Alizée et Chermont escrita por Velvet


Capítulo 2
Deux


Notas iniciais do capítulo

Oi, pessoinhas. Tudo bom? Eu terminei esse ontem de noite, mas parece que minha internet não quer conectar no meu notebook (só nele), então eu não consegui postar. Eu não exatamente sei se gostei desse capítulo.
Ah, só uma coisa: os capítulos vão ser narrados alternadamente pela Alizée e pelo Chermont. Então esse capítulo é do Chermont.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/525826/chapter/2

Tirei os fones de ouvido e olhei ao redor, meu quarto estava ameaçando revolução, mas eu já estava acostumado e passei com os olhos pela bagunça sem me importar muito. Finalmente, quando ouvi o barulho outra vez, foi que notei que isso que tinha me estranhado. Era a gargalhada extremamente desagradável e altíssima de Alizée.

Joguei o telefone em cima de uma poltrona, no canto do quarto, e peguei uma camiseta em cima de uma pilha de roupas que eu achava que estavam mais ou menos limpas.

Estava pretendendo só pedir pra ela calar a boca com toda a educação que me foi ensinada, mas quando eu vi por que ela estava rindo daquele jeito (que eu até admito que já me acostumei), eu só consegui sorrir. Sorrir perversamente.

Era o pateta do namoradinho dela.

Ela estava sentada no sofá, e consequentemente de costas para mim, então eu podia ver a tela por cima do ombro dela e o Pouca Sombra conseguia me ver também. E é claro que ele parou de rir assim que me viu. Alizée olhou para trás meio surpresa e tomou um susto, porque eu já tinha me aproximado o suficiente para que eu ficasse cara a cara com ela, minhas mãos no encosto do sofá.

– Oi, Coração – debochei. Eu provavelmente não devia ter começado com isso de Coração pra cá e pra lá, mas era divertido ver o rosto dela sofrer com uns espasmos de raiva e depois esfriar para uma indiferença calculada. – Me traindo com esse daí? – Medi minha cara na frente da câmera do notebook e olhei com uma carranca de verdade para o amigo dela do outro lado, aquele filho da mãe.

Você, cara pessoa, talvez esteja se perguntando por que eu odeio tanto esse cara, mas ele tem escrito na testa que é um playboy machista desses que parece ter em todo canto, eu não sei como a retardada da Alizée nunca viu isso, mas eles devem se pegar, mesmo que ela jure de pé junto que não (logo antes de dizer “Por que eu estou te dando satisfação mesmo?”, e me mandar ir lamber sabão).

– Vai lamber sabão, Chermont – ela bufou e pegou um travesseiro e jogou em mim. – Desculpa, Jean, mas você sabe como esse babaca é.

Ela me ignorou tacitamente enquanto retomava o papo com o Jean. Jean Tailleur, tem nome mais ridículo?

Desisti de irritar a Boulanger e o Tailleur, e fui pomposamente para a cozinha, escondendo a carranca até cruzar a porta. Abri a geladeira e peguei um pouco de queijo e dei de ombros ao pegar uma garrafa de vinho que estava de bobeira.

Eu descontava minha raiva no queijo, cortando o pobre com meu canivete como se estivesse tentando assassinar o queijo em homicídio triplamente qualificado. Não era só por causa do melhor amigo playboy da minha colega de quarto descerebrada, eu só conseguia olhar languidamente para a porta da cozinha e pensar se havia algum cartão de aniversário na caixa de correio do nosso apartamento no lobby. Provavelmente não.

Alizée veio com uma ideia no café da manhã de ir pra uma festa que ia ter hoje na casa de alguém, mas eu não estava querendo sair de casa. Eu nunca contei para ninguém, mas eu sempre assisto Rei Leão na noite anterior ao meu aniversário, porque talvez no fundo eu me sinta exatamente como Simba, vivendo minha vida à Hakuna Matata. E eu sei que isso provavelmente faz com que eu pareça bem gay, mas eu não ligo.

Olhei para a porta mais uma vez e desisti de ficar me martirizando, e fui confirmar que a caixa do correio estava vazia. Enquanto descia as escadas pisando de dois em dois degraus (nunca tive paciência para o elevador lento do prédio), tentava me concentrar só na parede de branco gelo que eu tinha certeza que já ouvira Alizée chamando de “cinza feio”.

Tirei a chave do bolso e abri caixinha de metal e madeira, e havia dentro um grosso maço de envelopes. Carta da imobiliária, conta de luz, vale-compras, uns panfletos da universidade e... Um cartão de aniversário.

