trás, deixando a oura parte solta, fazendo um belo e simples penteado. Lavei meu rosto novamente, e me olhei de perto no espelho.

Abaixo de meus olhos verdes, havia pequenas olheiras, que estavam me incomodando. As sardas em meu rosto eram quase invisíveis, o que eu agradecia, e minhas bochechas estavam coradas. Desci até a cozinha e peguei um morango, o espremendo. Peguei o líquido e passei em meus lábios, dando um tom um pouco mais belo para meu rosto.

– Você está linda – ouvi meu pai dizer atrás de mim, então me virei, o encarando.

– Obrigada.

– Está nervosa?

– Mais do que nunca.

Minhas pernas ficaram bambas assim que saímos de casa. Vi vários adolescentes passando, todos assustados e desanimados. Alguns paravam para me olhar, outros apenas seguiam seu caminho, o qual repetiam todos os anos. Meu pai segurou meu braço e minha mãe nos acompanhou em silencio.

Fomos até a praça e lá tivemos que nos separar. Meus pais foram para o palco, e eu fui para a fila me registrar.

Quando chegou minha vez, estiquei minha mão para que tirassem a amostra de meu sangue. Olhei para o papel e vi “WALDORF, Natália”. Daquele jeito eu me sentia uma prisioneira. Não que fosse muito diferente.

Procurei por Kyle no meio da multidão de garotos, e logo o vi encarando Greta, que estava a alguns metros em minha frente, com garotas de sua idade. Não nego – ele estava incrível. Seus cabelos loiros estavam penteados para trás, usava uma camisa branca e uma calça bege, com sapatos do mesmo tom.

Abaixei o olhar e esperei até que todos os adolescentes ficassem em seus devidos lugares. Era uma situação deplorável.

– Bem vindos! – disse uma mulher loira parada em frente ao microfone.

Era Lyra Falcon, a representante da Capital. Seus cabelos loiros estavam soltos e enfeitados com penas vermelhas, que combinavam com seu vestido brilhante e cheio de plumas. Ela usava um salto alto que pareciam laminas, e sua maquiagem estava mais chamativa do que nunca. Eu não evitei um riso ao vê-la em detalhes, sempre achei o jeito que as pessoas da Capital se vestiam exagerado e ridículo.

– Antes de começarmos, vamos passar um filminho feito especialmente pra vocês, vindo de lá da Capital! – ela disse animada, apontando para o telão.

E o filme de sempre começou, com a voz do Presidente de Panem. Falava sobre o levante dos distritos e a consequência disso – o que estava acontecendo naquele exato momento. O filme terminou e apenas Lyra aplaudiu. Ela abriu um largo sorriso e aproximou a boca do microfone, se preparando para falar as mesmas coisas de sempre.

– Garotas primeiro! – ela foi até o circulo de vidro a sua direita e colocou a mão ali, remexendo em todos os papéis até tirar um, voltando para o microfone. Ela abriu o papel e eu senti a tensão no ar. – Greta Grimory.

Minhas pernas ficaram bambas, e tudo em minha volta girou. Era a irmã de Kyle. Eu olhei pra ele e eu vi o desespero em seus olhos, gritando para que alguém se voluntariasse. Mas isso não aconteceu. Nenhuma das garotas mais velhas foi corajosa o suficiente para ir no lugar dela.

A garota começou a andar em direção ao palco. Eu respirei fundo.

– Eu me voluntario como tributo – gritei, fazendo com que todos os olhares se voltassem para mim.

Meu pai se levantou e eu ouvi um grito de minha mãe atrás de mim. Eu mordi meu lábio inferior e me concentrei para não chorar, indo até o palco. Greta me olhou assustada quando eu passei por ela, e eu pisquei, tentando mostrar que estava tudo bem. Subi ao palco e parei ao lado de Lyra, que me olhou incrédula. Meu pai continuava em pé atrás de mim, mas nada falou.

– Incrível, maravilhoso, esplendido – disse a mulher, sorrindo – diga seu nome, por favor, querida.

– Natália Waldorf – gaguejei.

– Palmas para o tributo feminino do distrito um, Natália Waldorf! Você foi muito corajosa, obrigada. Sei que aquela garotinha agradece a vida por você, literalmente.

Ver aquelas pessoas me encarando enquanto eu estava encima do palco era assustador. Alguns pareciam aliviados por não ter sido nenhum de seus familiares, outros me olhavam com pena. Realmente, aquela situação era aterrorizante e desconfortável.

Kyle me olhava pasmo, sem acreditar que eu havia feito aquilo para salvar sua irmãzinha. Mesmo que só tinha o conhecido direito no dia anterior, eu entendia o seu desespero, sabia que não conseguiria viver bem vendo sua irmã ir para os Jogos Vorazes. Ele disse um “obrigado”, que eu consegui ver de longe.

– Agora o tributo masculino – Lyra disse, fazendo com que eu balançasse a cabeça de nervosismo. – Kyle Grimory. Oh, incrível, se não fosse por nossa voluntária teríamos irmãos nesses jogos!

Meu mundo desabou ali mesmo. Eu havia salvado a irmã de meu amigo, mas não pude salvá-lo. Droga de vida.

Ele subiu ao palco com os ombros rígidos, e eu o segui com o olhar. Aquilo só podia ser muita falta de sorte.

– Palmas para os tributos do Distrito um! – disse Lyra, batendo palmas sozinha novamente – Cumprimentem-se.

Eu estiquei a mão para ele, o qual recusou, partindo para um longo abraço.

– Você salvou minha irmã, eu vou salvar você – ele sussurrou em meu ouvido, fazendo com que a primeira lágrima daquele dia caísse em meu rosto.

Nos separamos e a mulher colocou a mão sobre nossos ombros, nos levando para dentro do Edifício da Justiça. As portas atrás de nós foram fechadas por pacificadores, e a partir daquele momento eu tive certeza do que fiz.

Eu seria mandada para os Jogos Vorazes.


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