Para: C. Chevalier

De: A. e P. Chevalier

Ao nosso neto em comemoração ao seu 23º aniversário. Os melhores votos.

Encarei o cartão com olhos vidrados. Por que aquilo não havia sido extraviado? Eles poderiam ter simplesmente se abstido de mandar um, mas aquilo foi claramente escrito pela assistente de Pierre ao seu mando, poderia facilmente ser a resposta para o pedido “Escreva algo frio como um iceberg, Amelie e eu não queremos ele achando que estamos realmente desejando um feliz aniversário”.

E eu ri. Eu ri como um maníaco olhando o papel branco e sem alegoria em minhas mãos, e o envelope impessoal no chão. Em pouco tempo eu estava gargalhando, o descontrole completo me assustando mais do que eu poderia assustar alguém que me visse daquele jeito.

Depois de um tempo eu me acalmei o suficiente para começar a chorar silenciosamente. Rastejando escada a cima e entrando em casa pela porta da cozinha, conseguindo chegar ao meu quarto sem ver alma viva, eu não havia ideia sobre onde Alizée estava, e não me importava, só queria que estivesse bem longe.

Eu peguei o notebook na minha estante de livros e me deitei na cama com ele na minha mesa de cabeceira, dando o play em o Rei Leão. Aquela tempestade na minha cabeça me privando de todos os sentidos, mas as falas que eu já sabia de cor, e o borrão laranja na tela tinham algo de estranhamente calmante. Depois de algumas horas, o sol já havia baixado no céu e já estava na segunda vez em que via Simba decidir voltar, e acho que cai no sono.

Acordei na outra manhã com os raios de sol batendo no meu rosto e esquentando minha pele, abri os olhos e fiquei admirando a luz transpassando os vitrais azuis.

Era meu aniversário de 23 anos e eu ia fazer algo muito legal, mas muito legal mesmo, tão legal que Amelie e Pierre não iriam nem passar pela minha cabeça.

Levantei e fui tomar uma ducha rápida, decidido também a encontrar alguma coisa limpa de verdade pra usar, ter um maravilhoso café da manhã com Alizée (porque café da manhã é um momento de trégua, e porque ela não tem ideia de que é meu aniversário), e depois ligar para algum dos meus amigos que sabiam para saber o que seria.

Mas quando sai do meu quarto completamente pronto e no pique, vi que ainda eram 6 da manhã. Sério? Tem coisa pior que ter que esperar os outros acordarem?

Bufei e peguei a carteira na minha cômoda, eu teria mesmo que ir comprar umas tortas ou alguns bombons pra entregar hoje, já que era o que rezava a tradição. Fui na padaria que havia a umas poucas quadras, ainda aproveitando os resquícios do ar frio da noite. O vento brincando de morder minha pele onde a parka não cobria.

Eu comprei um bolo, uma torta, dois pacotes dos meus macarons favoritos, pães e ainda comprei queijos no caminho de volta. Preparei o café da manhã e coloquei tudo na mesa na varanda, antes de ir acordar Alizée.

Senti-me estranho entrando no quarto dela sem bater, tudo estava organizado, e o maior sinal de desleixo era uma pequena pilha de rouba no canto. Sentei no chão ao lado do rosto dela e cutuquei sua barriga, ela se revirou satisfatoriamente, devia ser cheia de cócegas. Não, Chermont, você não devia deixar esse presente de aniversário, descobrir que Alizée tem cócegas, sem ter nenhum uso...

Coloquei minhas mãos em sua barriga e movi os dedos, tentando acorda-la, ela começou a se revirar outra vez, e a perna direita dava chutes aleatórios, ela ainda estava a meio caminho, ainda com os olhos fechados, mas expressão desconfortável e irritada no rosto.

Eu soube que ela acordou, porque eu estava lá em um momento atacando os pontos notórios onde pessoas tem cócegas, e em outro momento estava batendo minha cabeça na quina aos pés da cama, porque ela havia me coiceado.

Fiquei encarando o teto do chão do quarto, tentando parecer pior do que eu já estava, mas era um trabalho árduo, PORQUE EU NÃO PODERIA ESTAR PIOR.

– Sua assassina maluca! – Bradei do chão. Ela veio correndo sentar no chão ao meu lado, com a cara mais preocupada que eu já a vi fazer.

– Me desculpa, me desculpa, me desculpa, eu juro que não queria te fazer sangrar... – eu a cortei com um grito.

– EU TÔ SANGRANDO? – Passei a mão pela minha testa e senti o líquido quente e espesso.

– Fica deitado aí, eu vou concertar isso – ela sumiu de vista e eu achei melhor deixar minha cabeça no chão, talvez assim parasse de sangrar.

Alizée colocou uma enorme caixa branca do meu lado e começou a tirar coisas de lá, tocando na ferida com as pontas dos dedos e depois limpando com um algodão. Quando ela terminou, eu tinha o mais feio dos curativos bem na minha testa, sorrindo para o meu magnífico dia.

– Desculpa, eu realmente não queria te machucar, mas eu acho que configura legítima defesa! Você estava me fazendo cócegas! – Ela levantou os braços exasperada – Mas pra provar minhas boas intenções, eu cuido do café hoje.

– Tarde demais – murmurei zangado.

Nós fomos para a varanda e os olhos dela brilharam no sol ao ver a comida, parecia prestes a voar na mesa.

– Sabia que eu quase gosto de você quando faz isso? – Ela sorriu, já se sentando e colocando café em uma xícara.

– Pela quantidade de dentes nesse sorriso, acho que você gosta muito mais de mim do que está deixando escapar. Ou da comida – Acrescentei, eu ainda estava meio carrancudo pela quase decapitação, mas estava difícil, com a empolgação dela.

– Da comida, com certeza, não se iluda – ela murmurou, colocando uns três tipos diferentes de pão no prato, e um generoso pedaço de queijo.

Nós nos entregamos à tarefa de acabar com tudo aquilo sem nenhuma pressa, aproveitando o sol da primavera. Levantei o rosto para contar a Alizée alguma coisa banal que eu tinha visto na internet, talvez sobre fotografia – porque ela fazia faculdade de fotografia e, na minha cabeça, eu tinha obrigação de comentar cada editorial que eu visse com ela –, mas acabei esquecendo no mesmo instante. Os raios do sol brilhavam no cabelo muito preto dela e na pele muito alva, criando um contorno luminoso. A brisa leve, mas fria, moldando a blusa de mangas longas e leves ao seu corpo. Ela estava de cabeça baixa, encarando um dos macarons e o revirando com os dedos longos, e seus cílios pretos tocavam-lhe a pele. Desviei os olhos quando ela levantou a cabeça.

Era tão estranho saber que depois de um ano vivendo com ela, Alizée não sabia o dia do meu aniversário, ou outras coisas idiotas, como minha cor favorita, mas sabia da maior parte das minhas manias.

Depois que terminamos, e Alizée cuidou gentilmente (provavelmente ainda estava se sentindo meio culpada) da louça, eu fui para o meu quarto e liguei para Enzo, meu melhor amigo, para combinarmos algo mais tarde. Eu queria beber até cair. Mas infelizmente Enzo parecia o doente modelo de Madre Tereza de Calcutá:

– Eu to de cama, cara – ele disse com a voz típica de alguém gripado –, e parabéns pelo aniversário, quando eu conseguir ficar em pé outra vez a gente sai pra fazer algum... – esse ponto ele espirrou e praguejou com alguém por cleanex.

Minhas das minhas três outras opções, uma se mostrou indiferente, a outra ocupa e o ultimo parecia vítima de uma doença tropical que ele pegou ao estudar o vírus no laboratório da universidade (?). Mas na quarta tentativa meu bom colega da aula de desenho anatômico da universidade e eu combinamos de ir pra alguma festa onde havia a grande probabilidade de a polícia ir parar. Exatamente o tipo que eu queria. Mas ainda era meio-dia e pelo resto dele, eu não tinha nada pra fazer. Absolutamente nada.

Peguei o notebook e fui para a sala, pensando em pesquisar no Google “Coisas para fazer em Paris”, mas Alizée parecia em sintonia com os meus pensamentos pelo menos uma vez na vida:

– Vamos no Louvre?

Mas cinco minutos depois – que ela disse que ia usar para se trocar e eu usara para encarar minhas meias – ela volta e solta:

– Eu estou com uma cólica infernal, eu vou pegar um comprimido e deitar pelo resto do dia, mas eu não quero estragar sua tarde, vai só – e com isso me chutou do apartamento.

Eu não tive opção senão passar o resto do dia me deleitando com a mais incrível coleção de arte do planeta. É claro que eu estava devidamente incomodado com todos me chutando no dia do meu aniversário.

Quando eu voltei pra casa as oito, escolhi subir os lances de escada observando o padrão da pedra que usaram. Eu até vi um tigre. Mas minha maior descoberta foi ao abrir a porta do apartamento.

– Mas que porra...?


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E o que vocês acharam? Comentem aqui em baixo e acompanhem a história também, o próximo capítulo já tá quase pronto.